Home office... quais os limites?


24/09/2019 às 17h57
Por Gisele Cruz Advocacia

Está cada dia maior a opção pelo trabalho em casa. O home office já é realidade. Além de ser uma boa opção para fugir do trânsito caótico de grandes cidades e aproveitar o aconchego do lar, as diversas cirses econômicas contrituíram para que os brasileiros se reinventassem e buscassem trabalhos caseiros para driblar a falta de dinheiro.

Essa facilidade é favorecida pelo avanço tecnológico que aproxima cada vez mais os clientes dos fornecedores, os empregados dos empregadores, sem que seja necessário ter um endereço profissional para demonstração ou execução de seus produtos/serviços, ou mesmo espaço para reuniões ou deliberações. Outrossim, as empresas têm permitido seus funcionários trabalharem em casa, o que contribui com a satisfação de seus colaboradores bem como auxilia na economia com transporte e gestão do tempo.

Por óbvio, aquelas pessoas que vez ou outra trabalham em casa por liberalidade de seus patrões, pouco interferem no cotidiano do condomínio onde residem. Não atrapalham em nada, pois trabalham remotamente utilizando-se apenas, na maioria das vezes, de computadores.

Por tal motivo, foca-se aqui naqueles que comandam seus pequenos negócios de forma permanente em casa, mais especificamente em prédios de apartamentos residenciais.

Não há normas legais expressas que proíbam o home office, mas também não existe nada que autorize o trabalho em apartamentos.O bom senso ajuda a ter um bom relacionamento com os vizinhos; a observância ao que dispõe a convenção e regulamento interno do condomínio completam a política da boa vizinhança.

Como não só de bom senso vive a sociedade, algumas regras devem ser observadas para que a boa convivência impere.

Primeiramente, deve-se observar a finalidade do imóvel. Imóvel residenciais não podem ter uso unicamente comercial. A lei não permite essa alteração de destinação local: unidades residenciais são proibidas de se tornarem comerciais. Ora, a unidade privativa não pode virar apenas escritório, por exemplo. A finalidade residencial deve ser preservada.

Isto porque a destinação da unidade autônoma deve ser a mesma da edificação, conforme reza o Código Civil, no art. 1336 que dispôe acerca dos deveres dos condôminos.

Lado outro, é imperioso que o direito do condômino ao conforto de sua residência seja reservado. É importante que não haja nenhum tipo de perturbação aos vizinhos, seja ele de barulho excessivo, aumento de energia ou água, elevado tráfego de pessoas estranhas ao condomínio, dentre outros incômodos.

Veja então que os limites legais e de boa convivência devem ser seguidos à risca. Tudo aquilo que causa problema para a saúde, sossego e segurança dos moradores do condomínio, é naturalmente proibido. É a regra geral! Se a atividade profissional for realizada com moderação, a convivência torna-se pacífica. De outro norte, se o morador promove movimentações que perturbem os demais condôminos, realiza comércio nas áreas comuns do edifício, ou mesmo utiliza os funcionários do prédio para serviços de sua empresa, esse pode sofrer sanções por perturbar a ordem do condomínio.

Abra-se um parênteses para mencionar que, no que tange a utilização dos funcionários do condomínio para fins pessoais, a prática é proibida. Isto porque os funcionários do condomínio enquadram-se na categoria de empregado doméstico. Ao fazerem serviços para as empresas que ali operam em home office, o enquadramento destes seria outro, eis que exerce atividade profissional empresarial, diversa de 'empregado doméstico'.

Na verdade, o segredo para quem trabalha no sistema de home office é evitar ao máximo qualquer possível desconforto aos demais moradores. Receber muitas pessoas na unidade, provocar barulho ou mau cheiro constantes e usar as áreas comuns para o exercício de sua atividade, pode gerar muitos problemas, ainda mais se esse (mau) uso das áreas comuns resultar em um aumento nos gastos de energia ou água rateados pelos condôminos.

Uma pessoa que faz doces em casa para vender não causa dificuldades e perturbações. Contudo, se a atividade for vender marmita, produzindo umas 100 refeições por dia, isso seria um problema. Ora, essa atividade de grande proporção pode impactar em maior gasto de água, entra e sai de pessoas (fornecedores, entregadores...), comprometendo assim o orçamento e a segurança do condomínio.

O mesmo acontece com os professores, por exemplo. Se o professor de aulas particulares recebe em sua casa um número limitado de alunos, sem ruídos ou gritaria, não há qualquer óbice. Ao passo que um professor de piano ou de bateria poderia ter alguns problemas. Não por causa da música, mas é que sendo a unidade exclusiva de uso residencial, os moradores buscam refúgio, tranquilidade e paz no seu lar, e o barulho excessivo e contínuo seriam pertubadores.

Assim, antes de aderir ao home office, o morador de condomínio deve considerar: se tem espaço suficiente para exercer atividades dentro de sua unidade; se sua atividade gera barulho excessivo ou circulação significativa de pessoas na área comum; se a atividade envolve produtos tóxicos, inflamáveis ou de forte odor, as quais não podem ser permitidas. Finalmente, sem exclusão de outras avaliações sobre o que seja permitido/proibido pela convenção e regulamento interno do condomínio, deve-se verificar pernte o Município se a atividade devidamente registrada permite ou não licença e/ou alvará de funcionamento em condomínios, em áreas com restrição de uso.

A tendência dos grandes empreendimentos imobiliários é a previsão de áreas comuns destinadas aos condôminos que aderem ao home office, por preferirem levar uma vida sossegada, evitando trânsito e perda de tempo útil. São salas equipadas com computadores e projetores, grandes mesas de reuinão, revestimentos para evitar que o barulho perturbe os demais moradores. Há até aqueles que contam com torres separadas para fins comerciais e residenciais. Importante lembrar que, nesses casos, essas áreas são de uso comum e não devem ser encaradas como extensão da unidade.

Todavia, não basta a boa vontade e visão empreendedora, o espaço de uso coletivo é regido pelas normas do condomínio, as quais são deliberadas e aprovadas por todos os condôminos.

Desta forma, como já foi dito, as atividades realizadas em home office não podem esbarrar nas normas nem no direito do vizinho de usufruir da sua residência de forma plena e serena.

Caso o síndico perceba alterações no comportamento de algum morador, ele pode, depois de adverti-lo, proibir a atividade exercida e aplicar-lhe multa, observando o que dita a convenção, podendo ainda, em último caso, ajuizar uma ação para que cesse essa perturbatória atividade. Ou ainda, para se resguardar, pode convocar uma assembleia e nela colocar a celeuma para que os próprios condôminos deliberem.

O ideal mesmo seria todos os proprietários deliberarem juntos acerca da possibilidade de exercer atividades em casa. Ademais, dependendo do espaço do edifício, o condomínio poderia até lucrar com o home office... alugando espcaço para exposição de víedos, para reuniões, conferências etc, podendo cobrar um valor extra para utilização dos espaços comuns para esse tipo de atividade.

Na própria convenção do condomínio deve haver menção sobre a finalidade de uso das unidades - geralmente residencial apenas. Já o regulamento interno deve prever os tipos de atividades permitidas no condomínio. Caso um morador exerça algo fora desse escopo - mas que não incomode o próximo - o regulamento deve ser alterado. Caso contrário, o empreendimento tem o regulamento a seu favor para barrar a atividade irregular. 

Em todo caso, o que mais importa é saber que o direito de uma pessoa esbarra no direito da outra. O direito de propriedade e o de exercício de atividade profissional sofrem limitações, não são absolutos. Há de se respeitar o espaço e as deliberações comuns do condomínio.

 

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Gisele Cruz Advocacia

Advogado - Belo Horizonte, MG


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