Como o consumidor pode utilizar o direito de desistência ou reflexão após a conclusão do contrato?


15/05/2018 às 13h20
Por Advocacia Antonio Vinicius

O Código de Defesa do Consumidor (CDC) traz norma que, rompendo com a lógica contratual clássica, enseja ao consumidor o direito de desistir do contrato – sem qualquer motivação – nos sete dias seguintes, contados da assinatura ou ato de recebimento do produto ou serviço.

Este direito, porém, só terá lugar se a contratação se deu fora do estabelecimento comercial “especialmente por telefone ou a domicílio”. A internet, atualmente, talvez seja a grande destinatária da disposição legal.

Estatui o art. 49: “O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar da sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a  domicílio”.

Repita-se que tal direito independe de qualquer vício (problema) do produto ou serviço. Não se trata de defeitos que oportunizam a rescisão contratual. Nesta hipótese teremos o direito de desistência, nos sete dias seguintes, incondicionado, independente de qualquer motivação.

A renúncia contratual a tal direito é inválida. Lembramos que o CDC é norma de ordem pública (CDC, art. 1º), razão pela qual são nulas as renúncias, mormente prévias, a direitos e garantias nele assegurados.

Trata-se, em suma, de norma que objetiva resguardar o consumidor das agressivas estratégias de vendas, perante as quais fica esvaziada a capacidade do consumidor de meditar acerca da conveniência do ajuste. Muitas vezes o consumidor se deixa levar pelo impulso, ou mesmo se mostra incapaz de dizer não à insistência habilidosa do vendedor, e termina por adquirir ou serviço que não precisava, ou pior, que não terá como pagar sem grave sacrifício pessoal.

Considera-se contratação feita fora do estabelecimento comercial aquela em que o fornecedor, valendo-se de ousadas técnicas de marketing, convida consumidores a comparecer em determinado local, onde são veiculados vídeos e oferecidas bebidas alcoólicas, e depois os consumidores, sob sutil pressão psicológica, são convidados a assinar contratos relativos aos bens oferecidos.

Por essas razões o CDC estabelece esse direito de desistência – uma espécie de denúncia vazia – nos sete dias referidos, desde que o ajuste se dê nos moldes apontados. Esse direito de reflexão, por assim dizer, será – imaginamos – crescentemente utilizado nas vedas realizadas pelo comércio eletrônico. Cabe repetir que são inválidas quaisquer cláusulas contratuais que tragam renúncia a tal disposição legal. O arrependimento não depende de forma específica, podendo ser realizado – e provado – de qualquer modo pelo consumidor.

Por essas razões o CDC estabelece esse direito de desistência – uma espécie de denúncia vazia – nos sete dias referidos, desde que o ajuste se dê nos moldes apontados. Esse direito de reflexão, por assim dizer, será – imaginamos – crescentemente utilizado nas vendas realizadas pelo comércio eletrônico. Cabe repetir que são inválidas quaisquer cláusulas contratuais que tragam renúncia a tal disposição legal. O arrependimento não depende de forma específica, podendo ser realizado – e aprovado – de qualquer modo pelo consumidor.

O STJ, no entanto, já teve oportunidade de se manifestar, dizendo que esses sete dias se contam a partir da celebração do negócio, não da efetiva entrega do bem, em se tratando de bem imóvel: “O direito de arrependimento previsto no artigo 49 do CDC se esgota decorridos sete dias da celebração do negócio, ainda que a entrega do bem dependa da conclusão do prédio. Extensão indevida a regra destinada a proteger o consumidor de uma prática comercial na qual ele não desfruta das melhores condições para decidir sobre a controvérsia do negócio, circunstância essas que não persistem depois de prolongada execução do contrato” (STJ, REsp. 57.789, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, 4ª T, j. 25/04/95, p. DJ 12/06/95).

Tem sido comum o consumidor fazer a compra no estabelecimento comercial, mas sem acesso ao bem. Na compra de veículos em concessionária, por exemplo, o vendedor faz o pedido, muitas vezes, através da internet, não havendo disponibilidade do bem, fisicamente, na loja. Poderá haver o direto de arrependimento neste caso?

O Direito de desistência imotivada tem, em sua origem, duas razões básicas: a) maior vulnerabilidade do consumidor fora do estabelecimento comercial; b) ausência de contato direto com o bem. No caso da compra do carro pela internet – mas dentro do estabelecimento comercial e com o pedido feito pelo vendedor da concessionária – não há contato direto com o produto, fisicamente. Há bens – como um carro, por exemplo – em que essa apreciação física do produto é importante. As expectativas do consumidor podem, em alguma medida, não ser confirmadas. Por isso cremos que, nessas situações, deverá incidir a proteção consagrada no art. 49 do CDC.

Devolução dos valores pagos pelo consumidor

O exercício do direito de reflexão e arrependimento traz, se já pago quaisquer valores, a natural pretensão de tê-lo de volta. Dissolvido o pacto contratual, faz-se imprescindível o retorno ao estado anterior, com a devolução atualizada de tudo quanto foi despendido.

É o que ordena o parágrafo único do art. 49: “Se o consumidor exercitar o direito de arrependimento previsto neste artigo, os valores eventualmente pagos, a qualquer título, durante o prazo de reflexão, serão devolvidos de imediato, monetariamente atualizados”.

Questão interessante surge a propósito dos custos de remessa. Se alguém, digamos, compra de um computador pela internet e, dentro do prazo dos sete dias, desiste da compra, quem arcará com as despesas de envio e, eventualmente, de reenvio? Se, no exemplo dado, o computador já tiver chegado ao domicílio do consumidor, precisará ser enviado de volta. Quem arcará com os custos?

O STJ, ao que nos consta, ainda não decidiu a questão. A inteligência mais harmônica com o CDC sinaliza que tais custos devem ser arcados pelo fornecedor de produtos ou serviços. A teoria do risco – crescentemente em sede de responsabilidade civil, sobretudo depois de consagrada pelo Código Civil, art. 927, parágrafo único – impõe a quem usualmente usufrui dos bônus de determinada atividade arcar também com os ônus que ela eventualmente cause. Essa teoria pode ser lembrada como argumento de reforço. Dificilmente, porém, os fornecedores, sem questionamento judicial, concordarão em arcar com esses custos. Os valores, ademais, são pequenos, e isso talvez desestimule o consumidor de ir a juízo, individualmente, questionar a cobrança. De toda sorte, a devolução deverá ser imediata (CDC, art. 49, parágrafo único). O fornecedor não poderá fixar prazo para realizar a devolução atualizada dos valores. Vale lembrar que são nulas as cláusulas contratuais que subtraiam ao consumidor a opção de reembolso da quantia já paga (CDC, art. 51, II).   

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Advocacia Antonio Vinicius

Advogado - Salvador, BA


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