Sociedade Simples, como funciona?


31/08/2023 às 16h28
Por Aline Barbosa

Diferente da sociedade empresária, as sociedades simples são destinadas ao exercício de atividade intelectual, profissionais liberais, a título de exemplo: os médicos, advogados. A sociedade simples pode se constituir segundo dois modelos diversos (Código Civil, art. 983), podendo se organizar conforme as regras do Código Civil que contemplam um tipo de sociedade (art. 997 a 1.038) ou adotar a forma de sociedade empresária, desde que não seja a de sociedade anônima, em comandita por ações ou cooperativa.[1]

 

Abaixo, alguns aspectos das sociedades simples.

 

Contrato Social, por se tratar de uma sociedade de pessoas, as sociedades simples têm natureza contratual (Código Civil art. 981), devendo o contrato ser na sua forma escrita, seguindo as exigências previstas no art. 997 do Código Civil, in verbis:

 

“Art. 997. A sociedade constitui-se mediante contrato escrito, particular ou público, que, além de cláusulas estipuladas pelas partes, mencionará:

I - nome, nacionalidade, estado civil, profissão e residência dos sócios, se pessoas naturais, e a firma ou a denominação, nacionalidade e sede dos sócios, se jurídicas;

II - denominação, objeto, sede e prazo da sociedade;

III - capital da sociedade, expresso em moeda corrente, podendo compreender qualquer espécie de bens, suscetíveis de avaliação pecuniária;

IV - a quota de cada sócio no capital social, e o modo de realizá-la;

V - as prestações a que se obriga o sócio, cuja contribuição consista em serviços;

VI - as pessoas naturais incumbidas da administração da sociedade, e seus poderes e atribuições;

VII - a participação de cada sócio nos lucros e nas perdas;

VIII - se os sócios respondem, ou não, subsidiariamente, pelas obrigações sociais.”[2]

 

Nome, poderá as Sociedades Simples utilizar firma ou denominação. Enunciado nº 213 da III Jornada de Direito Civil: “O art. 997, inc. II, não exclui a possibilidade de sociedade simples utilizar firma ou razão social.[3] Com exceção das sociedades de advogados, que somente será permitido a razão social (art. 16, § 1º, do Estatuto da Advocacia).

 

Objeto Social, o contrato social deverá indicar o seu objeto social, vale lembrar que a definição precisa do objeto social é de suma importância para a delimitação de responsabilidade por ato dos administradores.

 

Capital Social, é o montante monetário, material (bens imóveis ou móveis) ou imaterial (marcas, patentes) investido pelos sócios na formação da sociedade, para o desempenho de seu objeto social. O capital social não deve ser confundido com o patrimônio social que é constituído no que a sociedade possui de ativos e passivos, que pode ser negativo ou positivo.

 

O Capital Social tem uma função de produção, ou seja, garante o custeamento das atividades da sociedade para a realização do seu objeto, bem como de organização, pois cada sócio responde conforme as cotas investidas, além de ter uma função de garantia para os credores.[4]

 

É fundamental que haja uma adequação do capital social ao objeto social, tendo em vista que o capital social confere proteção aos credores da sociedade. Uma sociedade pode estar subcapitalizada quando o seu capital social for incapaz de financiar a concessão do seu objeto social, nesse caso será necessário o aumento do capital social, a inobservância levaria a uma transferência dos riscos do negócio aos credores e demais membros do mercado e da sociedade.

 

Segundo o professor Fábio Guimarães Bensoussan[5], o capital social é orientado por dois princípios: o da efetividade, segundo o qual o capital social deve corresponder aos bens ou dinheiro trazido pelos sócios na formação da sociedade e o da intangibilidade, indica que o capital social deve permanecer inalterado, a menos que haja determinação legal ou deliberação social.

 

É dividida em quotas, devendo ser expresso em moeda corrente nacional, compreendendo dinheiro ou bens suscetíveis de avaliação pecuniária. As quotas podem ser definidas como uma parcela do capital social que representa o quinhão que cada sócio possui do patrimônio da sociedade e dos seus direitos e deveres daí decorrentes.

 

A integralização das quotas, pode ocorrer mediante dinheiro ou bens, suscetíveis de avaliação monetária, materiais ou imateriais. Nas Sociedades Simples é possível, excepcionalmente, a contribuição do sócio em serviço (art. 997, V, do Código Civil), no entanto esse sócio sofre algumas restrições como por exemplo: não pode exercer a mesma atividade fora da sociedade, sem a expressa autorização no contrato social (Art. 1.006 do Código Civil).

 

Aquele sócio que integralize suas quotas por meio de crédito de sua titularidade responderá pela solvência do devedor (art. 1.005 do Código Civil). Ainda, o Sócio que integraliza suas quotas com imóvel e que posteriormente venha a perder o bem, considerando a perca, não há o que se falar em integralização da quota, o que é um problema, pois o sócio continua obrigado, deste modo gerando responsabilidade solidária aos demais sócios em relação a parcela não integralizada (art. 1.052 Código Civil). O sócio que integralizar sua quota com bem reclamado por terceiro, responde pela evicção (art. 1.005 Código Civil).

 

O sócio que está inadimplente com a integralização de suas cotas, é chamado de sócio remisso (art. 1.004 do Código Civil), podendo os demais sócios executá-lo, excluí-lo do quadro societário ou, ainda, reduzir sua participação ao montante já integralizado. (Art. 1.031 do Código Civil).

 

Responsabilidade dos sócios¸ a responsabilidade do sócio deve constar expressamente no contrato social (art. 997, inciso VIII do Código Civil). Surge uma dúvida, os sócios respondem subsidiariamente pelas dívidas da sociedade?

 

O artigo 1.023 do Código Civil dispõe que se os bens da sociedade não lhe cobrirem as dívidas, respondem os sócios pelo saldo na proporção em que participam das perdas sociais, salvo cláusula de responsabilidade solidária. O artigo 1.024 prevê que os bens particulares dos sócios não podem ser executados por dívidas da sociedade, senão depois de executados os bens sociais, ou seja, estabelece um benefício de ordem.

 

Vale lembrar que conforme aduz o artigo 1.026, pode o credor particular do sócio, na insuficiência de outros bens do devedor, executar sua parcela dos lucros da sociedade, ou a parte que lhe couber em liquidação. Pode ainda requerer a liquidação da cota do devedor (Art. 1.031 Código Civil).

 

A responsabilidade entre os sócios de sociedade simples, poderá ser limitada à proporção da participação no capital social, ressalvadas as disposições específicas, Enunciado nº 10, da I Jornada de Direito Comercial do CJF.

 

Na omissão do contrato social, valerá as regras gerais do artigo 1.023 e 1.024 do Código Civil, que prevê a responsabilidade dos sócios como subsidiária e ilimitada.

 

A Sociedade deverá levar os atos constitutivos ao Registro Civil de Pessoas Jurídicas (caso seja uma cooperativa ou uma sociedade de advogados, sujeitas a registro próprio). Os atos deverão estar acompanhados de: requerimento de arquivamento, o instrumento contratual, a procuração (quando o sócio estiver sendo representado por procurador) e a autorização governamental, caso o objeto social assim o exija.

 

Alteração do contrato social, as sociedades simples tendo o seu aspecto contratual e pessoal, o Código Civil exige em seu art. 997 que seja decidido por unanimidade dos sócios as alterações contratuais tratadas no artigo.

 

Direitos e obrigações dos sócios, é com a formalização do contrato social que se inicia a vida da sociedade simples, bem como as obrigações dos sócios (Código Civil art. 1.001) que são a de contribuir para com a formação do capital social - subscrevendo e integralizando as cotas – e do direito de participar dos resultados sociais.

 

Na sociedade simples o vínculo contratual é intuitu personae, diante disso o ingresso de pessoa estranha ao quadro societário deve ser objeto de anuência dos demais (Artigo 1.002 e 1.0003 do Código Civil). Retirar sócio de uma função que lhe foi dada na constituição da sociedade, representa violação do anteriormente acordado e deve ser algo acordado entre todos os demais sócios e representado por alteração contratual.

 

Diante dessa particularidade é que o legislador deu tratamento especial à cessão de cotas, como é possível acompanhar no art. 1.003 do código civil onde determina que a cessão de cotas somente terá eficácia perante a sociedade e aos sócios remanescentes quando houver alteração do contrato social e consentimento dos demais sócios. Ainda, o sócio cedente das suas cotas, responderá solidariamente como o cessionário, pelas suas obrigações, perante a sociedade e terceiros, até dois anos a partir da alteração contratual.

 

Sobre a distribuição de resultados, característica de toda sociedade, o artigo 1.007 do código civil prevê que salvo disposição ao contrário, o sócio participa dos lucros e das perdas, na proporção das respectivas quotas, mas o sócio que a contribuição consiste em serviços, somente participará dos lucros, na proporção da média de valor das quotas, isso na sociedade simples pura, não na empresária.

 

É nulo a cláusula contratual que estipula a exclusão de qualquer sócio de participar dos lucros e perdas, conhecida como cláusula leonina (1.008 do Código Civil).

 

A administração de sociedade simples pura, somente pode ser exercida por pessoa física, sócia ou não sócia, sendo afastado pelo Artigo 1.011 § 1º do Código Civil a administração da sociedade por aqueles que:

 

§ 1 o Não podem ser administradores, além das pessoas impedidas por lei especial, os condenados a pena que vede, ainda que temporariamente, o acesso a cargos públicos; ou por crime falimentar, de prevaricação, peita ou suborno, concussão, peculato; ou contra a economia popular, contra o sistema financeiro nacional, contra as normas de defesa da concorrência, contra as relações de consumo, a fé pública ou a propriedade, enquanto perdurarem os efeitos da condenação.

 

Não é necessário a apresentação de certidões de nenhuma espécie para comprovar os requisitos do artigo supracitado no ato do registro da sociedade, bastando a declaração de desimpedimento, conforme exemplo abaixo:

 

CLÁUSULA XXXXXX - DECLARAÇÃO DE DESIMPEDIMENTO: Os sócios administradores declaram, sob as penas da lei, que não estão impedidas de exercer a administração da sociedade, por lei especial, ou em virtude de condenação criminal, ou por se encontrarem sob os efeitos dela, a pena que vede, ainda que temporariamente, o acesso a cargos públicos; ou por crime falimentar, de prevaricação, peita ou suborno, concussão, peculato, ou contra a economia popular, contra o sistema financeiro nacional, contra normas de defesa da concorrência, contra as relações de consumo, fé pública ou a propriedade.

 

O administrador poderá ser indicado no próprio contrato social ou em instrumento separado, desde que averbado no registro competente (Art. 1.012 Código Civil). Não havendo em contrato estipulado quem é o administrador da sociedade, competirá a administração separadamente a cada um dos sócios, devendo cada um impugnar a decisão do outro, cabendo decisão aso sócios, por maioria de votos (Art. 1.013 do Código Civil). Aquele que agir em desacordo com a maioria dos sócios, responderá por perdas e danos perante a sociedade, haja vista que é requisito neste caso o concurso de todos.

 

Os administradores possuem poderes e deveres, sendo os poderes legais e contratuais. Os poderes legais são à prática de atos ordinários e os poderes contratuais à prática de atos extraordinários. A apreciação de cada caso dependerá de qual a atividade exercida pela sociedade, ou seja, seu objeto social. Por exemplo, numa sociedade imobiliária, a venda de bens imóveis estará contida nos poderes legais de administração, nas demais não. A venda por exemplo de máquina importante para a produção do objeto social da sociedade é ato estranho aos negócios da sociedade, ato extraordinário, precisando o administrador nesse caso de autorização (poder contratual) para praticá-lo.

 

Em relação à sociedade e a terceiros, o art. 1.016 do código civil, dispõe que se os terceiros cobrarem diretamente da sociedade, esta poderá exercer seu direito de regresso contra o administrador.

 

Ainda, o administrador que, sem o consentimento por escrito dos sócios, aplicar créditos ou bens sociais em proveito próprio ou de terceiros, deverá restituir à sociedade, ou a pagar o equivalente, com todos os lucros resultantes, respondendo ainda, por eventuais prejuízos.

 

A destituição do administrador, o administrador nomeado em contrato social, somente poderá ser destituído por justa causa, reconhecida decisão judicial, já os administradores nomeados em ato separado (sócios ou não sócios) podem ter seus poderes revogados a qualquer tempo (art. 1.019 do código civil).

 

Por fim, vale ressaltar que o administrador é obrigado a prestar aos sócios, contas justificadas de sua administração, apresentando-lhes o inventário anualmente (art. 1.021 do código civil).

 

  • sociedade simples
  • direito empresarial
  • direito civil

Referências

[1] BENSOUSSAN Fábio Guimarães e BOITEUX Fernando Netto. Manual de direito empresarial, p. 173.

[2] Disponível no site: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm>. Acessado em 30/10/2021

[3] Disponível no site: < https://www.cjf.jus.br/enunciados/enunciado/417>. Acessado em 30/10/2021

[4] SICHERLE, Camillo Stefano Maria. A Subcapitalização. In: FRANÇA, Erasmo Valladão Azevedo e Novaes (coord). Direito Societário Contemporâneo II. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 635.

[5] [5] BENSOUSSAN Fábio Guimarães e BOITEUX Fernando Netto. Manual de direito empresarial, p. 175.


Aline Barbosa

Bacharel em Direito - Sinop, MT


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