A expressão “repetição do indébito”, originada do latim “repetitivo indebiti”, costuma gerar grande confusão entre os operadores do Direito, que por vezes tendem a fundir a sua aplicação com a condenação de devolução em dobro.
O Código Civil de 2002, em seu artigo 876, prevê que "todo aquele que recebeu o que lhe não era devido fica obrigado a restituir". Isto é, diante de um pagamento indevido, quem tiver tido proveito econômico fica obrigado a restituir a quantia, devidamente corrigida, sob pena de configurar enriquecimento sem causa (Art. 884 do CC/2002). A Repetição do indébito possui, portanto, duas modalidades, à saber: Restituição Simples e Devolução em dobro. A devolução em dobro dos valores vem prevista no Artigo 940 do Código Civil de 2002, nos seguintes termos: Art. 940. Aquele que demandar por dívida já paga, no todo ou em parte, sem ressalvar as quantias recebidas ou pedir mais do que for devido, ficará obrigado a pagar ao devedor, no primeiro caso, o dobro do que houver cobrado e, no segundo, o equivalente do que dele exigir, salvo se houver prescrição.
Em relações de consumo, diante de uma cobrança indevida, caso seja comprovada a má-fé do suposto credor, a simples propositura da Ação de Repetição torna-se justificativa suficiente para amparar a procedência do pedido de repetição, em dobro, a ser formulada mediante reconvenção ou pedido contraposto, conforme o rito. Visando equilibrar as relações jurídicas e sedimentar o vínculo obrigacional dos contratos, o Supremo Tribunal Federal, através da súmula n° 159, determinou que se houver boa-fé do pretenso credor, inexiste a possibilidade de condenação de devolução em dobro dos valores. Tal ressalva também vem prevista no Código de Defesa do Consumidor, no parágrafo único do Artigo 42, vide legis:
Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qual tipo de constrangimento ou ameaça.
Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.
No que se refere as hipóteses de engano justificável, aptas a afastar a penalidade, compete ao fornecedor desincumbir da produção dessa prova, tendo em vista a inversão do ônus probandi, cabendo ao consumidor apenas a prova da cobrança e do pagamento.
Para obter a devolução em dobro dos valores em relações de consumo, é indispensável que seja ajuizada a respectiva Ação de Repetição, do contrário não é possível exigir tais valores do cobrador/fornecedor. Ao ajuizar uma Ação de Repetição, se faz necessário o preenchimento de três requisitos:
(a) a existência de uma prestação indevida;
(b) natureza de pagamento ao ato e
(c) inexistência de dívida entre as partes.
É indispensável que não exista dívida entre as partes, uma vez que, ao existirem dívidas líquidas, vencidas e de coisas fungíveis, opera-se a compensação, afastando-se o direito à repetição do indébito (artigos 368 e seguintes do CC).
Conclui-se que há hipóteses diferentes para a aplicação da repetição de indébito, sendo possível a condenação na forma simples ou em dobro, sendo que nas relações de consumo apenas através do Poder Judiciário é possível exigir a devolução em dobro do fornecedor/cobrador, ocasião em que o magistrado deverá analisar o caso concreto, para identificar se há ou não má-fé do cobrador, aptas a ensejar tal sanção.
Assim, caros colegas deve-se ter muito cuidado ao pleitear a devolução em dobro dos valores, eis que estas só são admitidas quando há efetivo proveito econômico da outra parte, não bastando a existência de uma cobrança.