Anteriormente à promulgação da Lei n. 13.429 de 2017, a terceirização de mão de obra era regulamentada apenas pela Súmula n. 331 do TST, a qual definia esta prática como sendo a transferência de uma ou mais atividades de um determinado estabelecimento para outras empresas especializadas nestes ramos.
Tratando-se da terceirização lícita, formava-se uma relação de trabalho “trilateral”, na qual uma empresa prestadora de serviços de mão de obra especializada – neste caso, a contratada –, fornecia à empresa tomadora de serviços, ora contratante, funcionários suficientes para suprir as necessidades do estabelecimento da tomadora, inexistindo, portanto, vínculo empregatício entre os funcionários que laboravam nas dependências da empresa contratante, com esta.
Cumpre salientar que, neste contexto, apenas era lícita a terceirização de mão de obra das atividades-meio das empresas tomadoras de serviços, ou seja, daquelas não ligadas ao objetivo principal de seu contrato social – tais como: limpeza, conservação, vigilância, dentre outras –, desde que não houvesse subordinação direta e/ou pessoalidade entre o tomador e os funcionários que laboravam em suas dependências.
Em outras palavras, o doutrinador Sérgio Pinto Martins (2005, p.136), define atividade-meio como sendo “a atividade desempenhada pela empresa que não coincide com seus fins principais”.1
No entanto, com o advento da Lei n. 13.429 de 2017 – publicada na data de 31 de março do ano vigente –, a terceirização fica mais flexível, considerando que esta amplia a possibilidade de contratação tanto de mão de obra destinada às atividades-meio, quanto àquelas voltadas às atividades-fim da empresa contratante.
Quanto à definição de atividades-fim, o doutrinador Maurício Delgado Godinho (2012, p. 429/430), leciona:
Atividades-fim podem ser conceituadas como as funções e tarefas empresariais e laborais que se ajustam ao núcleo da dinâmica empresarial do tomador de serviços, compondo a essência dessa dinâmica e contribuindo inclusive para a definição de seu posicionamento e classificação no contexto empresarial do tomador dos serviços, nem compõem a essência dessa dinâmica ou contribuem para a definição de seu posicionamento no contexto empresarial e econômico mais amplo. São, portanto, atividades periféricas à essência da dinâmica empresarial do tomador dos serviços.2
Diante disso, com a publicação da nova lei da terceirização, fica estabelecido que independentemente de seu ramo, todas as atividades desenvolvidas por uma determinada empresa podem ser terceirizadas, inclusive aquelas consideradas essenciais à seu funcionamento.
O TST, na data de 15/5/17, decidiu anular cláusulas constantes em uma Convenção Coletiva de Trabalho que proibiam a terceirização de atividades-meio em condomínios residenciais no Distrito Federal.
Ad argumentandum, tratava-se de uma ação anulatória proposta pelo Sindicato das Empresas de Asseio, Conservação, Trabalho Temporário e Serviços Terceirizáveis do Distrito Federal – SEAC –, o qual pleiteava pela declaração de nulidade das cláusulas 51 a 57 constantes na Convenção Coletiva de Trabalho de 11/13, firmada entre o SEICON e SINDICONDOMÍNIOS, ficando estabelecido que as atividades de zelador, garagista, porteiro, serviços gerais e faxineiro eram consideradas como atividades-fim de um condomínio, não podendo, desta forma, serem terceirizadas.
Como consequência, todos os contratos firmados entre as empresas prestadoras de mão de obra representadas pelo Sindicato SEAC e os Condomínios, deveriam ser rescindidos.
Em segunda instância, o TRT da 10ª Região rejeitou os pedidos formulados na ação anulatória proposta pelo Sindicato SEAC, considerando que o objeto das cláusulas constantes na Convenção Coletiva em análise “se encontrava dentro da seara de interesses passíveis de autocomposição pelas partes”. E ainda frisou que “conquanto a Súmula n. 331 do TST permitisse a terceirização dos serviços de conservação e limpeza, não se tratava de norma cogente, impositiva, podendo as partes disporem de forma diversa.”
No recurso interposto perante o TST, o SEAC defendeu que as estipulações previstas nas cláusulas da Convenção Coletiva 11/13, as quais determinavam que os condomínios, em geral, não poderiam “contratar as empresas de asseio e de conservação, por ele representadas, para a execução dos serviços de seu objeto social, dentre eles limpeza, faxina, portaria, zeladoria e garagem”, são incompatíveis com a ordem jurídica vigente, podendo causar, inclusive, prejuízos às empresas – baseando-se no princípio da livre concorrência –, reiterando, assim, o pedido de anulação das cláusulas 51 e 52 da CCT.
A relatora do recurso na Sessão de Dissídios Coletivos – Ministra Dora Maria da Costa – afirmou que a grande maioria dos condomínios residenciais existentes no Distrito Federal adotam a terceirização de limpeza e conservação, e que, a proibição da contratação dos serviços prestados por empresas terceirizadas – especialmente nas hipóteses amparadas pela Súmula n. 331 do TST – “além de representarem evidente ingerência na esfera de atuação do Sindicato autor”, implicaria na restrição de mercado “atingindo a livre iniciativa empresarial para a consecução de um objetivo considerado regular e lícito”, podendo, inclusive interferir na sobrevivência das empresas prestadoras de mão de obra especializada.
Assim, Dora Maria da Costa, baseando-se na previsão legal constante no artigo 7º, XXVI, da Carta Magna Brasileira, deu provimento ao recurso interposto pelo SEAC, utilizando como fundamento que “não há como reconhecer a validade das cláusulas 51 e 52 da CCT 11/13, que atingem categorias diversas daquelas representadas pelos Sindicatos convenentes”, elidindo o permissivo de terceirização previsto na Súmula n. 331 do TST e apresentando afronta ao artigo 170, inciso IV e parágrafo único, da Constituição Federal.
Por fim, analisando o caso em apreço com os olhos voltados a nova Lei da Terceirização, resta evidente que as cláusulas constantes na Convenção Coletiva 11/13 – firmada entre os Sindicatos SEICON e SINDICONDOMÍNIO – no que tange à terceirização das atividades-fim dos condomínio residenciais, perdem a eficácia diante do artigo 9º, parágrafo terceiro, da Lei n. 13.429/17, o qual estabelece que “o contrato de trabalho temporário pode versar sobre o desenvolvimento de atividades-meio e atividades-fim a serem executadas na empresa tomadora de serviços”, sendo o cancelamento destas cláusulas, medida que necessariamente se impõe.
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