Reflexões sobre igualdade entre filhos e a necessária evolução do princípio no Direito de Família
Desde 2003 atuando na advocacia, tenho testemunhado o amadurecimento (e, por vezes, o retrocesso) de muitos princípios jurídicos. Um deles é o da paternidade responsável, frequentemente invocado em ações de alimentos, como fundamento para a manutenção (ou impedimento) de revisões no valor da pensão alimentícia.
Mas a questão central que trago aqui é: o uso do termo "paternidade" não estaria ultrapassado ou, pior, violando o princípio da igualdade?
Por que "concepção responsável" seria um termo mais justo?
A responsabilidade pela geração de um novo ser humano não é exclusiva do pai. Vivemos tempos em que a pluralidade de arranjos familiares e as técnicas de reprodução assistida escancaram a inadequação do termo "paternidade responsável", afinal:
➡️ A concepção pode ocorrer por ato sexual, inseminação artificial, adoção ou até por gestação por substituição (a chamada “barriga solidária”), conforme permite a Resolução CFM nº 1.957/2010.
➡️ Existem famílias monoparentais, homoafetivas, ou constituídas de forma não tradicional — e todas devem ser respeitadas.
➡️ A responsabilidade, nesse contexto, deve ser compartilhada, e não atribuída exclusivamente ao pai.
Logo, por que não defendermos o uso de um conceito mais amplo e neutro, como "concepção responsável"?
O problema prático: irmãos com direitos desiguais?
Um cenário cada vez mais frequente nas varas de família: um pai ou uma mãe constitui nova família e tem outro(s) filho(s).
Na tentativa de ajustar a pensão alimentícia ao novo contexto familiar, depara-se com a negativa do Poder Judiciário, sob o argumento de que “sabia o custo de ter outro filho” ou, quando resumidamente e em geral temos a seguinte afirmação: “o princípio da paternidade responsável que impõe aos genitores realizarem o devido planejamento familiar, antes de optarem por constituir nova família e gerar filhos, não podendo esse planejamento prejudicar a filha já existente”.
Mas então eu pergunto:
Um(a) filho(a) recém-nascido(a) terá menos direitos que seu irmão(ã) mais velho(a)?
O genitor deve viver com medo de constituir nova família, sob pena de cair na miserabilidade?
O Poder Judiciário pode, ainda que indiretamente, impor controle de natalidade?
Tais posições geram não apenas conflitos familiares, mas também aumento exponencial de demandas judiciais, onde irmãos buscam equiparação de direitos.
Isso compromete não só o princípio da igualdade (art. 5º da CF), mas também sobrecarrega o Judiciário, a Defensoria Pública e o Ministério Público.
A reflexão que proponho
A manutenção cega do termo "paternidade responsável" transfere toda a carga moral, jurídica e financeira ao pai (normalmente), ignorando as nuances e transformações da sociedade atual.
Mais do que isso: pode levar ao retrocesso jurídico, semelhante ao tempo em que filhos extraconjugais ou adotivos tinham menos direitos.
É preciso repensar esse princípio à luz da igualdade entre filhos, da dignidade humana e da própria justiça social.
Precedentes e fundamentos legais:
CF, art. 5º (igualdade)
Código Civil, arts. 1.694, § único e 1.699
Lei 5.478/68, art. 15
Como advogado atuante há mais de 20 anos, deixo esse artigo como contribuição ao debate sobre a evolução dos princípios do Direito de Família, em especial nos casos de revisão de alimentos.
Se você já vivenciou um caso semelhante (com sucesso ou não) ou tem opinião sobre o tema, compartilhe nos comentários ou entre em contato. O diálogo é o melhor caminho para transformar o Direito em instrumento de equidade.
E você, o que pensa? Devemos falar em paternidade ou concepção responsável?