Propriedade Intelectual no Brasil: Conceito, Divisões e Normas


11/08/2025 às 16h16
Por Andrew de Estefano Turquetti

1. Introdução

A propriedade intelectual vem ganhando destaque crescente no cenário jurídico e econômico contemporâneo, sobretudo em sociedades orientadas pelo conhecimento e pela inovação. Conforme definição da Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI), trata-se do conjunto de direitos relativos às criações do intelecto humano, abrangendo diversas áreas e modalidades que demandam proteção específica para assegurar a justa remuneração dos autores e estimular o progresso tecnológico e cultural.

No ordenamento brasileiro, além da regulamentação específica que disciplina as diversas modalidades de propriedade intelectual, o tema está intrinsecamente ligado a instrumentos de política comercial e de defesa dos interesses nacionais no comércio exterior. A título exemplificativo, destaca-se a Lei da Reciprocidade Econômica (Lei nº 15.122, de 11 de abril de 2025), que estabelece critérios para suspensão de concessões comerciais, de investimentos e de obrigações relativas a direitos de propriedade intelectual em resposta a medidas unilaterais adotadas por país ou bloco econômico que impactem negativamente a competitividade internacional brasileira. Este mecanismo estratégico ganhou relevância especialmente em razão das medidas tarifárias impostas a múltiplas nações pelo governo norte-americano na gestão do presidente Donald Trump. A referida lei incide quando tais medidas interferem nas escolhas legítimas e soberanas do Brasil; violam ou são incompatíveis com acordos comerciais internacionais; anulam ou prejudicam benefícios ao país em tratados vigentes; ou impõem requisitos ambientais excessivamente onerosos em comparação aos padrões nacionais. Dessa forma, reforça-se a utilização da propriedade intelectual como importante instrumento de política econômica e comercial, alinhado à proteção dos interesses nacionais no cenário global.

Outro avanço relevante no campo da política nacional de propriedade intelectual é a recente aprovação, pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), do Plano de Ação 2025-2027 da Estratégia Nacional de Propriedade Intelectual (ENPI), instituído pela Resolução GIPI/MDIC nº 14, de 1º de agosto de 2025. O plano, elaborado de forma colaborativa com 13 órgãos do governo e 24 organizações da sociedade civil, além de uma série de outros parceiros públicos e privados, tem como objetivo principal promover o uso da PI e incentivar a inovação no Brasil. Com vigência até julho de 2027, o documento prioriza 64 ações e 140 entregas distribuídas por sete eixos de atuação, que destacam agendas locais de desenvolvimento econômico-social, a importância da propriedade intelectual (PI) para o incentivo às soluções sustentáveis e o fomento à transferência de tecnologia entre Institutos de Ciência e Tecnologia e indústrias, seguindo um ciclo anterior que já demonstrou resultados positivos, como o avanço do Brasil da 10ª posição para a 6ª posição em número de Marcas registradas, enquanto manteve a 11ª posição em depósito de Patentes e a 12ª posição no depósito de Cultivares - conforme o último ranking da Organização Mundial de Propriedade Intelectual.

2. Conceito de Propriedade Intelectual

A Convenção que instituiu a Organização Mundial da Propriedade Intelectual, assinada em Estocolmo em 14 de julho de 1967 e modificada em 28 de setembro de 1979, estabelece que a propriedade intelectual compreende os direitos relativos às obras literárias, artísticas e científicas; às interpretações e execuções dos artistas; aos fonogramas e transmissões de radiodifusão; às invenções em todos os domínios da atividade humana; às descobertas científicas; aos desenhos e modelos industriais; às marcas comerciais, industriais e de serviço, assim como às firmas e denominações comerciais; à proteção contra a concorrência desleal; e a quaisquer outros direitos inerentes à atividade intelectual nos campos industrial, científico, literário e artístico.

Esta definição evidencia a amplitude do conceito, que abarca desde a tutela das criações culturais até a proteção de sinais distintivos e inovações tecnológicas.

3. Divisões da Propriedade Intelectual

De forma geral, a propriedade intelectual divide-se em dois grandes grupos: a propriedade industrial e o direito autoral.

3.1 Propriedade Industrial

Abrange a proteção de criações com aplicação prática nas áreas industrial, comercial e tecnológica, incluindo:

Patentes, que conferem exclusividade temporária para invenções e modelos de utilidade;

Marcas, que protegem sinais distintivos que identificam produtos e serviços;

Desenhos industriais, que tutelam a forma plástica ornamental de um objeto ou o conjunto ornamental de linhas e cores que possa ser aplicado a um produto, proporcionando resultado visual novo e original na sua configuração externa e que possa servir de tipo de fabricação industrial;

Indicações geográficas, que protegem a indicação de procedência ou a denominação de origem;

Proteção contra concorrência desleal, que combate práticas comerciais injustas, inclusive a tutela de segredos de negócio.

No Brasil, a matéria é regulada pela Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996 (Lei da Propriedade Industrial - LPI).

3.2 Direito Autoral e Direitos Conexos

Destina-se à proteção das obras literárias, artísticas e científicas, garantindo aos autores direitos morais e patrimoniais sobre suas criações. Abrange:

Direitos autorais, conforme a Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998 (Lei de Direitos Autorais), que protege os direitos morais e patrimoniais sobre a obra que criou;

Direitos conexos, que tutelam as interpretações artísticas e execuções, fonogramas e transmissões de radiodifusão;

Programas de computador, protegidos pela Lei nº 9.609, de 19 de fevereiro de 1998 (Lei de Software).

3.3 Regimes Especiais

Além dos ramos principais, o ordenamento jurídico brasileiro prevê regimes especiais para determinados ativos intelectuais, tais como:

Cultivares, protegidas pela Lei nº 9.456, de 25 de abril de 1997;

Conhecimentos tradicionais e recursos genéticos, regulados pela Lei nº 13.123, de 20 de maio de 2015;

Topografia de circuitos integrados, disciplinada pela Lei nº 11.484, de 31 de maio de 2007.

4. Considerações Finais

A propriedade intelectual configura-se como um instrumento indispensável para o estímulo à inovação, à criatividade e ao desenvolvimento econômico sustentável. A compreensão aprofundada de suas diversas modalidades e do arcabouço normativo que as rege é fundamental para que autores, inventores e empreendedores possam proteger suas criações, promovendo não apenas a segurança jurídica, mas também a geração de valor econômico e social.

No contexto brasileiro, a consolidação de um sistema regulatório sólido, aliado à integração em tratados internacionais, favorece a valorização do capital intelectual e fortalece a competitividade do país em um mercado cada vez mais globalizado e baseado no conhecimento. Assim, a propriedade intelectual transcende sua função tradicional de mera proteção legal, assumindo um papel estratégico crucial para o desenvolvimento sustentável, a inovação contínua e a inserção qualificada do Brasil na economia mundial do conhecimento.

  • propriedadeintelectual

Referências

Referências

Convenção que institui a Organização Mundial da Propriedade Intelectual Assinada em Estocolmo em 14 de julho de 1967, e modificada em 28 de setembro de 1979.

Lei nº 15.122, de 11 de abril de 2025.

Resolução GIPI/MDIC nº 14, de 1º de agosto de 2025.

Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996 (Lei da Propriedade Industrial).

Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998 (Lei de Direitos Autorais).

Lei nº 9.609, de 19 de fevereiro de 1998 (Lei de Software).

Lei nº 9.456, de 25 de abril de 1997 (Proteção de Cultivares).

Lei nº 13.123, de 20 de maio de 2015 (Conhecimentos Tradicionais e Recursos Genéticos).

Lei nº 11.484, de 31 de maio de 2007 (Topografia de Circuitos Integrados).

Andrew de Estefano Turquetti. Graduado em Direito (PUC-Campinas). Extensão em Propriedade Intelectual (WIPO). Especialização em Perícia em Propriedade Intelectual e Inovação (UFRGS). Advogado.


Andrew de Estefano Turquetti

Advogado - Campinas, SP


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