Juliano Sguizardi{C}[1]
RESUMO
Este artigo refere-se a um fato jurídico recente e pouco minutado pelas instituições jurídicas. Trata-se do Dumping Social, que é uma prática que busca vantagens comerciais perante a sociedade capitalista, através da adoção de condições ínfimas de trabalho, ferindo a ordem social e econômica, transformando a relação laboral. Com este ilícito observa-se o dano que a sociedade sofre, bem como o ordenamento jurídico em face da dignidade da pessoa humana.
INTRÓITO
Literalmente temos a tradução do tema Dumping Social como sendo “Despejo Social” ou “Descaso com o Social”, ou seja, é uma expressão que tem por fim a prática por meio de “empreendedores” que encerram as atividades de suas empresas e se estabelecem em outros locais com o intuito de auferir facilidades na produção de mercadorias e serviços, com mão de obra barata, causando redução de salários, inobservando os direitos trabalhistas, oferecendo determinado produto e ou serviço para o mercado globalizado com preço agregado reduzido implicando desta feita em concorrência desleal por não respeitar os parâmetros legais para a produção de determinado produto ou serviço.
DO DANO AO DIREITO TRABALHISTA
Para o direito laboral o Dumping Social surge pelas agressões ao direito dos trabalhadores gerando dano à toda sociedade, pois essa prática, desconsidera a estrutura do Social e Capitalista do Estado, com a obtenção de vantagem indevida perante a concorrência através da aplicação de preços com menor valor agregado no mercado de consumo.
A vantagem em tela configura ato ilícito através do exercício abusivo do direito, desrespeitando a ordem social, econômica e jurídica. Sendo assim, temos que o ato ilícito gera dano contra a sociedade, e conforme os termos dos artigos 186, 187, 404 e 927 do Código Civil, o fundamento positivo para embutir ao agressor contumaz a obrigação a reparar tais danos através de uma indenização suplementar, como, aliás, já previam os artigos 652, "d", e 832, § 1º, da CLT, além da reparação para com os trabalhadores e a ordem econômica.
Nesta senda, concluímos que o dano moral gerado é coletivo, e que a reparação do dano possui natureza de caráter social, atingindo determinadamente a parcela trabalhadora.
RELAÇÃO JURÍDICA
A situação de Dumping Social conflita com o princípio doutrinário fair trade (denominado “comércio justo”), relação estabelecida pela Organização Mundial do Comércio, segundo o qual, o mercado global não deve consumir produtos e serviços oriundos de produção que descumprem a legislação trabalhista. O nosso sistema pátrio adere esta corrente, e tal situação, aflora para os demais países uma obrigação ética, moral e principiológica de não satisfazer seus anseios comerciais em proporção dos trabalhadores que são explorados nessa cadeia produtiva. Assim, o Dumping Social está relacionado com a prática do desenvolvimento de produtos e serviços de uma região, seja estrangeira, seja nacional, os quais são introduzidos no comércio por preços menorizados ao do mercado comum, em razão ao desrespeito da legislação trabalhista no país de origem, além dos reflexos no local da comercialização, afetando indiretamente as condições sociais e econômicas.
Desse modo, o Direito Constitucional assumiu as garantias trabalhistas e principiológicas da irrenunciabilidade salarial, dos limites de jornada de trabalho, à condição do trabalhador frente ao empregador e a superioridade jurídica do direito laboral, estímulo aos direitos de cidadania do trabalhador, da ordenação do sindicalismo, além de constituir competências e atribuições a órgãos próprios (Justiça do Trabalho, Ministério Público do Trabalho e Delegacia Regional do Trabalho), definindo a jurisdição e regramentos processuais aos litígios trabalhistas, garantindo o contraditório, a legítima defesa, a publicidade, o devido processo legal, entre outros.
Vale ressaltar que a Carta Magna, de forma imperiosa, imbuiu o valor social do trabalho, a igualdade salarial proporcional ao serviço prestado, o repouso semanal remunerado, a hora extraordinária, as indenizações proporcionais, as gratificações, etc. A importância destas relações na sociedade, estabelece a concretização da dignidade da pessoa humana como trabalhador, e esta condição como caminho e estímulo a construção proba do ser humano.
O PRINCÍPIO DA DIGNINDADE DA PESSOA HUMANA
Temos uma ordem principiológica trabalhista de âmbito global, adotado pela Organização das Nações Unidas na Declaração Universal dos Direitos do Homem no ano de 1948, que constitui uma norma imperativa protecionista na determinação da isonomia de trabalho, liberdade e defesa dos trabalhadores e que na Carta Política de 1988 em seu inciso III do artigo 1º consagra a dignidade da pessoa humana bem como os valores sociais do trabalho, à categoria de fundamentos do Estado Democrático de Direito, e este princípio possui densidade jurídica data máxima venia, consolidando assim, todas as faces éticas da personalidade.
A dignidade ultrapassa quaisquer valores, posto que é atribuido à vida humana, é um direito universal, que independe de classificação social ou pessoaç, pois fundada-se na base constitucional, servindo de embasamento jurídico para as demais normas do ordenamento.
DA PROTEÇÃO
A questão social fora expandida a partir da revolução industrial (século XIX), e com o surgimento do modelo capitalista, bem como pela estruturação social, e nesta construção fora instituída a Justiça do Trabalho para solucionar os conflitos das relações de laborais, bem como instituíram a Delegacia Regional do Trabalho e o Ministério Público do Trabalho, para proteção da integridade da ordem jurídica de forma a prever, aplicar e solucionar os atos ilícitos contra a ordem em questão, ou seja, atribuição fundada em justiça social. Fato este constituído posteriormente em consonância às normas coletivas estabelecidas pela Organização Internacional do Trabalho – OIT.
ENTENDIMENTO
Nessa toada, temos o seguinte julgado em relação ao tema:
EMENTA: REPARAÇÃO EM PECÚNIA - CARÁTER PEDAGÓGICO - DUMPING SOCIAL – CARACTERIZAÇÃO. Longas jornadas de trabalho, baixos salários, utilização da mão-de-obra infantil e condições de labor inadequadas são algumas modalidades exemplificativas do denominado dumping social, favorecendo em última análise o lucro pelo incremento de vendas, inclusive de exportações, devido à queda dos custos de produção nos quais encargos trabalhistas e sociais se acham inseridos. "As agressões reincidentes e inescusáveis aos direitos trabalhistas geram um dano à sociedade, pois com tal prática desconsidera-se, propositalmente, a estrutura do Estado Social e do próprio modelo capitalista com a obtenção de vantagem indevida perante a concorrência. A prática, portanto, reflete o conhecido 'dumping social'" (1ª Jornada de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho, Enunciado nº 4). Nessa ordem de idéias, não deixam as empresas de praticá-lo, notadamente em países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento, quando infringem comezinhos direitos trabalhistas na tentativa de elevar a competitividade externa. "Alega-se, sob esse aspecto, que a vantagem derivada da redução do custo de mão-de-obra é injusta, desvirtuando o comércio internacional. Sustenta-se, ainda, que a harmonização do fator trabalho é indispensável para evitar distorções num mercado que se globaliza" (LAFER, Celso - "Dumping Social", in Direito e Comércio Internacional: Tendências e Perspectivas, Estudos em homenagem ao Prof. Irineu Strenger, LTR, São Paulo, 1994, p. 162). Impossível afastar, nesse viés, a incidência do regramento vertido nos artigos 186, 187 e 927 do Código Civil, a coibir - ainda que pedagogicamente - a utilização, pelo empreendimento econômico, de quaisquer métodos para produção de bens, a coibir - evitando práticas nefastas futuras - o emprego de quaisquer meios necessários para sobrepujar concorrentes em detrimento da dignidade humana. (RO - Num: 00866; 3ª Região - Quarta Turma; Relator: JÚLIO BERNARDO DO CARMO; DEJT 31-08-2009. Pág. 75).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nessa vertente racional, fala-se em despejo social, quando os preços de produtos ou serviços com valores reduzidos resultam do fato de os empreendedores e as empresas estar produzindo sem obedecer à legislação trabalhista, o controle econômico e de produção do padrão internacionalmente reconhecido. Transformada em prática condenável, uma vez que tem como fonte principal, o prejuízo à pessoa do trabalhador, e automaticamente o reflexo em sua família e à sociedade, bem como a prática desleal para com o comércio e em prejuízo a sociedade capitalista e por fim, denegrindo a dignidade da pessoa humana do trabalhador.
[1]Graduado do Curso de Direito-Bacharelado / FACIDER – Faculdade de Colider/MT (2012/1). Advogado atuante no município de Colider/MT e região em causas cíveis, administrativas e constitucionais, inscrito na OAB/MT sob n° 16.483/O. Pós graduado em Direito Constitucional pela Instituição AVM/WPós e Pós graduado em Docência do Ensino Superior pela Instituição FAUC. Endereço eletrônico dr.juliano@live.com