Certa vez, perguntei a uma amiga, advogada e palestrante, qual livro todo advogado deveria ler. Aguardei como resposta alguma obra dos teóricos do Direito ou algo de Bobbio, Hans Kelsen, Pasquino ou qualquer um outro de nome difícil de pronunciar. Mas não. A dedicada advogada recomendou um livro cujo título brasileiro mais parece um conto de fadas: O Sol é para todos.
Alguns anos depois, um grande amigo advogado e membro do Tribunal de Contas respondeu a mesma pergunta e deu a mesma resposta: um livro que todo advogado deveria ler é O Sol é para todos. Depois disso, resolvi procurar a obra e me deparo com um romance chiclete, desses que faz a gente grudar da primeira a última página, com uma narrativa surpreendentemente cativante.
Escrito por uma autora chamada Harper Lee, O Sol é para todos se passa nos Estados Unidos, na época da grande depressão econômica, na década de 1930. Mas a narrativa do livro é tão atraente que a história poderia se passar no Brasil de 2020. E só essa capacidade de ser atual já demostra se tratar de um clássico da literatura, descrevendo com firmeza os conflitos tão presentes e influentes nos dias de hoje.
Na história, pelos olhos de uma menininha extremamente sagaz e observadora, acompanhamos a rotina de uma cidade segregada pelas condições sociais e pelo racismo. O pai da menininha é um advogado. No livro não é dito que ele é defensor público, mas ao longo da história, na medida que acompanhamos seu trabalho, pode-se interpreta o personagem desta forma.
Em meio as suas aventuras e brincadeiras de criança, vividas numa cidade do interior, acompanhamos como nascem os preconceitos pela ótica desta menina e seus amigos. No decorrer da história, o pai da garota, um dos poucos advogados desta comunidade, precisa defender um homem negro acusado de violentar uma mulher branca. O réu vai a juri popular e o julgamento movimenta toda a cidade, inflamando o clamor público, que exige justiça para moça violada.
Mas essa parece ser uma história tão simples, né? Então por qual motivo tantos juristas, advogados e demais estudiosos do Direito citam O Sol é para todos como um livro fundamental? Depois de lê-lo, acredito eu que seja por conta das lições de vida ministradas pelo advogado e também pai da garotinha. Tanto seus conselhos para família quanto a sustentação oral que faz de seu cliente são irretocáveis. E é bem provável que suas falas sirvam de inspiração para advogados até hoje.
O julgamento apresentando no livro envolve questões significativas como a segregação social, o dever do Estado, o princípio da presunção de inocência e cabe, perfeitamente, uma análise da narrativa pela ótica do trânsito em julgado, mediante certos fatos retratados na história. Não estragarei o prazer do leitor. Se bateu curiosidade, apenas leia.
Como já dito antes, acompanhamos tudo pelos olhos de uma criança e é isso que também encanta na história. Vemos a ingenuidade da menina e como a inocência vai se diluindo com o avançar dos anos. E tudo isso leva o leitor a inúmeras reflexões. Após a leitura, descobri que há um filme sobre a história. Mas não vi ainda. Encontrei apenas pequenas cenas no youtube. Em compensação, li a versão em quadrinhos e é de uma delicadeza só. E com essa simples resenha espero ter despertado sua curiosidade. Leia O Sol é para todos.
Autor: Leônidas Macêdo Neto.
Artigo publicado original no blog Direito e Et Caetera.