A APLICAÇÃO DA PENA DE MORTE E A SUA RELAÇÃO CONSTITUCIONAL EM FACE À REALIDADE SOCIAL BRASILEIRA.


08/08/2018 às 13h33
Por Micael Lopes

RESUMO

A crescente demanda da sociedade brasileira pela aceitação à aplicabilidade da pena de morte para crimes violentos nos remete a uma importância diante deste trabalho acadêmico. Apesar de ser o método histórico mais utilizado para a punibilidade de fatos jurídicos ilícitos agravantes, não houveram comprovações científicas que afirmaram a diminuição de tais crimes nos países que utilizam a aplicação da pena capital, havendo uma maior tendência abolicionista. No Brasil, a Constituição de 1891 previu o fim formal da pena de morte no ordenamento jurídico, no entanto, atualmente existe uma mínima possibilidade de aplicação desta medida. As convenções e tratados internacionais, em seus artigos que tratam sobre o direito à vida, enfatizam o efeito retroativo caso optem pelo retorno da aplicação desta sanção. Entretanto, é importante ressaltar com mais clareza a realidade social e jurídica brasileira, relacionado com a falência do sistema prisional e a sensação de insegurança vivida pela sociedade.

Palavras-chave: pena de morte, direitos humanos, criminalidade.

 

 

 

 

 

 

João Pessoa

2017

 

 

Introdução

 

Uma reflexão se torna bastante necessária diante do aumento populacional nos índices de aceitação, no que diz respeito à aplicação da medida extrema da pena de morte no território brasileiro. Constitui-se como parâmetro desta visão popular a pesquisa do CNI/IBOPE, divulgada em outubro de 2011, onde a temática foi sobre a segurança pública e trataremos através deste, diversas opiniões doutrinárias acerca da pena capital e se, neste caso, define-se como a melhor alternativa para a redução dos níveis de criminalidade no Brasil.[1]

Diante disso, o objetivo deste presente trabalho é analisar, questionar e indagar sobre o conceito da pena de morte e suas aplicações variadas, para que desta forma possamos compreender esta aceitação favorável por parte da população para a aplicação da medida e analisar a trajetória humana na questão criminal, resultando em encontrar formas de combate à criminalidade com eficácia para os dias atuais, advindo de um maior respeito aos Direitos Humanos e aos princípios constitucionais.

Para abordar um tema complexo e polêmico que envolve o direito penal e questões como a pena de morte, é importante uma abordagem histórica para contextualizar este tipo de medida extrema e tudo que nela se relaciona. Posteriormente, dar-se-á necessário verificar algumas das principais nações mundiais que ainda aplicam a pena capital, contrariando o posicionamento da maioria dos países signatários das Organizações das Nações Unidas (ONU) e, de foco primário, analisar o sistema criminal brasileiro na situação atual em que se encontra, frente ao aumento das taxas de violência.

Abordagem histórica

A história nos mostra que as penas aplicadas na antiguidade eram bastante severas comparando-as com os dias atuais.  Nem sempre as penalidades eram proporcionais aos delitos cometidos. Todavia, os processos de julgamento eram feitos por reis, sacerdotes, juízes e chefes de clãs que nem sempre seguiram um código jurídico adequado, causando assim muita injustiça principalmente para os menos abastados.

            Tomando como base a Grécia da qual tinha uma forma de julgamento bastante rígido, onde as penas variavam de acordo com o delito cometido, o condenado quase sempre passava de criminoso para vítima, devido às fortes penalidades aplicadas, simulando-as mais como uma vingança pessoal, considerando a desproporcionalidade das penas. Essas penalidades eram quase sempre introduzidas a um suplício, que é uma pena corporal ou quando não, a própria sentença de morte, como foi o caso do filósofo Sócrates, que foi condenado a pena de morte por meio de envenenamento através de um suco de uma planta venenosa (cicuta).

Um fato histórico de grande importância para humanidade e que contribuiu para uma redução dessa desproporcionalidade nas penas aplicadas, foi o Código de Hamurabi. Nele, descrevia como deveria ser aplicada as penalidades aos criminosos, baseado na Lei de Talião, evitando assim uma possível vingança pessoal, haja vista que as penas seriam proporcionais aos delitos cometidos, ou seja, “olho por olho e dente por dente”. Este código, dotado de 282 leis foi decretada por volta de 1772 a.C. e teve como principal responsável o rei da Babilônia que usou o seu próprio nome para promover esse código que entraria para história do direito penal.

Na história contemporânea, deu-se início o período da Revolução Francesa, incluindo neste momento histórico o posicionamento de Cessare Beccaria, um dos principais representantes do iluminismo do qual tinha a razão e uma visão mais realista das penas que eram aplicadas, como linha fundamental, através do seu livro Dei Delitti Dele Pene (Dos Delitos e Das Penas). Ele tornou-se conhecido por contestar a esfera punitiva de delitos, defendia a abolição da tortura e o fim da pena de morte.  Segundo Beccaria, o crime pode ser evitado com prevenção através de leis e penas mais claras das quais possam influenciar nas decisões do indivíduo que pretende cometer algum tipo de crime. O autor enfatiza que “Não é a intensidade  da  pena  de  causa  maior efeito na mente, mas sua duração”.[2] Deste modo, uma pena de maior duração seria mais eficaz que uma pena de morte. Cessare Beccaria teve um papel fundamental para história do direito penal e principalmente para o Brasil, onde através de suas ideias pode influenciar e contribuir para construção do Código Penal brasileiro. Não obstante, verificamos o posicionamento contrário de Hegel e Schopenhauer, que defendem a pena de morte através da teoria organicista de que o Estado é um organismo que depende das partes para o seu bom funcionamento e, nesse sentido, se uma parte coloca em risco todo o organismo, esta deve ser eliminada.

A pena de morte no cenário atual

De modo geral, a pena de morte é um processo legal pelo qual o Estado pune um indivíduo por um crime cometido. A decisão judicial que resulta na execução é denominada de "sentença de morte", enquanto o processo é chamado de "execução”. Muito criticada por violar o Art. 3° da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que prevê o Direito à vida, sua aplicação é motivo de debates em países onde está em vigor, assim como em países onde foi abolida, tendo defensores e opositores que alegam, respectivamente, sua eficiência no combate ao crime, pois acabaria por intimidar um possível criminoso, ou a inviabilidade de sua existência no mundo contemporâneo, por violar o direito supracitado. Dentre os países onde a Pena de Morte ainda se faz presente legalmente, pode-se destacar a China, que, como a maioria dos países de regime totalitário, mantém em sigilo seus números de sentenças e execuções de morte, porém, instituições ligadas à defesa dos Direitos Humanos estimam que os números cheguem a milhares anualmente. As inúmeras críticas ao possível número de execuções resultaram em uma ação do Governo Chinês, que passou a rever as condenações à morte em seu Supremo Tribunal. A china é uma das maiores potências mundiais mais quando se trata do assunto pena de morte ainda é um pais retrógado pois insiste em ocultar a maior parte das informações como segredo de estado. A ONG da anistia internacional encontrou diversas reportagens de âmbito público de pelo menos 931 pessoas executadas entre 2014 e 2016.[3]

Nos Estados Unidos da América, pelo fato de os estados terem certa autonomia quanto a sua legislação, a Pena de Morte é vigente em apenas 31 dos 50 estados norte-americanos. Um relatório divulgado revela que o ano de 2016 foi marcado por uma grande queda na prática da pena de morte no país. Os resultados do relatório animaram as esperanças daqueles que lutam contra a pena de morte. No entanto, infelizmente existe um lado da população americana que ainda não há um consenso, pois, estatísticas mostram que nos estados de Oklahoma, Nebraska e Califórnia, a maioria da população apoia a pena, porém outros vários estados norte-americanos elegeram governadores, juízes e procuradores conhecidos por defenderem os direitos dos condenados.

Os Estados unidos e o Japão são um dos únicos países democratizados que ainda insistem em manter a pena de morte ativa. Atualmente, há cerca de 130 prisioneiros no Japão que estão no corredor da morte à espera de serem executados pelo método do enforcamento, onde tal método foi instituído pelo país desde o ano de 1873. De acordo com pesquisas feitas dentro do próprio país, mais de 80% da população apoia a pena de morte, pois alegam que é por ter a pena de morte que a taxa de crimes é relativamente baixa. Não é novidade que este tema sempre gera polêmicas entre os especialistas, principalmente no Japão, onde é permitido os policiais usarem métodos de tortura para extrair a verdade do cidadão, utilizando artifícios por meio da pressão psicológica. Na Rússia, há mais de dez anos que não há execução por pena de morte. Pois, no país vigora um Protocolo da convenção Europeia dos Direitos Humanos. Nos termos deste documento, a pena de morte tem que ser revogada, que neste caso, a referida moratória era uma das condições para a Rússia poder ingressar no Conselho da Europa. O único país da Europa ao qual se ainda é aplicado a pena de morte é a Bielorrússia.

De maneira breve, podemos entender um pouco do processo evolutivo da pena capital e constatar a importância de cada acontecimento em sua época, aliado com o que vigora nos principais países do mundo. Desta forma, podemos usufruir do conhecimento repassado ao longo do tempo e, se possível, contribuir de modo humilde e singelo nesse processo de evolução do direito que é fundamental na vida das pessoas.

 

Fundamentação teórica

 

Contexto histórico brasileiro

 

A pena de morte teve origem na história brasileira através das comunidades tribais e deu direcionamento para os escravos, pois era considerada essencial para o regime escravagista. Nele ficou estabelecido que os escravos seriam condenados à morte se realizassem qualquer grave ofensa física aos seus senhores, sua mulher, seus descendentes e seus ascendentes, não havendo a possibilidade de cárcere ou prisão. Obtendo como fito a punição, a pena de morte vigorou na época do Brasil colonial antes da independência (1822), ocorrendo seu fim para crimes mais comuns através da Constituição de 1891 apesar de ter sido contemplada, ainda que por pouco tempo, na república em 1937.

O código criminal de 1830 não excluiu a pena de morte, mas a aplicação ficou reduzida a casos de homicídio, latrocínio e rebelião de escravos.[4] Além disto, foi uma questão muito debatida na época. Segundo Pierangeli (2001), tentaram repelir a pena de morte pois raramente a utilização compensava o horror da aplicação, mediante a forca. Entretanto, a população brasileira encontrava-se em um nível baixo de educação e a aplicação da pena de morte tornava-se necessária em algumas hipóteses, tendo que perseverá-la em um código penal. Ademais, a pena de morte deixou de ser aplicada em casos civis, no final do século XIX, em 1876. O Brasil tornou-se em 1891 a segunda nação das américas a abolir a pena de morte, ficando apenas atrás da Costa Rica, que aboliu este tipo de pena em 1859. Desde então, foi uns dos direitos conquistados em favor da pessoa humana e serve como instrumento de contenção para os poderes decisórios e interventores do Estado.

 

Proteção quanto aos direitos fundamentais

 

Atualmente, a pena de morte no brasil é proibida pelo inciso XLVIIº, do quinto artigo da constituição federal, onde neste texto a lei determinou a proibição da pena da morte, exceto no caso de crimes militares em momento de guerra declarada. Além disso, para poder acontecer a pena de morte neste caso excepcional, deve haver um comunicado ao Presidente da República e, apenas sete dias após a comunicação que deve ser executada a sentença. Além disso, este direito à vida conquistado pela sociedade brasileira e previsto na atual Constituição é preservado e acolhido por cláusula pétrea, ou seja, não terá capacidade de ser alterada ou revogada por meio de uma emenda constitucional.

Esta preservação dos direitos fundamentais se deu em escala mundial a partir da criação da ONU. A conferência que deu origem a esta entidade reuniu 51 governos e várias organizações não governamentais para elaboração da carta das nações unidas. Esta carta foi ratificada em 24 de outubro de 1945 por 5 países membros, França, China, União soviética, Reino unido e Estados Unidos, e também pela maioria dos outros 46 países destinatários, como o        Brasil, por exemplo. O que ocorre após este acontecimento é uma tendência abolicionista em relação a pena de morte e outras sanções que agridem mais o ser humano, obtendo outro fato marcante com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, especificamente em seu artigo 3º, que proclama “todo indivíduo possui direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal”.[5] Foi uma imensa conquista pois em decorrência as atrocidades cometidas na última guerra mundial, onde houve um maior desrespeito quanto à dignidade da pessoa humana e no que diz respeito a raça, cor, sexo e religião, foi necessário um movimento mundial capaz de enaltecer todos os direitos humanos lesionados pelos horrores do nazismo. Na atualidade, aproximadamente 170 países dos 193 países que integram a ONU já aboliram a pena de morte ou não é utilizada há 10 anos, no mínimo, segundo relatório apresentado em 2016 ao Conselho de Direitos Humanos desta entidade.[6]

Além de tudo isso, o Brasil ratificou em 25 de setembro de 1992 a convenção americana sobre direitos humanos (Pacto de San José da Costa Rica), promulgada em 1969. Nele, ficou implícito em seu artigo 4º que ninguém deverá ter sua vida ceifada pelo Estado e de que nenhum país poderá reestabelecer a pena capital nos países que já houve a abolição.[7]

A dignidade da pessoa humana é uma atribuição inerente a cada indivíduo. Segundo Alexandre de Moraes (2011), os direitos fundamentais são um conjunto de direitos e garantias do ser humano, tendo por finalidade o respeito à própria dignidade, protegendo-o contra a arbitrariedade estatal e estabelecendo condições mínimas de vida. Rúbia Alvarenga (2014) ainda enfatiza que esses direitos são anteriores à implicação das normas positivadas e originários das agressões aos bens jurídicos mais relevantes do ser humano.

Em relação à preservação destes direitos fundamentais, estes princípios assegurados vinculam-se com a concretização das conquistas sociais, para acompanhar a evolução da sociedade e limitar a intervenção do Estado na vida das pessoas. São sustentados pelo princípio da proibição ao retrocesso, tese desenvolvida por Konrad Hesse, em 1978, e aceita pela doutrina majoritária brasileira. Segundo Luísa Cristina Pinto e Netto (2010), os princípios que estão intimamente ligados à sociedade em geral, uma vez que eles forem normatizados, uma vez que estes direitos estarem regulados, quaisquer medidas que possuam um efeito regressivo vinculados à estas normas serão inconstitucionais, ou seja, haveria uma irreversibilidade destas conquistas sociais. Ingo Wolfgang Sarlet (2012) enfatiza que este princípio possui vinculação íntima com a noção de segurança jurídica. Deste modo, cada direito deverá ser preservado contra as medidas retroativas, principalmente aqueles relacionados ao núcleo essencial da Constituição Federal.

 

Argumentação da opinião pública

 

Em contrapartida, existe um clamor público por parte da população brasileira acerca sobre o retorno da pena de morte. Os argumentos incluem que esta medida extrema, estando prevista no Código Penal, poderia prevenir ou intimidar os criminosos que possam cometer mais delitos que aterrorizam cidadãos honestos, como homicídio e assalto à mão armada. Além disto, alegam que teria utilidade econômica pois reduziria o número de criminosos no sistema carcerário, gerando custos mínimos ao Estado. Mello (1999) destaca que existe uma atribuição da mídia em relação a criação e fixação destes estereótipos. O autor enfatiza que estes veículos de comunicação instigam as pessoas à inflamarem os sentimentos de vingança, como se fosse à opção única e exclusiva para a resolução dos problemas da criminalidade.

Sendo assim, para satisfazer a opinião pública frente à criminalidade, os legisladores abrangem de forma suscetível, vários outros tipos penais que não se relacionam com a lesão aos bens jurídicos de maior importância, mas para outras ações que oferecem situações de perigo, como por exemplo: criminalização do porte ilegal de arma de fogo, dirigir após a ingestão de bebidas alcoólicas, entre outras. Isto contraria o princípio da intervenção mínima, no sentido em que a abrangência da ação penal do Estado, que deve ser apreciada como “ultima ratio”, agora está sendo cada vez mais utilizada na resolução de conflitos diversos.[8]

No que diz respeito ao aspecto de intimidação da pena capital, Warley Belo (2014) afirma que um criminoso suicida, como por exemplo um terrorista, não iria se intimidar com a pena de morte. Pelo contrário, o infrator iria realizar tudo que é possível, inclusive retirar a própria vida, para não ir preso. Barreto (1998) conscientiza que a pena de morte poderá não influenciar aqueles que perderam a total sensibilidade humana, natural dos seres racionais. Quanto ao argumento econômico, o valor de uma vida humana é imensurável, não se pode colocar preço em uma pessoa, ademais, o processo de uma pena de morte é especialmente duradouro, por conta de que o Estado não poderá retirar a vida de alguém erroneamente, gerando assim altos custos nas instituições e órgãos estatais investigativos e judiciários.

Toda esta inclinação popular reflete nos obstáculos do sistema criminal e da segurança pública para combater, oriundo da legalidade, contra a espantosa taxa de criminalidade, ocorrendo gradativamente a perda da legitimidade do Estado, a falta de confiança nas instituições de justiça e na grande sensação de insegurança vivida pela população. Os altos índices de homicídio relacionam-se com o medo transparecido na sociedade. Entre o período compreendido de 1980 e 2016, a taxa de homicídio no país cresceu de 11,4 homicídios por 100 mil habitantes para 29,9, acrescentando mais de 1 milhão de mortes no período compreendido entre as últimas três décadas. Em números, os expansivos 61,5 mil assassinatos cometidos em 2016 equivalem-se às mortes provocadas pela explosão da bomba nuclear de Nagasaki, no Japão, em 1945, durante a Segunda Guerra Mundial.[9]

A desigualdade social é, sem dúvidas, o maior óbice para a solidificação das instituições relacionadas ao sistema penal. Deste modo, existe uma facilidade notória na escolha dos casos a serem esclarecidos, pois, além dos incontáveis delitos ocultos praticados, somente uma pequena fração destes casos chegam até as instituições criminais e transforma-se em processo penal, evidenciando a falta de capacidade institucional para desvendar a maior parte das condutas ilícitas. Segundo Zaluar (2007), uma grande quantidade de homicídios não possui inquérito e seus autores não são identificados. O próprio afirma que houve um estudo no sistema criminal de São Paulo em que constatou que os crimes que são mais levados à júri, até chegar a sua condenação, é o de tráfico de drogas e roubo. Os crimes de homicídio e assalto à mão armada que são os que mais apavoram as pessoas, não estão nessas altas taxas de condenados, evidenciando ainda mais a sensação de insegurança.

 

Posicionamentos específicos

 

No que diz respeito à opinião pública sobre o tema em diversos países, existem diversas pesquisas que retratam sobre a eficácia da pena de morte, vinculando-a aos níveis de criminalidade. Warley Belo destaca que na Alemanha, em 1948, foram 521 assassinatos. Em 1949, aboliu a pena de morte.  Em 1950, houve 301 homicídios e, em 1960, 355 homicídios.[10] Um estudo publicado pelo Jornal de Lei Criminal e Criminologia da Universidade de Northwestern, em Chicago, realizado por 67 pesquisadores especializados na temática sobre a pena de morte, afirmou que 88,2% destes pesquisadores asseguraram que a aplicação da pena de morte não tem qualquer influência nos níveis de criminalidade. Joe Domanick, diretor do centro de Mídia, Crime e Justiça da Universidade da Cidade de Nova York, afirmou, em reportagem concedida ao jornal BBC Brasil, que as pessoas que cometem crimes mais violentos, que em sua maioria são crimes passionais ou acertos entre gangues, não estão preocupadas com a pena capital ao cometer estes tipos de delitos. Para ele, ao invés desta medida, substituiria para a prisão perpétua sem possibilidade de ser solto, pois seria menos drástico e teria a mesma eficácia de tirar infratores da sociedade.[11]

 

Realidade social em relação ao sistema prisional

 

Sobre os aspectos sociais que se vinculam ao sistema corretivo penal, Cristsinelis (2009) denota que as alterações drásticas na lei, seja para aplicar a pena de morte, prisão perpétua ou redução da maioridade penal não resolverão as dificuldades trazidas pela violência. São necessárias outras mudanças em fatores mais específicos. Noronha (2004) enfatiza que se for aplicado um código penal de modo correto, melhorando os meios de recuperação do indivíduo, não ouvirão falar a respeito da aplicação da pena capital. Segundo Ottobani (2001), o infrator é preso e punido por imposição da sociedade, ao fato de que trazê-lo de volta ao meio social é uma conjuntura de natureza moral, da qual ninguém deve se omitir. O autor enfatiza que a sociedade se sentirá segura somente quando o preso voltar a se socializar e não ter condições de ser reincidente.

Quanto aos aspectos que concernem ao sistema prisional, o Estado não revê a situação dos condenados, nos quais englobam as condições insalubres e degradantes aos que os presos se encontram, tornando as penitenciárias verdadeiras fabricantes de indivíduos mais perigosos, na medida em que o Estado deixa de cumprir cada vez mais as determinações previstas pelo artigo 5º, inciso XLIX, da Constituição Federal que esclarece que “é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral”, evidenciando diversos problemas como a superlotação, a má-alimentação, a falta de assistência judiciária,  além de submeterem novos presidiários, dos quais teriam maiores chances de ressocialização, às facções e aos seus líderes que comandam a rede de diversos criminosos de dentro dos presídios e fora deles, auxiliado pelo uso exacerbado dos celulares.

 

MÉTODO

 

O presente trabalho consistiu no método indutivo, onde foi utilizado vários argumentos doutrinários acerca da temática sobre a pena de morte, em que foi buscado um posicionamento mais plausível e coerente em razão do objetivo tratado. Ademais, houve uma extensa utilização de pesquisas, tanto nacionais quanto internacionais, em que foi discutido o parecer da opinião pública atual, no que concerne à aplicação da sanção extrema, para um maior combate à violência.

Estas pesquisas, das quais foram trazidos os seus conteúdos de extrema importância para este trabalho, estão amplamente disponíveis a todos, seja por acesso à rede mundial de computadores, seja pelos veículos de comunicação em massa.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A tendência abolicionista se torna cada vez mais frequente, na medida em que os países absorvem com mais ponderação o princípio da dignidade da pessoa humana. Observa-se que à aplicação desta medida não é possível nesta atual Constituição porque não é permitido alterar à essência das cláusulas pétreas que acolhem e preservam os direitos fundamentais, e nem seria possível em uma nova Constituição, pois colide com o princípio da proibição ao retrocesso, que neste caso trata-se de um direito à vida conquistado pela sociedade, na medida em que as normas jurídicas acompanham a evolução societária. Aliás, caso estes contrapontos não se satisfaçam, as convenções e tratados internacionais dos quais o Brasil realizou adesões incondicionais já bastam. Qualquer medida retroativa seria, além de um profundo desprezo aos direitos humanos, um desrespeito enorme em relação aos outros países, gerando assim incidentes diplomáticos de proporções inimagináveis.

Não obstante, a falta de clareza e de conhecimento dos princípios constitucionais por boa parte da população brasileira, vinculados aos baixos índices educacionais e às altas taxas de homicídios que resultam em um maior sentimento de insegurança e impunidade, faz com que evidencie cada vez mais a parte da sociedade que é favorável ao retorno da pena capital aos crimes praticados por civis. É possível analisar que a aceitação da pena de morte por boa parte da população seria apenas um pretexto, de forma não conscientizada, para ignorar a realidade social, judicial e carcerária, onde o Estado não possui a capacidade de contornar estas situações de forma instantânea, resoluta e legitimada.

De fato, a falta de políticas públicas para a segurança, a educação, o desemprego, o sistema prisional que atualmente encontra-se falido são grandes dificuldades no enfrentamento diário frente à violência. Fatores errôneos para combater este problema social, como por exemplo na alteração do modo como se pune os infratores, serve apenas como uma satisfação rápida para as pessoas minimizarem os sentimentos temorosos causados pelos efeitos danosos da violência nítida no país. Soa como uma dissimulação que encobre a incompetência institucional do Estado de garantir o simples direito à locomoção, além da lentidão de desvendar casos graves de maiores impactos morais à sociedade, crimes estes que permanecem por boa parte ocultos, seja pela ineficácia dos órgãos ou pela vagarosa disseminação jurídica dos poucos casos trazidos ao sistema penal.

Nas outras formas de enfrentamento, é necessário o quanto antes a realização de novos presídios com a modernização da arquitetura presidiária, descentralizando presos mais perigosos dos que não oferecem maiores perigos, aliados a uma maior abrangência da assistência jurídica para contribuir com os ritos processuais em que os condenados se encontram e que muitos deles estão com suas penas já cumpridas e são deixados de lado. Além disso, deve ser disseminado a utilização da laborterapia ou da ocupação destas pessoas com o trabalho, para que não haja a ociosidade, bem como o acompanhamento do retorno à sua vida social e a disposição de garantias ao reingresso ao mercado de trabalho, ou de esforços finais à privatização do sistema carcerário são algumas das várias medidas que devem já ser tomadas.

A visão célebre e clássica de Beccaria, que há mais de 250 anos depois ainda se torna atual em razão aos problemas vividos pela sociedade, serve de inspiração para o engajamento de novas frentes específicas de resolução destes problemas sociais graves.

 

"Quereis prevenir os crimes? Fazei leis simples e claras; e esteja a nação inteira pronta a armar-se para defendê-las, sem que a minoria de que falamos se preocupe contentemente em destruí-las. Quereis prevenir os crimes? Marche a liberdade acompanhada das luzes. Se as ciências produzem alguns males, é quando estão pouco difundidas; mas, à medida que se estendem, as vantagens que trazem se tornam maiores". (BECCARIA, C. Pag. 191-192)

 

Em verdade, existem certos indivíduos que não possuem sensibilidade de se arrependerem do delito cometido, que neste caso, já não possuem a mesma razoabilidade dos seres humanos em geral. Para eles, darem o rigor da lei penal, na proporcionalidade do crime cometido. Aos legisladores, é necessário realizar leis mais claras, de fácil compreensão ao povo, pois, o direito deve acompanhar a trajetória em que a maioria da sociedade caminha, inclusive no que diz respeito ao baixo nível educacional. A população tomando conhecimento da própria legislação, facilita na instrução e na gradativa resolução de conflitos diversos, principalmente no tocante ao direito penal. A defesa dos direitos e deveres de cada indivíduo se torna mais compreensível com leis e normas mais nítidas de conhecimento.

 

[1] A pesquisa foi realizada com 2.002 entrevistas em 141 municípios das 5 regiões brasileiras, constatando que 46% dos entrevistados apoiam a medida da pena de morte para crimes mais graves, sendo que 54 % são contrários ou indiferentes em relação à esta medida. A pesquisa também revelou que 69% são favoráveis à prisão perpétua e 83% dos entrevistados concordam total ou parcialmente com a adoção de uma política de tolerância zero, em que todo tipo de infração ou ilegalidade sejam punidos. Encontra-se disponível em http://www4.ibope.com.br/download/111019_cni_seguranca.pdf

[2] BECCARIA, Cessare. Op.Cit. P. 81.

[3] Disponível em https://anistia.org.br/noticias/pena-de-morte-china-deve-explicar-nivel-grotesco-de-aplicacao-da-pena-capital/

[4] Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lim/lim-16-12-1830.htm.

[5] Disponível em https://www.unicef.org/brazil/pt/resources_10133.htm

[6] Disponível em https://nacoesunidas.org/pena-de-morte-nao-tem-lugar-no-seculo-21-diz-secretario-geral-da-onu/

[7] A Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH; também conhecida como Pacto de San José da Costa Rica) é um tratado internacional entre os países-membros da Organização dos Estados Americanos e que foi subscrita durante a Conferência Especializada Interamericana de Direitos Humanos, em 22 de novembro de 1969, na cidade de San José da Costa Rica. Entrou em vigor em 18 de julho de 1978, sendo atualmente uma das bases do sistema interamericano de proteção dos Direitos Humanos.

[8] Ultima ratio significa “última razão” ou “último recurso”. É uma expressão com origem no Latim e frequentemente empregada no Direito. Diz-se que o Direito Penal é a ultima ratio, ou seja, é o último recurso ou último instrumento a ser usado pelo Estado em situações de punição por condutas castigáveis, recorrendo-se apenas quando não seja possível a aplicação de outro tipo de direito, por exemplo, civil, trabalhista, administrativo, etc...

 

[9] Os dados foram divulgados em relatório apresentado no 11º Anuário Brasileiro de Segurança Pública e constatou o maior número de homicídios na história do país. Segundo estes mesmos dados, a cada uma hora, sete pessoas são assassinadas no Brasil.

[10] BELO, Warley. Op. Cit. P. 9.

[11] Disponível:<http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/01/150115_penademorte_pai_jf

  • pena de morte, direitos humanos, criminalidade

Referências

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Micael Lopes

Estudante de Direito - João Pessoa, PB


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