A adoção por homossexuais é uma questão bastante discutida. Há quem diga que pais homossexuais causariam problemas psicológicos em seus filhos, já que estes teriam como exemplo um comportamento “errado”. Baseado nesse ponto de vista, chega-se à conclusão que a criança não teria uma referência comportamental correta, e passaria a ter tendência ao homossexualismo. Ainda se levanta a possibilidade da criança ou adolescente sofrer preconceitos e ter vergonha de sua própria origem. Resumindo, a fundamentação se baseia única e exclusivamente no preconceito em relação a orientação sexual de uma pessoa, sem levar em conta posições legais ou científicas, e, principalmente a afetividade.
Em um país onde o catolicismo é predominante, a posição da Igreja Católica é ponto de partida para formação de opiniões. Por isso mesmo é que continua havendo resistência por parte da população em relação aos homossexuais e seus direitos.
Em nenhum momento o Estatuto da Criança e do Adolescente, assim como o Código Civil ou qualquer outra legislação pátria, faz menção a orientação sexual do adotando. Assim, não existe qualquer razão para que uma pessoa não seja considerada apta a adotar em razão de sua opção sexual.
O art. 43 do ECA deixa ensina que “a adoção será deferida quando apresentar reais vantagens para o adotando e fundar-se em motivos legítimos”, ou seja, a adoção é um meio de dar afeto àqueles que não recebem, dar amor àqueles que foram abandonados. Assim, não existe razão para uma criança ou um adolescente serem privados da possibilidade de ter uma família única e exclusivamente pela orientação sexual de alguém. É muito mais vantajoso para o adotando viver em um lar estável, com pessoas dispostas a dar educação e afeto, do que viver em abrigos ou mesmo nas ruas.
O art. 5º da CF trouxe a máxima: “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”, o que deixa claro que qualquer tipo de distinção por opção sexual é inconstitucional. Qualquer pessoa tem direito a paternidade ou maternidade e a não observação desse direito fere claramente o princípio constitucional da igualdade. Ressalta-se novamente que não há qualquer legislação vigente impedindo que um homossexual exerça a paternidade ou a maternidade, podendo recorrer a adoção se assim preferir.
Em relação as dificuldades dos homossexuais em matéria de adoção, Aimbere Torres traz a seguinte posição:
A ideia de família concebida por nossos legisladores e aplicadores da lei sofre de um mal crônico – a forte influência do casal imaginário, do amor cortês entre um homem e uma mulher –, a qual tem servido de fundamento para não se acolher a pretensão à paternidade socioafetiva quando requerida por entidades familiares homoafetivas. Imperioso se faz despertá-los deste romanesco sonho quixotesco, retirar-lhes o véu da indiferença e lhes apresentar não só uma nova realidade social brasileira, mas de toda a humanidade, qual seja, o fato de que a convivência de crianças e adolescentes em lares de casais homoafetivos é uma realidade bastante frequente. (TORRES, 2009, p.112)
Assim, aqueles que rejeitam a adoção por homossexuais devem perceber que casais homoafetivos são cada vez mais comuns, e que as relações familiares continuam se baseando no amor e no afeto, independentemente de quem forma a família, se um casal heterossexual ou dois homossexuais; a capacidade de amar e ser amado é a mesma.
A principal questão a ser discutida é a inexistência de legislação que autorize ou rejeite a adoção conjunta por homossexuais.
Até então, o que geralmente ocorre é que um homossexual adota sozinho a criança ou o adolescente, ou seja, legalmente, o adotando será filho de um do casal.
O caput do art. 226 da CF traz: “A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado”. Não há qualquer menção a respeito de quem compõe a unidade familiar, ou seja, qualquer entidade que preencha os requisitos de afetividade e estabilidade é considerada família.
A jurisprudência atual reconhece que a união homossexual é entidade familiar, possuindo caraterísticas de união estável. A própria CF autoriza o reconhecimento de outros tipos de famílias, não somente aquela formada por marido, mulher e filhos. Não há explícito em nenhum diploma a necessidade de diversidade de sexos para o reconhecimento de entidade familiar.
Salienta-se novamente que não há qualquer norma no país que impeçam a adoção por casais homossexuais, pois em nenhum momento foi estabelecida a necessidade de diversidade de sexos entre adotantes.
Ambiere Torres afirma ainda:
Destarte, partindo do pressuposto de que o tratamento a ser dado às uniões entre pessoas do mesmo sexo, que convivem de modo durável, sendo essa convivência pública, contínua e com o objetivo de constituir família, deve ser o mesmo que é atribuído em nosso ordenamento às uniões estáveis, resta concluir que é possível reconhecer a essas pessoas o direito de adotar em conjunto. (TORRES, 2009, p. 115)
Em relação a eventual comportamento diferenciado por parte do adotado por família homoafetiva, já foram realizados estudos que comprovaram que a felicidade e o comportamento do adotado são resultado da forma como a família vive e não em como ela é formada. Já foi cientificamente comprovado que pessoas criadas por pais de mesmo sexo são tão afetivas quanto aqueles criados por pais de sexos diferentes.
Existem artigos onde se analisam a influência da orientação sexual dos pais na identidade sexual, desenvolvimento pessoal e relacionamento social em crianças adotadas com idade de quatro a nove anos; os resultados mostraram que a autoestima e o desenvolvimento pessoal e social dessas crianças são os mesmos daquelas criadas por pais de sexos diferentes.
A sexualidade dos pais não interfere na personalidade dos filhos, como apontam estudos realizados na Califórnia desde 1970, onde os pesquisadores concluíram que o ajustamento das crianças filhas de pessoas do mesmo sexo é o mesmo de qualquer outra. Meninos são tão masculinos quanto os outros, assim como as meninas são tão femininas como quaisquer outras, sendo que não foi encontrada qualquer tendência que sugerisse que filhos de pais homossexuais sejam necessariamente homossexuais.
Logo, não existe qualquer motivo que indique problemas em crianças adotadas por homossexuais, mas, ao contrário, fica claro que elas alcançam os mesmos benefícios daquelas adotadas por casais heterossexuais.
Acreditar que uma criança pode vir a ter problemas psicológicos caso seja criada por pais homossexuais significa esquecer que uma criança abandonada pode ser vítima de violência e exploração sexual, pode passar fome e não ter qualquer futuro, o que faz com que uma criança, com certeza, tenha problemas psicológicos.
Existem decisões a favor da adoção por pessoa que mantém união homoafetiva. Como exemplo, pode ser exposta decisão do STJ, que reconheceu o direito de uma mulher adotar duas crianças já perfilhadas por sua companheira:
“Menores. Adoção. União homoafetiva. Cuida-se da possibilidade de pessoa que mantém união homoafetiva adotar duas crianças (irmãos biológicos) já perfilhadas por sua companheira. É certo que o art. 1.º da Lei n.º 12.010/2009 e o art. 43 do ECA deixam claro que todas as crianças e adolescentes têm a garantia do direito à convivência familiar e que a adoção fundada em motivos legítimos pode ser deferida somente quando presentes reais vantagens a eles. Anote-se, então, ser imprescindível, na adoção, a prevalência dos interesses dos menores sobre quaisquer outros, até porque se discute o próprio direito de filiação, com consequências que se estendem por toda a vida. Decorre daí que, também no campo da adoção na união homoafetiva, a qual, como realidade fenomênica, o Judiciário não pode desprezar, há que se verificar qual a melhor solução a privilegiar a proteção aos direitos da criança. Frise-se inexistir aqui expressa previsão legal a permitir também a inclusão, como adotante, do nome da companheira de igual sexo nos registros de nascimento das crianças, o que já é aceito em vários países, tais como a Inglaterra, País de Gales, Países Baixos, e em algumas províncias da Espanha, lacuna que não se mostra como óbice à proteção proporcionada pelo Estado aos direitos dos infantes. Contudo, estudos científicos de respeitadas instituições (a Academia Americana de Pediatria e as universidades de Virgínia e Valência) apontam não haver qualquer inconveniente na adoção por companheiros em união homoafetiva, pois o que realmente importa é a qualidade do vínculo e do afeto presente no meio familiar que ligam as crianças a seus cuidadores. Na específica hipótese, há consistente relatório social lavrado por assistente social favorável à adoção e conclusivo da estabilidade da família, pois é incontroverso existirem fortes vínculos afetivos entre a requerente e as crianças. Assim, impõe-se deferir a adoção lastreada nos estudos científicos que afastam a possibilidade de prejuízo de qualquer natureza às crianças, visto que criadas com amor, quanto mais se verificado cuidar de situação fática consolidada, de dupla maternidade desde os nascimentos, e se ambas as companheiras são responsáveis pela criação e educação dos menores, a elas competindo, solidariamente, a responsabilidade. Mediante o deferimento da adoção, ficam consolidados os direitos relativos a alimentos, sucessão, convívio com a requerente em caso de separação ou falecimento da companheira e a inclusão dos menores em convênios de saúde, no ensino básico e superior, em razão da qualificação da requerente, professora universitária. Frise-se, por último, que, segundo estatística do CNJ, ao consultar-se o Cadastro Nacional de Adoção, poucos são os casos de perfilhação de dois irmãos biológicos, pois há preferência por adotar apenas uma criança. Assim, por qualquer ângulo que se analise a questão, chega-se à conclusão de que, na hipótese, a adoção proporciona mais do que vantagens aos menores (art. 43 do ECA) e seu indeferimento resultaria verdadeiro prejuízo a eles” (STJ, REsp 889.852-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 27.04.2010).
Já existem países onde é adotada uma postura efetiva contra atos discriminatórios, como é o caso da Espanha, que suspendeu um juiz do Conselho do Poder Judicial por ter negado a um casal de mulheres homossexuais o direito de uma delas adotar a filha biológica da outra, alegando que iria prejudicar a menor e aumentaria a chance de que ela se tornasse homossexual.
O Estado francês foi condenado a pagamento de indenização por ter recusado o direito de adotar uma criança a uma homossexual. Juízes da Áustria, Bélgica, Dinamarca, Grécia, Holanda, Portugal, Reino Unido, Sérvia e Suécia votaram a favor da condenação, com fundamento na Convenção Europeia dos Direitos Humanos.
Apesar disso, no Brasil não houve qualquer punição a membro do Judiciário que tenha negado o direito de adoção a homossexuais sem qualquer fundamento pertinente.