RESUMO: A adoção no Brasil não tem as mesmas características da sua origem na antiguidade. Ela já existia no mundo antigo, entre os egípcios, hebreus e romanos. Sua origem tinha a finalidade religiosa, ou seja, destinava-se à perpetuação do culto dos antepassados, assegurando-lhes a continuidade do culto sagrado. Posteriormente, a adoção assume a função de transmitir ao adotado o patrimônio do adotante (ALBERGARIA, 1996). A adoção, até anos atrás, era tratada como uma cultura do segredo. As crianças eram adotadas e criadas como legítimas e a adoção e a origem biológica não costumavam ser reveladas. O segredo era visto como um modo lógico de proteger as crianças do estigma e do preconceito que envolvia o tema. Diante deste contexto, é possível perceber que a adoção brasileira servia especialmente aos interesses dos adultos e não aos da criança em casos de adoção, estabelece a equiparação dos direitos dos filhos adotivos aos dos filhos biológicos. O Código de Menores Brasileiro, na Lei n. 6.697, de 10 de outubro de 1979, realizou notável avanço na adoção, concentrando-se no objetivo da adoção atual, que consiste na proteção integral do menor sem família. Enfim, enquanto a adoção clássica procurava garantir a descendência para casais sem filhos, a adoção moderna enfatiza a solução para a crise da criança abandonada, usando como fundamento possibilitar uma família para uma criança que não possui essa convivência em um meio familiar. (VARGAS, 1998). O presente visa demostrar de forma objetiva os princípios que envolve a adoção brasileira, os sistemas que cuidam deste tema no país e como o CNJ faz o controle de adoção uma analise comparativa da localização dos principais focos que prejudicam o processo de adoção, e porque tem tantas crianças para serem adotadas e tantas famílias nas filas de espera.
PALAVRAS CHAVES: Principios; adoção; modalidades; CNJ; entraves.
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*Graduando em Direito, filiada à Faculdade de Direito de Cachoeiro de Itapemirim (FDCI); (michelly_bidu@hotmail.com)
1 INTRODUÇÃO
A adoção hoje é um instituto do Direito, mas a sua origem é de natureza religiosa. A procriação, no passado, tinha uma importância não só para a perpetuação da raça humana, mas também para a sua redenção, pois os homens achavam que os filhos eram responsáveis pelos cultos fúnebres. Até mesmo na Bíblia existem passagens onde à mulher que não pudesse ter filhos, acabava por entregar uma escrava ao marido, para que esta lhe servisse, dando-lhe um filho que dele se regozijasse como se seu filho fosse. Conforme cita Rui Ribeiro de Magalhães, na passagem de Gêneses 16 em que Sara esposa de Abraão fala: “Visto que o Senhor fez de mim uma estéril, peçote que vás com a minha escrava. Talvez, por ela, eu consiga ter Filhos”1. Percebe-se que nesta passagem já ocorre o princípio da Adoção quando Sara diz: “por ela também terei filhos”. Semelhante passagem pode ser verificada no Código de Hamurabi em que os homens aos quais as esposas não podiam ter filhos, acabavam por gerá-los com outra. O Código de Hamurabi prescreve expressamente acerca do Instituto da Adoção em seu art. 185 como pode verificar nas palavras de Antônio Chaves:
Enquanto o pai adotivo não criou o adotado, este pode retornar à casa paterna; mas uma vez educado, tendo o adotante despendido dinheiro e zelo, o filho adotivo não pode sem mais deixá-lo e voltar tranquilamente à casa do pai de sangue. Estaria lesando aquele princípio de justiça
elementar que estabelece que as prestações recíprocas entre os contratantes devam ser iguais, correspondentes, princípio que constitui um dos fulcros do direito babiloniense e assírio. ( Magalhães p.267)
Nesta época entre o anos de 1728-1686 a.C., o Código de Hamurábi, além de tratar desta questão, ia mais longe, ao prever soluções nas relações adotivas e sucessórias. Funcionavam mais ou menos assim: se o adotado viesse a reclamar pela família biológica, este deveria voltar ao seio desta família, contudo, se o adotante ensinasse um ofício ao adotado este não poderia ser reclamado pela família biológica. Porém, se o pai adotivo porventura viesse a ter filhos naturais e resolvesse abandonar o adotado, teria que dar a terça parte dos seus bens móveis a título de herança. Como pode ser verificado, mesmo nesta época já existia uma preocupação com a sustentabilidade do filho adotado, no caso do pai adotivo o abandonasse. Pode-se depreender, quando Antônio Chaves faz menção à palavra “contratante” na citação acima, demonstra que nesta época o caráter contratual da relação já era utilizado no instituto da adoção. No Código de Manu, que foi redigido entre os séculos II a.C. e II d.C., havia os mesmos dispositivos, quando prevê o enaltecimento da procriação. O homem casado por mais de 08 (oito) anos e que a esposa não procriasse, o marido poderia substituí-la. O interessante neste Código é o caso do homem estéril que poderia autorizar a esposa a ter com o irmão ou outro parente o seu primogênito. Outro ponto que também chama atenção no Código de Manu é que a adoção
já era tratada com rigor em relação ao direito sucessório, conforme no seu artigo558:
Um filho dado a uma pessoa não faz mais parte da família de seu pai natural e não deve herdar de seu patrimônio. O bolo fúnebre segue a família e o patrimônio; para aquele que deu seu filho não há mais oblação fúnebre feita a esse filho. ( Monaco p.19)
Verifica-se que a maior preocupação dos homens naquela época era no sentido religioso, quando mencionava-se cerimônia fúnebre, pois para eles, eram os filhos varões que conduziriam os cultos fúnebres dos seus ancestrais. Já no Direito Romano e segundo a Lei das XII Tábuas, havia dois tipos de adoção a serem praticados: a ad rogatio que era adoção na forma mais complexa e a adoptio adoção propriamente dita. Em ambos os casos era necessário que o adotante fosse sui juiris (homem), mais velho ao menos 18 (dezoito) anos em relação ao adotado e não possuir filhos legítimos ou adotados. Só depois de serem analisados estes requisitos, no caso da ad-rogatio, que a igreja e a lei autorizavam a adoção. Como se pode ver a ad-rogatio somente se realizava por força de uma lei, em concurso sucessivo da Religião e do Estado. Para a efetivação da ad-rogatio era necessário, ainda, a concordância das partes interessadas, ou seja, do ad-rogante e do ad-rogado.
Já adoptio ou adoção em sentido estrito ou propriamente dita do Direito Romano é a que mais se assemelha à concepção moderna do instituto A adoção, neste caso, possuía característica bem peculiar, segundo a Lei das XII Tabuas, em que o pai que vendesse o filho por três vezes perderia o poder paterno, diferente da ad-rogatio aqui deveria ocorrer anuência dos dois pater familis e não interessando a opinião do adotado. A efetivação da adoptio dependia de duas solenidades: a mancipatio, que extinguia o pátrio poder do pai natural, e a in juri cessio, que consistia na cessão de direito pura e simples em favor do adotante, que deveria ser realizada perante o pretor. A forma pela qual a civilização romana se estruturava religiosamente e socialmente favoreceu o desenvolvimento e a plenitude dos efeitos da adoção. Já em Portugal, o instituto da adoção não teve aceitação. Mesmo sendo um ,país de exagerada fé católica e com grande influência dos romanos, a Igreja não aceitou, indo a valorizar somente os filhos concebidos das relações matrimonias religiosas católicas. A adoção só foi reintroduzida na legislação portuguesa com o Código Civil de 1966, em seu art.1973 e SS. No Brasil, a adoção foi introduzida por influência do Reino de Portugal, fortemente influenciado pelo Direito Canônico.
No entanto, somente com a introdução do Código Civil de 1916, que adoção passa a ser disciplinada no ordenamento jurídico brasileiro, nos termos dos artigos 368 a 378 em que somente poderiam adotar os maiores de cinquenta anos, e pelo menos dezoito anos mais velhos que os adotados, desde que não possuíssem filhos legítimos ou legitimados, colocando obstáculos àqueles que tivessem a intenção de adotar. Quanto a esse aspecto, é interessante observar a necessidade de o adotante não possuir filhos. Este detalhe importante demonstra como a adoção possuía, à época, a função primordial de dar a oportunidade àquele que não podia ou não quis ter um filho biológico, mantendo-se o caráter que a adoção já possuía desde suas origens.
A Lei nº 3.133 de 8 de maio de 1957 veio modificar o Código Civil no Capítulo que faz referência a adoção, mudando requisitos indispensáveis como: a idade mínima de 50(cinquenta) passou para 30(trinta) anos, e a diferença de idade entre adotado e adotante de 18 (dezoito) anos para (16) dezesseis anos. A partir daqui os casais que tivessem filhos também poderiam adotar, desde que, comprovassem estabilidade conjugal. Verifica-se, através da citada Lei, uma pequena evolução no que se refere ao caráter da adoção, uma vez que são colocados menos objeções a quem queira adotar. Em 2 de junho de 1965, entra em vigor a Lei nº 4.655, introduzido em nosso ordenamento jurídico a chamada legitimação adotiva. Poderia ser adotado os menores expostos, cujos pais fossem desconhecidos ou que manifestasse por escrito que o menor poderia ser concedido a adoção ou menores de sete anos cujos pais tivessem sido destituído do pátrio poder. Porém era exigido que passassem por um período de adaptação de no mínimo 03(três) anos.
Em 1979, foi recepcionado em no ordenamento jurídico brasileiro, o Código de Menores, por meio da Lei nº 6.697 de 10 de outubro. Esta lei veio por substituir a legitimação adotiva, pela adoção plena. E em 13 de julho de 1990, um estatuto legal veio modificar o instituto da adoção, com a Lei nº 8.069, que instituiu o Estatuto da Criança e do Adolescente ECRIADE. O ecriad veio para revogar o Código de Menores e modificar a ideia de adoção, visando proteger o melhor interesse da criança e do adolescente, já luz da Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1998, Nesta perspectiva, o Estatuto da Criança e do Adolescente outorga ao adotado a condição de filho, atribuindo-lhe os mesmos direitos e deveres, em relação aos filhos biológicos, inclusive os sucessórios. O parentesco resultante da adoção não se limita ao adotante e adotado, envolvendo toda a família do adotante.
3- NATUREZA JURIDICA
A natureza jurídica da adoção é uma questão que gerou grandes discussões entre os doutrinadores vez que se trata de questão um tanto controvertida. E segundo Carlos Roberto Gonçalves diz:
É controvertida a natureza jurídica da adoção da adoção. No sistema do Código de 1916, era nítido o carater contratual do instituto. Tratava-se de negócio jurídico bilateral e solene, uma vez que se realizava por escritura publica, mediante o consentimento das duas partes. Se o adotado era maior e capaz, comparecia em pessoa, se incapaz, era representado pelo pai, ou maiores, pelo acodo de vontade [...]. A partir da constituição de 1988, todavia, a adoção passou a constituir-se por ato complexo e a exigir sentença judicial, prevendo-a expressamente o art.47 do Estatuto da Criança e do Adolescente e o art 1623, paragrafo único do Código Civil de 2002 ( GONÇALVES, 2008, p. 338)
Por sua vez, Venosa (2007, p.320) assim afirma:
[…] A adoção no Código Civil de 1916 realcava a natureza negocial do instituto, como contrato do direito de família, tendo em vista a singela solenidade da escritura publica que a lei exigia ( art 375). Por outro lado, na adoção no Estaturo da criança e do Adolescente não podemos considerar somente a existência de simples bilateralidade na manifestação de vontade, porque o Estatuto participa necessária e ativamente do ato, exigindo-se uma sentença judicial tal como faz o código civil de 2002 [...]
Dessa forma, pode-se dizer que no que tange a natureza jurídica da adoção, verifica-se que a mesma se trata de um ato solene e bilateral, não podendo esta ser subordinada a condição ou termo, fazendo-se necessária a presença do Estado e uma sentença judicial para que esta seja então possível.
4 – PRINCIPIOS DA ADOÇÃO
Quando falamos de princípio principalmente o que tange a adoção, o mais significativo em todos os ramos do direito brasileiro é o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, este princípio vem trazer a preocupação com a ordem dos direitos humanos e da justiça social, foi o que levou o constituinte a consagrar a dignidade da pessoa humana como valor nuclear da ordem constitucional, é considerado o mais universal de todos os princípios, pois o mesmo irradiam todos os demais; liberdade, autonomia, cidadania, igualdade e solidariedade.
Este princípio encontra na família, o local apropriado, pois a ordem constitucional da uma especial proteção independentemente da sua origem, desta maneira favorece o desenvolvimento pessoal e social de cada partícipe com base em ideias pluralista, solidarista, democráticos e humanistas.
Outro princípio muito relevante no direito de família é o da proteção integral da criança e do adolescente é encontrado no dispositivo referente à adoção, previsto no artigo 227 da Magna Carta: Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Tal princípio preceitua que o adotante deverá observá-lo e, ainda fornecer ao adotado, um ambiente familiar favorável ao seu desenvolvimento que, por algum motivo, foi privado de sua família biológica.
Portanto, denota-se da Constituição Federal de 1988, que o legislador optou por assegurar a proteção à criança, ao adolescente e ao jovem, como um optou por assegurar a proteção à criança, ao adolescente e ao jovem, como um dever da família, da sociedade e do Estado, não só para os filhos havidos da relação ou não do casamento, mas também aos adotados, sem nenhuma distinção.
Com isso, denota-se que, os casais ou pessoas que pretendam adotar precisam ter ciência da responsabilidade e da complexidade desse ato. A decisão de adotar uma criança ou adolescente é de suma importância, e antes de ocorrer deve haver uma análise pautada na seriedade pelo adotante, pois, tal ato é reconhecer no filho gerado por outro, seja por caráter consanguíneo ou afim, o próprio filho.
É importante destacar o Principio da Afetividade pois ele fundamenta as relações interpessoais e o direito de família nas relações sócios afetivas de caráter patrimonial ou biológico e na comunhão de vida. Vem trazer exatamente a ideia de que o afeto é o resultado de todas as mudanças e evoluções ocorridas nos últimos anos na família brasileira, tem como base os valores consagrados pela lei maior e acaba sempre balizando importantes doutrinas e jurisprudência do direito de família.
A constituição Federal elenca um enorme rol de direitos individuais e sociais, como forma de garantir a dignidade de todos, deste modo o estado confere para si obrigações para com seus cidadãos, é uma forma de ter assegurado o afeto, e a adoção também é uma escolha afetiva com igualdade de direitos.
O código civil não traz a palavra afeto, porém invoca o laço da afetividade como um componente indicativo para a definição da guarda do filho quando há a separação dos pais.
O princípio da Igualdade e respeito a diferença trata que a lei deve tratar todos de forma igual. O tratamento isonômico da pessoa igualitária, que traz o sistema jurídico, é assegurada a todos os cidadãos no âmbito social, o código civil consagra o princípio da igualdade no âmbito do direito das famílias essa relação deve ser pautada não pela pura e simples igualdade entre iguais mas pela solidariedade entre seus membros, caracterizada pelo afeto e pelo amor.
O princípio da solidariedade familiar traz um conteúdo ético e moral, tendo origem nos vínculo afetivo, uma vez que solidariedade é o que cada um deve o outro, compreendendo a fraternidade e a reciprocidade, este vinculo é o que impõe que cada pessoa tem os deveres de cooperação, assistência, amparo, ajuda e cuidado em relação as outras. Este princípio se resumi no dever de mútua assistência que os parentes possuem um pelo outro.
O princípio da pluralidade das entidades familiares é visto com o reconhecimento pelo Estado da existência de várias possibilidades de arranjos familiares, a Constituição federal de 1988, reconheceu o princípio da pluralidade familiar, admitindo em seu ordenamento, além das famílias ditas tradicionais aquelas decorrentes de união estável e as famílias monoparental.
Quando trata do Direito de Família é importante ressaltar o principio da proteção integral a crianças, adolescentes, jovens e idosos, é uma diretriz determinante nas relações da criança e do adolescente com seus pais, com sua família, com a sociedade e com o Estado. E a Constituição Federal em seu artigo 227, assegura as crianças e os adolescentes o direito a vida, a saúde, a alimentação ao lazer, a profissionalização, a cultura, a dignidade, ao respeito, a liberdade e a convivência familiar e comunitária.
De forma expressa, fica determinada a garantia de absoluta prioridade aos jovens (art 4º), que compreende a primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstância; precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância publica preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas e destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção integral á infância e a juventude.
A Carta Magna também veda discriminação em razão da idade, bem como garante especial proteção ao idoso, impondo a família, á sociedade e ao Estado, em seu artigo 230, a obrigação de assegurar sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar, bem como lhe garantindo o direito a vida.
4- REGIMES E ENTRAVES DA ADOÇÃO BRASILEIRA
O tema da adoção no Brasil é um desafio de enormes dimensões, como comprova a análise dos dados do Cadastro Nacional de Adoção (CNA) e do Cadastro Nacional de Crianças e Adolescentes Acolhidos (CNCA), administrados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). “Este dado é muito alarmante, hoje existe cerca de 5.500 crianças em condições de serem adotadas e quase 30 mil famílias na lista de espera do CNA. O Brasil tem 44 mil crianças e adolescentes atualmente vivendo em abrigos, segundo o CNCA , em fevereiro do ano passado, eram 37 mil”. O mais interessante é o questionamento de um numero tão alarmante, se tem famílias para recebê-las porque os dados continuam os mesmo, em que esfera pode estar o erro.
A primeira situação a ser analisada é a chamada de adoção “à brasileira está pratica ilegal continua crescendo muito no país, consiste em um modo pelo qual a mãe ou a família biológica “dá” a criança para outra pessoa, escolhida por ela, à margem dos trâmites legais. Muitas vezes, o casal adotante registra a criança como se fosse filho biológico desta maneira essa modalidade de adoção fica fora de qualquer tipo de controle judicial ou institucional, esse tipo de prática acaba afetando famílias que não tem uma situação econômica estável, pois vivem uma pressão social. A adoção à brasileira também pode encobrir casos de venda ou tráfico de crianças. E, sobretudo, esse modo de adoção não leva em conta os interesses da criança, o que é o mais importante para a lei em vigor, e sim o interesse de quem já possui um determinado fim para o mesmo.
Outrossim, após análise dos perfis do CNA indica que é falsa a crença comum de que o maior obstáculo às adoções no Brasil é a questão racial. Cerca de um terço (32,36%) dos pretendentes só aceita crianças brancas, que representam exatamente três em cada dez das cadastradas. Por esse viés, portanto, não existiria dificuldades. Até porque quase 100% das famílias se dispõem a acolher crianças negras ou pardas, que são duas em cada três do cadastro. Além disso, nada menos que 38,72% se declaram indiferentes em relação à raça do futuro filho ou filha.
A incompatibilidade difícil de ser suplantada é, na verdade, o fato do perfil adotante não se identificar com o perfil adotado, apenas um em cada quatro pretendentes admite adotar crianças com quatro anos ou mais, enquanto apenas 4,1% dos que estão no cadastro do CNJ à espera de uma família têm menos de 4 anos. Esta situação é tão alarmante que em 13 de março deste ano, eram apenas 227 em um universo de 5.465, por isso, cada dia que passam nos abrigos afasta as crianças ainda mais da chance de encontrar um novo lar. Um novo fator muito importante e que não deve ser esquecido é a saída de crianças e adolescentes das instituições de acolhimento, de acordo com as estatísticas do CNJ, é a baixa disposição dos pretendentes para adotar mais de uma criança ao mesmo tempo, ou para receber irmãos. Entre os aptos à adoção do CNA, 76,87% possuem irmãos e a metade desses tem irmãos também à espera de uma família na listagem nacional e como a chance é muito pequena cada vez torna-se mais difícil um irmão mais velho encontrar uma família tornando um problema ainda mair e o separando de sua família de origem.
O importante seria se cada casal que se dispusesse a adotar estivesse pronto para superar a corrida de obstáculo que envolve o processo, paciência para esperar em uma longa fila, precisa também ter uma capacidade financeira e uma estrutura familiar para acolher a criança que não tem família. Isto faz parte da adoção que geralmente o perfil adotado reflete em casais casados com idade equivalente entre 30 e 50 anos, com uma renda consideravelmente boa. Além do estado civil e da idade, dois outros fatores são comuns à grande maioria dos candidatos à adoção no Brasil: a região onde moram e a situação econômica.
A mesma homogeneidade do perfil socioeconômico dos integrantes do cadastro de adotantes pode ser observada em relação às aspirações quanto à criança que esperam acolher na família. Em primeiro lugar está o desejo de adotar uma criança ainda pequena, apenas 4,77% dos pretendentes aceitariam receber um filho com 6 anos ou mais, realidade que se choca com o perfil das crianças aptas à adoção no país.
Mais ainda, são os bebês os mais procurados. Menos de um 1% está disposto à tarefa de acolher um adolescente como filho. Conclui-se, portanto, que o grande empecilho para as adoções, mais do que os entraves burocráticos ou as exigências legais, é mesmo a exigência de pouca idade por parte dos pretendentes. A duração média de um processo de adoção deveria se em torno de um ano, porem na prática, tem processos que demoram até 12 anos. Muitos pais adotivos, mesmo sabendo que a guarda provisória foi concedida, que não há condição da criança voltar à família biológica, ficam na angústia pelo tempo que dura o processo. Esse processo tão prolongado afasta muitas pessoas que têm condições e vontade de serem pais adotivos.
O preconceito racial não é, pelas estatísticas, um fator determinante nas chances que uma criança tem de ser adotada, a maioria dos casais que desejam adotar optam hoje por uma criança negra, ou seja, não se trata de um mito, mas também não é uma verdade absoluta no que diz respeito aos pais postulantes à adoção de crianças negros ou pardos.
O cadastro de pretendentes foi uma das mais importantes vitórias da nova legislação, sem um casal ou uma pessoa disposta a adotar, as crianças não vão ter famílias, no entanto a exigência de candidatos devidamente habilitados em um curso para adoção pode estar sendo um empecilho adicional na redução da fila, Mas as adoções precisam ser preparadas por alguém que tenha capacidade técnica, emocional, que tenha amor em seu coração.
Um outro dado a ser averiguado é o perfil das crianças que estão disponíveis para adoção, em março deste ano segundo dados do CNJ apenas cerca de cinco mil quatrocentos e sessenta e cinco estavam aptas a serem recebidas por novas famílias em um ambiente de mais de 44 mil crianças. E ainda segundo o CNJ Apenas 1 em cada 8,15 crianças abrigadas no país figuravam no Cadastro Nacional de Adoção. São mais meninos (56%) do que meninas (44%), classificados em totais nacionais como pardos (47%), brancos (33%) e negros (19%), além de um pequeno número de indígenas e amarelos. Só na Região Sul o contingente de brancos (54%) supera o de pardos, certamente em razão do perfil étnico dos moradores daqueles estados.
5- CONSIDERAÇÕES FINAIS
Adoção tem que estar dentro do nosso coração. Não é qualquer pessoa que vai adotar. Não se pode pedir a ninguém para adotar uma criança e, quando ela quer adotar, os grupos preparam o casal para uma adoção legal, segura e para sempre, pois vivemos num mundo em constante transformação, onde a cultura das pessoas é deficiente e o preconceito ainda existe. A adoção é um exemplo transparente disso. Adotar um filho é sempre um ato de coragem, afinal é preciso enfrentar o desejo da família em ter consigo alguém que não carregue suas características genéticas, o preconceito da sociedade em relação às crianças abandonadas, e, principalmente, um medo irracional que muitas vezes se sente de não tratar como filhos crianças que não sabemos a origem. Para quem quer adotar existe uma burocracia imensa.
Entretanto a atuação da atual cultura da adoção tem dificultado os processos de adoção em seus mais diferentes estágios, ou seja, desde o processo de discernimento e decisão do casal/família postulante à adoção até o processo de construção dos vínculos que produzirão os tão almejados laços de família. Assim, identificamos a atual cultura da adoção como um nó, metaforicamente falando. Postulamos como tarefa dos chamados profissionais da adoção (psicólogos, assistentes sociais, advogados, promotores de justiça, juízes, etc.) o urgente exercício ético de "cuidado" com a temática, de modo a não reproduzirmos os mitos e medos existentes, mas que, pelo contrário, trabalhemos em função de suas desconstruções.
A construção de uma nova cultura da adoção é, um dos desafios e um dos caminhos que podemos decidir enfrentar e percorrer para que o contingente de crianças e adolescentes sem famílias comece a diminuir no Brasil. Este é um direito inalienável da criança e do adolescente e um dever ético, e para mudar a realidade brasileira basta toda a política se voltar para essa situação e de maneira eficaz cuidar dessas crianças e adolescentes, para que as mesmas possam ter o encontro com uma família de verdade e viver de forma digna para que também contribua com a futura geração brasileira.