Guarda dos Filhos: Desvendando os caminhos para o bem-Estar da criança após o divórcio


06/11/2025 às 10h46
Por Gabriella Palmejani

Categoria: Direito de Família

 

O fim de um relacionamento é um processo doloroso e complexo, mas quando há filhos, a jornada ganha uma camada adicional de responsabilidade. A principal preocupação passa a ser: como garantir que eles sofram o mínimo possível? No centro dessa questão está a definição da guarda, um tema que, apesar de comum, ainda é cercado de dúvidas, medos e informações equivocadas.

Este artigo é um guia para trazer clareza. O objetivo não é apenas explicar o que a lei diz, mas ajudar você a entender que a guarda não é um troféu a ser disputado, e sim a construção de um novo arranjo familiar focado em uma única prioridade: o bem-estar dos seus filhos.

 

O QUE REALMENTE SIGNIFICA "GUARDA"?

Muitos associam a guarda apenas a "com quem a criança vai morar". Mas o conceito é muito mais amplo. Guarda é o conjunto de direitos e, principalmente, deveres que os pais têm em relação à criação dos filhos. Envolve zelar pela saúde, educação, segurança, desenvolvimento emocional e social.

bússola que guia todas as decisões judiciais sobre o tema é o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, previsto em nosso Estatuto (ECA) e na Constituição Federal. Isso significa que a vontade dos pais fica em segundo plano se não estiver alinhada ao que é mais saudável para o filho, conforme reiteradamente decide o Superior Tribunal de Justiça (STJ - REsp 1838271 SP 2018/0273102-3).

 

GUARDA COMPARTILHADA: A REGRA DE OURO NO BRASIL

Desde a Lei nº 13.058/2014, a guarda compartilhada é a regra em nosso sistema jurídico. E o motivo é simples: entende-se que a participação ativa de ambos os pais na vida dos filhos é fundamental para o seu desenvolvimento saudável.

Como funciona na prática? Ambos os pais, juntos, tomam as decisões importantes: a escolha da escola, a autorização para uma viagem, a definição de um tratamento médico, a escolha de uma atividade extracurricular, etc.

E a moradia? Aqui está o ponto que mais gera confusão. A guarda compartilhada não significa divisão igualitária do tempo (ex: 15 dias na casa de cada um). Para garantir uma rotina estável para a criança, o juiz define uma residência de referência (o "lar base"), onde ela morará na maior parte do tempo. O outro genitor terá seu direito de convivência (visitas) regulamentado de forma ampla e equilibrada. O STJ já decidiu, inclusive, que é possível a guarda compartilhada mesmo que os pais morem em cidades diferentes (STJ - REsp: 1878041 SP 2020/0021208-9).

O objetivo é que a criança sinta que tem dois lares, duas referências, e que ambos os pais são igualmente responsáveis por ela.

 

GUARDA UNILATERAL: A EXCEÇÃO QUE PROTEGE

A guarda unilateral é aplicada em situações mais delicadas, quando a compartilhada se mostra inviável ou prejudicial à criança. Nela, apenas um dos pais (ou um terceiro, como um avô) toma as decisões sobre a vida do filho.

Quando é aplicada?

Quando um dos pais declara expressamente que não deseja a guarda.

Em casos de conflitos extremos e falta total de diálogo entre o casal, que acabam prejudicando a criança. O STJ reconhece que a "acentuada beligerância" pode inviabilizar a guarda compartilhada (STJ - AgInt no AREsp: 2412569 SP 2023/0256350-4).

Quando um dos genitores representa um risco, como em casos de violência doméstica, alcoolismo, uso de drogas ou abandono. A Lei nº 14.713/2023, inclusive, alterou o Código Civil para afastar a guarda compartilhada quando há risco de violência.

Mesmo na guarda unilateral, o outro genitor mantém o dever de supervisionar os interesses do filho e o direito de convivência (visitas), além da obrigação de pagar a pensão alimentícia.

 

MITOS E VERDADES SOBRE A GUARDA

1. "Se eu sair de casa, perco a guarda." (MITO)

Verdade: Sair de casa para se proteger de um ambiente hostil ou para dar fim a um relacionamento que não existe mais não configura abandono de lar e não resulta na perda automática da guarda. A decisão judicial levará em conta quem tem as melhores condições de cuidar da criança.

2. "A mãe sempre tem preferência na guarda." (MITO)

Verdade: A lei não faz distinção de gênero. A decisão é baseada em quem oferece as melhores condições para o desenvolvimento da criança, analisando o vínculo afetivo, a disponibilidade e o cuidado. Pai e mãe têm direitos e deveres iguais.

3. "Quem tem a guarda não precisa prestar contas sobre a pensão." (MITO)

Verdade: Quem paga a pensão tem o direito de exigir, judicialmente, uma prestação de contas para saber se o dinheiro está sendo efetivamente usado para o bem-estar do filho.

 

O QUE O JUIZ REALMENTE LEVA EM CONTA?

Para decidir, o juiz fará uma análise profunda da dinâmica familiar, muitas vezes com o auxílio de psicólogos e assistentes sociais. Ele observará:

  • O vínculo afetivo da criança com cada um dos pais.
  • A disponibilidade de tempo e a rotina que cada um pode oferecer.
  • A capacidade dos pais de colocarem as necessidades do filho acima do conflito do casal.
  • As condições (emocionais, sociais e materiais) para proporcionar um ambiente estável e saudável.

 

CONCLUSÃO: CONSTRUINDO UM NOVO COMEÇO

A definição da guarda não precisa ser uma batalha. Com a orientação correta, pode ser um processo de construção de um plano de parentalidade, um acordo detalhado que estabelece como a convivência, as decisões e as responsabilidades serão compartilhadas.

Cada família é única. O modelo ideal é aquele que se encaixa na sua realidade e, acima de tudo, protege quem mais importa: seu filho. Se você está passando por esse momento, buscar a orientação de um advogado especializado em Direito de Família não é um sinal de conflito, mas sim um ato de responsabilidade. Um profissional poderá mediar o diálogo, esclarecer seus direitos e ajudar a construir a solução jurídica e emocional mais saudável para todos.

 

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Gabriella Palmejani

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Referências

Legislação

BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm.

BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm.

BRASIL. Lei nº 13.058, de 22 de dezembro de 2014. Altera o Código Civil para estabelecer o significado da expressão “guarda compartilhada” e dispor sobre sua aplicação.

BRASIL. Lei nº 14.713, de 30 de outubro de 2023. Altera o Código Civil e o Código de Processo Civil para impedir o exercício da guarda compartilhada no caso de risco de violência doméstica ou familiar.

Jurisprudência

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1.838.271/SP. Relator: Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma. Julgado em 27/04/2021.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1.878.041/SP. Relatora: Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma. Julgado em 25/05/2021.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Interno no Agravo em Recurso Especial nº 2.412.569/SP. Relatora: Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma. Julgado em 17/06/2024.


Gabriella Palmejani

Advogado - Sorocaba, SP


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