Categoria: Direito de Família
O fim de um relacionamento é um processo doloroso e complexo, mas quando há filhos, a jornada ganha uma camada adicional de responsabilidade. A principal preocupação passa a ser: como garantir que eles sofram o mínimo possível? No centro dessa questão está a definição da guarda, um tema que, apesar de comum, ainda é cercado de dúvidas, medos e informações equivocadas.
Este artigo é um guia para trazer clareza. O objetivo não é apenas explicar o que a lei diz, mas ajudar você a entender que a guarda não é um troféu a ser disputado, e sim a construção de um novo arranjo familiar focado em uma única prioridade: o bem-estar dos seus filhos.
O QUE REALMENTE SIGNIFICA "GUARDA"?
Muitos associam a guarda apenas a "com quem a criança vai morar". Mas o conceito é muito mais amplo. Guarda é o conjunto de direitos e, principalmente, deveres que os pais têm em relação à criação dos filhos. Envolve zelar pela saúde, educação, segurança, desenvolvimento emocional e social.
A bússola que guia todas as decisões judiciais sobre o tema é o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, previsto em nosso Estatuto (ECA) e na Constituição Federal. Isso significa que a vontade dos pais fica em segundo plano se não estiver alinhada ao que é mais saudável para o filho, conforme reiteradamente decide o Superior Tribunal de Justiça (STJ - REsp 1838271 SP 2018/0273102-3).
GUARDA COMPARTILHADA: A REGRA DE OURO NO BRASIL
Desde a Lei nº 13.058/2014, a guarda compartilhada é a regra em nosso sistema jurídico. E o motivo é simples: entende-se que a participação ativa de ambos os pais na vida dos filhos é fundamental para o seu desenvolvimento saudável.
Como funciona na prática? Ambos os pais, juntos, tomam as decisões importantes: a escolha da escola, a autorização para uma viagem, a definição de um tratamento médico, a escolha de uma atividade extracurricular, etc.
E a moradia? Aqui está o ponto que mais gera confusão. A guarda compartilhada não significa divisão igualitária do tempo (ex: 15 dias na casa de cada um). Para garantir uma rotina estável para a criança, o juiz define uma residência de referência (o "lar base"), onde ela morará na maior parte do tempo. O outro genitor terá seu direito de convivência (visitas) regulamentado de forma ampla e equilibrada. O STJ já decidiu, inclusive, que é possível a guarda compartilhada mesmo que os pais morem em cidades diferentes (STJ - REsp: 1878041 SP 2020/0021208-9).
O objetivo é que a criança sinta que tem dois lares, duas referências, e que ambos os pais são igualmente responsáveis por ela.
GUARDA UNILATERAL: A EXCEÇÃO QUE PROTEGE
A guarda unilateral é aplicada em situações mais delicadas, quando a compartilhada se mostra inviável ou prejudicial à criança. Nela, apenas um dos pais (ou um terceiro, como um avô) toma as decisões sobre a vida do filho.
Quando é aplicada?
Quando um dos pais declara expressamente que não deseja a guarda.
Em casos de conflitos extremos e falta total de diálogo entre o casal, que acabam prejudicando a criança. O STJ reconhece que a "acentuada beligerância" pode inviabilizar a guarda compartilhada (STJ - AgInt no AREsp: 2412569 SP 2023/0256350-4).
Quando um dos genitores representa um risco, como em casos de violência doméstica, alcoolismo, uso de drogas ou abandono. A Lei nº 14.713/2023, inclusive, alterou o Código Civil para afastar a guarda compartilhada quando há risco de violência.
Mesmo na guarda unilateral, o outro genitor mantém o dever de supervisionar os interesses do filho e o direito de convivência (visitas), além da obrigação de pagar a pensão alimentícia.
MITOS E VERDADES SOBRE A GUARDA
1. "Se eu sair de casa, perco a guarda." (MITO)
Verdade: Sair de casa para se proteger de um ambiente hostil ou para dar fim a um relacionamento que não existe mais não configura abandono de lar e não resulta na perda automática da guarda. A decisão judicial levará em conta quem tem as melhores condições de cuidar da criança.
2. "A mãe sempre tem preferência na guarda." (MITO)
Verdade: A lei não faz distinção de gênero. A decisão é baseada em quem oferece as melhores condições para o desenvolvimento da criança, analisando o vínculo afetivo, a disponibilidade e o cuidado. Pai e mãe têm direitos e deveres iguais.
3. "Quem tem a guarda não precisa prestar contas sobre a pensão." (MITO)
Verdade: Quem paga a pensão tem o direito de exigir, judicialmente, uma prestação de contas para saber se o dinheiro está sendo efetivamente usado para o bem-estar do filho.
O QUE O JUIZ REALMENTE LEVA EM CONTA?
Para decidir, o juiz fará uma análise profunda da dinâmica familiar, muitas vezes com o auxílio de psicólogos e assistentes sociais. Ele observará:
- O vínculo afetivo da criança com cada um dos pais.
- A disponibilidade de tempo e a rotina que cada um pode oferecer.
- A capacidade dos pais de colocarem as necessidades do filho acima do conflito do casal.
- As condições (emocionais, sociais e materiais) para proporcionar um ambiente estável e saudável.
CONCLUSÃO: CONSTRUINDO UM NOVO COMEÇO
A definição da guarda não precisa ser uma batalha. Com a orientação correta, pode ser um processo de construção de um plano de parentalidade, um acordo detalhado que estabelece como a convivência, as decisões e as responsabilidades serão compartilhadas.
Cada família é única. O modelo ideal é aquele que se encaixa na sua realidade e, acima de tudo, protege quem mais importa: seu filho. Se você está passando por esse momento, buscar a orientação de um advogado especializado em Direito de Família não é um sinal de conflito, mas sim um ato de responsabilidade. Um profissional poderá mediar o diálogo, esclarecer seus direitos e ajudar a construir a solução jurídica e emocional mais saudável para todos.
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Gabriella Palmejani
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