A liberdade do advogado empregado em recusar demandas que contrariem suas orientações éticas e jurídicas


25/01/2017 às 18h34
Por V M S R

A atuação do advogado reflete a complexidade dos desafios diários que a sociedade apresenta em seu dia-a-dia, sendo este profissional o responsável pela defesa dos direitos e prerrogativas pessoais dos indivíduos no interior desta sociedade de intensa transformação. Com a constante mutação dos indivíduos, dos direitos e das sociedades, bem como, com o incansável surgimento de novas políticas e de novos pensamentos, o profissional do Direito, por ser igualmente um ser social, acompanha tais transições, normalmente posicionando-se conforme seus preceitos éticos e jurídicos.

Diante da importância deste profissional, reconhecida até mesmo na própria Constituição Federal, tornou-se imprescindível conceder a tal indivíduo uma liberdade e uma independêcia de manifestações superiores às dos demais cidadãos, no que se refere especificamente à sua atuação profissional. Tal fato ocorre porque é exatamente do advogado a incumbência de ser a voz dos demais cidadãos frente à Justiça e por isso é importante que tal indivíduo possua uma proteção maior quanto ao exercício de sua profissão.

Neste sentido, o parágrafo único do artigo 31 do Estatuto da Advocacia, em defesa do profissional, exige que o advogado mantenha independência em qualquer circunstância, conforme:

Art. 31. O advogado deve proceder de forma que o torne merecedor de respeito e que contribua para o prestígio da classe e da advocacia. §1º. O advogado, no exercício da profissão, deve manter independência em qualquer circunstância.

Ademais, a independência referida acima também é assegurada ao advogado empregado, pois também para este profissional tal prerrogativa deve ser observada. É o que se extrai do art. 18 do Estatuto da Advocacia e da OAB, conforme:

Art. 18. A relação de emprego, na qualidade de advogado, não retira a isenção técnica nem reduz a independência profissional inerentes à advocacia. Parágrafo único. O advogado empregado não está obrigado à prestação de serviços profissionais de interesse pessoal dos empregadores, fora da relação de emprego.

Com o objetivo de proteger ainda mais tais prerrogativas, o TED da OAB/SP definiu que a atuação do advogado deve limitar-se apenas à sua própria consciência, à lei e à ética. Deste modo, mesmo o advogado empregado deve ter sua posição ética e sua independência respeitados, tendo em vista estas prerrogativas estarem ligadas a suas liberdades idividuais e profissionais, além de estarem intrínsecas à sua atuação jurisdicional.

Tal direito permite, legitimamente, que o advogado se recuse a atuar em sentido contrário à sua orientação jurídica ou aos seus preceitos éticos, ainda que este esteja submetido a uma relação empregatícia.

A íntegra da decisão apresenta o seguinte:

EXERCÍCIO PROFISSIONAL – ADVOGADO EMPREGADO – ATUAÇÃO CONTRÁRIA À SUA ORIENTACAO TÉCNICA E JURÍDICA – RECUSA – POSSIBILIDADE E LEGITIMIDADE.

Nos termos do artigo 133 da Constituição Federal e da Lei nº 8.906/94, o advogado tem direito ao exercício de sua atividade com independência e liberdade, para que possa desempenhar adequadamente o seu mister livre de coações e interferências que poderiam lhe constranger e, por conseguinte, prejudicar a defesa de seu cliente e a concretização do múnus social da profissão.

A atuação do advogado deve limitar-se apenas à sua própria consciência, à lei e à ética.

A independência e liberdade intrínsecas à atuação do advogado permitem, legitimamente, que este se recuse a atuar contrariamente à sua orientação jurídica ou aos seus preceitos éticos, ainda que submetido a relação empregatícia.

Inteligência dos artigos 7º, inciso I, e 18 do Estatuto da Advocacia e do artigo 4º, caput e parágrafo único do Código de Ética e Disciplina.

Proc. E-4.731/2016 – v.u., em 17/11/2016, do parecer e ementa do Rel. Dr. Fábio Teixeira Ozi, Rev. Dra. Marcia Dutra Lopes Matrone – Presidente em exercício Dr. Cláudio Felippe Zalaf.

Portanto, mais uma vez se consagra a liberdade e independência do advogado, quanto a sua manifestação de pensamentos e quanto aos seus posicionamentos éticos e jurídicos, devendo tal profissional ter seus direitos e deveres respeitados para que continue atuando dentro de suas prerrogativas institucionais, sendo estas prerrogativas defendidas até mesmo para o advogado empregado, que recebe tais proteções jurídicas e legais, mesmo sendo prestador de serviços a terceiros, pois tais direitos são indisponíveis e intransmissíveis.

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Referências

ALMEIDA, Dayse Coelho de. Acesso à Justiça e o Jus Postulandi das próprias partes do direito do trabalho: alcance da justiça ou quimera jurídica? – São Paulo: Letras Jurídicas, 2012.

CARVALHO, Miguel Ângelo Farage de; A Independência do Advogado Público. Revista Jurídica Consulex, São Paulo, Ano VI, n. 134, p. 6-8, ago. 2002. Entrevista concedida para Revista CONSULEX.


V M S R

Advogado - Vitória, ES


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