A Lei Anticorrupção e as garantias das Pessoas Jurídicas


09/07/2015 às 18h46
Por Volnistem Advocacia

Com o advento da Lei n. 12.846/2013 (Lei Anticorrupção) surgiu a figura do processo penal-administrativo, mecanismo que buscará provar a prática corruptiva por parte da pessoa jurídica que contrata com o Poder Público ou não.

Poderão figurar no pólo passivo do processo penal-administrativo, as pessoas jurídicas elencadas no parágrafo único, do artigo 1º, da presente legislação, quais sejam: sociedades empresárias e às sociedades simples, personificadas ou não; fundações; associações de entidades ou pessoas; e, sociedades estrangeiras, que tenham sede, filial ou representação no território brasileiro.

Assim, se alguma pessoa jurídica das citadas acima cometer ato lesivo que atente contra o patrimônio público nacional ou estrangeiro, contra os princípios da administração pública ou contra os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, irá responder um processo penal-administrativo, e poderá sofrer as punições previstas em lei.

Entende-se por atos lesivos as definições contidas no artigo 5º e incisos, da Lei Anticorrupção:

Art. 5o Constituem atos lesivos à administração pública, nacional ou estrangeira, para os fins desta Lei, todos aqueles praticados pelas pessoas jurídicas mencionadas no parágrafo único do art. 1o, que atentem contra o patrimônio público nacional ou estrangeiro, contra princípios da administração pública ou contra os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, assim definidos:

I - prometer, oferecer ou dar, direta ou indiretamente, vantagem indevida a agente público, ou a terceira pessoa a ele relacionada;

II - comprovadamente, financiar, custear, patrocinar ou de qualquer modo subvencionar a prática dos atos ilícitos previstos nesta Lei;

III - comprovadamente, utilizar-se de interposta pessoa física ou jurídica para ocultar ou dissimular seus reais interesses ou a identidade dos beneficiários dos atos praticados;

IV - no tocante a licitações e contratos:

a) frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo de procedimento licitatório público;

b) impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de procedimento licitatório público;

c) afastar ou procurar afastar licitante, por meio de fraude ou oferecimento de vantagem de qualquer tipo;

d) fraudar licitação pública ou contrato dela decorrente;

e) criar, de modo fraudulento ou irregular, pessoa jurídica para participar de licitação pública ou celebrar contrato administrativo;

f) obter vantagem ou benefício indevido, de modo fraudulento, de modificações ou prorrogações de contratos celebrados com a administração pública, sem autorização em lei, no ato convocatório da licitação pública ou nos respectivos instrumentos contratuais; ou

g) manipular ou fraudar o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos celebrados com a administração pública;

V - dificultar atividade de investigação ou fiscalização de órgãos, entidades ou agentes públicos, ou intervir em sua atuação, inclusive no âmbito das agências reguladoras e dos órgãos de fiscalização do sistema financeiro nacional.

Ocorre que o inciso V, do artigo acima, se interpretado de forma literal, ferirá diretamente princípios e garantias penais constitucionais, pois o processo penal-administrativo difere-se do processo administrativo comum, já que este visa apenas sanção administrativa, e o processo discutido possui nítida natureza penal, configurando-se o jus puniendi ou direito de punir estatal.

Desta forma, como o processo penal-administrativo preserva características penais, incidirão às pessoas jurídicas os princípios e garantias penais, em obediência ao devido processo legal. Ou seja, a pessoa jurídica que estiver sendo processada penal-administrativamente, não precisará produzir prova contra si mesma (nemo tenetur se detegere); será presumida inocente; e, terá garantida a ampla defesa e o contraditório.

Neste contexto, ao analisarmos o disposto no Art. 5º, inciso V, da Lei Anticorrupção, deveremos interpretá-lo sob a ótica das garantias e princípios penais constitucionais, resguardando a pessoa jurídica em seus direitos, e deixando-a livre para escolher se colabora ou não com as fiscalizações; as investigações; e, com requisições feitas durante o processo penal-administrativo. Inclusive, não sendo necessário entregar qualquer tipo de documento, informação ou responder ofícios.

Para que a pessoa jurídica infrinja o inciso V, precisará fraudar o processo e tumultuar o seu andamento, como: coagir testemunhas; destruir provas; elaborar documentos e informações falsas; etc.

Nas palavras de Modesto Carvalhosa,

“o tipo instituído no inciso V do art. 5º deve ser entendido como delito de fraude processual e de criação de entraves para a apuração dos delitos corruptivos e não de obrigação de prestar colaboração. Restringe-se o preceito tipológico do inciso V à destruição de provas, ao aliciamento e suborno de testemunhas, ao falseamento de documentos e a toda espécie de fraude processual” (CARVALHOSA, Modesto. Considerações sobre a Lei Anticorrupção das pessoas jurídicas. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, pg. 34).

Neste sentido, para que fique claro, o dispositivo (artigo 5º, V) nunca poderá ser entendido como delito de não colaboração (produção de provas contra si mesmo), pois como bem afirma o professor Carvalhosa, seria uma aberração jurídica.

Assim, caso sejam desrespeitados os princípios e garantias penais das pessoas jurídicas durante o processo penal-administrativo, este deverá ser anulado, mantendo-se o respeito ao devido processo legal e ao Estado Democrático de direito.

  • DIREITO EMPRESARIAL
  • PESSOAS JURÍDICAS

Referências

Alexandre Salum Pinto da Luz

Advogado Criminalista

http://alexandresalum.jusbrasil.com.br/artigos/206764547/a-lei-anticorrupcao-e-as-garantias-das-pessoas-juridicas?ref=topic_feed


Volnistem Advocacia

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