DOLO EVENTUAL OU CULPA CONSCIENTE EM HOMICÍDIO NO TRÂNSITO COM EMBRIAGUEZ


12/03/2018 às 18h15
Por A&M Advogados Associados

DOLO EVENTUAL OU CULPA CONSCIENTE EM HOMICÍDIOS NO TRÂNSITO COM EMBRIAGUEZ

 

Amanda Elizabeth Araujo Silva*

 

 

RESUMO

 

  • O artigo tem como objetivo analisar como deve ser responsabilizado criminalmente o agente que causou uma morte, em razão de embriaguez no trânsito. No Brasil, acontecem muitos acidentes no trânsito, voltados à embriaguez. Mesmo com a lei seca em vigor e com vários órgãos públicos fiscalizando, ainda há acidentes em razão do agente que dirigir com teor alcoólico acima do permitido em lei. Quando o agente comete o resultado morte, devido a um acidente no trânsito ainda há duas teorias que o legislador elaborou em seu texto jurídico, que é o dolo eventual e o culpa consciente. O dolo eventual pode pressupor que é quando o agente assume o risco, mas também o aceita, o que é totalmente diferente da culpa consciente, pois o motorista assume o risco, mais não aceita o resultado, enfim, não desejava o resultado. Ao longo do artigo vamos observar que há vários doutrinadores e julgados que são a favor e contra as decisões em que, o agente embriagado no trânsito que venha a causar homicídio, seja responsabilizado pelo dolo eventual. Contudo, analisar as duas correntes, e verificar quais são os casos que podem aplicar em cada uma delas no ordenamento jurídico.

 

Palavras-Chave: Dolo Eventual, Culpa Consciente e embriaguez.

 

 

  1.  INTRODUÇÃO


            O presente artigo tem como elementos a discussão sobre quando aplicar dolo eventual ou culpa consciente em homicídios no trânsito em razão do agente com embriaguez. Atualmente no Brasil, mesmo com o Código de Trânsito Brasileiro (Lei nº 9.503/1997) em vigor, muitos condutores são imprudentes no trânsito, com isso, causando um elevado índice mortes.

            Em relação aos acidentes que estavam acontecendo em razão da ingestão de álcool, os legisladores elaboraram a lei seca (n° 12.760/2012) e também recorreu ao direito penal, com o objetivo de tentar diminuir os índices de acidentes em razão de condutor embriagado. Sem dúvidas, a embriaguez provoca falhas na coordenação motora do condutor. Assim, a embriaguez trata de um perigo individual e coletivo, causando transtorno para a sociedade.

A grande discussão que gera em torno do tema do artigo é como o agente que causou o homicídio no trânsito com sinais de alteração na capacidade psicomotora, deve responder: pelo homicídio culposo, tipificado no art. 302 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), ou por homicídio doloso, no art. 121do Código Penal Brasileiro (CPB), tendo sua principal diferença que seria as penas. O dolo eventual e a culpa consciente são dois institutos do Direito Penal, mas apresenta dificuldade para a distinção, obtendo efeitos totalmente diferentes.

Pode-se diferenciar o dolo eventual da culpa consciente, pois o primeiro o agente aceitou o risco, enquanto no segundo acreditou plenamente na sua capacidade em não causar o homicídio. Contudo, a diferenciação dos dois conceitos no campo prático seria praticamente inviável, pois não há como penetrar nos pensamentos do condutor para descobrir o que o agente desejou naquele momento do fato. No entanto, a aplicação de cada dispositivo precisa que seja analisado cada caso concreto, pois o dolo eventual a pena pode chegar até 20 (vinte) anos.

            O trabalho também irá abordar a diferenciação dos dois conceitos (dolo eventual e culpa consciente), sem a necessidade de adentrar na mente do autor do crime. Indicar as divergências doutrinárias, demonstrar aspectos legais e apresentar os entendimentos de alguns tribunais que são a favor do dolo eventual, quando o agente apresenta o teor alcoólico muito elevado e excesso de velocidade, causando o resultado morte. Neste mesmo entendimento, faz-se necessário definir também o tipo doloso e o tipo culposo; distinguir as modalidades de embriaguez e a sua aplicação no caso exposto, diante do Código de Trânsito Brasileiro e detalhar a nova lei seca; relatar quais seriam os elementos obrigatórios para aplicar o dolo eventual no agente que cometeu o resultado.

Com tudo que foi exposto, pode-se concluir que o tema do referido artigo é fundamental para a relevância jurídica, tendo como objetivo apresentar as discussões que são realizadas em razão da responsabilidade do agente no caso concreto. Por outro lado, temos que entender que este tema não se trata de uma fórmula absoluta ou automática, pois cada caso concreto tem que ser analisado. Mas sempre haverá raciocínios diferentes se a prática do delito foi dolosa ou culposa.

 

 

2. CONCEITO DO CRIME

 

            É importante ressalvar que quando se refere a um crime, existem elementos do crime material, formal e analítico. Em relação ao conceito material, tem que constituir a lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico. O conceito formal é a lei penal onde apresenta a pena base. O conceito analítico possui os elementos que compõe o crime é a divisão Tripartida: a) fato típico; b) ilícito e c) culpável.  No fato típico há os elementos que são imprescindíveis para a configuração do tipo que são: a) Conduta; b) resultado; c) nexo de causalidade e d) Tipicidade.

A conduta, representada pela a ação ou omissão, que é a conduta do agente de dolo (é quando o agente quer o resultado ou assumiu o risco de produzir) ou culpa (quando o agente age com negligencia, imperícia ou imprudência). No segundo elemento que se trata do resultado, existem duas denominações que é o resultado material ou o resultado normativo. O resultado normativo conhecido também por naturalístico é quando há lesão ou perigo de lesão, não pode haver crime se não alcançar o resultado naturalístico. No entanto, o resultado material tem como aspecto a modificação do mundo exterior pela conduta do agente, que neste contexto há a possibilidade de existir crime sem necessariamente resultar no resultado material.

Existem duas hipóteses de delito que podem ser comissivas ou omissivas. No comissivo, a ação do agente tem uma finalidade de realizar o ato ilícito, neste caso, a conduta do agente será positiva, pois o agente atua sabendo do resultado. Já no caso da conduta omissiva, diferente da comissiva, o agente faz a omissão de uma atividade que era prevista no ordenamento jurídico. Mas o crime omissivo há duas hipóteses que seria o próprio e o impróprio. Seguindo, ainda que o omissivo próprio seja a omissão do dever de agir do agente, seria um crime de mera conduta do autor. No entanto, no omissivo impróprio é quando o agente tem o dever de garantidor, tendo a responsabilidade de evitar o resultado. Só poderia praticar a omissão imprópria o sujeito tem um dever legal de proteção, ou quando o agente assumiu a responsabilidade de impedir tal resultado, ou quando o seu comportamento resultou na ocorrência do fato. No entanto o elemento do fato típico que seria o nexo de causalidade, que é o vinculo entre a conduta (dolo ou culpa) e o dano (resultado).  E necessário o nexo causal configurar a responsabilidade do agente que cometeu o resultado.

 Para ocorrer um crime, tem que estar tipificado e descrito na lei. Pode acontecer que uma conduta não seja crime. É, quando isso acontece, denominar-se como uma conduta atípica, que não é punida. Também se deve citar o elemento da antijuridicidade que a oposição a lei e o fato ocorrido, que seriam as excludentes de ilicitude que ocorre conforme art. 23 do CP (estado de necessidade, legitima defesa e cumprimento do dever legal). Seria aquela conduta que haveria uma causa significativa para justificá-la. 

Devem observar que o crime é um fato jurídico que o agente tem vontade. Há também, a culpabilidade não se trata de um elemento do crime, mas se trata da conduta típica e ilícita que o agente realizou.  Nas lições de Sanzo Brodt:

 

A culpabilidade deve ser concebida como reprovação, mais precisamente, como juízo de reprovação pessoal que recai sobre o autor, por ter agido de forma contrária ao Direito, quando podia ter atuado com conformidade com a vontade da ordem jurídica. (1996, p.102)

 

Em vista disto, vale resultar que para ser a culpável o autor tem que ter a união de 3 (três) elementos que seriam; a) imputabilidade; b) potencial consciência sobre a ilicitude do fato; c) elegibilidade de conduta diversa. No entanto, o agente tem que seja responsável pelo ilícito e fato típico é necessário ser imputável. Esclarece o Sanzo Brodt, sobre a imputabilidade:

 

A imputabilidade e constituída por dois elementos: um intelectual (capacidade de entender o caráter ilícito do fato), outro volitivo (capacidade de determinar-se de acordo com entendimento). O primeiro e a capacidade (genérica) de compreender as proibições ou determinações jurídicas. Bettiol diz que o agente deve poder ‘ prever as repercussões que a própria ação poderá acarretar no mundo social’, deve ter, ‘a percepção do significado ético-social do próprio agir’. O segundo, a ‘ a capacidade de dirigir a conduta de acordo com entendimento ético- jurídico’. Conforme Bettiol, e preciso que a agente condição de avaliar o valor do motivo que o impele a ação e, do outro lado, o valor inibitório da ameaça penal. (1996, p.46)

 

            Para tanto, existe a exceção que seria os inimputáveis, que, no entanto, existem duas hipóteses conforme art. 26 Código Penal Brasileiro, que seria inseto de pena o agente que obter doença mental ou imaturidade natural (menores de 18 anos). Na culpabilidade, ressalva a potencial consciência sobre a ilicitude, neste caso o agente tinha a possibilidade de obter o resultado. No entanto, Greco (2014, p.411) em seu ensinamento cita o conceito de exigibilidade de conduta diversa, “Essa possibilidade ou impossibilidade de agir conforme o direito variará de pessoa para pessoa, não só podendo conceder um “padrão” de culpabilidade”. Vale ressaltar, que se no momento da ação o agente apresentar esses elementos, podemos observar que ouve uma reprovação do agente.  A culpabilidade seria uma conduta típica e ilícita do autor.

 

3 ELEMENTOS RELEVANTES SOBRE O TIPO DOLOSO

 

O primeiro instituto que deve ser citado no trabalho seria o conceito do dolo, que é a consciência e a vontade de produzir o resultado. Em nosso Código Penal Brasileiro cita o crime doloso em seu artigo 18, inciso I, “Diz-se o crime: doloso, quando a agente quis obter aquele resultado ou em algum momento assumiu o risco de chegar a produzir tal resultado’’ acentuando que o crime doloso só seria aplicado quando o agente quis ou assumiu plenamente o resultado.

 

3.1 O Tipo Doloso

 

O dolo é a vontade consciente e livre do agente em cometer o resultado. Na consciência há a ação do agente em cometer o ato ilícito e a omissão do agente sobre o resultado. Para se enquadrar no tipo doloso, tem que haver a conduta consciente e voluntária do agente, pois se não houver conduta não há o que se falar em fato típico. Se não existir a conduta dolosa ou culposa do agente não há do que se falar em crime. Existem dois tipos de elementos: o dolo direito ou dolo indireto (eventual e alternativo).

Para o Direito Penal, o tipo doloso seria a vontade e a consciência do agente de cometer uma ação que causa o resultado lesivo que é vedado pelo ordenamento jurídico. O dolo é a consciência do agente de agir para causar o ato ou assumir o risco causando o referido resultado. Na expressão de Bitencourt (2016, p. 356), “dolo, em sentido técnico penal, é somente a vontade de ação orientada a realização do tipo de um delito”. No entanto, para se configurar o dolo o agente tem que conseguir alcançar o resultado lesivo e ter a vontade de realizar os requisitos que conduz a realização do resultado.

Há situações que ocorre o erro de tipo, que acontece quando o agente não tem vontade, por este motivo é afastado o dolo por razão do “erro”, como disposto no art. 20 do Código Penal, dispõe que: “O erro sobre o elemento constitutivo do tipo legal do crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei”. Greco cita um exemplo:

 

Se alguém durante uma caçada, confunde um homem com um animal e atira nele, matando-o, não atua como dolo do crime previsto no art. 121 do Código Penal, uma vez que não tinha consciência que atirava contra um ser humano, mas sim contra um animal. (2014, p. 192)

 

            No exemplo acima mencionado, pode-se observar que houve um erro de tipo, pois não houve consciência do agente, desta forma se descarta o dolo pela falta da vontade do agente. Também podemos citar o agente que é coagido fisicamente para cometer um ato ilícito. Entretanto, se Amanda é coagida fisicamente por David para acabar com a vida de Davi, e com a ação da Amanda houve a morte de Davi, não há o que se falar de dolo por parte da Amanda, pois não agiu com vontade do resultado. A produção do ato criminoso tem que conter consciência e vontade, tendo a falta de um destes elementos não há o que se falar de crime doloso. Para haver a configuração do dolo são necessárias a previsão e a vontade do resultado.

Os elementos do dolo nada mais seriam que a vontade e a consciência do agente quando comete a infração penal. O dolo tem dois requisitos, que seria momentos ou os dados estruturais, tendo como elementos o cognitivo e o volitivo. Assim, o elemento cognitivo é a plena consciência do sujeito sobre o ato que está cometendo, o agente sabia plenamente o que estava fazendo. A conduta deste agente seria uma ação que molda a descrição típica do resultado. Os escritores Ariosvaldo de Campos e Sheila Jorge descrevem o elemento intelectual:

 

Definido como a representação ou o conhecimento dos elementos (descritivos ou normativos) do tipo; para a caracterização do elemento intelectual do dolo não se exige do sujeito agente conheça o significado jurídico dos elementos normativos, bastando a “valoração paralela na esfera do profano”. (1998, p. 56)

 

Já no elemento volitivo este se materializa pelo querer, ou seja, é posterior ao elemento cognitivo, deste modo, se não há conhecimento, não há vontade, descaracterizando o dolo, pela falta de um elemento essencial. Pode-se dizer que é representado pela vontade do agente e pelo livre consentimento do ato. Greco (2008, p. 192) cita que não há dolo, por ausência de vontade quando o agente é submetido a coação:

 

A vontade é outro elemento sem o qual se desestrutura o crime doloso. Aquele que é coagido fisicamente a acabar com a vida de outra pessoa não atua com vontade de matá-la. Assim, se Antônio, pressionado por João, é forçado a colocar o dedo no gatilho por uma arma, que é disparada contra Pedro, que vem a falecer, não atua com vontade.

 

Portanto, os elementos acima são plenamente ligados um ao outro, se não havendo qualquer destes elementos não haveria o que se falar em dolo, pois o agente tem que ter a vontade e a consciência de realizar o ato. Sem a presença de ambos não tem como caracterizar o dolo, desqualificando o crime se não apresentar os mesmos.  Pode-se alegar que o elemento cognitivo antecede o volitivo, pois não existe vontade capaz de concretizar algo que ainda não existe na mente do sujeito. 

 

3.2 Teorias do Dolo

 

Para poder falar sobre o homicídio doloso, é necessário saber a diferença das teorias que se relaciona ao dolo. Podemos mencionar quatro teorias sobre o dolo: a) teoria da vontade; b) teoria do assentimento; c) teoria da representação; d) teoria da probabilidade. Para a Teoria da Vontade, segundo Francesco Carrara (1887, p.313), “é a intenção mais ou menos perfeita de praticar um fato que se sabe ser contrário à lei”. Nessa teoria o dolo seria a vontade desejada do agente em cometer o resultado. Para a teoria do assentimento, fala-se em dolo quando o agente, prevendo o resultado lesivo da sua conduta, conforma-se e aceita o risco da produção do resultado. Segundo Juarez Tavares (2000, p. 278-279):

 

A teoria do consentimento ou da assunção é a teoria predominante e tem por base uma vinculação emocional do agente para com o resultado. Vale dizer, exige não apenas o conhecimento ou a previsão de que a conduta e o resultado típicos podem realizar-se, como também que o agente se ponha de acordo com isso ou na forma de conforma-se ou de aceitar ou de assumir o risco de sua produção.

 

Mesmo observando a circunstâncias do ato sem nenhuma intenção em um primeiro momento, mas assume-se o risco de produzir o ato que obtém o tipo penal. Contudo, o agente tem que ter conhecimento da prática, para poder concorrer ao instituto do dolo, o agente tem que ter plenos conhecimentos das suas condutas que foram realizadas, sabendo exatamente da escolha que realizou. No entanto, também na teoria da representação, o dolo ocorre quando o agente que cometeu o ato tinha como previsível a possibilidade do resultado. Para esta teoria, não há diferenciação entre o dolo eventual e culpa consciente, pois se o agente sabia que era possível o resultado terá que ser responsabilidade pelo ato sem dentições. De acordo com Bitencourt (2016, p. 358):

 

Embora a teoria da vontade seja a mais adequada para extremar os limites entre o dolo e a culpa, mostra-se insuficiente, especialmente naquelas circunstancias em que o autor demonstra somente uma atitude de indiferença ou de desprezo para a ordem jurídica.

 

Na quarta teoria é a da probabilidade, que observa os dados estatísticos, ou seja, depende do ato que foi realizado pelo o agente e se quando aconteceu o resultado havia uma grande possibilidade da ocorrência do fato. A teoria da vontade seria a mais adequada para expressar os limites da culpa e do dolo. Mas as teorias do assentimento e da vontade que são adotadas no nosso Código Penal Brasileiro. Para o ordenamento jurídico brasileiro, age com dolo o agente que tem a vontade de produzir o resultado lesivo, bem como o agente que mesmo não querendo o resultado, assume o risco de realizar o resultado.

 

3.3 Espécies de Dolo: Eventual e Direto

 

No dolo, há que ser diferenciar do dolo direto do eventual. Para poder diferenciar cada tipo se faz necessária análise concreta de cada um dos institutos (dolo eventual e dolo direto). O dolo direto é quando o agente prática a conduta com o fim especifico no resultado lesivo. Segundo Prado (2008, p.322): “O agente busca diretamente a realização do tipo legal, a prática do delito. O resultado delitivo era seu fim principal”. Pode-se observar que o dolo direto é quando o agente tem à vontade especifica em cometer aquele ato ilícito. Conforme Bitencourt (2016, p. 361) cita sobre dolo direto:

 

No dolo direto o agente quer o resultado representando como fim de sua ação. A vontade do agente é dirigida a realização do fato típico. O objeto do dolo direto é o fim proposto, os meios escolhidos e os efeitos colaterais representados como necessários a realização do fim pretendido. Assim o dolo direto compõe-se de três aspectos, quais seja representação, querer anuir, nos seguintes termos: a) a representação do resultado, dos meios necessários, e das conseqüências secundaria; b) o querer a ação, o resultado, bem como os meios escolhidos para sua consecução; c) o anuir na nas realizações das conseqüências previstas como certas, necessárias ou possíveis, decorrentes do uso dos meios escolhidos para atingir o fim proposto ou de forma de utilização desses meios.

 

No dolo direto podemos falar que há vontade e desejo de alcançar o resultado. O agente tem a livre consciência do fato típico, ilícito que irá causar, não se importando com o resultado, mas sim, objetivando alcançar a vontade de realizar o resultado. Já o dolo indireto ou dolo eventual pode ser definido como aquele em que não há uma precisão acerca da vontade direcionada a um resultado. Para que haja dolo indireto ou eventual, o agente não tem a vontade de cometer o fato típico, mas tinha consciência do resultado possível, mesmo assim, o agente não se importa com o risco que está assumindo. Com as palavras de Ariosvaldo de Campos e Sheila Jorge, pode se definir o dolo alternativo como:

 

O agente representa ou prevê como conseqüência certa (dolo direto) ou possível (dolo eventual) da realização da conduta a pratica de dois ou mais resultados, sem saber qual deles ocorrerá (Ex: A dispara contra B para provocar lesões corporais ou morte). (1998, p. 58)

 

O exemplo acima mencionado, explica que dolo alternativo seria o misto do dolo direto com o eventual, tomando por base o ato que causaria o resultado. O dolo eventual pode ser caracterizado por assumir o risco de produzir o resultado. O agente não teria diretamente a vontade de cometer o resultado, mas não se abstém de agir e aceita cometer a infração penal. Segundo o entendimento de Prado (2008, p. 323):

 

O agente não quer diretamente a realização do tipo, mas a aceita como possível ou provável. O agente conhece a probabilidade de que sua ação realize o tipo e ainda assim age. Vale dizer: o agente consente ou se conforma se resigna ou simplesmente assume a realização do tipo penal. [...] A vontade também se faz presente, ainda que de forma atenuada.

 

Pode se concretizar que o agente no primeiro momento realmente não queria o resultado, mas após a consciência e a previsão do resultado a agente aceita o resultado e continua. No dolo eventual é quando o agente assume o risco de cometer o resultado, mas não o deseja diretamente. Mesmo assim o resultado para o agente é indiferente. Nas palavras de Nucci (2009, p.221), o conceito de dolo eventual seria:

 

É a vontade do agente dirigida a um resultado determinado, porém vislumbrando a possibilidade de ocorrência de um segundo resultado, não desejado, mas admitido, unido ao primeiro. Por isso a lei utiliza o termo “assumir o risco de produzi-lo”. Nesse caso, de situação mais complexa, o agente não quer o segundo resultado diretamente, embora sinta que ele pode se materializar juntamente com aquilo que pretende o que lhe é indiferente.

           

            Com a citação a cima, pode-se dizer que ocorre o dolo eventual quando o agente assume o risco de produzir o resultado lesivo, mas também admite que o resultado seja indiferente para o agente. Mas em nenhum momento o agente quer diretamente que o resultado aconteça se caso o agente quisesse o resultado seria dolo direto que é quando há vontade de cometer a conduta ilícita.  Para a configuração do dolo eventual, não podemos obter a mera ciência que o agente obteve a probabilidade que o resultado iria acontecer ou até mesmo a possibilidade que poderia vim a causar o fato típico. 

 

 

4 ELEMENTOS RELEVANTES SOBRE O TIPO CULPOSO

 

Trazendo o conceito legal do crime culposo que se disposto no artigo 18, inciso II, do Código Penal Brasileiro, que cita: “culposo quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligencia ou imperícia”. Neste mesmo raciocínio para Nucci (2010, p. 210): “Culpa é o comportamento voluntário desatencioso, voltado a um determinado objetivo, lícito ou ilícito, embora produza resultado ilícito, não desejado, mas previsível, que podia ter sido evitado”. No elemento culposo há quando o agente provoca o resultado que foi previsto, mas acreditava plenamente que o resultado poderia ser evitado.

 O agente comete a ação sabendo que há estará infringindo uma norma do ordenamento jurídico e tem consciência que tem a possibilidade de concretizar o crime, mas seu pensamento é que nada irá acontecer. A culpa é quando obtemos a conduta do ato ilícito, mas em nenhum momento aceitamos que o resultado aconteceu. O agente não tem a intenção de causar, mas agiu de forma negligente, imperito ou imprudente. Existem dois tipos de culpa que seriam a culpa consciente e a culpa inconsciente. 

 

4.1 Tipo Culposo

 

O crime culposo quando está caracterizada a imprudência, negligência ou imperícia, sem possuir intenção do resultado danoso, embora sua ocorrência seja previsível. Conforme Bittencourt descreve sobre a imprudência (2004, p. 279): “A prática de uma conduta arriscada ou perigosa e tem caráter comissivo. Conduta imprudente é aquela que se caracteriza pela intempestividade, precipitação, insensatez ou imoderação”. Na negligência, há imprevisão passiva do sujeito, pois o agente não realiza o que deveria ser feito. Por fim, a imperícia é o despreparo ou insuficiência de conhecimentos técnicos para o exercício de arte, profissão ou ofício. Nas palavras Ariosvaldo de Campos e Sheila Jorge sobre a negligencia, imperícia e imprudência:

 

Imprudência é a forma de imprevisão ativa, de culpa in comittendo. E a forma de agir com precipitação e insensatez. Atua com imprudência o motorista que ultrapassa o sinal de transito fechado, etc. [...]. Negligencia é a modalidade de imprevisão passiva, ou seja, é a inação, a inércia, a passividade, corpórea ou psíquica. [...]. Imperícia pressupõe o exercício de arte, oficio ou profissão, e, seria a pratica de determinada atividade técnica ou profissional, sem adequado preparo ou sem experiência. [...] (1998, p.78)

 

Há os elementos que constituem o tipo culposo seriam: conduta humana voluntária, violação do dever de cuidado, resultado, nexo causal, previsão objeto e tipicidade. A conduta humana seria a voluntariedade na ação, mas não no resultado em si. Já a violação de um dever de cuidado pode se configurar quando o agente não respeita a lei. Todo agente que comete o crime culposo conhecia a possibilidade do referido perigo. Com isso, o agente só poderia ser punido pelo fato que teve previsão do ato que poderia ocasionar um resultado ou quando comete o crime com a vontade (dolosamente).

Como mencionado acima, os elementos são essenciais para poder caracterizar o crime culposo, mostrando que o agente cometeu o ato sem observar os cuidados, e com isso, causando o referido resultado.  No crime culposo tem que caracterizar que o agente não queria cometer o ato ilícito, pois caso ao contrário seria crime doloso. Vale ressaltar que o agente em nenhum momento aceita o resultado, só seria cabível aplicar nesta situação a culpa, pois o agente apresentou os elementos do fato típico culposo.

4.2 Espécies de Culpa (Culpa Consciente e Culpa Inconsciente)

 

Fala-seda culpa consciente quando o agente prevê o resultado, mas mesmo assim acredita plenamente em suas habilidades para não causar o resultado lesivo, que em nenhum momento foi consentido pelo agente. O Código Penal Brasileiro dispõe a mesma pena para ambos os casos (Culpa Consciente e Inconsciente). Na palavra Cézar Roberto Bittencourt:

 

Há culpa consciente, também chamada de culpa com previsão, quando o agente, deixando de observar a diligencia a que estava obrigado, prevê um resultado, previsível, mas confia convictamente que ele não ocorra. [...] na análise dessa espécie de culpa, deve-se agir com cautela, pois a simples previsão do resultado não significa, por si só, que o agente age com culpa consciente, pois mais que a previsão, o que caracteriza efetivamente é a consciência acerca da lesão ao dever de cuidado. Logo, nada impede que possa ocorrer erro de proibição, quando o agente se equivocar a respeito da existência, ou dos limites, do dever objetivo de cuidado. (2009, p. 307)

 

Na culpa consciente o agente tem previsão do resultado, mas deixa de observar o cuidado objetivo, acreditado que há possibilidades de evitar o resultado previsto. Devemos observar que neste instituto da culpa consciente o agente tinha consciência do que poderia acontecer com a prática do ato, mas o sujeito acreditava sinceramente em suas habilidades para evitar o resultado.

A culpa com representação apresenta quando o agente é capaz de prever o acontecimento, porém acredita plenamente em suas habilidades, ele confia em que sua ação conduzirá ao resultado que pretende. No dizer de Cézar Roberto Bittencourt (1995, p.250), "Há culpa consciente também chamada culpa com previsão, quando o agente, deixando de observar a diligência a que estava obrigada prevê um resultado, possível, mas confia convictamente que ele não ocorra". A grande característica deste instituto seria a confiança que o agente tem por acreditar sinceramente que pode evitar o resultado lesivo, não pode ser confundida com uma mera esperança em fatores aleatórios. Nas lições de Capez (2007, p.207) conceitua culpa:

Culpa é assim chamada porque sua verificação necessita de um prévio juízo de valor, sem o qual não se sabe se ela está ou não presente. Com efeito, os tipos que definem o crime culposo são, em geral, abertos, portanto, neles não se descreve em que consiste o comportamento culposo (...) a culpa não está, portanto, descrita, nem especificada, mas apenas prevista genericamente no tipo.

 

No entanto na culpa inconsciente decorre da conduta praticada sem previsão de resultado que deveria ser realmente previsto pelo agente. Em suma Mirabete (2008, p. 141) discorre; “a culpa inconsciente existe quando o agente prevê o resultado que é previsível. Não há no agente o conhecimento efetivo do perigo que sua conduta provoca para o bem jurídico alheio”. Como citado acima, na culpa inconsciente o resultado não é previsto pelo agente, embora previsível, ou seja, o homem médio consegue prever o resultado, e a sua conduta cometeu ato de imprudência, negligência ou imperícia. A culpa inconsciente se difere da consciente, nas palavras de Greco (2013, p.207):

 

Justamente no que diz respeito a previsão do resultado; naquela, o resultado, embora previsível, não foi previsto pelo agente; nesta, o resultado é previsto, mas o agente, confiando em si mesmo, nas suas habilidades pessoais, acredita sinceramente que este não venha a ocorrer. A culpa inconsciente é a culpa sem previsão e a consciente é a culpa com previsão.

           

            Para a diferenciação dos dois tipos de culpa, pode-se falar que a culpa inconsciente o agente em nenhum momento teve a previsão que o resultado poderia acontecer, no entanto na culpa consciente há previsão do agente que o resultado poderá acontecer, mas o agente acredita plenamente que pode evitar o resultado.

 

5 ABORDAGEM SOBRE O DOLO EVENTUAL E DA CULPA CONSCIENTE EM HOMICIDIO NO TRÂNSITO SOBRE O EFEITO DA EMBRIAGUEZ.

 

O tema do referido artigo é muito discutido como afirma Bitencourt (2007, p.288), “os limites fronteiriços entre o dolo eventual e a culpa consciente constituem um dos problemas mais tormentosos da Teoria do delito”. Com as conceituações nos tópicos anteriores, aparentemente parece muito simples a distinção, mas quando se depara com um caso concreto observa-se a dificuldade para diferenciar ambos. A distinção entre dolo eventual e culpa consciente, seria uma análise sobre o elemento interno e psicológico do agente. Tendo uma dificuldade para a distinção da conduta do dolo eventual e da culpa consciente, pois é muito fácil de confundir “assumir risco” de “negligencia, imperícia e imprudência”.

No Brasil, acontecem muitos acidentes no trânsito, voltados à embriaguez. Mesmo com a lei em vigor e com vários órgãos públicos fiscalizando, ainda há acidentes em razão do agente que dirigir com teor alcoólico acima do permitido em lei. E com isso, ocorreram várias redações na lei sobre a embriaguez ao decorrer dos anos. Conforme Ariosvaldo de Campos e Sheila Jorge (1998, p. 87): “diante do aumento da criminalidade do automóvel, sob influencia da opinião pública e da mídia, no Brasil acentua-se a pressão para reprimir de forma mais severa os crimes de transito”. 

Com isso, ouve ao decorrer dos anos várias alterações nas redações dos artigos do Código de Transito Brasileiro. Os legisladores criaram a lei seca com o propósito de evitar os acidentes decorridos em razão do agente sob influência de álcool ou drogas no veiculo automotor.  Mas mesmo com várias alterações, não houve uma diminuição dos acidentes por este motivo.

 

 

5.1 Diferença entre Dolo Eventual e Culpa Consciente

 

O dolo eventual se configura quando o agente age ou deixa de agir, prevendo a conduta que pode causar um resultado lesivo, mas o agente não se importa se irá causar a lesão ao bem jurídico ou não.  No art. 18, I, do Código Penal Brasileiro, estar disposto “assume o risco de produzi-lo (o resultado lesivo)”, observando que quem assume o risco de produção do resultado, e o agente não se importar do resultado que irá acontecer sendo indiferente deve ser aplicado o dolo eventual. Temos que observar que para a configuração do dolo eventual é indispensável que o agente, ao conhecer do risco de produção do resultado, pouco se importar com o fato de causara lesão. Nas palavras do ilustre doutrinador Masson, cita um exemplo:

 

‘’A’’ sai atrasado de casa em uma motocicleta, se dirige para uma entrevista que provavelmente lhe garantirá um emprego. No caminho, fica parado em um congestionamento. Ao perceber que a hora combinada se aproxima, é se continuar ali inerte não chegará a tempo, é decide trafegar um quarteirão pela calçada, com o propósito de, em seguida, rumar por uma via alternativa descongestionada. Na calçada, depara-se com inúmeros pedestres, mas mesmo assim insiste na sua escolha. (2010, p. 252)

 

Podem-se tirar duas conclusões do exemplo acima: 1°, o agente observar o possível atropelamento e causou a morte de um terceiro, mas acreditou plenamente em suas habilidades e fez tudo para poder evitá-lo, caso em que poderia ser aplicada a culpa consciente. Já na 2°, o agente sabia do perigo quando estava na calçada, mas mesmo assim continuou seu ato sem se importar, insistindo na sua escolha para poder chegar a tempo na entrevista que tanto desejava referido caso seria configurado o dolo eventual.

Já na culpa consciente, o agente age ou deixa de agir, prevendo a conduta que pode causar um resultado lesivo, mas o agente acredita sinceramente na sua não ocorrência. O agente tem que deixar de observar sua conduta, cometendo imprudência, negligencia ou imperícia. No entanto, a pergunta que é mais falada sobre estas espécies do dolo e da culpa, seria com identificar estes institutos nos casos? Como saber quando o agente acreditou plenamente que o resultado não aconteceria ou que o agente agiu com indiferença no ato, aceitando-o? Por isso que alguns doutrinadores criticam o dolo eventual, pois o único meio de prova seria a mente do agente. Como Jesus dispõe sobre assunto:

 

Não se exige consentimento explícito, formal, sacramental, concreto e atual (...). O consentimento que o tipo requer não é o manifestado formalmente, o imaginário explicitamente, o ‘’mediato’’, ‘’pensado cuidadosamente’’. Não se exige fórmula psíquica ostensiva, com se o sujeito pensasse ‘’consigo’’, ‘’conformo-me com a produção do resultado’’, nenhuma justiça conseguiria condenar alguém por dolo eventual se exigisse confissão cabal de que o sujeito psíquico e claramente consentiu na produção do evento; que, em determinado momento anterior a ação, deteve-se para meditar cuidadosamente sobre suas opções de comportamento, aderindo ao resultado. Jamais foi visto no banco dos réus alguém que confessasse ao juiz ‘’ no momento da conduta eu pensei que a vítima poderia morrer, mas, mesmo assim, continuei a agir’’. A consciência profunda da ilicitude, na teoria finalista da ação, não faz parte do dolo, que é natural. (2009, p. 287-288)

 

            Podemos observar as diferenças entre o dolo eventual e a culpa consciente, uma das diferenças seria quando o agente, ao prever o resultado, acredita sinceramente que não irá acontecer o resultado ou o resultado é indiferente para o agente. Esta diferença é da consciência do agente, algo interno que não é possível saber o que se passava na consciência do agente no momento da previsão do resultado. Deste modo há uma diferença entre a culpa consciente e o dolo eventual que seria em qual dispositivo que o agente será enquadrado. No Código de Trânsito Brasileiro, está prevista no artigo 302, o crime de homicídio culposo (culpa consciente)na direção de veículo automotor,cuja pena prevista de reclusão 02 (dois) a 04 (quatro) anos e a suspensão ou proibição de se obter a permissão ou habilitação de dirigir veículo automotor. Entretanto no artigo 121 do Código Penal Brasileiro, que está previsto o crime doloso (dolo eventual), cuja pena é de 6 (seis) a 20 (vinte) anos de reclusão. Podemos observar que as penas são extremamente exorbitantes entre os artigos 302 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) e 121 do Código Penal Brasileiro (CPB).

            Portanto, devemos relembrar que o Código Penal adotou a Teoria da Vontade ou assentimento, portanto para a configuração do dolo eventual tem que haver previsão do resultado, é o agente tem que aceitar e não importar com a lesão que irá causar ao bem jurídico tutelado. Queremos salientar que para a distinção entre o dolo eventual e a culpa consciente sempre teremos que avaliar o caso concreto. No entanto a embriaguez, por si só, não tem o cordão de transformar o crime de homicídio culposo regido pelo CTB (Código de Trânsito Brasileiro) em homicídio doloso do CPB (Código Penal Brasileiro). Mas dependo do evento, poderia ser analisada por jurisprudência ou por doutrina outra definição para o condutor que dirige alcoolizado. Greco justifica seu entendimento com um simples exemplo:

 

Determinado sujeito, durante a comemoração de suas bodas de prata, bebe excessivamente e, com isso, se embriaga. Encerrada a festividade, o agente, juntamente com sua esposa e três filhos, resolve voltar rapidamente para sua residência, pois que queria assistir a uma partida de futebol que seria transmitida na televisão. Completamente embriagado, dirige em velocidade excessiva, a fim de chegar a tempo para assistir ao início do jogo. Em razão do seu estado de embriaguez, conjugado com a velocidade excessiva que imprimia ao seu veículo, colide com o seu automóvel com outro, causando a morte de todo a família (2008, p. 209).

 

O exemplo acima explica que o agente em momento aceitou o referido resultado, que seja a morte sua e dos seus familiares. No entendimento do Greco, não teria como extrair da mente do sujeito se ele aceitou ou não o fato, colocando então a impossibilidade da aplicação do dolo eventual nos crimes de transito com embriaguez. Dos julgados Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) se posicionou favorável a configuração da culpa consciente em estado de embriaguez em seu veículo, causou um acidente tendo como resultado a morte de terceiro. De acordo com a maioria dos ministros, a embriaguez não teria elementos probatórios para se tornar dolo eventual. Veja-se:

 

EMBARGOS INFRINGENTES. PRONÚNCIA. HOMICÍDIO. TRÂNSITO. DOLO EVENTUAL. INOCORRÊNCIA. CULPA CONSCIENTE. DESCLASSIFICAÇÃO. 1. Para que se conclua se o crime foi praticado com dolo eventual ou culpa consciente é necessário examinar as circunstâncias de cada caso, não sendo possível aplicar fórmulas pré-determinadas. 2. Inexistindo nos autos elementos suficientes para comprovar que o agente, com sua conduta, assumiu o risco de produzir o resultado morte, a desclassificação é medida que se impõe, reconhecendo-se a existência de culpa consciente e não de dolo eventual. (MINAS GERAIS, 2014)

 

            Cabe salientar que a embriaguez não gera a presunção automática que haveria o dolo eventual. Mas há também julgados do Supremo Tribunal Federal (STF) tem decidido ao contrário, quando o agente estar embriagado e ainda com excesso de velocidade, e causado a morte de uma pessoa. Verifica-se o julgado:

HABEAS CORPUS. PENAL. CRIME DE HOMICÍCIO PRATICADO NA CONDUÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. PLEITO DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO PREVISTO NO ARTIGO 302 DO CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO. DEBATE ACERCA DO ELEMENTO VOLITIVO DO AGENTE. CULPA CONSCIENTE X DOLO EVENTUAL. CONDENAÇÃO PELO TRIBUNAL DO JÚRI. CIRCUNSTÂNCIA QUE OBSTA O ENFRENTAMENTO DA QUESTÃO. REEXAME DE PROVA. ORDEM DENEGADA. I - O órgão constitucionalmente competente para julgar os crimes contra a vida e, portanto, apreciar as questões atinentes ao elemento subjetivo da conduta do agente aqui suscitadas – o Tribunal do Júri - concluiu pela prática do crime de homicídio com dolo eventual, de modo que não cabe a este Tribunal, na via estreita do habeas corpus, decidir de modo diverso. II - A jurisprudência desta Corte está assentada no sentido de que o pleito de desclassificação de crime não tem lugar na estreita via do habeas corpus por demandar aprofundado exame do conjunto fático-probatório da causa. Precedentes. III – Não tem aplicação o precedente invocado pela defesa, qual seja, o HC 107.801/SP, por se tratar de situação diversa da ora apreciada. Naquela hipótese, a Primeira Turma entendeu que o crime de homicídio praticado na condução de veículo sob a influência de álcool somente poderia ser considerado doloso se comprovado que a embriaguez foi preordenada. No caso sob exame, o paciente foi condenado pela prática de homicídio doloso por imprimir velocidade excessiva ao veículo que dirigia, e, ainda, por estar sob influência do álcool, circunstância apta a demonstrar que o réu aceitou a ocorrência do resultado e agiu, portanto, com dolo eventual. IV Habeas Corpus denegado. (BRASIL, 2014)

Na jurisprudência acima mencionada, a decisão foi de negar o habeas corpus e legitimar a sentença dada pelo tribunal do júri que condenou o agente por dolo eventual, por estar dirigindo sob influência de álcool e em velocidade excessiva. Foi adotada a fórmula que seria: “embriaguez + velocidade excessiva + direção de veículo automotor + morte = dolo eventual”. O art. 302 CTB, tem uma lacuna em razão da retirada de seu inciso V do parágrafo 1°, com isso abrindo a possibilidade de novas interpretações no sentido do caso acima exposto, onde STF aceitou o dolo eventual no agente que apresenta outros elementos + a embriaguez.

O entendimento do STF sobre o referido dolo eventual, que não seria mais extraído da mente do autor do acidente, mas sim diante observada a situação referente ao crime. Vale ressaltar que é necessário analisar a circunstâncias do crime para poder se aplicar o dolo eventual ou a culpa consciente. Deve se analisar o caso concreto para poder chegar a uma conclusão. Dos exemplos nas emendas acima apresentadas, pode-se salientar que a jurisprudência reconhece o dolo eventual nos casos com excesso de velocidade mais outros fatores para se somar. Um dos exemplos que podemos citar sobre estes fatores seria a ‘’embriaguez no volante’’.

Pode-se salientar que ainda não há um posicionamento único dos tribunais, pois em alguns estados como São Paulo, dependendo do caso concreto é aplicado o dolo eventual, com a soma de fatores acima citados. Não há como obter um entendimento totalmente uniforme em relação a estes institutos, o ponto crucial é analisar plenamente todo o caso para que não haja uma impunidade. Pois de qualquer maneira o resultado aconteceu, mas devemos observar se houve o homicídio doloso (não se importou com o resultado) ou homicídio culposo (Não desejou o resultado, pois confiava em suas habilidades) ou até mesmo acidente onde não há culpa de ninguém.

 

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

         O artigo trouxe um tema bastante problemático que seria a aplicação dos institutos do dolo eventual e a culpa consciente[GDNdL1] .O dolo eventual se configura quando o agente age ou deixa de agir, prevendo a conduta que pode causar um resultado lesivo, mas o agente não se importa se irá causar a lesão ao bem jurídico ou não. No entanto, na culpa consciente é quando o agente prevê o resultado, mas mesmo assim acredita plenamente em suas habilidades para não causar o resultado lesivo, que em nenhum momento foi consentido pelo agente.

Mesmo já existindo um conceito formado sobre os institutos, quando chega ao campo prático surge o grande problema, pois existe uma dificuldade para diferenciar quando o agente assumiu ou não o resultado. Como pode-se observar ainda não há entendimento uniforme sobre o tema do trabalho, causando um grande conflito entre doutrinadores e até mesmo divergências entre os Tribunais Estatais, STJ e o STF.[GDNdL2] 

Existem duas espécies de dolo (direto e eventual). O dolo direto é quando o agente prática a conduta com o fim especifico no resultado lesivo. O dolo eventual se configura quando o agente age ou deixa de agir, prevendo a conduta que pode causar um resultado lesivo, mas o agente não se importa se irá causar a lesão ao bem jurídico ou não. Temos que observar que para a configuração do dolo eventual é indispensável que o agente, ao conhecer do risco de produção do resultado, pouco se importar com o fato de causara lesão. Constatou-se que para ser caracterizado o dolo eventual [GDNdL3] a conduta do agente, devem ser obtidos elementos comprobatórios que evidenciem que o agente, ao decidir pela ingestão de bebida alcoólica, teria agido com vontade de praticar o ato ou pelo menos assumido o risco de praticá-lo[GDNdL4] .

Há dois tipos de culpa no ordenamento jurídico que seriam a culpa inconsciente e consciente. Na culpa consciente, o agente age ou deixa de agir, prevendo a conduta que pode causar um resultado lesivo, mas o agente acredita sinceramente na sua não ocorrência. O agente tem que deixar de observar sua conduta, cometendo imprudência, negligencia ou imperícia. Pode-se falar que a culpa inconsciente o agente em nenhum momento teve a previsão que o resultado poderia acontecer.

Também se pode observar que, na maioria das jurisprudências no Tribunal de Justiça de Minas Gerais, entende-se que na embriaguez ao volante não pode se aplicar o dolo eventual, pois o agente teria que agir com vontade de praticar o ato ou pelo menos assumir o risco do resultado lesivo, para obter elementos que evidenciem o dolo[GDNdL5] . No crime com homicídio no trânsito pode[GDNdL6]  ser aplicada a culpa consciente, que é caracterizada pela hipótese em que o agente prevê o resultado, mas não aceita. O agente tem noção da possibilidade do resultado, mas a afasta de imediato, pois acredita que sua perícia ou habilidade impedirá que tal resultado aconteça. O ponto crucial na diferenciação entre dolo e culpa é que não há como entrar no pensamento (na consciência) do agente para realmente saber a verdade. Não há como julgar um ato sem ter prova para poder considerar se o agente realmente quis o resultado.

Importante ressaltar que uma das diferenças do dolo eventual e da culpa consciente seriam as penas. No homicídio doloso, as penas variam acima de 6 (seis) anos, como disposto no art. 121 do Código Penal. No homicídio culposo praticado na direção de veículo automotor, verificado no Código de Trânsito no art. 302, a pena varia entre 2 (dois) a 4 (quatro) anos. Ou seja, a diferença é exorbitante.

Por isso, devem ser analisados todos os elementos do fato, para que sejam analisadas as circunstâncias e as provas capazes de apontar o dolo eventual ou a culpa consciente, para não haver erro. Não se pode dizer que o dolo eventual não deve ser aplicado nestas hipóteses, somente em casos que realmente merecem sua aplicação. De toda forma, conclui-se que a embriaguez, por si só, não pode configurar dolo.

Se, no caso concreto, há certeza de que o agente, no momento do fato determinado, assumiu o risco do resultado, deverá ser imputado ao agente o dolo eventual. Caso contrário, se for comprovada a embriaguez por si só, deverá ser aplicada a culpa consciente, observando o princípio da especialidade, tendo como norte o Código de Trânsito Brasileiro. Pois não há prever o que se passava consciência do agente, que é algo interno que não é possível saber o que se passava na consciência do agente no momento da previsão do resultado.

 

 

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Referências

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