HABEAS CORPUS, O CANIVETE SUÍÇO DO DIREITO PENAL


02/09/2014 às 09h29
Por Pablo Roberto dos Santos - Advogado

Parte 1 - Um Pouco de História

O famoso Habeas Corpus tem raízes muito mais profundas do que as pessoas comuns sempre dizem.
A palavra Habeas Corpus significa em termos simples, “traga-me o corpo”.
Ele não serve apenas para tirar pessoas da cadeia ou para impedir que sejam presas.
Buscando um pouco de lição de história para se entender melhor, vejamos de onde vem o habeas corpus.
As raízes originais do Habeas Corpus são da Inglaterra no ano de 1215.
Um pouco antes existia um Rei, o pai do Rei João Sem Terra, o Rei Henrique II.
Esse Rei doou várias terras a seus filhos, deixando o Rei João Sem Terra sem propriedade alguma.
Contudo como forma de indenizá-lo, deu-lhe diversos privilégios que causaram uma briga enorme entre os demais filhos do Rei Henrique II.
Um dos filhos, o Rei Ricardo Coração de Leão, partiu para a 3ª Cruzada dos Reis em 1189, junto com Frederico (Barba – Roxa) Rei da Prússia e o Rei Felipe Augusto da França, em direção a Terra Santa. Dos três Frederico acabou morrendo afogado e Felipe voltou para a França ante as diversas dificuldades de tal campanha militar. Contudo, algo interessante acontecia no trono inglês com a saída do Rei Ricardo. João Sem Terra que ficou cuidando do trono inglês enquanto o Rei Ricardo estava em campanha militar tentou usurpar o trono com a ajuda de Felipe Augusto.
Contudo, Ricardo voltou ao reino e retirou João Sem Terra do trono e expulsou Felipe Augusto da frança, restabelecendo a ordem do reino. O Rei Ricardo era um rei muito bom e acabou por perdoar João Sem Terra.
Entretanto o Rei Ricardo era um combatente nato e voltou às batalhas, vindo a morrer por ferimentos de guerra em 1199.
Após esses 10 anos de calmaria, João Sem Terra, com a morte do irmão, o Rei Ricardo, subiu ao trono e iniciou um governo de tirania.
Abusos de toda sorte banhavam os arbítrios de João Sem Terra que ia ao extremo de decidir sobre o patrimônio e a vida de seus súditos.
Até meados de 1215 o abuso persistiu. Contudo por volta de 1215 surgiu uma nova ameaça de guerra entre a Inglaterra e a França.
O reino necessitava de recursos e homens, coisa que os barões não negaram, mas que também não cederam de graça. Em troca de auxílio, foi imposto ao Rei João Sem Terra que assinasse um acordo que limitava seus poderes.
Assim os nobres, o clero e a burguesia elaboraram um documento que minava o poder abusivo do Rei João Sem Terra.
Tal documento era a Magna Charta Libertatum, ou simplesmente Magna Carta.
Nessa carta foram impostas diversas restrições ao trono que antes não tinha limite algum.
Existiam 67 regras que limitavam os poderes antes ilimitados do trono. Uma dessas garantias era o Habeas Corpus, que impedia que qualquer pessoa pudesse ser presa sem que isso estivesse na lei.
Diversos países incorporaram o Habeas Corpus em suas legislações na sequencia, sendo que daí em diante a viagem não teve mais volta., o Habeas Corpus foi reconhecido pelas pessoas como sua principal válvula de escape quando seu tesouro mais valioso está em risco...a liberdade de ir e vir...
Na mais simples realidade, o Habeas Corpus surgiu como uma garantia aplicável a qualquer pessoa de não perder a liberdade sem que a lei assim o determine.

Parte 2 - O “Habeas Corpus” - No Contexto do Brasil

O Habeas Corpus no Brasil como muitos imaginam não é uma invenção moderna, mas sim fruto da opção legislativa imperial.
No Brasil ante aos mais diversos abusos cometidos desde as Ordenações do Reino, onde o poder da coroa portuguesa e de seus “aparentes súditos” aparentava não ter qualquer limite.
A tortura, bem como diversos tratamentos desumanos e sem qualquer respaldo legal banharam de sangue e arbitrariedade o início da História Jurídica do Brasil.
Em meio a essa confusão, mediante a evolução do reino e no direcionamento da República, juntamente com as revoltas e a crescente expansão da indignação popular, bem como pela pressão externa dos países que emergiam, cresciam e se desenvolviam “a todo vapor”, não havia outra forma do Brasil ficar excluído desse contexto.
Seu primeiro aparecimento na Lei Brasileira ocorreu em 1821, no Decreto 23, por meio de D. João VI. Após isso o Código Criminal do Império de 1832 o sustentou em seu artigo 340, mesmo que a Constituição Imperial tenha se omitido quanto a sua existência.
Atualmente o Habeas Corpus está no artigo 647 e seus artigos seguintes do Código de Processo Penal, os quais estão sustentados no Livro 3, Título 2, o quais se referem aos recursos em geral.
E mais especialmente na Constituição Federal em seu artigo 5º LXVIII, que é sua assinatura genética na Legislação Brasileira, sem a qual jamais o referido instituto poderia existir ou ser usado.
Voltando ao cotidiano, podemos ver com toda a facilidade em jornais, revistas e na televisão como Habeas Corpus é difundido no Brasil.
É normal vermos nos jornais escritos e televisivos manchetes dizendo “Fulano de Tal não foi preso porque impetrou um Habeas Corpus”.
Ou então, o preso “Ciclano ou Beltrano” livrou-se da prisão por meio de um Habeas Corpus.
Realmente o Habeas Corpus é uma ferramenta quase que idêntica a um canivete suíço, contudo isso tem um preço bem alto se ele for mal usado...
O Habeas corpus é um direito de todos os cidadãos, podendo ser usado sem um advogado. Em resumo qualquer pessoa pode elaborar um Habeas Corpus em favor de outra.
Contudo, recomenda-se que alguém com experiência técnica o elabore e o apresente em favor de alguém.
Com a mesma facilidade que o usamos é possível não se chegar a nada, não conseguir nada e ainda servir de motivo de chacota entre os demais juízes que o analisarão.
O Habeas Corpus não serve apenas para livrar alguém da cadeia...
Muito além disso, o Habeas Corpus serve para combater qualquer coação ilegal que direta ou indiretamente atinja o direito de liberdade de uma pessoa, vindo a restringi-lo.
A coação ilegal é o ato que não tem correspondência com a Lei.
É o ato que não poderia ser feito mas que infelizmente foi trazido ao processo e que causou inúmeros prejuízos ao Paciente.
Em termos mais fáceis de se entender, se uma decisão de um juiz ou de um delegado de polícia prejudicar alguém e isso atingir direta ou indiretamente a liberdade da pessoa, o Habeas Corpus pode ser usado como forma de repelir tal ataque e proteger a Liberdade.
Contudo, o Habeas Corpus apenas deve ser usado quando for uma pessoa a vítima da coação.
Quando se tratar de qualquer coisa que não seja uma pessoa e não seja direta ou indiretamente atingido o direito de liberdade, não use o Habeas Corpus, pois certamente haverá outra solução para o caso.
No meio da confusão toda do ato ilegal, as pessoas envolvidas no Habeas Corpus são identificadas como Paciente (a vítima do abuso, ataque ou quem está preso), Autoridade Coatora (a pessoa ou autoridade que pratica o ato fora do que a lei manda) e Impetrante (a pessoa que escreve e apresenta o Habeas Corpus em favor de si mesma ou do paciente).
É importante dizer que o impetrante pode ser o paciente e vice-versa...
O Habeas Corpus não precisa ter forma obrigatória, podendo até mesmo ser escrito a mão, desde que contenha como objeto principal o ato ilegal e a demonstração do resultado que venha ameaçar ou efetivamente restringir o direito de liberdade do ser humano.
A jurisprudência ou as decisões geradas pelos tribunais na solução dos processos alargaram o entendimento sobre o cabimento do Habeas Corpus, permitindo até mesmo a concessão de liminares.
As Liminares são decisões dadas antes do próprio Habeas Corpus ser julgado definitivamente.
Isso na verdade acontece porque o motivo do Habeas Corpus existir é a defesa da liberdade do paciente.
Sendo a Liberdade o bem jurídico (ser livre é fato mais importante depois de ser vivo, devido que praticamente nada pode ser feito se não formos livres).
Outro detalhe que acabou por ser sedimentado sobre o Habeas Corpus é que se não existir outro recurso cabível para a repulsão do ato ilegal, por exclusão, após ser consultada toda a sorte de recursos presentes na Legislação Processual Penal, o Habeas Corpus é cabível caso a coação limite o direito de ir, vir e permanecer do ser humano.
O Habeas Corpus pode ser usado de forma repressiva (quanto o ato ilegal já foi praticado e já causou danos ou está a prestes a causar), ou de forma preventiva (quando há fundadas razões que o ato ilegal seja praticado e venha a causar dano de difícil reparação).
Muito além de um recurso o Habeas Corpus na verdade é uma Ação de Impugnação ou Ação Constitucional.
Mesmo estando no capítulo referente aos recursos, na realidade o Habeas Corpus é uma Ação de Impugnação ou Ação Constitucional.
Ação na realidade e de forma prática é a forma que alguém reclama de uma ilegalidade ao representante do Estado.
A Ação é um direito de qualquer pessoa que pode ser usado contra qualquer um, até mesmo contra o próprio Estado na defesa de seus direitos.
Impugnação, porque afasta, anula, tira os efeitos, neutraliza e cancela os efeitos do ato ilegal praticado.
Constitucional, por superioridade ou excelência, porque está previsto na Lei Maior, a Lei mais importante do Brasil, a Constituição Federal de 1988.
Caso não estivesse lá, caso não tivesse sua assinatura genética (sua paternidade) prevista na Constituição, jamais poderia ser usado mesmo que estivesse no Código de Processo Penal.
Por meio do Habeas Corpus é possível em termos gerais que qualquer juiz analise a situação de restrição da liberdade de qualquer pessoa e se esta for ilegal, a retire de onde está presa e a ponha em liberdade.
No Brasil, ante as mais variadas arbitrariedades cometidas por várias autoridades, que no afã de responder à sociedade que vem abastecida de uma fúria por vingança e não de justiça.
Por uma sociedade que antes de pedir a permissão do abuso não enxerga que o problema vem de omissões que prefere ignorar e assistir a carnaval e jogos de futebol.
De omissões que procedem do mal voto e da apatia cidadã quanto à escolha do governante.
Da falta de ciência que ser cidadão vai muito além do que votar, mas sim de poder escolher não votar em ninguém se não gostar dos candidatos, votando em branco...
Diante disso, o Habeas Corpus ganha seus contornos dourados, fazendo que muitas vezes surja antes da injustiça da decisão ao cidadão que não merece a liberdade, o aparecimento do mal procedimento e do completo desrespeito à lei; o desvelamento do arbítrio antes do cumprimento da justiça.
No delicado momento social do Brasil onde a corrupção está em alta, a grande incidência de decisões concedendo a liberdade por meio de habeas corpus não é motivo para nos escandalizarmos com a ineficiência da lei ou com o jargão, “Brasil, terra do pode tudo...”
Na verdade isso é o reflexo do mal voto e da omissão das pessoas em não cobrarem do Estado uma postura mais ativa na prevenção e não apenas na cobrança da repressão; como se fôssemos patrícios junto a um gigantesco espetáculo de coliseu.
O Habeas Corpus sempre existiu, isso não duvidem, contudo, o que nunca existiu foram tantas decisões descompassadas com a lei, com a realidade, bem como com o equilíbrio, dignas de completa eliminação por via do instituto já tão discutido nas linhas superiores.

Parte 3 - Funcionamento Prático dos Artigos 647 e seguintes do Código de Processo Penal.

Na prática o Habeas Corpus funciona da seguinte maneira:
Qualquer pessoa mesmo o Ministério Público pode impetrar Habeas Corpus em favor de outra pessoa.
No caso concreto, é necessário que seja analisado se existe ou não, ameaça ou efetiva restrição da liberdade (a famosa coação ilegal já dita) para saber se o Habeas Corpus é cabível ou não. Sendo positiva a resposta, pode ser usado o referido instituto.
A ameaça para ser identificada deve ser traduzida no ato que não tem respaldo legal, no ato que mantém alguém preso por mais tempo do que a lei autoriza, na situação quando a autoridade coatora não tem poder de praticar o ato ilegal, quando a situação que autorizaria o uso do ato ilegal não mais existir e o ato permanecer, quando for negado o pagamento da fiança quando a lei assim o autoriza para garantir a liberdade, quando o ato provocar a nulidade do processo (quando um pedaço vital do processo for desobedecido, esquecido, ou mesmo proibido).
Entretanto, se o caso for de punição disciplinar, ou seja, atos inerentes à punição dentro das regras da hierarquia militar, seguida estritamente a regra da Lei, o referido instituto não é cabível.
A petição de Habeas Corpus deve conter o nome do paciente, a identificação da autoridade coatora, a descrição da coação e indicação das provas de sua existência, a assinatura do impetrante ou quem o faça a seu rogo (em seu lugar), o endereço do paciente e do impetrante. Quanto ao impetrante deverá conter sua assinatura o referido pedido.
Vencida a fase de constatação da situação de coação e de verificação se há ou não alguma irregularidade na estrutura do pedido, apresentada a petição do Habeas Corpus, o juiz que o receber analisa se é ou não se é apto a analisar o pedido. Essa aptidão chama-se competência.
Se não o for, ou seja, se outro juiz deva analisar o ato, remeterá ao seu substituto (o juiz que seria o competente desde o início), caso contrário se for competente, verificará se é ou não possível a concessão do pedido.
O habeas corpus pode ser conhecido (recebido) pelos Tribunais Superiores, dos Estados e pelos Juízes de Direito e Juízes Federais, dependendo do nível hierárquico da autoridade coatora.
Por exemplo, se o paciente for uma pessoa comum, caso a autoridade coatora seja o delegado de polícia, a autoridade judiciária que poderá receber o Habeas Copus será o Juiz de Direito ou Juiz Federal dependendo do tipo de crime.
Caso a autoridade coatora seja o Juiz de Direito ou o Juiz Federal, a autoridade judiciária apta a receber o Habeas Corpus será o Tribunal de Justiça do Estado ou o Tribunal Regional Federal, isso respectivamente.
O Habeas Corpus pode ser concedido (deferido) de ofício (sem provocação) se o Tribunal notar que no curso de determinado processo a pessoa esteja sob iminência ou efetivo ato de ilegalidade. Nesses casos ninguém leva à autoridae Judiciária a questão, pois esta fica sabendo por conta própria do caso e toma as medidas cabíveis para preservar a liberdade do paciente.
Após emitida a ordem de não prender ou de soltar a pessoa, podem acontecer alguns problemas. Esses problemas referem-se à demora em soltar a pessoa.
Nesse caso o responsável pela demora será multado caso seja concedido ou sejam solicitadas informações à autoridade coatora sobre o objeto do Habeas Corpus.
Na mesma multa incorrem o carcereiro ou diretor da prisão, o escrivão, o oficial de justiça, a autoridade judiciária, a autoridade coatora, ou mesmo a polícia atrapalharem o cumprimento da decisão, ou a chegada de informações que sejam imprescindíveis para o conhecimento do motivo da prisão, condução do preso ou mesmo a apresentação do paciente perante quem conceder a ordem de soltura.
As multas serão dadas pelo Juiz, pelo Tribunal do Estado ou pelos Tribunais Superiores, dependendo do nível hierárquico da autoridade coatora.
Se a autoridade coatora for alguém que seus atos sejam destinados diretamente ao Juiz de Direito ou ao Juiz Federal, este será o receptor do pedido de Habeas Corpus.
Caso seja o Juiz de Direito ou Juiz Federal o Coator, o responsável por receber a Ordem Será o Tribunal de Justiça do Estado ou o Tribunal Regional Federal.
Caso o coator seja o próprio Tribunal de Justiça do Estado ou Juiz Federal, o receptor do Pedido será o STJ e se este for o coator o STF será o receptor da ordem.
Note-se que tudo funciona como uma escada, subindo nível após nível, sempre numa relação de hierarquia completamente vertical.
Se o ato ilegal for proveniente de autoridade coatora de mesma hierarquia do receptor do habeas corpus (quem julga), ou mesmo de hierarquia superior, o poder de análise (competência) do receptor cessa imediatamente.
Em casos especiais o Habeas Corpus será destinado diretamente ao STF, como prevê o artigo 102, “d” e “g”, onde os paciente são o Presidente da República e seu vice (crimes comuns), o Procurador Geral da República (em crimes comuns), os membros do Congresso Nacional (em crimes comuns), seus Ministros (em crimes comuns e de responsabilidade), os Comandantes das Formas Armadas (nos crimes comuns e de responsabilidade – menos se o crime for da mesma natureza conexo com o crime de Responsabilidade cometido pelo Presidente da República, onde tanto os Comandantes como o Presidente e seu vice serão julgados perante o Senado Federal), os membros dos Tribunais Superiores (crimes comuns e de responsabilidade), Membros do Tribunal de Constas da União (crimes comuns e de responsabilidade), Chefes de Missão Diplomática em Caráter Permanente (crimes comuns e de responsabilidade).
A princípio se o Habeas Corpus for concedido ou negado o processo principal de onde o problema se originou continuará seu desenvolvimento normal, salvo se o problema discutido no Habeas Corpus for a própria existência do processo onde surgiu o ato de coação ilegal.
Neste caso, se concedida a ordem o processo é encerrado imediatamente.
Caso o objeto do Habeas Corpus for uma nulidade no processo, se possível ela será sanada e o processo sobrevive em seus termos seguintes, caso contrário o processo será encerrado.
O autor da coação responderá por custas se deu a ordem ilegal por má – fé. Os documentos que provarem a má-fé serão enviados ao Ministério Público para que sejam tomadas providências.
O receptor do Habeas Corpus poderá determinar que o preso lhe seja apresentado em dia e hora determinados assim que receber o pedido de Habeas Corpus. Esta apresentação não é obrigatória, dependendo do que o receptor analisar sobre os detalhes da coação ilegal.
Caso o detentor do preso não o apresente se assim for determinado pelo receptor, será expedido mandado de prisão em seu desfavor, sendo este processado nos termos da lei, providenciando o juiz que o preso seja retirado de onde esteja e lhe seja apresentado.
A única escusa à apresentação ocorrerá nos casos em que o preso esteja gravemente doente, se não estiver sob a guarda da pessoa apontada como seu detentor, ou ainda, se o comparecimento não for determinado pelo Juiz ou Tribunal.
Nos casos de doença o juiz poderá ir até onde o preso estiver.
O detentor do preso é obrigado e declarar sob quais ordens mantém o preso sob sua custódia.
Caso a coação seja interrompida pela autoridade coatora o receptor do Habeas Corpus o julgará prejudicado arquivando-o.
Ao receber o pedido de Habeas Corpus a autoridade judiciária resolverá em 24 à respeito de dar liminar para que o paciente seja posto imediatamente em liberdade.

A liminar é dada quando é constatada a presença de dois requisitos. O primeiro deles é o “fumus boni juris”, conhecida como fumaça do bom direito, que é provada quando o ato de coação não tem qualquer respaldo na lei, mostrando-se totalmente contrário ao que a legislação diz.
O segundo requisito é o “periculum in mora”, ou perigo na demora. Este requisito consiste na constatação de que se a coação não for imediatamente repelida o paciente certamente sofrerá danos irreversíveis.
Um caso curioso à respeito da liminar do Habeas Corpus é o fato da coação ocorrer quando é negado o direito de prestar fiança para que o paciente seja solto. Neste caso a autoridade judiciária que estiver analisando o Habeas Corpus determinará o valor da fiança, enviando os documentos de todo o pedido de Habeas Corpus para a autoridade coatora para que esta os junte aos autos (processo ou inquérito) as providências tomadas em razão da decisão liminar ou de mérito do Habeas Corpus.
Outro detalhe é que tanto a decisão de liminar, concedendo-a ou negando-a, bem como a decisão de mérito (julgamento final do Habeas Corpus), importam no envio de cópias da decisão para a autoridade coatora e para o paciente.
Caso o Habeas Corpus diga à respeito de coação que poderá ocorrer (iminência de prisão, algo que ainda não aconteceu mas que poderá acontecer e ocasionar a prisão do paciente), autoridade judiciária dará ao paciente um Salvo Conduto (ordem para que nenhuma pessoa prenda o paciente pelos motivos ditos no pedido de Habeas Corpus).
Quando o Habeas Corpus for deferido (o receptor concordar com o pedido de Liberdade requerido no mesmo), será expedida ordem via fax, telefone, e-mail ou outro meio hábil para seu imediato cumprimento, mesmo que o paciente esteja fora da jurisdição (área de atuação do juiz) do receptor.
Voltando a falar do julgamento do Habeas Corpus, caso a liminar seja ou não concedida, o receptor solicitará informações por escrito sobre a coação ilegal.
Na sequencia o pedido será analisado em seu mérito (análise mais profunda de seus fundamentos). Nota-se com isso que o Habeas Corpus tem um julgamento de dois estágios, um preliminar, onde não se analisa em profundidade a questão e outro com maior profundidade. Se a liminar for deferida o julgamento de mérito poderá ou não confirmá-la. Isto deve-se ao fato que novas informações podem ser enviadas ao receptor pela autoridade coatora, as quais poderão ou não mudar a ideia inicial de deferimento ou indeferimento da liminar.
Caso o Habeas Corpus seja indeferido na liminar, o receptor se juiz justificará o motivo. Caso seja o receptor o Tribunal, este além de justificar o motivo, levará ao conhecimento da câmara ou turma, podendo estar deliberarem a respeito.
Após o recebimento das informações pela autoridade coatora o Habeas Corpus será julgado na primeira oportunidade disponível.
No julgamento do mérito a decisão é votada e vencerá a decisão por maioria de votos. Caso haja empate e o presidente ainda não votou no caso que está sendo analisado (casos em que o coator é juiz de direito ou federal), o presidente vota e desempata. Caso o presidente tenha votado e ainda houve empate, considera-se a decisão mais favorável ao paciente. Em resumo o empate liberta a pessoa.
Por fim, é necessário explicarmos que os Tribunais terão regimento interno que suplementará os casos omissos do procedimento mostrado pelo Código de Processo Penal, conforme as particularidades de seu funcionamento. Contudo, lembremos sempre, em caráter suplementar jamais primário.

Conclusões

Pelo presente artigo foi possível dar um panorama geral a respeito do que é o tão famoso Habeas Corpus e assim desmistificar um pouco a fama de canivete suiço que o mesmo recebe há décadas.
O Habeas Corpus na realidade é uma conquista de todas as pessoas, mas ao mesmo tempo, uma triste prova do arbítrio, do desrespeito e da nítida ideia de superioridade e inferioridade que nossa sociedade sofre, diante os mais variados caprichos.
Caprichos que nascem do descaso com atos inicialmente pequenos que ao final de um decurso longo de tempo, gera verdadeiros monstros.
Monstros que nem sempre estão em cadeias ou presos, mas monstros que sob o manto de estarem fazendo o certo, fazem de tudo, menos cumprir efetivamente o que a lei manda.
Monstros banhados ao sofisma, ao capricho, ao ódio e à violência sem pudor e precedentes.
O Habeas Corpus poderia virar item de bibliotecas se vivêssemos num mundo ideal. Se a sociedade caminhasse em ritmo de evolução de sua civilidade.
Entretanto, mediante as provas do cotidiano, o que vemos é que o Habeas Corpus longe de se tornar um item de museu, está virando um item de primeira, de arma primária ao lugar de item de emergência...
A liberdade é o principal item a ser salvo mediante o uso do Habeas Corpus.
Esta é um bem jurídico que antes de ser questionado deve ser entendido e acima de tudo, preservado quando a lei for desrespeitada e o arbítrio uns fazer as vezes de vontade da maioria.

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  • HABEAS CORPUS
  • CANIVETE SUÍÇO

Pablo Roberto dos Santos - Advogado

Bacharel em Direito - Limeira, SP


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