A LICITAÇÃO NA MODALIDADE CONCORRÊNCIA: IMPASSES EM FACE DOS PRINCÍPIOS LICITATÓRIOS


22/09/2014 às 21h24
Por Fernando Falk Sundl

RESUMO

O presente trabalho monográfico trata do tema “a licitação na modalidade concorrência: impasses em face dos princípios licitatórios”. Desenvolve-se o trabalho considerando os preceitos da Constituição Federal em relação à atuação da Administração Pública no Estado Democrático de Direito, que terá que ser pautada nos princípios e valores constitucionais, especialmente no atendimento do interesse público e na indisponibilidade dos bens públicos. À luz da literatura jurídica, destaca-se a função do processo licitatório e a sua importância para a sociedade, em vista que possibilita a transparência na atuação da Administração Pública, bem como o controle pela cidadania. Identificam-se os princípios da Administração Pública, especialmente os indicados na Lei de Licitações, para centrar-se a discussão na modalidade de licitação da concorrência, procurando a partir das decisões do Tribunal do Estado do Rio Grande do Sul, nos anos de 1998 a 2012, analisar os impasses na atuação da Administração Pública em relação aos princípios constitucionais, uma vez que essa modalidade de licitação é a que envolve os maiores valores para a aquisição de bens e contratação de serviços. Para tanto, utiliza-se o método dedutivo e monográfico e a técnica de pesquisa bibliográfica, em fontes primárias e secundárias.

Palavras-chave: licitação; princípio; concorrência; impasses.

ABSTRACT

.This monograph deals with the theme "bidding in competition mode: impasses in the face of bidding principles." Develops work considering the precepts of the Constitution in relation to the performance of public administration in a democratic state, which must be based on the principles and constitutional values​​, especially in serving the public interest and the availability of public goods. In light of the legal literature, there is the function of the bidding process and its importance to society, a view that enables transparency in the operation of the Public Administration, as well as control for citizenship. It identifies the principles of public administration, especially those indicated in the Bidding Law, to focus the discussion on the bidding competition, looking from the decisions of the Court of the State of Rio Grande do Sul, in 1998 the 2012, the impasses analyze the performance of public administration in relation to constitutional principles, since this type of bidding is the one involving the highest values ​​for the acquisition of goods and contracting services. For this, we use the deductive method and technique and monographic literature in primary and secondary sources.

Keywords: bidding; principle; competition; impasses.

1 INTRODUÇÃO

A Administração Pública atualmente, além de governantes sérios e eficientes, necessita de leis, regulamentos e procedimentos que norteiem a sua finalidade e gestão.

Uma das formas que o legislador encontrou para controlar o setor de compras, serviços e alienações da Administração Pública foi a chamada licitação, que, constituindo-se em instrumento da Administração Pública, oferece uma série de procedimentos, expressos nas modalidades licitatórias e em consonância com os princípios para a eficiência na aplicabilidade dos recursos públicos.

Mas, como a maioria das leis têm lacunas, tanto administradores quanto membros da sociedade mal intencionados que se aproveitam dos recursos públicos, podem utilizar o procedimento licitatório para fins ilícitos.

Com essas considerações, apresenta-se como problema a ser tratado no presente trabalho, a identificação e a análise dos impasses apresentados na licitação, na modalidade concorrência, considerando as possíveis dissonâncias apresentadas nessa modalidade em razão do desrespeito aos princípios licitatórios.

Têm-se como objetivos demonstrar quais os impasses mais comuns presentes na prática da modalidade de licitação denominada concorrência, utilizando como vetor os princípios previstos na legislação. Além disso, o trabalho ainda objetiva apresentar o conceito e a finalidade da licitação; demonstrar as modalidades da licitação, com ênfase na concorrência; definir quais são os princípios licitatórios; apresentar casos práticos que tenha tido algum impasse, na modalidade concorrência e ainda analisar a possível violação dos princípios licitatórios na prática da concorrência.

Desse modo, justifica-se o desenvolvimento do presente tema, pois representa um grande valor social e econômico, visto que grande parte dos recursos que a Administração Pública dispõe para a aquisição é gasta utilizando essa modalidade de licitação, na compra de bens e de serviços importantes para a utilização da sociedade.

Outro motivo é o crescente número de fraudes envolvendo essa modalidade de licitação, em total desrespeito com os princípios estabelecidos em lei, que são protegidos pela Constituição Federal. Assim, o estudo buscará identificar os principais pontos problemáticos da modalidade em tela para, posteriormente, ser realizada uma análise mais profunda, a qual poderia resultar em alterações na lei para seu aprimoramento e, consequentemente, extinção dos problemas a serem abordados.

O trabalho está dividido em três capítulos. O primeiro capítulo aborda o conceito de licitação e as modalidades licitatórias. Na segunda parte expõem-se os princípios pertinentes ao processo licitatório. E, por último, no terceiro capítulo, serão abordados os impasses em face da licitação, tomando-se como base a modalidade concorrência, procurando utilizar-se como parâmetros os principais princípios licitatórios.

O presente trabalho utiliza-se dos métodos dedutivo e monográfico e da técnica de pesquisa bibliográfica com consulta a livros, legislação, jurisprudência e sites oficiais de justiça.

Com essa proposta, sem a pretensão de apresentar conclusões definitivas, o trabalho procurará discutir problemas comuns em uma das modalidades licitatórias, o que equivale a uma pequena parcela da atividade administrativa frente ao grande conjunto de atribuições afetas à Administração Pública.

2 ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA, CONCEITO DE LICITAÇÃO E AS MODALIDADES LICITATÓRIAS

A Administração Pública tem na derivação de sua gerência pelos administradores o respeito a certos procedimentos previstos em lei, que são estritamente necessários para que a gestão não seja desviada de sua finalidade.

Dentre esses inúmeros procedimentos, destaca-se a licitação, que é um importante instrumento que o administrador público dispõe na sua atividade, sendo seu conceito e suas modalidades elencados a seguir.

2.1 A Administração Pública e a licitação

A Administração Pública tem o dever de cuidar dos recursos públicos (gestão), devendo arrecadá-los e investi-los de maneira eficiente e atrelada as necessidades da sociedade, já que a ela foi dada essa missão. O Estado recebe contribuição por parte da sociedade, por meio das pessoas, empresas, entre outros, mediante o recolhimento de impostos, taxas e demais tributos, que devem ser aplicados em benefício da sociedade, desde aquisições de pequeno porte e baixo custo, como por exemplo, a compra de dez cadeiras odontológicas para equipar um centro de odontologia para a comunidade, como para aquisições e investimentos de maior porte, tendo como exemplo a construção de escolas, hospitais, rodovias, entre outros.

Para desempenhar a gestão da aquisição de bens e serviços, os administradores são obrigados a respeitar leis e regras que os legisladores elaboraram. Os preceitos dessas leis fundamentam-se na aplicação e uso correto dos recursos que os administradores encontram disponíveis para aplicar, visto que a má aplicação dos recursos pode levar uma boa administração à falência, como uma grande empresa que é mal administrada, ou a se tornar apenas autossuficiente, não sobrando verbas para investir em outros pontos a não ser para manter a sua própria existência.

Assim, uma das formas que o legislador encontrou para regular os gastos da Administração Pública, tanto na forma de aquisição de bens e serviços, como na alienação de bens, foi à chamada licitação, que é muito utilizada atualmente. De abrangência bastante ampla, são poucas as opções para a não utilização deste mecanismo, como, por exemplo, para aquisição de produtos de baixo valor e produtos que somente possuem um fornecedor.

A licitação rege-se pela lei nº 8.666 de 21 de junho de 1993. Tomando como base os artigos da referida lei, verifica-se a existência de diversas modalidades.

Ocorre que na prática, às vezes, devido às modalidades que possuem um alto valor empregado, os administradores e outras pessoas mal intencionadas acabam desconsiderando os princípios que norteiam a licitação para verem seus interesses individuais atendidos, como por exemplo, o favorecimento de alguma empresa com o referido processo, ajudando parentes na compra de produtos, dentre outros.

Mas, antes de elencar os problemas, deve-se saber o que é licitação e quais são as suas modalidades e seus princípios, como serão relatados a seguir.

2.2 Conceito de licitação

Como na maioria dos casos, os procedimentos que possuem lei que os especificam e regulamentam têm o seu conceito expresso em algum artigo da lei que o regulamenta.

A licitação, sendo um procedimento da Administração Pública para aquisição de bens que se encontra expressa em lei, apesar de ter uma lei vasta com mais de cem artigos a regulamentando, nenhum deles de forma clara descreve o conceito de licitação, portanto, não há um conceito definido de modo geral pela lei nº 8.666/93.

A lei nº 8.666/93 centra-se mais na regulamentação de como se utiliza a licitação, sem a preocupação em definir a mesma. A disposição que conceitua de forma mais clara a licitação no ordenamento jurídico brasileiro se encontra na Constituição Federal Brasileira, em seu artigo 37, inciso XXI, onde elenca o seguinte:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.

Note-se que o referido artigo da Magna Carta brasileira também não esclarece de maneira clara e definitiva o conceito de licitação, direcionando-se mais para a finalidade da mesma. Desse modo, coube aos doutrinadores o importante papel de conceituar este ilustre instituto do direito administrativo.

Para tanto, a licitação é conceituada da seguinte forma, sendo que a mesma

[...] é um certame que as entidades governamentais devem promover e no qual abrem disputa entre os interessados em com elas travar determinadas relações de conteúdo patrimonial, para escolher a proposta mais vantajosa às conveniências públicas. Estriba-se na ideia de competição, a ser travada isonomicamente entre os que preencham os atributos e aptidões necessárias ao bom cumprimento das obrigações que se propõem a assumir. (MELLO, 2012, p. 532, grifo do autor).

O conceito elencado acima se constitui equivocadamente, visto que nem todas as relações que a Administração Pública trava com os interessados na licitação são de cunho patrimonial, ou seja, nem todas as modalidades se servem apenas de aquisição de bens que serão incorporados ao patrimônio da Administração Pública, visto que a licitação também serve para contratação de empresa para prestação de determinado serviço, como por exemplo, a contratação de empresa para a manutenção da iluminação pública urbana. Pode se notar que é somente a manutenção que esta sendo colocada em disputa, que é o conserto do equipamento já instalado, e não a construção de redes para este determinado fim. Assim, a palavra patrimonial no conceito de Mello poderia ser substituída pela palavra “oneroso”, visto que em qualquer modalidade de licitação, sempre há uma contraprestação entre o ente público e o vencedor do certame.

Outro conceito de licitação é demonstrado por Dromi (1975), citado por Di Pietro (2012, p.368), onde demonstra o seguinte conceito sobre a licitação

[...] pode se definir a licitação como o procedimento administrativo pelo qual um ente público, no exercício de função administrativa, abre a todos os interessados, que se sujeitem às condições fixadas no instrumento convocatório, a possibilidade de formularem propostas dentre as quais selecionará e aceitará a mais conveniente para a celebração de contrato.

Note-se que no conceito elencado anteriormente, o autor não demonstra qual a real finalidade da licitação, apenas demonstrando a importância do instrumento convocatório para a elaboração do certame.

O que pode se notar é que pela primeira vez se fala que a licitação configura-se como um procedimento administrativo, que nada mais é, segundo Di Pietro (2012, p. 368), “uma série de atos preparatórios do ato final objetivado pela Administração”. Estaria aí um conceito explicito para licitação, visto que o que a maioria dos autores conceitua como licitação e o que a própria lei traz sobre a sua definição tem mais relação com a finalidade da licitação do que com o esclarecimento de seu conceito.

A real finalidade da licitação é a aquisição de bens para a Administração Pública e a contratação de serviços. O único conceito que elenca essa situação é o encontrado no site do Tribunal de Contas da União (TCU, [2005?], < http://portal2.tcu.gov.br/portal/page/portal/TCU >), onde:

[...] licitação é o procedimento administrativo formal em que a Administração Pública convoca, mediante condições estabelecidas em ato próprio (edital ou convite), empresas interessadas na apresentação de propostas para o oferecimento de bens e serviços.

Nesse conceito pode-se notar a verdadeira função da licitação: o oferecimento de bens e serviços para a Administração Pública.

Portanto, afirma-se que a licitação é um procedimento administrativo formal que, segundo Mello (2012, p.507) é classificado dentro dos “procedimentos concorrenciais”, onde obedecendo a um instrumento convocatório previamente elaborado, vincula empresas ou sujeitos interessados na participação de um certame, assim ofertando bens ou serviços ou adquirindo bens da Administração Pública, onde ao final será escolhido àquele que seja menos oneroso e mais vantajoso para a Administração Pública.

2.3 As modalidades da licitação

O presente trabalho tem por objetivo a análise dos impasses da modalidade concorrência, portanto, deixando as demais modalidades excluídas da análise proposta. Mas, como não menos importantes, é interessante ao menos ressaltar as principais características de cada modalidade da licitação, vistos que a maioria delas encontram-se estabelecidas na lei nº 8.666/93, junto com a modalidade concorrência, que é objeto do presente trabalho.

As modalidades foram normatizadas no intuito de dar maior organização à licitação, visto que a mesma tem em seu procedimento tanto o manejo de bens e serviços, que vão de valores irrisórios até valores consideráveis, considerados o valor da arrecadação dos impostos, por exemplo, quanto ainda a alienação de bens pertencentes a Administração Pública.

Portanto, o administrador não tem como justificativa a utilização de uma única modalidade para a aquisição de bens e serviços, ou para a alienação de bens, pois senão o processo se tornaria menos específico, tornando mais burocrático, e consequentemente mais demorado, gerando mais custos para a Administração Pública.

Na lei nº 8.666/93, mais precisamente no seu artigo 22, encontram-se estabelecidas cinco modalidades da licitação, sendo elas a concorrência, tomada de preços, convite, concurso e o leilão.

Ainda, segundo Alexandrino, Paulo (2012, p. 611) existem outras duas modalidades de licitação presentes em nosso ordenamento jurídico, mas fora da lei das licitações, que seria a modalidade pregão, que foi introduzida pela lei nº 10.520/2002, e mais uma sétima modalidade, denominada consulta. E, ainda, a forma ainda prevista fora da lei das licitações é o regime diferenciado de contratação (RDC), que está prevista na lei nº 12.462/2011(Di Pietro 2012 p.413).

Como se vê, não é apenas a lei nº 8.666/93 que dispõem de todas as modalidades da licitação, mas também leis esparsas que se encontram em nosso ordenamento jurídico também estabelecem modalidades licitatórias. Isso se deve ao fato de como a Administração Pública e a sociedade estão em constantes mudanças, o legislador se vê na possibilidade de criar uma nova modalidade de licitação do que modificar alguma modalidade já existente no ordenamento jurídico, assim somente incluindo, e não modificando.

As modalidades licitatórias são definidas em lei, como será apresentado a seguir.

2.3.1 Concorrência

A modalidade concorrência encontra-se definida no artigo 22, inciso I, parágrafo primeiro da lei nº 8.666/93, onde diz o seguinte:

Art. 22. São modalidades de licitação:

I - concorrência;

§ 1º Concorrência é a modalidade de licitação entre quaisquer interessados que, na fase inicial de habilitação preliminar, comprovem possuir os requisitos mínimos de qualificação exigidos no edital para execução de seu objeto.

A concorrência, segundo Alexandrino, Paulo (2012) é a mais complexa das modalidades da licitação. Não é por menos que ela é a mais complexa, visto que a mesma envolve o maior montante de recursos gastos na aquisição de determinado bem ou serviço e nas aquisições e alienações de imóveis pela Administração Pública, como veremos mais adiante.

Ainda seguindo, Alexandrino, Paulo (2012, p. 613) relatam a finalidade da concorrência nas licitações:

Presta-se à contratação de obras, serviços e compras, de qualquer valor. Além disso, é a modalidade exigida, em regra, para a compra de imóveis e para a alienação de imóveis públicos, para a concessão de direito real de uso, para as licitações internacionais, para a celebração de contratos de concessão de serviços públicos e para contratos de parcerias público-privadas [...].

A finalidade acima exposta encontra realmente a grande importância dessa modalidade, como pode se notar, pois além de servir para qualquer valor de aquisição, a mesma pode ser usada tanto nas aquisições quanto nas alienações de imóveis pela Administração Pública.

Segundo Di Pietro (2012 p. 407 e 408, grifo do autor), a licitação possui duas características básicas, a ampla publicidade e a universalidade:

A publicidade, nos termos do artigo 21, é assegurada pela publicação do aviso do edital, no mínimo uma vez, com a indicação do local em que os interessados poderão ler e obter o texto integral e todas as informações sobre a licitação;[...]

Universalidade significa a possibilidade de participação de quaisquer interessados que, na fase inicial de habilitação preliminar, comprovem possuir os requisitos mínimos de qualificação exigidos no edital para execução de seu objeto(art. 22, § 1º).

A licitação na modalidade concorrência possui em seu artigo definido em lei, a expressão “habilitação preliminar”, na qual essa expressão vem a dizer que a Administração Pública examina primeiramente se os interessados em participar do certame estão aptos ou não a promoverem a disputa entre si, ou seja, se preenchem os requisitos necessários para que a sua participação seja confirmada.

Mas a expressão “habilitação preliminar” não é o que caracteriza a modalidade concorrência, pois ela não é a única modalidade licitatória que possui esse requisito. O que realmente diferencia essa modalidade das demais seria a amplitude de participação dos interessados no certame (FILHO, 2012).

Essa modalidade, como já comentado acima, pode ser utilizada para compras e serviços de qualquer valor. Mas a lei nº 8.666/93 estipula valores que por ela devem ser seguidos, tanto para a aquisição de materiais quanto para a contratação de serviços. Os valores estão dispostos no artigo vinte e três da lei nº 8.666/93, que traz tanto os valores para as obras e serviços de engenharia como para as compras e serviços, como se vê a seguir exposto:

Art. 23. As modalidades de licitação a que se referem os incisos I a III do artigo anterior serão determinadas em função dos seguintes limites, tendo em vista o valor estimado da contratação:

I - para obras e serviços de engenharia:

c) concorrência: acima de R$ 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil reais);

II - para compras e serviços não referidos no inciso anterior:

c) concorrência - acima de R$ 650.000,00 (seiscentos e cinqüenta mil reais).

Quanto à alienação de bens, a mesma pode ser utilizada tanto na alienação de bens imóveis quanto de bens móveis. No caso dos imóveis, a concorrência pode ser utilizada em qualquer venda, ressalvado o caso do artigo 19, III da lei das licitações, onde bens imóveis que sejam originados de procedimentos judiciais ou de dação em pagamento devem utilizar a modalidade leilão para a sua alienação [1]. No caso dos bens móveis, a concorrência deve ser utilizada, segundo Alexandrino, Paulo (2012 p. 616) para a alienação dos bens móveis que excedam, tanto separadamente quanto em grupo, o valor estipulado pelo artigo 17, § 6º da lei nº 8.666/93, que é o valor estabelecido para a tomada de preços no caso de compras e serviços, ou seja, o valor de até R$ 650.000,00(seiscentos e cinquenta mil reais). Caso a alienação de bens móveis não chegue a este montante, deve ser utilizada a modalidade leilão.

Assim, percebe-se com o exposto a importância dessa modalidade, visto que é a que tem os maiores valores envolvidos, tanto na compra como na alienação de bens. Desta forma, essa modalidade acaba atraindo grandes empresas para a disputa, abrindo os olhos tanto dos administradores como dos interessados na participação do certame nas questões de fraudes.

2.3.2 Tomada de preços

A tomada de preços é outra modalidade que se encontra elencada no rol das modalidades da licitação. Essa modalidade encontra-se descrita no artigo 22, II, parágrafo segundo da lei nº 8.666/93, que diz o seguinte:

Art. 22. São modalidades de licitação:

II - tomada de preços;

§ 2º Tomada de preços é a modalidade de licitação entre interessados devidamente cadastrados ou que atenderem a todas as condições exigidas para cadastramento até o terceiro dia anterior à data do recebimento das propostas, observada a necessária qualificação.

Nota-se que nessa modalidade, segundo o artigo 22, os interessados devem se submeter anteriormente a um cadastro, onde a Administração Pública observa se os interessados estão aptos a participar do certame.

A tomada de preços está mais bem demonstrada por Mello (2012, p. 570, grifo do autor), que relata o seguinte:

A tomada de preços (art.22, § 2º), destinada as transações de vulto médio, é a modalidade em que a participação na licitação restringe-se (a) às pessoas previamente inscritas em cadastro administrativo, organizado em função dos ramos de atividade e potencialidades dos eventuais proponentes, e (b) aos que, atendendo a todas as condições exigidas para o cadastramento, até o terceiro dia anterior à data fixada para recebimento das propostas, o requeiram e sejam, destarte, qualificados.

Diferente das outras modalidades cabe ressaltar que na tomada de preços a licitação é mais organizada e ágil, visto que somente podem participar quem se cadastrar até três dias antes da apresentação das propostas. Ainda, quem deseja participar dessa modalidade é cadastrado de acordo com o que tem para oferecer, assim, sendo essa modalidade a mais ágil das encontradas nas licitações.

Há duras criticas a comprovação dos requisitos necessários até três dias antes do recebimento das propostas. Segundo Di Pietro (2012, p.409)

[...] esse entendimento parece não ser aceitável, primeiro porque nem todos os órgãos públicos possuem registro cadastral e, nesse caso, teriam que ficar dependendo do procedimento de cadastramento realizado em outro órgão ou entidade, segundo porque a realização de procedimento paralelo poderia contribuir para retardar inutilmente o procedimento da licitação.

O caso de retardamento do processo licitatório poderia se dar pelo recurso, que pode ser impetrado pelo participante que teve sua inscrição negada até três dias antes da apresentação das propostas. Assim, segundo Mello (2012, p.570)

[...] o interessado terá direito de recorrer administrativamente, no prazo de cinco dias úteis e com efeito suspensivo, que é o que corresponde aos recursos contra inabilitação, a teor do art. 109, § 2º.

Caso algum interessado queira se cadastrar para participar do certame, a Administração Pública só poderá pedir os documentos que se encontram descritos nos artigos 27 a 31 da lei nº 8.666/93 (MEDAUAR, 2012 p. 202). Os documentos citados acima valem para qualquer fase licitatória. Tem a função de dar mais credibilidade à licitação e a comprovar os requisitos necessários para a participação no certame.

A tomada de preços ainda pode ser, segundo Alexandrino, Paulo (2012, pg. 614) utilizado nas licitações internacionais, desde que: a) o órgão ou entidade disponha de cadastro internacional de fornecedores; e b) o contrato a ser celebrado esteja dentro dos limites de valor para a tomada de preços.

Mais umas vez, como nas demais modalidades, a tomada de preços possui seu valor definido tanto para compras, serviços, obras e serviços de engenharia mencionados na lei nº 8.666/93, mais precisamente no seu artigo 23, incisos I e II, onde se diz o seguinte quanto aos valores:

Art. 23. As modalidades de licitação a que se referem os incisos I a III do artigo anterior serão determinadas em função dos seguintes limites, tendo em vista o valor estimado da contratação:

I - para obras e serviços de engenharia:

b) tomada de preços - até R$ 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil reais);

II - para compras e serviços não referidos no inciso anterior:

b) tomada de preços - até R$ 650.000,00 (seiscentos e cinqüenta mil reais);

Dessa forma, percebe-se que os valores envolvidos na tomada de preços dão a sua real importância, visto que é umas das modalidades mais bem elaboradas quanto a sua atribuição e aplicação, gerando em certo sentido menos burocracia, tanto para a Administração Pública, quanto à aquisição de bens, quanto para quem quer concorrer, onde o processo de participação é mais fácil e simplificado.

2.3.3 Convite

O convite é a terceira modalidade apresentada no rol que se encontra no artigo 22 da lei nº 8.666/93. Dentre as outras modalidades que se encontram no rol da lei nº 8.666/93, é a que possui o valor mais baixo para a aquisição de bens e serviços. Essa modalidade é assim conceituada no seu parágrafo terceiro do artigo anteriormente elencado

Art. 22. São modalidades de licitação:

III - convite;

§ 3o Convite é a modalidade de licitação entre interessados do ramo pertinente ao seu objeto, cadastrados ou não, escolhidos e convidados em número mínimo de 3 (três) pela unidade administrativa, a qual afixará, em local apropriado, cópia do instrumento convocatório e o estenderá aos demais cadastrados na correspondente especialidade que manifestarem seu interesse com antecedência de até 24 (vinte e quatro) horas da apresentação das propostas.

A modalidade convite se diferencia das demais modalidades, pois além do valor envolvido, que será explanado mais adiante, o modo como é feita é bastante diferenciado, já que se exige para que a mesma modalidade possa ser utilizada a participação mínima de três interessados, independente de cadastro ou não, sendo escolhidos e convidados pela unidade administrativa para a participação no certame, publicando após isso o instrumento convocatório para que os demais interessados nessa área manifestem seu interesse de participação.

Além do mais, essa modalidade não utiliza o edital como instrumento convocatório, possuindo um procedimento interessante para a convocação dos interessados. O referido instrumento, segundo Alexandrino, Paulo (2012, p.614) se chama carta-convite, que é enviado diretamente aos interessados.

Alexandrino, Paulo (2012, p.615, grifo do autor) fazem uma pequena ressalva ao número mínimo de participantes, no que tange o envio da carta-convite:

[...] a carta-convite poderá ser enviada a menos de três interessados, desde que por limitações do mercado ou manifesto desinteresse dos convidados, seja impossível a obtenção do numero mínimo de licitantes. Essas circunstancias deverão ser devidamente justificadas no processo, sob pena de repetição do convite (art. 22, § 7.º).

Essa situação é importante, visto que a mesma visa a proteger a Administração Pública de algum modo, pois o administrador poderia ser aproveitar de alguma forma dessa situação em proveito próprio, por exemplo.

Segundo o artigo 21, § 2º, IV da lei nº 8.666/93, o prazo mínimo para o lançamento das cartas convites será de cinco dias úteis ou da sua disponibilidade com os anexos até a data do recebimento da proposta (Mello, 2012 p.571).

Os valores envolvidos nessa modalidade da licitação encontram-se explanados no artigo 23 da lei nº 8.666/93, onde diz o seguinte:

Art. 23. As modalidades de licitação a que se referem os incisos I a III do artigo anterior serão determinadas em função dos seguintes limites, tendo em vista o valor estimado da contratação:

I - para obras e serviços de engenharia:

convite - até R$ 150.000,00 (cento e cinqüenta mil reais);

II - para compras e serviços não referidos no inciso anterior:

convite - até R$ 80.000,00 (oitenta mil reais);

Portanto, essa modalidade tem os valores considerados mais baixos que os outros, sendo a última modalidade mencionada nos incisos do artigo 22 que se remete a valores para compra e aquisição de bens e serviços.

2.3.4 Concurso

O concurso é a primeira modalidade do rol dos incisos do artigo 22 que não apresenta valores que o estipulam para a sua utilização ou não, ou seja, ele não tem como requisito compra ou aquisição de até certo valor. O concurso destina-se a escolha de trabalho técnico, científico e artístico, conforme o artigo 22, inciso IV, parágrafo quarto da lei nº 8.666/93 que assim dispõe:

Art. 22. São modalidades de licitação:

IV - concurso;

§ 4o Concurso é a modalidade de licitação entre quaisquer interessados para escolha de trabalho técnico, científico ou artístico, mediante a instituição de prêmios ou remuneração aos vencedores, conforme critérios constantes de edital publicado na imprensa oficial com antecedência mínima de 45 (quarenta e cinco) dias.

Essa modalidade tem como função:

[...] selecionar trabalho técnico ou artístico, exteriorizador de habilidade físico-intelectual ou revelador de certas capacidades personalíssimas, seja para fins de incentivo ao desenvolvimento cultural seja para obtenção de resultado pratico imediato (Filho 2012 p.270).

O resultado prático seria o desejado pelo ente público que promoveu o concurso, onde ele pode ter, como por exemplo, intenção de construir uma nova praça, assim podendo utilizar essa modalidade para promover a seleção do melhor projeto para a construção da praça em questão.

Depois de os interessados apresentarem o trabalho, o mesmo será submetido a uma comissão especial, que tenha conhecimento na matéria do trabalho em questão e que tenha reputação ilibada, podendo ser servidores públicos ou não (artigo 51, § 5º da lei nº 8.666/93).

Ainda há uma ressalva a se fazer quanto ao projeto, no qual após tal projeto ter sido o vencedor do concurso, o autor ainda deve autorizar a Administração Pública a executá-lo quando julgar conveniente, conforme determina o artigo 52, § 2º da lei nº 8.666/93.

2.3.5 Leilão

O leilão constitui-se uma modalidade da licitação. A licitação, como se observa até agora, serve para a aquisição de bens e contratação de serviços para o ente público. Mas a exceção é o leilão, onde tem como principal finalidade a venda de bens móveis inservíveis, e bens imóveis específicos da Administração Pública.

Essa modalidade esta explicita no artigo 22, inciso V, parágrafo quinto da lei nº 8.666/93, onde tem o seu conceito e sua finalidade elencada:

Art. 22. São modalidades de licitação:

V - leilão.

§ 5o Leilão é a modalidade de licitação entre quaisquer interessados para a venda de bens móveis inservíveis para a administração ou de produtos legalmente apreendidos ou penhorados, ou para a alienação de bens imóveis prevista no art. 19, a quem oferecer o maior lance, igual ou superior ao valor da avaliação.

Como mencionado no artigo acima, a alienação é feita mediante lances dos interessados, onde o produto objeto do leilão vai passar a pertencer a quem der o maior lance, ou seja, a quem oferecer mais dinheiro para a aquisição do referido produto, desde que o valor seja igual ou superior ao valor avaliado pelo órgão público que promove o leilão.

Outra finalidade dada ao leilão, como mencionado no artigo 22 da lei nº 8.666/93, é o da alienação de bens imóveis previstos no artigo 19 da mesma lei, que são os imóveis provenientes de procedimentos judiciais ou de dação em pagamento. Os demais imóveis, tanto para a compra quanto para a venda dos mesmos, deve ser utilizada a modalidade concorrência, conforme o artigo 23, parágrafo terceiro da lei das licitações.

Quanto ao valor dos bens móveis, os mesmos não podem ultrapassar, sendo somente um ou juntados em um grupo, o valor de R$ 650,000.00, segundo o artigo 17, §6º da lei das licitações. Caso ultrapasse, a modalidade a ser utilizada para a alienação deve ser a concorrência (Alexandrino, Paulo 2012 p.616).

2.3.6 Demais modalidades licitatórias

Além das modalidades citadas anteriormente que se encontram expressas na lei nº 8.666/93, existem outras três modalidades que se encontram descritas fora da lei das licitações, mas não menos importantes, que são o pregão, a consulta e ainda, segundo Di Pietro (2012, p.413) o regime diferenciado de contratação (RDC).

A primeira delas, o pregão, está expressa na lei nº 10.520/2002, lei que instituiu essa modalidade, onde o seu artigo primeiro afirma que essa modalidade é usada para a aquisição de bens e serviços comuns, os quais são definidos pelo parágrafo único do mesmo artigo, onde os bens e serviços comuns podem ser considerados os que cujo padrão de desempenho e qualidade possa ser objetivamente definido em edital, por meio de especificações usuais de mercado.

A lei não fala em nenhum valor monetário a ser utilizado como base para o uso ou não dessa modalidade. Alexandrino, Paulo (2012 p.617) afirmam que a possibilidade de uso do pregão está ligada à natureza do objeto da contratação e não o valor econômico do contrato.

O interessante desta modalidade é que a mesma junta à maioria das outras modalidades numa só, visto que possui o recebimento de propostas como as demais modalidades, e depois de abertas passam a ter uma disputa parecida com a da encontrada na modalidade leilão, onde os interessados efetuam lances menores que o valor em questão, sendo o vencedor do pregão aquele que der o lance de menor preço (artigo 8º, VIII da lei nº 8.666/93).

O pregão divide-se em duas espécies, que são o pregão presencial e o pregão eletrônico. O pregão presencial é definido por lei, onde segundo Gasparini (2010, p.629,630), pregão é definido

[...] pelo artigo 2º do regulamento (Anexo I) aprovado pelo Decreto n. 3.555/2000 como a modalidade de licitação em que a disputa pelo fornecimento de bens e serviços comuns é feita em sessão pública, por meio de propostas de preços escritas e lances verbais.

Além do pregão presencial, há também o pregão eletrônico, que diferente do pregão presencial, esse, segundo Gasparini (2010, p.635) “é a realizada por meio da utilização de recursos de tecnologia da informação”.

Acrescente-se a modalidade prevista fora da lei das licitações seria a consulta, que é considerada por muitos doutrinadores como inconstitucional, visto que esta definida somente para a ANATEL, mais precisamente na lei nº 9.472/97, com seu conceito elencado no artigo 15 do Regulamento de Contratações da ANATEL, ato posterior à lei, portanto, sendo considerado por Bandeira (2012, p.579), “ato subalterno, obviamente sem força de inaugurar no universo jurídico uma nova modalidade licitatória”.

A finalidade desta modalidade, como já dito anteriormente, consta no Regulamento de Contratações da ANATEL, que veio a disciplinar a parte das contratações da lei nº 9.472/97 da ANATEL, mais precisamente o artigo 58 dessa lei, onde esse artigo relata que a consulta tem por objetivo o fornecimento de bens e serviços não compreendidos nos artigos 56 e 57 da mesma lei. Isso deixa um pouco vago quanto a real finalidade da consulta, o que é bem definido pro Bandeira (2012, p.579) em seu conceito:

Consulta é a modalidade de licitação em que ao menos cinco pessoas, físicas ou jurídicas, de elevada qualificação, serão chamadas a apresentar propostas para o fornecimento de bens e serviços não comuns”, formulada no parágrafo único, que são aqueles insuscetíveis de comparação útil ou cujas características individualizadoras apresentam-se como necessárias.

Tal conceito demonstrado pelo autor acima demonstra o que está descrito no artigo quinze do referido Regulamento de Contratações (ANATEL, [1998?], < http://www.anatel.gov.br>), que foi criado para reger apenas as contratações dessa agência reguladora. Posteriormente, após a promulgação da lei nº 9.986/2000 essa modalidade foi estendida as demais agências reguladoras, passando a vigorar como uma modalidade licitatória.

Por último, foi criada ainda uma nova modalidade de licitação, que é o Regime Diferenciado de Contratação (RDC) criado pela lei nº 12.462/2011, onde no seu artigo primeiro, incisos I ao III relata a sua finalidade:

I - dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016, constantes da Carteira de Projetos Olímpicos a ser definida pela Autoridade Pública Olímpica (APO); e

II - da Copa das Confederações da Federação Internacional de Futebol Associação - Fifa 2013 e da Copa do Mundo Fifa 2014, definidos pelo Grupo Executivo - Gecopa 2014 do Comitê Gestor instituído para definir, aprovar e supervisionar as ações previstas no Plano Estratégico das Ações do Governo Brasileiro para a realização da Copa do Mundo Fifa 2014 - CGCOPA 2014, restringindo-se, no caso de obras públicas, às constantes da matriz de responsabilidades celebrada entre a União, Estados, Distrito Federal e Municípios;

III - de obras de infraestrutura e de contratação de serviços para os aeroportos das capitais dos Estados da Federação distantes até 350 km (trezentos e cinquenta quilômetros) das cidades sedes dos mundiais referidos nos incisos I e II.

Tal lei, segundo Di Pietro (2012, p.214) é um procedimento previsto para ser aplicado a situações específicas e ter duração limitada à conclusão dos eventos referidos no artigo 1º.

Portanto, é uma modalidade que tem um curto tempo de vida, com uma finalidade específica para um tempo específico, não podendo após a passagem dos eventos ser mais utilizada, pois, como relatado acima, foi criada somente para os fins do artigo 1º.

Assim, as modalidades apresentadas nesse capítulo constituem condições a serem observadas para a realização da licitação por parte dos Administradores da sociedade, considerando-se assim a licitação uma forma de compra complexa e elaborada, pois como observa-se, são várias as modalidades que a constituem.

Mas além de observar-se a modalidade correta na elaboração de um certame de acordo com a lei, devem-se observar também os princípios que podem ser aplicados ao processo licitatório. Os princípios que regem o processo licitatório serão tema do próximo capítulo.

3 OS PRINCÍPIOS LICITATÓRIOS

Os princípios são considerados os vetores que conduzem as normas a serem interpretadas de forma uniforme. Os princípios podem ser notados nas mais diversas áreas do direito, como na esfera constitucional, civil, penal, trabalhista, entre outros. Ainda sua importância se dá na implementação em conjunto com o ordenamento jurídico brasileiro, dada sua ampla utilização nas decisões proferidas pelos juízes nas mais variadas instâncias do judiciário brasileiro, onde podem ser notadas nas decisões.

Em relação aos princípios da licitação, os mesmo constituem papel importante na observância dos requisitos das diversas modalidades existentes. A lei das licitações possui em seu artigo terceiro os princípios a serem utilizados no âmbito do processo licitatório, que vai da escolha da modalidade correta a ser aplicada a tal situação, indo até a escolha do vencedor do certame estabelecido.

Os princípios na lei das licitações podem ser encontrados no seu artigo terceiro, onde estabelece os seguintes princípios a serem observados:

Art. 3° A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos.

Além dos princípios que a lei nº 8.666/93 atribui à licitação, outros princípios são incluídos pelos principais doutrinadores brasileiros, como o princípio da adjudicação compulsória (Di Pietro 2012 p.382); e ainda os princípios do formalismo, do sigilo na apresentação das propostas e da competividade (Alexandrino, Paulo 2012 p.578, 590, 593).

Como se percebe no artigo terceiro da lei das licitações, os princípios ganham uma importância muito grande na lei das licitações, uma vez que buscam proteger o processo licitatório, o participante do processo licitatório e a sociedade que de certa forma será beneficiada com o tal processo licitatório.

Pode-se notar que os três primeiros princípios que constam no rol do artigo terceiro da lei das licitações se relacionam com a finalidade da licitação, sendo que o restante dos princípios é utilizado para a realização da licitação e o julgamento das propostas que se originam do devido processo.

Portanto, a licitação possui princípios que se originam do mesmo lugar, sendo aplicados nas duas hipóteses demonstradas no parágrafo anterior, mas recebendo denominações diferentes, como por exemplo, o princípio da isonomia e o princípio da igualdade.

3.1 O princípio da isonomia

Esse princípio encontra-se descrito no rol de princípios do artigo terceiro da lei das licitações, sendo que é o único princípio que a licitação utiliza-se de um já existente, pois como podemos notar, no rol de princípios encontra-se descrito como sendo o “princípio constitucional da isonomia”.

O princípio da isonomia se relaciona com o princípio da igualdade, possuindo o mesmo significado perante a doutrina e a lei, sendo afirmado por Di Pietro (2012, p.373), onde a mesma diz que a igualdade entre os licitantes é mencionada duas vezes na lei das licitações, uma nos objetivos da licitação e a outra como um dos princípios expressamente previstos.

O princípio da isonomia encontra-se estabelecido no artigo 5º, CAPUT da Constituição Federal, onde diz que:

Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

O princípio da isonomia vem então a garantir a participação de qualquer pessoa no processo licitatório, sem discriminação. Mas esse princípio não aplica a igualdade que o mesmo proporciona de natureza ao processo licitatório, pois segundo Filho (2010, p.69)

Há equivoco em supor que a isonomia veda diferenciação entre os particulares para contratação com a Administração. É da essência da licitação a adoção de tratamento diferenciado entre os particulares. Assim se impõe por a licitação conduz à seleção de um ou de alguns dos potenciais interessados.

Nota-se então que o referido princípio não é totalmente consolidado dentro da licitação, onde o mesmo pode ser aplicado, segundo Filho (2010, p.69), ao livre acesso do interessado á disputa e para a ampliação da disputa em questão, não havendo a proteção na totalidade aos participantes da licitação.

3.2 O princípio da igualdade

A diferenciação dos participantes da licitação não tem como ser evitada, já que como dito anteriormente, é da natureza da licitação a utilização de tratamento diferenciado entre os participantes. Mas quando esse tratamento diferenciado é demasiadamente desfavorável a alguns participantes, o princípio da igualdade estabelece o limite, visto que segundo Meirelles (2010, p.283) o princípio da igualdade entre os licitantes seria

[...] princípio impeditivo da discriminação entre os participantes do certame, quer através de cláusulas que, no edital ou convite, favoreçam uns em detrimento de outros, quer mediante julgamento faccioso, que desiguale os iguais ou iguale os desiguais (art. 3º, § 1º).

Ou seja, esse princípio não visa a total proteção do processo licitatório, visto que essa proteção já é feita pelo princípio da isonomia. O principal foco desse princípio é proteger os participantes da licitação de qualquer forma de discriminação que possa ocorrer entre eles que acabe favorecendo demasiadamente alguém.

Tal princípio encontra-se estabelecido indiretamente no parágrafo primeiro, inciso I do artigo terceiro da lei das licitações, que diz o seguinte:

§ 1º É vedado aos agentes públicos:

I - admitir, prever, incluir ou tolerar, nos atos de convocação, cláusulas ou condições que comprometam, restrinjam ou frustrem o seu caráter competitivo, inclusive nos casos de sociedades cooperativas, e estabeleçam preferências ou distinções em razão da naturalidade, da sede ou domicílio dos licitantes ou de qualquer outra circunstância impertinente ou irrelevante para o específico objeto do contrato, ressalvado o disposto nos §§ 5o a 12 deste artigo e no art. 3º da Lei no 8.248, de 23 de outubro de 1991;

Constata-se que apesar da lei das licitações estabelecer em seu artigo o princípio da igualdade, no mesmo artigo ainda se demonstram as exceções a tal princípio, que se encontram, como já demonstrado anteriormente, nos parágrafos quinto ao décimo segundo do artigo terceiro da lei das licitações e no artigo terceiro da lei nº 8.248 de 23 de outubro de 1991.

Ainda, Meirelles (2010, p.284, grifo do autor) salienta que a desigualdade em alguns casos visa a trazer benefícios ao processo licitatório, onde o mesmo diz que se pode estabelecer no processo licitatório

[...] requisitos mínimos de participação no edital ou convite, porque a Administração pode e deve fixa-los sempre que necessários à garantia da execução do contrato, à segurança e perfeição da obra ou serviço, à regularidade do fornecimento ou ao atendimento de qualquer outro interesse público.

Esse requisito de não igualdade demostrado anteriormente tem por objetivo a garantia do cumprimento do serviço de acordo com o esperado pela Administração Pública, onde, caso não utilizada para a realização de fraude, é muito benéfica para a sociedade.

3.3 Princípio da seleção da proposta mais vantajosa para a Administração

O princípio da seleção da proposta mais vantajosa para a Administração encontra-se prevista no artigo terceiro da lei das licitações. Para obtermos uma idéia do que este princípio significa, devemos ler o artigo 45 da lei das licitações, mais especificamente o seu parágrafo primeiro, inciso I, que diz o seguinte:

Art. 45 - O julgamento das propostas será objetivo, devendo a Comissão de Licitação ou o responsável pelo convite realizá-lo em conformidade com os tipos de licitação, os critérios previamente estabelecidos no ato convocatório e de acordo com os fatores nele referidos, de maneira a possibilitar sua aferição pelos licitantes e pelos órgãos de controle.

§ 1º - Para os efeitos deste artigo, constituem tipos de licitação, exceto na modalidade concurso:

I - a de menor preço - quando o critério de seleção da proposta mais vantajosa para a Administração determinar que será vencedor o licitante que apresentar a proposta de acordo com as especificações do edital ou convite e ofertar o menor preço;

De acordo com esse artigo, podemos concluir que tal princípio tem a ver com o meio utilizado como objeto de julgamento, ou seja, tomando como exemplo o artigo transcrito acima, quando a licitação for à de menor preço, a proposta mais vantajosa para a Administração será a que for oferecida com o menor custo. Outro exemplo seria a modalidade leilão, que tem como objetivo a venda de bens públicos pelo maior preço ofertado, onde a proposta mais vantajosa vai ser considerada o maior lance dado sob o bem, objeto do leilão.

3.4 Princípio da promoção do desenvolvimento sustentável

Este princípio, citado apenas por Di Pietro (2012, p.383) também é por ela denominada princípio da licitação sustentável, onde poderia se dizer que por meio do procedimento licitatório seria possível incentivar a preservação do meio ambiente.

Tal princípio adveio da implantação da emenda constitucional nº 42/2003, que alterou o artigo 170, inciso VI, que diz o seguinte em sua redação:

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação;

Então o referido artigo por analogia acaba protegendo a licitação que trata diferenciadamente aquele que, por exemplo, oferece produto mais danoso do que seu concorrente, assim não ferindo o princípio da igualdade no processo licitatório.

Desse modo, com o artigo descrito acima, segundo Di Pietro (2012, p.384), tal artigo na Constituição Federal seria considerado como o

[...] fundamento constitucional para as chamadas licitações sustentáveis ou licitações verdes, em que combinam os objetivos tradicionais da licitação (de buscara a melhor proposta para a Administração e garantir a isonomia aos licitantes) com o desenvolvimento sustentável, que procura preservar o meio ambiente, em harmonia com fatores sociais e econômicos.

Percebe-se com o descrito acima que a licitação não só tem por objetivo a aquisição de qualquer tipo de material utilizando se de critérios objetivos, como menor preço, melhor produto, distância do local de aquisição, entre outros. A licitação ainda se utiliza de critérios que, como à exemplo do impacto ambiental, preserve não só o dinheiro público, mas também a vida em sociedade, deixando-a o mais sustentável possível.

3.5 Princípio da legalidade

Verifica-se que muitos autores não possuem um conceito deste princípio na parte de suas obras que os mesmos dedicam às licitações, pois o princípio da legalidade já é abordado pelos autores quando falam dos princípios da Administração Pública.

O princípio da legalidade, além de ser um dos principais princípios que regem a Administração Pública, também é um dos principais princípios do processo licitatório, onde a sua principal consequência se não for atendido e a sua principal função , segundo Gasparini (2010, p. 61) seria deixar

[...] a Administração Pública, em toda a sua atividade, presa aos mandamentos da lei, deles não podendo afastar, sob pena de invalidade do ato e responsabilidade de seu autor. Qualquer ação estatal sem o correspondente calço legal, ou que exceda o âmbito demarcado pela lei, é injurídica e expõe-se a anulação.

Assim, vê se a importância da observância da lei das licitações pelo administrador sob a ótica deste princípio, já que qualquer desrespeito ao mesmo acaba por anular o processo, devido a não observância da lei para a realização desse procedimento.

Di Pietro (2012, p.379, grifo do autor), ressalta a importância deste princípio no processo licitatório, pois

[...] esta constitui um procedimento inteiramente vinculado à lei; todas as suas fases estão rigorosamente disciplinadas na Lei nº 8666/93, cujo artigo 4º estabelece que todos quantos participarem da licitação promovida pelos órgãos ou entidades a que se refere o artigo 1º têm direito público subjetivo à fiel observância do pertinente procedimento estabelecido na lei.

Assim como o princípio da igualdade cuida da observância do tratamento dos participantes de maneira igual dentro do processo licitatório, o princípio da legalidade vem buscar que isso se confirme, utilizando se do texto legal já existente, apenas fazendo que o administrador realize o processo licitatório em estrita observância ao disposto na lei, assim impedindo o tratamento desigual e ainda que o realizador do certame faça tal procedimento uma maneira que tenha a disposição para realizar atos ilícitos em seu favor, como no beneficiamento de compadres no processo licitatório, por exemplo.

3.6 Princípio da impessoalidade

O princípio da impessoalidade no processo licitatório constitui-se em ótimo mecanismo para que as pessoas participantes da licitação não sejam tratadas de formas desiguais, não se valendo da pessoa em si para julgar um processo licitatório, mas valendo da proposta que a mesma apresentou. Ou seja, a análise deve ser objetiva, levando em conta o processo licitatório, e não o participante da mesma.

Tal princípio é ressaltado por Di Pietro (2012, p. 379), onde diz o seguinte quanto ao objetivo de tal princípio, que seria onde

[...] todos os licitantes devem ser tratados igualmente, em termos de direitos e obrigações, devendo a Administração, em suas decisões, pautar-se por critérios objetivos, sem levar em consideração as condições pessoais do licitante ou as vantagens por ele oferecidas, salvo se expressamente previstas na lei ou instrumento convocatório.

Tal princípio, de acordo com o transcrito acima, visa a impedir que as vantagens pessoais, como os subornos, propinas, entre outros, venham a corromper com um importante mecanismo de compra e venda que a Administração Pública possui.

Uma importante característica que este princípio defende, segundo Bandeira (2012, p.542) é o julgamento dos participantes da licitação de forma neutra, avaliando os participantes de forma objetiva, ou seja, de acordo com os critérios que são previamente estabelecidos em lei, e não pela vontade e pela convicção subjetiva que o Administrador possa usar para o benefício de um participante no processo licitatório. Outra importante característica seria o interesse público, onde se alia a finalidade à impessoalidade, assim, quando o Administrador for redigir um certame para a aquisição de bens, procurará sempre fazê-lo de acordo com o interesse público envolvido, não redigindo a mesma sobre a certeza de beneficiar apenas uma pessoa.

3.7 Princípio da moralidade e da probidade

O princípio da moralidade é outro importante princípio encontrado na lei das licitações, que segundo Di Pietro (2012, p.379 e 380)

[...] exige da Administração comportamento não apenas lícito, mas também consoante com a moral, os bons costumes, as regras de boa administração, os princípios de justiça e de equidade, a ideia comum de honestidade.

Percebe-se com o que foi exposto anteriormente que a idéia deste princípio seria a de constar que a licitação além de ter requisitos legais e objetivos, possui também requisitos subjetivos, os quais o administrador deve-se utilizar, tanto na sua atuação como no seu comportamento para que o certame a ser elaborado pelo mesmo se estabeleça e funcione da forma como o princípio em questão protege.

Vários autores citam ainda que tal princípio encontra-se em consonância com o princípio da probidade, como Bandeira (2012, p. 547) menciona que o princípio da probidade, que traduz a idéia de que a licitação deva ser elaborada e mantida de acordo com o princípio da moralidade.

Para Di Pietro (2012, p. 380), o princípio da probidade nada mais é que a honestidade na forma de proceder.

Assim sendo, caso o Administrador desrespeite o princípio da moralidade, acaba também de certa forma desrespeitando o princípio da probidade, onde esse princípio traz em lei própria (lei nº 8.429/1992) punições a quem praticar a chamada “improbidade administrativa”.

A lei nº 8.666/93 cita em seu artigo tanto o princípio da moralidade como o princípio da probidade. Os dois princípios, apesar de parecidos, não estão citados lá por qualquer razão, sendo que Di Pietro (2012, p.380, grifo do autor), diz que

A lei nº 8.666/93 faz referência à moralidade e a probidade, provavelmente porque a primeira, embora prevista na Constituição, ainda constitui um conceito vago, indeterminado, que abrange uma esfera de comportamentos ainda não absorvidos pelo direito, enquanto a probidade ou, melhor dizendo, a improbidade administrativa já tem contornos bem mais definidos no direito positivo, tendo em vista que a Constituição estabelece sanções para punir os servidores que nelas incidirem (art. 37, §4º).

Pode-se concluir que o princípio da probidade seria mais completo, pois prevê sanções em caso de desrespeito a esse princípio, diferente da moralidade que está apenas previsto para ser respeitado, não prevendo qualquer sanção ao seu não respeito.

3.8 Princípio da publicidade

O princípio da publicidade encontra-se expresso, como já visto anteriormente, no artigo terceiro da lei nº 8.666/93, encontrando-se mais bem definida no parágrafo terceiro do mesmo artigo, onde diz que “a licitação não será sigilosa, sendo públicos e acessíveis ao público os atos de seu procedimento, salvo quanto ao conteúdo das propostas, até a respectiva abertura”.

Sendo assim, tal princípio revela a publicidade de seus atos, como veremos a seguir, sendo que Alexandrino, Paulo (2012, p.578 e 579) demonstram o objetivo desse princípio, o qual considera que

[...] é permitir o acompanhamento e a fiscalização do procedimento, não só pelos licitantes, como também pelos diversos órgãos de controle interno e externo e pelos administrados em geral. Estes podem sustar ou impugnar quaisquer atos lesivos à moralidade administrativa ou ao patrimônio público, representar contra ilegalidades ou desvios de poder, apresentar denúncias ao Ministério Público, aos tribunais de contas etc.

Percebe-se com o declarado acima a importância desse princípio, o qual os cidadãos e os órgãos competentes conseguem fiscalizar os atos e o andamento correto do certame, para ver se o mesmo está seguindo os padrões estabelecidos e atendendo aos requisitos da lei, sendo então um princípio muito importante para o impedimento de fraudes e do mau uso do processo licitatório, já que se os atos fossem praticados em sigilo seria mais difícil para qualquer órgão ou cidadão fiscalizar.

Uma importante utilização deste princípio é dada por Meirelles (2010, p.283), onde o autor relata o princípio da publicidade com um foco maior na publicidade dos atos do processo licitatório, sendo que esse princípio

[...] abrange desde os avisos de sua abertura até o conhecimento do edital e seus anexos, o exame da documentação e das propostas pelos interessados pelo fornecimento de certidões de quaisquer peças, pareceres ou decisões com ela relacionadas.

Assim, esse princípio tem uma ampla área de abrangência, tendo todo o processo licitatório à proteção do princípio da publicidade, ressalvado o caso das propostas antes de abertas, as quais devem se manter em sigilo até a data prevista para a abertura.

3.9 Princípio da vinculação ao instrumento convocatório

O princípio da vinculação ao instrumento convocatório encontra-se disposto na lei das licitações no seu artigo terceiro, de onde não se extrai a essência desse princípio, ou seja, sua finalidade. Mas na lei das licitações pode-se encontrar esse princípio explicitado no artigo 41, que diz que “a Administração não pode descumprir as normas e condições do edital, ao qual se acha estritamente vinculada”.

Segundo Bandeira (2012, p.547) tal princípio “obriga a Administração a respeitar estritamente as regras que haja previamente estabelecido para disciplinar o certame [...]”.

Este princípio, além de obrigar a Administração ao instrumento convocatório, ainda obriga os participantes do processo licitatório, já que estes, segundo Di Pietro (2012, p.381) “não podem deixar de atender aos requisitos do instrumento convocatório”.

Assim verifica-se que tal princípio vem a proteger o motivo ou objetivo dado a aquele certame, como podemos citar, por exemplo, a realização de licitação para a aquisição de três tratores com oitenta cavalos de potência, sendo que posteriormente vence a licitação quem ofereceu pelo menor preço cinco tratores com setenta cavalos de potência. Neste caso, vemos um completo desrespeito ao procedimento licitatório, visto que além da entrega de produto diferente ao discriminado no instrumento convocatório, ainda deixou de fora interessados que certamente ofereceram suas propostas de acordo com o instrumente convocatório.

Tal princípio é tão importante no processo licitatório que caso seja verificado alguma afronta a tal princípio, todo o processo licitatório poderá ser considerado nulo (Di Pietro, 2012, p.381).

Meirelles (2010, p.285) destaca ainda que caso haja qualquer problema com algum dos requisitos do edital, como a invalidade de algum deles, deverá invalidar o referido processo licitatório e reabri-lo novamente, tudo para preservar tal princípio. Ainda explicita que o edital é a lei interna da licitação, onde, além do processo licitatório ter que se ater e respeitar o que está disposto na lei nº 8.666/93, deve respeitar ao que consta no próprio edital que previu e estabeleceu tal certame.

3.10 Princípio do julgamento objetivo

O princípio do julgamento objetivo faz menção ao julgamento das propostas, que deve ser de acordo com alguns critérios previstos na lei das licitações. Tais critérios podemos observar na leitura do artigo 45 da lei nº 8.666/93, que diz o seguinte quanto ao julgamento objetivo do processo licitatório

Art. 45. O julgamento das propostas será objetivo, devendo a Comissão de licitação ou o responsável pelo convite realizá-lo em conformidade com os tipos de licitação, os critérios previamente estabelecidos no ato convocatório e de acordo com os fatores exclusivamente nele referidos, de maneira a possibilitar sua aferição pelos licitantes e pelos órgãos de controle.

Gasparini (2010) ressalta que tal princípio atribui à Administração Pública o dever de seguir os critérios previamente fixados no ato de convocação, assim evitando-se o subjetivismo por parte da Administração Pública. O mesmo autor ainda salienta que o critério objetivo seria aquele que não faz jus a uma justificativa pelo simples fato de ser escolhido, onde apenas pelas normas do instrumento convocatório, já é possível saber o vencedor.

Portanto, pelo artigo 45 da lei das licitações, observamos que o princípio do julgamento objetivo visa proteger o participante da licitação, uma vez que obriga o licitante a julgar um processo licitatório levando em conta o tipo de licitação empregada, os critérios estabelecidos no instrumento convocatório, dentre outras.

Di Pietro (2012) ainda ressalta que o julgamento objetivo não se aplica as modalidades que se encontram fora do rol do parágrafo primeiro do artigo 45, sendo o rol taxativo.

Mas diante do princípio do julgamento objetivo, existem exceções, como as apontadas por Bandeira (2012, p. 547), que diz o seguinte

[...] objetividade absoluta só se pode garantir previamente nos certames decididos unicamente pelo preço. Quando entram em causa qualidade, técnica, rendimento [...] nem sempre será possível atingir-se o ideal da objetividade extrema, pois, quando os bens ou serviços são fortemente aparentados nestes atributos, a primazia de um de outro depende de apreciações irredutíveis a um plano excludente de opiniões pessoais.

O autor, com o disposto acima, só veio a confirmar que os tipos de licitação que não estão dispostas no rol do parágrafo primeiro do artigo 45 não estão sujeitas somente ao critério objetivo de julgamento, mas também ao critério subjetivo.

3.11 Princípio da adjudicação compulsória

O princípio da adjudicação compulsória é citado por Meirelles (2010) como sendo um principio onde garante ao final do certame que seja atribuída somente ao vencedor o objeto da licitação, e não a outro participante do processo licitatório em questão.

O objeto da licitação deve ser garantido a quem, levando em conta os critérios e o tipo da licitação, vencer o certame, onde a Administração Pública não pode atribuir tal objeto a outrem.

A única maneira do princípio da adjudicação compulsória não ser de plano aplicado é, segundo Meirelles (2010), quando o vencedor, após a divulgação do resultado, desistir expressamente do objeto da licitação ou caso não cumpra com o objeto da licitação no tempo fixado pelo edital. A única maneira, caso o vencedor do certame de retornar ao processo licitatório caso prejudicado pela perda do prazo seria apresentando um justo motivo para que o mesmo continuasse como vencedor.

Com o explicado acima, a adjudicação compulsória dá a ideia de que a partir do momento que o processo licitatório tem um vencedor, a Administração Pública está obrigada com ele a cumprir o contrato no certame estipulado. Mas segundo Di Pietro (2012, p.382) este conceito está equivocado, pois

[...] a revogação motivada pode ocorrer a qualquer fase da licitação. Tem-se que entender o princípio no sentido de que, se a Administração levar o procedimento a seu termo, a adjudicação só pode ser feita ao vencedor; não há um direito subjetivo à adjudicação quando a Administração opta pela revogação do procedimento.

Isto nos demonstra a idéia de que a Administração pode revogar o processo licitatório a qualquer momento, desde que tenha um motivo, não sendo pelo simples fato de ter revogado a licitação que a mesma se obriga a adjudicar o objeto do procedimento licitatório ao vencedor no momento da revogação.

Meirelles (2010) ainda lembra que com a homologação e a adjudicação do objeto do processo licitatório, se dá fim a fase da licitação, onde a partir desse ponto começa-se a elaboração do contrato.

3.12 Princípio do formalismo

O princípio do formalismo se constitui um dos princípios mais importantes da licitação. Um conceito sobre tal princípio é dado de forma clara por Meirelles (2010, p.282, grifo do autor), que diz o seguinte quanto a este princípio

[...] é o que impõe a vinculação da licitação às prescrições legais que a regem em todos os seus atos e fases. Essas prescrições decorrem não só da lei mas, também, do regulamento, do caderno de obrigações e até do próprio edital ou convite, que complementa as normas superiores, tendo em vista a licitação a que se refere( Lei 8.666/93, art. 4º).

Com a citação acima, podemos observa que tal princípio visa a garantir à observância de procedimentos fixados anteriormente a elaboração do processo licitatório, com o intuito de garantir um processo licitatório uniforme.

O artigo quarto da lei das licitações já expõe esse princípio, onde fala o seguinte quanto a sua observância pela Administração Pública

Art. 4o Todos quantos participem de licitação promovida pelos órgãos ou entidades a que se refere o art. 1º têm direito público subjetivo à fiel observância do pertinente procedimento estabelecido nesta lei, podendo qualquer cidadão acompanhar o seu desenvolvimento, desde que não interfira de modo a perturbar ou impedir a realização dos trabalhos.

Neste artigo podemos observar que qualquer participante pode fiscalizar a correta observância da aplicação da lei das licitações e demais normas ao processo licitatório em questão, onde podemos assim perceber que a Administração Pública está simplesmente obrigada a seguir o procedimento previsto para o processo licitatório.

Mas a Administração Pública não é a única obrigada a respeitar este princípio. Gasparini (2010) comenta que os participantes da licitação, ou seja, aqueles que oferecem o seu produto ou serviço na licitação também estão obrigados a respeitar este princípio em qualquer fase do processo licitatório, haja visto que também estão subordinados as normas vigentes sobre o processo licitatório.

3.13 Princípio do sigilo na apresentação das propostas

O princípio do sigilo na apresentação das propostas encontra-se elencado indiretamente no parágrafo terceiro do artigo terceiro da lei das licitações, que diz o seguinte em relação a este princípio

§ 3o A licitação não será sigilosa, sendo públicos e acessíveis ao público os atos de seu procedimento, salvo quanto ao conteúdo das propostas, até a respectiva abertura.

Como se verifica na redação do artigo, o princípio visa a proteger o participante da licitação que apresenta sua proposta em relação aos próximos que apresentarão as propostas, já que a abertura antecipada da proposta apresentada por um interessado pode prejudicar quem apresentou tal proposta e beneficiar alguém que esteja querendo ilicitamente se valer da sua esperteza, junto com a Administração Pública, para fraudar o processo licitatório.

Meirelles (2010, p.285, grifo do autor) destaca a importância deste princípio para a igualdade dos participantes do processo licitatório, já considerando que

[...] ficaria em posição vantajosa o proponente que viesse a conhecer a proposta de seu concorrente antes da apresentação da sua . Daí o necessário sigilo, que há de ser guardado relativamente a todas as propostas, até a data designada para a abertura dos envelopes [...].

O princípio é de tal importância que sua inobservância constitui crime, segundo Alexandrino, Paulo (2012, p.590), onde declaram que o princípio do sigilo na apresentação das propostas “é de tal importância que constitui crime sua violação, como consta no art. 94 da lei”.

3.14 Princípio da competitividade

O princípio da competitividade pode ser considerado como um princípio aliado da Administração Pública, já que o mesmo, segundo Alexandrino, Paulo (2012, p. 593), considera que apenas

o procedimento em que haja efetiva competição entre os participantes, evitando manipulações de preços, será capaz de assegurar à administração a obtenção da proposta mais vantajosa para a consecução e seus fins.

Então é importante que o princípio seja observado, já que sua inobservância pode causar a ineficiência do processo licitatório, levando em conta que seu objetivo, que é o de aquisição de produtos ou serviços pelo menor preço, não ser alcançado.

Um artigo da lei das licitações que analogicamente pode ser aplicado a tal princípio seria o artigo sétimo, parágrafo quinto da lei das licitações, onde diz que

§ 5º É vedada a realização de licitação cujo objeto inclua bens e serviços sem similaridade ou de marcas, características e especificações exclusivas, salvo nos casos em que for tecnicamente justificável, ou ainda quando o fornecimento de tais materiais e serviços for feito sob o regime de administração contratada, previsto e discriminado no ato convocatório.

Visualizando tal artigo, pode-se ver que existe exceções a tal princípio, onde caso, por exemplo, se tenha um medicamento onde há apenas um fabricante, ou onde uma empresa que ganhou uma licitação adquira material necessário para a construção de um prédio por conta própria, desde que conste no ato convocatório.

Gasparini (2010) faz uma ressalva de tal princípio, dizendo que nem todas as licitações onde apenas um interessado apresentar proposta ou restar ao final do procedimento licitatório serão fraudulentas no ponto de vista do princípio da competitividade, já que uma licitação que conste cláusulas que não restrinjam a participação de interessados é totalmente válida.

Percebe-se que tal princípio visa a proteger a competitividade do processo licitatório, já que um processo licitatório sem competição descaracterizaria totalmente o instituto da licitação, não havendo motivos para a sua utilização.

Portanto, vê-se que a licitação possui dos mais variados princípios, visto que ela constitui-se em um grande procedimento para aquisição de materiais pela Administração Pública. Mas como qualquer procedimento, os erros e problemas aparecem do nada, apesar do grande complexo de normas que protegem o processo licitatório. A modalidade concorrência, sendo a modalidade que envolve os maiores valores, é a que mais apresenta problemas. Esses problemas, aliados aos princípios licitatórios vão ser objeto de análise do capítulo a seguir, onde serão apresentadas jurisprudências para demonstrar os principais impasses decorrentes do desrespeito aos princípios licitatórios.

4 OS IMPASSES APRESENTADOS NA LICITAÇÃO, MODALIDADE CONCORRÊNCIA, EM FACE AOS PRINCÍPIOS LICITATÓRIOS

Como se observa nos capítulos anteriores, a licitação se constitui num importante mecanismo que a Administração Pública dispõe para a aquisição e alienação de bens, uma vez que, tanto na aquisição quanto na alienação estão sempre presentes interesses e contribuições da sociedade.

O direito administrativo, que traz o suporte para a atuação da Administração Pública, é norteado por vários princípios, para que os atos praticados pelo Administrador Público tenham um parâmetro a ser seguido. Com a licitação não poderia ser diferente, já que se constitui num processo complexo. Pode- se notar no artigo terceiro da lei nº 8.666/93 que a mesma destina a licitação a observar vários princípios importantes, para que erros, equívocos e principalmente, o desvio da finalidade da licitação para a utilização de outros modos abusivos não seja realizado.

Ocorre que, mesmo com a vasta lei que norteia a licitação, muitos Administradores quanto participantes desrespeitam a mesma lei, achando que a licitação está disposta para atender a interesses próprios, e não interesses coletivos, para a qual ela existe.

A modalidade a ser analisada será a Concorrência, devido à mesma envolver os maiores valores de compra e venda de bens, o que de certo modo, abre os olhos de quem tem interesse na participação do certame para se aproveitar ilicitamente da mesma.

Assim, neste capítulo serão analisados os principais impasses decorrentes da utilização incorreta da licitação para os interesses individuais, levando como parâmetro a desobediência, na modalidade concorrência, os princípios licitatórios elencados no artigo terceiro da lei nº 8.666/93, bem como ainda o princípio da competitividade, onde será apresentado o princípio a ser analisado e a seguir será feita a análise dos impasses encontrados.

4.1 Princípio da isonomia na concorrência

O princípio da isonomia, como já assinalado, constitui um princípio constitucional aplicável ao direito administrativo, e no caso em questão ao processo licitatório. Tal princípio é definido como uma garantia de tratamento igualitário entre os participantes do processo licitatório.

Analisando a jurisprudência atual, encontra-se um caso onde o poder judiciário teve que proceder a aplicação do princípio da isonomia ao processo em questão, senão vejamos no acórdão proferido por Cassiano (2007, http://www.tjrs.jus.br/), onde relata

AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONCORRÊNCIA. CONCESSÃO DE SERVIÇO PÚBLICO DE TRANSPORTE URBANO DE PASSAGEIROS. MUNICÍPIO DE CAPÃO DA CANOA. No caso, o não fornecimento, pelo Departamento de Trânsito do Município de Capão da Canoa, dos dados necessários para a elaboração de planilha de custo de tarifa tempestivamente requeridos, indica que a ora recorrente está sendo indevidamente preterida na licitação descrita na petição inicial, o que provoca a irregularidade do certame, por afronta à isonomia. E ainda que assim não fosse, o próprio procedimento supracitado, segundo o qual será disponibilizado, mediante requerimento, para cada interessado em separado, documento no qual constam os dados necessários para a elaboração da proposta de tarifa não permite que um licitante fiscalize os dados que foram fornecidos a outro licitante, bem como dificulta sobremaneira eventual atuação fiscalizatória dos munícipes ou do Ministério Público, o que revela afronta ao princípio da publicidade. RECURSO PROVIDO, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO. UNÂNIME. (Agravo de Instrumento Nº 70021999685, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Adão Sérgio do Nascimento Cassiano, Julgado em 19/12/2007) (Grifos originais).

Na decisão citada acima, percebe-se que o impasse encontrado na referida concorrência ocorreu quando o Departamento de Trânsito de Capão da Canoa não forneceu uma planilha para o cálculo dos custos da tarifa do transporte público de passageiros, onde o legislador entendeu que esse não fornecimento constitui-se um afronto ao princípio da isonomia.

Analisando o acórdão acima mencionado, observa-se que o desembargador concluiu que ao requerer que cada participante da licitação deveria individualmente retirar a planilha, o Administrador estaria tentando favorecer algum dos participantes da licitação, já que poderia disponibilizar um tipo de planilha para um participante e outro tipo de planilha para outro participante, assim, tratando de modo diverso os participantes do processo licitatório.

Portanto, de acordo com os impasses ocasionados na concorrência, levando em consideração o princípio da isonomia, tal princípio visa a proteger o licitante que de maneira diferente for tratado no processo licitatório, desde que esse tratamento diferenciado cause a ele prejuízo, já que se não há prejuízo para qualquer das partes, não há por que se falar em desobediência ao princípio da isonomia.

4.2 Aplicação do princípio da seleção da proposta mais vantajosa para a Administração na concorrência

O princípio da seleção da proposta mais vantajosa é outro princípio importante previsto na lei das licitações. Como já demonstrado no capítulo anterior, tal princípio constitui-se como obrigatório ao Administrador na averiguação da aplicação do tipo certo de licitação ao caso real, ou seja, quando a modalidade for à de concorrência para a aquisição de um bem por menor preço, a proposta mais vantajosa a ser considerada pela Administração Pública será aquela que tiver o menor preço, assim, atendendo ao disposto na lei e no instrumento convocatório.

Mas na concorrência, este princípio apresenta também impasses em função de seu entendimento, como demonstra Heinz (2008, http://www.tjrs.jus.br/) no acórdão em seguida colocado

AGRAVO DE INSTRUMENTO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. AÇÃO ANULATÓRIA DE ATO ADMINISTRATIVO. EDITAL. COMBINAÇÃO DO CRITÉRIO DE MAIOR OFERTA COM A MELHOR TÉCNICA. SERVIÇO DE TRANSPORTE COLETIVO. DISCRIMINAÇÃO DE LINHAS. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. A delegação de concessão ou permissão de serviço público pelo Poder Público está subordinada ao princípio da obrigatoriedade de prévia licitação, no escopo de assegurar a igualdade de condições a todos os concorrentes e a seleção da proposta mais vantajosa (CF, artigos 37, XXI e 175, Lei nº 8.666/93, artigos 1º, 2º e 3º e Lei nº 8.987/95, art. 40). A fixação prévia de um critério para o julgamento da licitação constitui imposição legal e visa atender ao princípio do julgamento objetivo (art. 37, caput, da CF, e art. 3º da Lei nº 8.666/93). Não se pode fixar em doutrina um critério único para o julgamento das propostas, visto que os interesses predominantes da Administração variam em cada licitação. É taxativamente permitida no julgamento da licitação, a combinação do critério de maior oferta pela outorga da concessão, com o de melhor proposta técnica (art. 15, inciso VI, da Lei nº 8.987/95). Discriminação das linhas para os serviços licitados que permite a fácil memorização. Evidente a ausência de qualquer nulidade no ato convocatório da concorrência para a outorga de serviço público de transporte coletivo urbano convencional e especial. Agravo provido. (Agravo de Instrumento Nº 70020093175, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marco Aurélio Heinz, Julgado em 26/03/2008) (Grifo original).

Como observa-se na jurisprudência elencada acima, percebe-se que houve um impasse a cerca do princípio em discussão, já que a empresa de transportes participante da licitação tentou anular a licitação alegando que com os critérios adotados pela Administração de Cachoeirinha para a realização da licitação, como a discriminação das linhas a serem atendidas no serviço de transporte coletivo urbano, e o critério de julgamento pela melhor proposta de preço e melhor técnica a deixariam impedida de participar da licitação.

Pelo o que percebe-se no referido acórdão, a Administração de Cachoerinha fez essa diferenciação a fim de possibilitar um processo licitatório mais claro, colocando no edital dois tipos de análises das propostas para que a licitação pudesse ser mais aproveitável para a Administração.

O impasse a cerca do princípio da seleção da proposta mais vantajosa encontra-se no momento em que foi requerida a anulação pelo fato de prever dois tipos de julgamento, o que o magistrado achou incoerente, já que a presença de dois tipos de julgamento das propostas caracteriza um melhor resultado para a Administração Pública e para a sociedade que usufruirá do serviço.

4.3 O princípio da legalidade na concorrência

O princípio da legalidade, como já abordado anteriormente, não é abordado de forma direta por doutrinadores na parte das licitações, mas sim na parte geral, pois o princípio da legalidade é um dos princípios do Direito Administrativo.

Mas o referido princípio pode ser aplicado à licitação, onde visa a garantir que a licitação se baseie para sua elaboração, utilização e resultado a lei, onde o Administrador ao realizar qualquer ato no processo licitatório deve estar atento à lei para ver se tal ato é previsto, sob pena do ato ser inválido.

Mesmo sendo um princípio importante, tanto para o Direito Administrativo quanto para as licitações, não é difícil de encontrar casos de concorrência onde houve impasses com base nesse princípio. É o que se percebe no acórdão proferido por Moesch (2010, http://www.tjrs.jus.br/), que relata o seguinte

REEXAME NECESSÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. LICITAÇÃO E CONTRATO ADMINISTRATIVO. NULIDADE DO EDITAL. PREVISÃO DO SALÁRIO DOS GARIS ABAIXO DO SALÁRIO MÍNIMO NACIONAL E DO PISO SALARIAL DA CATEGORIA. INFRINGÊNCIA AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. DIREITO LÍQUIDO E CERTO CONFIGURADO. SEGURANÇA CONCEDIDA. ANULAÇÃO DA CONCORRÊNCIA Nº 02/2010. SENTENÇA CONFIRMADA EM REEXAME NECESSÁRIO. (Reexame Necessário Nº 70039398284, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Francisco José Moesch, Julgado em 01/12/2010) (Grifo original).

Como percebe-se no referido acórdão, a licitação foi anulada por não obedecer ao princípio da legalidade, onde no caso em questão, o salário mínimo a ser pago para a função de gari era abaixo do salário mínimo nacional vigente, o que fere uma norma onde o valor do salário mínimo é disposto, assim, ferindo-se o princípio da legalidade no caso em questão.

Outro impasse ao princípio da legalidade pode-se perceber no acórdão proferido por Difini (2007, http://www.tjrs.jus.br/), que diz o seguinte

APELAÇÃO CÍVEL. LICITAÇÃO E CONTRATO ADMINISTRATIVO. INABILITAÇÃO. Participação em processo licitatório de concorrência. Não-apresentação da documentação exigida. Previsão editalícia acerca da inabilitação do licitante em caso de não-apresentação da documentação exigida ou apresentação em forma diversa da estabelecida no instrumento convocatório. Legalidade da inabilitação. Princípio da legalidade e da vinculação ao edital. APELO IMPROVIDO. (Apelação Cível Nº 70020515946, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Silveira Difini, Julgado em 05/09/2007) (Grifo original).

Neste acórdão, ao contrário do primeiro apresentado, percebe-se que o impasse veio de quem participou da licitação, onde não apresentou os documentos requeridos pelo edital e pela lei das licitações, assim gerando a sua inabilitação no referido processo, já que não observou uma previsão da lei das licitações que obriga à apresentação dos requisitos necessários a participação do certame, onde assim não respeitou o princípio da legalidade.

Assim mostra-se claramente que todos os atos devem ser praticados conforme previstos em lei, onde caso esses atos não sejam respeitados, caracteriza afronta ao princípio da legalidade do processo licitatório.

4.4 O princípio da impessoalidade na concorrência

O princípio da impessoalidade, conforme já explicado no capítulo anterior, refere-se na hora da participação do processo licitatório, onde o Administrador que promoveu o certame deve levar em conta no processo licitatório não a pessoa que esta participando, e sim o que a mesma apresenta para aquele processo, como por exemplo, na apresentação das propostas para o julgamento, o que deve ser considerado é a proposta, e não a pessoa que apresentou tal proposta. Assim, o Administrador deve ser objetivo na avaliação da proposta apresentada.

Esse princípio, apesar de ser respeitável, também apresenta impasses, como percebe-se no acórdão proferido por Rovani(1998, http://www.tjrs.jus.br/), que diz o seguinte na ementa a seguir

DIREITO ADMINISTRATIVO. VENDAS DAS ACOES DA CORSAN. CONCORRENCIA. DIREITOS DE LICITAR E CONTRATAR. DIFERENCAS. MOMENTO DE EXCLUIR DO CERTAME O CONCORRENTE INABILITADO. DECISAO REFORMADA. 1. AS RESTRICOES AO DIREITO DE LICITAR SAO AS LEGAIS, DADO QUE A LICITACAO TEM O CARATER GERAL, E NAO LIMITADO, SOB PENA DE A ADMINISTRACAO INCORRER NA OFENSA AO PRINCIPIO DA IMPESSOALIDADE (CF, ART. 37). 2. NAO SE PODE EXCLUIR "A PRIORI", ANTES DA ABERTURA DAS SOBRECARTAS DAS PROPOSTAS, NENHUM CONCORRENTE. 3. A FASE DA HABILITACAO, OU SEJA, A FASE DE ABERTURA DAS SOBRECARTAS, E O MOMENTO DO EXPURGO, VALE DIZER, O MOMENTO EM QUE A ADMINISTRACAO TEM CONDICOES DE DECLARAR A IDONEIDADE E A CAPACIDADE PARA LICITAR DE CADA UM DOS CONCORRENTES, COM BASE NO ART. 27 E SEGUINTES E 43 DA LEI N. 8666, DE 21.6.L993 E NO PROPRIO EDITAL. PRELIMINAR REJEITADA. RECURSO PROVIDO. (Agravo de Instrumento Nº 598022028, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Celeste Vicente Rovani, Julgado em 27/05/1998) (Grifo original).

Como se observa na decisão acima, o impasse ocorreu quando a Corsan começou a excluir do certame alguns concorrentes, sem sequer analisar o que os mesmos haviam colocado em suas propostas.

Nessa esteira, percebe-se que a Corsan levou em consideração a pessoa que estava participando, e não a proposta que a mesma havia apresentado, assim infringindo claramente o princípio da impessoalidade, já que excluiu do certame os participantes ante sequer mesmo ter aberto a proposta apresentada por ela.

Outro impasse ao princípio da impessoalidade pode ser observado no acórdão proferido por Bins (2007, http://www.tjrs.jus.br/), onde diz o seguinte

AGRAVO DE INSTRUMENTO. LICITAÇÃO. SEBRAE. DESCUMPRIMENTO DE ITEM DO EDITAL. REGULAMENTO PRÓPRIO. CANCELAMENTO DO CERTAME. Descumprido item do edital de concorrência por todas as licitantes, mostra-se correta a decisão de cancelamento do certame, tendo a Comissão observado os preceitos legais aplicáveis, bem como o princípio da impessoalidade. RECURSO PROVIDO. (Agravo de Instrumento Nº 70019975333, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rejane Maria Dias de Castro Bins, Julgado em 30/08/2007) (Grifo Original).

Constata-se no caso apresentado acima o impasse a ser encontrado seria um item do edital que feriria o princípio da impessoalidade, certamente onde previa a inabilitação do participante em razão da pessoa e não do que a mesma tinha a apresentar, onde o impasse foi resolvido cancelando-se o certame, afim de ser preservado o princípio da impessoalidade.

4.5 O princípio da moralidade na concorrência

Como visto no capítulo anterior, o princípio da moralidade constitui-se como um princípio que zela pela honestidade da licitação, pela seriedade, pela moral, pelos bons costumes, pela boa forma de administrar, assim, não tornando a licitação um procedimento ilícito. Portanto, é um princípio subjetivo a ser respeitado na licitação.

Como os princípios apresentados até o presente momento, tal princípio também apresenta impasses na utilização do processo licitatório, como vemos no acórdão apresentado por Bins (2010, http://www.tjrs.jus.br/) que diz o seguinte

AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LICITAÇÃO. DISPENSA IRREGULAR. CONVITES DIRECIONADOS A EMPRESAS COM SÓCIOS FAMILIARES. Os agentes políticos submetem-se a diferentes regimes, conforme as condutas imputadas sejam crimes de responsabilidade, crimes comuns, atos administrativos ou civis. Consoante já decidiu o STF, o julgamento da Reclamação nº 2.138 não possui efeito vinculante e nem eficácia erga omnes. Precedentes. A interrupção da prescrição retroage à data da propositura da ação após válida citação. O termo inicial é a data em que o agente público e quem com ele contratou termina o mandato. A dispensa imotivada de licitação, o fracionamento das obras na mesma rua ou em ruas contíguas, superando o total o limite do art. 23, inc. I, da Lei nº 8.666/93, a assinatura simultânea de três desses contratos, sendo o Prefeito advogado e beneficiados dois dos réus, denota a prática de ato de improbidade administrativa, frustrando-se a licitação e a obtenção da melhor proposta para o Município e afrontando-se princípios administrativos da impessoalidade, imparcialidade, isonomia, competitividade, supremacia do interesse público e moralidade. A realização de vários processos de licitação com os mesmos participantes, reiteradas desistências, vencedora sempre a mesma empresa, com relações de parentesco ou identidade de endereços entre elas revela conduta ímproba dos terceiros, afastada a do Prefeito, o qual, no caso, apenas assinou os contratos, inclusive mediante parecer jurídico. Pelo princípio da proporcionalidade, recomenda-se a redução da pena de multa imposta ao ex-Prefeito, mantidas as demais sanções em relação a todos os réus. APELAÇÃO DO RÉU TITO LIVIO JAEGER PROVIDA EM PARTE. APELAÇÃO DOS DEMAIS RÉUS DESPROVIDAS. (Apelação Cível Nº 70037647070, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rejane Maria Dias de Castro Bins, Julgado em 11/11/2010) (Grifos originais).

Diante do exposto acima, percebe-se que o impasse encontrado diante do princípio da moralidade seria nas condutas ilícitas adotadas pela Administração para o favorecimento dos participantes da licitação, onde observa-se que foi violado o princípio da moralidade, já que cometido ato ilícito, apontando-se na jurisprudência em questão a prática da improbidade administrativa, que como ressaltada no capítulo anterior, é o crime de quem desrespeita o princípio da moralidade na licitação.

4.6 O princípio da igualdade da concorrência

Como já apresentado anteriormente, o princípio da igualdade visa a garantir, por obviedade, o tratamento igual dos participantes do processo licitatório. Mas essa proteção é garantida quando uma das partes é tratada de forma demasiadamente desigual, onde isso possa acarretar enorme prejuízo, já que pequenas desigualdades podem ser encontradas no processo licitatório pelo fato de a desigualdade fazer parte do processo.

O referido princípio apresenta impasses, como podemos perceber no acórdão proferido por Filho (2011, http://www.tjrs.jus.br/), que diz o seguinte

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO ADMINISTRATIVO. CARRIS. LICITAÇÃO. CONCORRÊNCIA. CONTRATAÇÃO DE ESCRITÓRIO DE ADVOCACIA. PRINCÍPIOS DA VINCULAÇÃO AO EDITAL E DA IGUALDADE. O instrumento convocatório de licitação não impugnado é soberano, vinculando não apenas os licitantes, mas principalmente a Administração Pública. Análise de titulação na etapa técnica que não segue exatamente o previsto em errata do edital fere os princípios da vinculação e da igualdade entre os licitantes. A titulação acadêmica dos representantes da sociedade de advocacia agravada não guarda relação direta com a área de atuação prevista no lote 02 do edital, mas tão-somente reflexa e subsidiária. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO. (Agravo de Instrumento Nº 70043452416, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Almir Porto da Rocha Filho, Julgado em 10/08/2011) (Grifo original).

Percebe-se que o impasse apresentado no acórdão acima relatado seria no tocante à análise dos títulos, onde a referida análise não seguia nos moldes previstos pelo edital, onde assim, a Administração Pública poderia julgar da maneira como quisesse cada participante do processo licitatório, ou seja, desigualando em chances os participantes da licitação, ferindo o princípio da igualdade.

Outro caso onde se observa um impasse ao princípio seria o acórdão proferido por Júnior (2004, http://www.tjrs.jus.br/), que diz o seguinte

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANCA. LICITAÇÃO. CONCORRÊNCIA PÚBLICA. ATRASO NA ENTREGA DE ENVELOPES CONTENDO PROPOSTAS. INFRINGÊNCIA AO PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE NÃO EVIDENCIADA. INEXISTÊNCIA DO DIREITO LÍQUIDO E CERTO. SUPREMACIA DOS PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE E IGUALDADE. APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação Cível Nº 70007847346, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Antônio Janyr Dall'Agnol Júnior, Julgado em 30/06/2004) (Grifo original).

Nesse caso percebe-se que o impasse se encontra na apresentação intempestiva dos envelopes com as propostas, onde o julgador entendeu que a entrega intempestiva não poderia ser aceita devido à supremacia do princípio da igualdade, onde no caso beneficiaria quem não entregou o envelope a tempo e prejudicaria os participantes que realizaram todos os procedimentos conforme o edital.

4.7 O princípio da publicidade na concorrência

O princípio da publicidade no processo licitatório garante aos participantes a ciência do processo licitatório, onde esse princípio obriga a Administração a divulgar uma licitação de forma mais ampla possível, para que um maior número de interessados possa participar e fiscalizar os atos exercidos no referido processo.

Neste princípio, encontram-se impasses, já que o mesmo é utilizado em todo o processo licitatório. Um dos impasses encontrados seria o que consta no acórdão proferido por Machado (2004, http://www.tjrs.jus.br/) que diz o seguinte

AGRAVO DE INSTRUMENTO. LICITAÇÃO E CONTRATO ADMINISTRATIVO. EDITAL DE CONCORRÊNCIA PÚBLICA. ADEQUAÇÃO AOS DITAMES LEGAIS. SUSPENSÃO DE PROCEDIMENTO LICITATÓRIO. -Publicação de aviso a respeito de prosseguimento do processo licitatório, após suspenso por decisão judicial, indicando quebra do princípio da publicidade, circunstância que se alia à subjetividade das demais questões apontadas na ação cautelar, as quais necessitam de análise probatória aprofundada para a verificação da adequação da licitação aos preceitos legais. -Verossimilhança do direito alegado e possibilidade de maior prejuízo ao patrimônio público, com a continuidade do certame, o que impõe a manutenção da tutela concedida liminarmente. -Agravo não provido. (Agravo de Instrumento Nº 70007972631, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Leila Vani Pandolfo Machado, Julgado em 08/06/2004) (Grifo original).

O impasse apresentado nesse acórdão seria quanto ao prazo para a apresentação das propostas. O edital foi publicado em um dia, e o prazo para a entrega das propostas era até o dia seguinte, onde o julgador entendeu por bem que essa rapidez constituía grave afronta ao princípio da publicidade, já que a ampla divulgação foi prejudicada, pelo fato do prazo ser curtíssimo para a apresentação das propostas.

4.8 O princípio da vinculação ao instrumento convocatório na concorrência

O princípio da vinculação ao instrumento convocatório estabelece que tanto o Administrador que elaborou o certame, quanto ao participante que apresentará as propostas, devem seguir rigorosamente o previsto no instrumento convocatório, realizando todos os atos lá previstos, sob pena de o certame ser considerado nulo.

Como será exposto a seguir, tal princípio apresenta vários impasses, devido ao mesmo estar ligado ao principal objeto da licitação, que é o edital, onde se estabelece os critérios e normas para referido certame.

Um dos impasses pode ser encontrado no acórdão proferido por Canibal (2012, http://www.tjrs.jus.br/), que diz o seguinte

APELAÇÃO CÍVEL. LICITAÇÃO E CONTRATO ADMINISTRATIVO. FISCALIZAÇÃO E EXECUÇÃO DE OBRA COM VALOR SUPERIOR A 3.000 SALÁRIOS-MÍNIMOS. TAXA DE FISCALIZAÇÃO. CIENTEC. LEI ESTADUAL Nº 6.719/74 E DECRETO ESTADUAL Nº 32.874/88. PRINCÍPIO DA VINCULAÇÃO AO INSTRUMENTO CONVOCATÓRIO. 1. A taxa de fiscalização, destinada À CIENTEC, e prevista na Lei Estadual nº 6.719/74, regulamentada pelo Decreto Estadual nº 32.784/88, é devida pela empresa contratada desde que comprovada a potencial realização do serviço fiscalizatório por parte da Fundação de Ciência e Tecnologia do Estado. Caso concreto em que a efetiva prestação do serviço é fato incontroverso nos autos. 2. Legalidade do Decreto Estadual nº 32.784/88 que, ao regulamentar a Lei Estadual nº 6.719/74, prevê a incidência da taxa de fiscalização nos contratos de obras e serviços de engenharia cujo valor contratado seja superior a 3.000 salários-mínimos. 3. A Lei de Licitações prevê, como um dos princípios a nortear os processos licitatórios, a vinculação ao instrumento convocatório. Se a autora não concordava com a cobrança da taxa de fiscalização, destinada à CIENTEC, deveria ter impugnado o Edital no momento oportuno. Não o fez. E na medida em que a incidência de tal taxa estava prevista no contrato - parte integrante do Edital de Licitações, era de seu conhecimento, de sorte que aceitou participar da concorrência ainda assim, e certamente incluiu no preço apresentado o custo desta taxa. Não é lícito, agora, pretender afastar a sua incidência, depois de já executado o serviço e recebido o preço. E se não incluiu na proposta o valor da taxa, talvez por isso tenha apresentado o melhor preço, devendo, da mesma sorte, arcar com as consequências. RECURSO DESPROVIDO. (Apelação Cível Nº 70048412407, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Roberto Lofego Canibal, Julgado em 23/05/2012) (Grifos originais).

Percebe-se no acórdão apresentado que o impasse se daria em relação à vencedora do processo licitatório, onde após cumprir com o objeto da presente licitação, pugnou pelo não pagamento de uma taxa de fiscalização, onde ao final a empresa foi perdedora da ação, já que tal taxa era prevista no edital do referido certame. Assim, a empresa foi obrigada a pagar tal taxa, em observância as normas previstas no edital, graças ao princípio em análise.

Outro impasse encontrado no referido princípio podemos observar no acórdão proferido por Borges (2008, http://www.tjrs.jus.br/) que relata o seguinte

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA. APROVEITAMENTO DE CRÉDITO POR PRECATÓRIO PARA OFERECIMENTO DE GARANTIA E DEMAIS EXIGÊNCIAS DE ORDEM FINANCEIRA CONSTANTES DO EDITAL DE CONCORRÊNCIA MODALIDADE MAIOR OFERTA PELA OUTORGA. PEDIDO INDEFERIDO ADMINISTRATIVAMENTE. IMPOSSIBILIDADE DE APRESENTAÇÃO DE PROPOSTA. REABERTURA DO PRAZO. DESCABIMENTO. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA VINCULAÇÃO AO INSTRUMENTO CONVOCATÓRIO. O processo licitatório rende homenagem ao princípio da vinculação ao instrumento convocatório, previsto no artigo 3º da Lei 8.666/93, que submete tanto a Administração como os interessados na licitação. Esse princípio vem reafirmado no art. 41 do mesmo diploma legal. Afinal, o edital é a lei interna da licitação, e uma vez estabelecida suas regras, tornam-se inalteradas durante todo o procedimento. Não poderia, pois, a Administração reabrir o prazo para admitir proposta; tampouco o Poder Judiciário, pena de subverter todo o processo, a afrontar os princípios que norteiam a aplicação da lei das licitações, e, porque não, desafiar a própria lei. Apelo desprovido. Unânime. (Apelação Cível Nº 70024865719, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Genaro José Baroni Borges, Julgado em 06/08/2008) (Grifo original).

Visualiza-se no referido acórdão que o impasse gerado seria em razão do prazo para abertura das propostas. A empresa ingressou com o recurso após não ter conseguido apresentar sua proposta a tempo devido a divergências, onde postulou que o prazo fosse novamente aberto para a apresentação da proposta. Mas o julgador, pelo princípio da vinculação ao instrumento convocatório, não autorizou a abertura de novo prazo, assim, preservando o princípio em questão.

4.9 O princípio do julgamento objetivo na concorrência

O princípio do julgamento objetivo, como já visto no capítulo anterior, seria o julgamento das propostas levando em conta o previsto no edital, a modalidade correta e o tipo de licitação correta, ou seja, de acordo com o previsto no edital do certame e com a lei das licitações.

Como nos outros princípios apresentados, o mesmo princípio revela impasses por conta de sua aplicação, como observa-se no acórdão proferido por Heinz (1999, http://www.tjrs.jus.br/) que diz o seguinte

MANDADO DE SEGURANCA. LICITACAO. DESCLASSIFICACAO DE CONCORRENTE SEM FUNDAMENTO EM REQUISITO CONSTANTE NO EDITAL. ATO NULO POR CONTRARIAR O PRINCIPIO DO JULGAMENTO OBJETIVO (ARTIGO 3 DA LEI 8666/93). CONCESSAO DE SEGURANCA MANTIDA. APELO NAO CONHECIDO, EIS QUE APRESENTADO A DESTEMPO. SENTENCA MANTIDA EM REEXAME NECESSARIO. (5 FLS) (Apelação Cível Nº 70000287730, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marco Aurélio Heinz, Julgado em 22/12/1999) (Grifo original).

Como percebe-se no referido acórdão, o Administrador desclassificou o concorrente sem qualquer justo motivo, não justificando seu ato na lei das licitações ou no edital do referido certame, onde isso afrontou o princípio do julgamento objetivo, já que o Administrador, no momento que retirou o participante da licitação, deveria ter pelo menos justificado o motivo da desclassificação, se era pela inobservância a algum item do edital ou se por inobservância a norma das licitações.

4.10 O princípio da competitividade na concorrência

Apesar deste princípio não estar incluso no rol de princípios do artigo terceiro da lei das licitações, resolve-se abordá-lo, pois são encontrados muitos impasses a cerca deste princípio na concorrência.

O princípio da competitividade, como já demonstrado no capítulo anterior, pode ser considerado como um princípio que garante a competitividade dos participantes no processo licitatório, ou seja, garante que haja, no mínimo, uma disputa entre os participantes no certame para que haja competição entre eles, seja de melhor preço ou melhor técnica.

Pode-se encontrar vários impasses a este princípio, como observa-se no acórdão proferido por Werlang (1999, http://www.tjrs.jus.br/) que diz o seguinte

ADMINISTRATIVO. ACAO POPULAR. LICITACAO. EXIGENCIAS. COMPETITIVIDADE COMPROMETIDA. I - EXIGENCIAS ABUSIVAS, DESNECESSARIAS, ELENCADAS PARA DETERMINADA LICITACAO, PODEM VIR A CAUSAR PREJUIZO AO ERARIO PUBLICO, VISTO QUE DIMINUEM O NUMERO DE PARTICIPANTES DO CERTAME. II - NO MAIS, REQUISITOS QUE DIMINUAM A COMPETITIVIDADE DA CONCORRENCIA GOZAM DA PRESUNCAO DE CAUSAREM PREJUIZO AO PATRIMONIO PUBLICO, A TEOR DO ARTIGO 4 DA LEI N. 4717/65. III - EVENTUAIS BENEFICIOS DE PARTICULARES EXCLUIDOS DA LICITACAO, NEM SEMPRE E OBICE AO MANEJO DA ACAO POPULAR, DESDE QUE O OBJETIVO PRECIPUO SEJA O DE EVITAR LESAO AOS COFRES PUBLICOS DECORRENTES DE EXIGENCIAS QUE DIMINUAM A COMPETITIVIDADE DA LICITACAO. RECURSO PROVIDO. SENTENCA DESCONSTITUIDA. (Apelação Cível Nº 599231107, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Arno Werlang, Julgado em 13/10/1999) (Grifo original).

Observando-se a ementa acima, o julgador deu grande ênfase ao princípio da competitividade, onde o impasse se deu em razão das exigências realizadas pelo Administrador no certame, inviabilizando a participação da maioria dos interessados, frustrando assim o princípio da competitividade. O julgador ainda demonstra que qualquer requisito que diminua a competitividade do certame goza de presunção de causar grave dano ao patrimônio público.

Outro impasse na concorrência, considerando o princípio da competitividade, encontramos no acórdão proferido por Cassiano (2003, http://www.tjrs.jus.br/), que diz o seguinte na ementa abaixo

AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA. LICITAÇÃO E CONTRATO ADMINISTRATIVO. EXPRESSÕES QUE VIOLAM OS PRINCÍPIOS DA COMPETITIVIDADE E ISONOMIA. SUSPENSÃO DO CERTAME. Na licitação ora objeto de questionamento, a CORSAN, para o fim de contratar serviço de advocacia para atuar na área contecionsa trabalhista, nas cidades de Porto Alegre e Brasília, erigiu como um dos critérios da proposta técnica o ajuizamento de ações na Justiça do Trabalho no período entre janeiro de 2004 a novembro de 2006 e os feitos desenvolvidos perante o Tribunal Superior do Trabalho no mesmo período. Todavia, as expressões em curso e ajuizadas no período de janeiro de 2004 a novembro de 2006 constantes nos itens 4.5.1 e 4.5.2 do edital violam os princípios da competitividade e isonomia entre os licitantes, reduzindo o universo de licitantes em prejuízo do interesse público, razão pela qual a concorrência deve ser suspensa até a decisão final do mandamus. AGRAVO PROVIDO. (Agravo de Instrumento Nº 70018571414, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Adão Sérgio do Nascimento Cassiano, Julgado em 04/04/2007) (Grifo original).

Analisando-se o acórdão acima, o impasse apresentado seria no tocante as cláusulas estabelecidas pela Corsan na concorrência pública, que frustrava grande número de interessados, já que as ações já realizadas pelo participante não contavam para fins da licitação, e sim critérios bem específicos e pouco claros, o que demonstrava a grande afronta ao princípio da competitividade.

Assim, com os diversos casos demonstrados acima, percebe-se quantos impasses existem em relação aos princípios licitatórios. Apesar de a lei prever mecanismos de proteção para a licitação pelos princípios, ainda pessoas encontram meios de burlar esse sistema, numa intenção de se favorecer de um bem que é de toda a sociedade.

5 CONCLUSÃO

No primeiro capítulo, foi apresentado o conceito de licitação, onde se observou que a licitação é um procedimento complexo e é utilizada para a compra de bens, contratação de serviços e, ainda, para a venda de bens por parte da Administração Pública.

Do mesmo modo, no primeiro capítulo, foram apresentadas as modalidades da licitação, constatando-se que existem, conforme a lei, oito modalidades licitatórias, que são a concorrência, tema do presente trabalho de conclusão, a tomada de preços, o convite, o concurso, o leilão, o pregão, a consulta e ainda o regime diferenciado de contratação (RDC).

No segundo capítulo, o foco foi a análise dos princípios do processo licitatório, que norteiam os certames licitatórios, impondo orientações e protegendo contra impasses que possam ocorrer diante da má utilização do processo licitatório.

Os princípios, no segundo capítulo, foram devidamente conceituados e fundamentados, com a apresentação de quatorze princípios que regem o processo licitatório, quais sejam os princípios da isonomia, da igualdade, da seleção da proposta mais vantajosa para a Administração, da promoção do desenvolvimento sustentável, da legalidade, da impessoalidade, da moralidade e da probidade, da publicidade, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo, da adjudicação compulsória, do formalismo, do sigilo na apresentação das propostas e o da competitividade.

Já no terceiro capítulo, foi apresentado o título do presente trabalho de conclusão de curso, ou seja, foram apresentados os impasses da licitação na modalidade concorrência, em face dos princípios licitatórios, onde foi analisados os princípios que encontram-se no rol do artigo terceiro da lei nº 8.666/93, bem como ainda o princípio da competitividade.

Para a análise dos impasses encontrados nos princípios, pesquisou-se as jurisprudências encontradas no site do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, do período de 1998 a 2012, onde o leitor pode perceber, com casos locais, os principais impasses em relação aos princípios que regem o processo licitatório, considerando a modalidade concorrência para tal análise.

Com isso, observa-se que o processo licitatório constitui-se em um importante instrumento para gestão da Administração Pública para a realização de suas necessidades quanto à compra e à venda de bens e contratação de serviços, possuindo diversas modalidades e princípios fundamentadores, criando uma expectativa de que sistema venha a funcionar bem.

Mas não é exatamente o que se percebe, principalmente na modalidade concorrência, que guarda os maiores valores da licitação, já que, como mostrado no trabalho, a mesma possui vários impasses, analisando do ponto de vista dos princípios licitatórios.

Uma solução para a presente questão seria a criação de mais mecanismos para o controle da utilização do processo licitatório. A lei nº 8.666/93 desde a sua criação é alvo constante de mudanças, entretanto essas mudanças ainda não dão conta da inclusão de procedimentos e normas mais rígidas a cerca da observância e da utilização dos princípios de forma conjunta e com maior ênfase. Além disso, julga-se conveniente incluir punições mais severas para quem se utiliza da licitação para finalidades ilícitas.

Acredita-se por fim, que os princípios devam ter a sua “força normativa” respaldada, uma vez que traduzem os valores concebidos pela sociedade como necessários para a boa gestão pública. Desse modo, a prática principiológica como norte no processo licitatório diminuiria drasticamente o índice de impasses nos certames, tornando o referido processo um meio mais idôneo e mais eficiente para a Administração Pública e para atender os anseios da sociedade.

[1] Vários doutrinadores citam o leilão como o adequado para a realização da venda de imóveis objeto de procedimentos judiciais ou dação em pagamento, mas sem citar o motivo pelo qual o leilão é utilizado já que no inciso III do artigo 19 da lei nº 8.666/93 também cita a concorrência como meio hábil para a alienação deste imóvel. Interpretando, o motivo a ser deduzido seria que, como o leilão é uma modalidade especifica para a venda, não se utilizando-a em nenhum momento para a compra de materiais, seria a forma mais especifica para se utilizar para a alienação deste tipo de imóvel.

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  • Princípios Licitatórios

Fernando Falk Sundl

Advogado - Santa Cruz do Sul, RS


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