RESUMO
Este trabalho tem como objetivo a busca pela melhor interpretação a ser dada ao art. 16, § 4º da Lei nº 8.213/91, o qual é omisso quanto à espécie de presunção de dependência econômica existente na pensão por morte. Parte-se, para tanto, da afirmação da existência de presunção de dependência econômica das pessoas elencadas no art. 16, I, da Lei nº 8.213/91, vindo, porém, questionar se esta presunção é absoluta, não admitindo prova em contrário, ou relativa, levando em consideração os princípios que regem a Previdência Social. Para tanto, utiliza-se do método hipotético-dedutivo aplicado à revisão bibliográfica, quando do estudo dos dependentes do instituidor da pensão por morte, passando por uma análise principiológica da Seguridade Social até chegar à análise dos recentes julgados sobre a matéria. Investiga-se, também, as consequências que poderiam ser acarretadas caso fossem adotadas ambas as interpretações. Restou constatado que, embora a doutrina e a jurisprudência não possuam um consenso, a corrente que vem ganhando mais adeptos é a que considera a presunção absoluta apenas se se tratar de cônjuge ou companheiro, a qual é capitaneada pelo Superior Tribunal de Justiça.
PALAVRAS-CHAVE: Pensão por morte. Dependência econômica. Presunção.
1 INTRODUÇÃO
Uma importante discussão travada na seara do Direito Previdenciário diz respeito à espécie de presunção econômica existente quanto aos dependentes do benefício de pensão por morte. Certo é que o art. 16 da Lei nº 8.213/91[1] estabelece quais são os dependentes do instituidor, bem como informa expressamente a dependência econômica de algumas pessoas, exigindo de outras a comprovação da mesma.
Desse modo, define o art. 16, § 4º, da referida lei que a dependência econômica do cônjuge, da companheira, do companheiro e do filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente, é presumida e a das demais pessoas deve ser comprovada.
Ocorre, no entanto, que o referido artigo é omisso no instante em que não informa se esta presunção de dependência econômica é relativa, admitindo-se prova em contrário, ou absoluta, bastando assim que seja comprovada a qualidade de cônjuge, companheiro ou filho menor de 21 anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, respectivamente.
No âmbito das lides previdenciárias, este questionamento, surgido a partir da lacuna na lei, se acentua na medida em que a espécie de presunção de dependência econômica iria determinar uma maior ou menor inclusão de novos beneficiários do sistema previdenciário, o qual já se encontra tão defasado, devido, sobretudo, ao grande número de beneficiários que não preenchem os requisitos de necessidade e tampouco precisam do sistema protetivo da Previdência Social.
Neste diapasão, questiona-se como a melhor interpretação data à lacuna legislativa poderia contribuir para que houvesse uma menor concessão de benefícios a pessoas que não necessitam da Previdência Social para manter-se e gerir suas vidas. Busca-se, pois, traçar o caminho para encontrar a interpretação que melhor se adeque à natureza principiológica do sistema.
Para elucidar a questão, faz-se necessário um retorno ao estudo da natureza da seguridade social e dos princípios que regem o Direito Previdenciário, em especial, uma análise mais aprofundada do atual sistema protetivo no qual se sustenta a Previdência Social, visando apreciar quais as consequências acarretadas por ambas as espécies de presunções, bem como uma análise aprofundada do atual entendimento jurisprudencial a respeito do tema. Tarefa a que se presta desempenhar este artigo, desprovido, entretanto, da ingênua pretensão de exaurir a cognição acerca do assunto.
O método utilizado na elaboração deste artigo foi o hipotético-dedutivo, por meio de revisão bibliográfica, pesquisa na legislação, jurisprudência, artigos científicos, noticias, e material disponibilizado na internet.
2 CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA DA SEGURIDADE SOCIAL
2.1 Os princípios da seguridade social
Segundo Pinto Martins (2011, p. 14), o princípio é a proposição que se coloca na base da ciência, informando-a e orientando-a. Partindo deste pressuposto, faz-se necessário analisar o art. 194 da Constituição Federal de 1988[2], no qual estão previstos a maioria dos princípios da Seguridade Social.
Neste ínterim, parte-se de uma análise dos princípios e a consequência direta dos mesmos nos objetivos do Estado ao estabelecê-los. Inicialmente cabe mencionar o princípio do solidarismo, o qual garante o dever dos ativos em sustentar os inativos e está embasado no objetivo fundamental da República Federativa do Brasil em construir uma sociedade livre, justa e solidária. Logo, desde já, é possível iniciar a delimitação dos objetivos da Previdência Social. Percebe-se claramente que o que se busca é que os ativos sustentem os inativos, os que não podem gerir suas próprias vidas, sem a proteção do Estado.
Outro princípio de suma importância é o da universalidade, que assegura proteção de cobertura e atendimento a todos os segurados.
Ademais, tem-se o princípio da uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais, o qual visa assegurar benefícios e serviços equivalentes, o que não importa, necessariamente, que sejam iguais, uma vez que irão levar em conta o tempo de serviço, o coeficiente de cálculo, dentre outros.
O princípio da seletividade e distributividade na prestação de benefícios e serviços está em perfeita consonância com os objetivos da seguridade social, uma vez que visa a distribuir renda, principalmente para as pessoas de baixa renda, o que fará com que algumas pessoas não gozem do direito de receber determinados benefícios, caso deles não necessitem.
O princípio da equidade na forma de participação no custeio, por sua vez, assegura que as pessoas que estiverem em igualdade de situações, deverão contribuir da mesma forma.
Já o princípio da preexistência determina que para que haja a criação ou majoração de um benefício ou serviço, é necessário haver previamente uma fonte de custeio. Por fim, visando novamente a proteção dos segurados e beneficiários, surge o princípio da irredutibilidade dos benefícios, que visa preservar o valor real dos mesmos, garantindo mais segurança e estabilidade.
Diante desta análise, é possível concluir-se que o que o Estado busca é proteger os cidadãos vulneráveis, que não podem prover o seu próprio sustento e que, por este motivo, não podem quedar-se à revelia da proteção Estatal. Os princípios da seguridade social nada mais são do que meios de garantir aos contribuintes que caso um dia padeçam de algum mal que os torne inválidos, estarão protegidos pelo Estado. Especialmente com relação à pensão por morte, busca-se claramente amparar os dependentes do instituidor, o qual anteriormente provia a subsistência dos mesmos, cabendo ao Estado, caso necessitem, dar continuidade à proteção anteriormente dada pelo falecido.
2.2 A evolução e a necessidade da seguridade social
A preocupação com as adversidades da vida tornou ao longo do tempo cada vez mais forte a discussão sobre a seguridade social e seus objetivos. É possível afirmar que a proteção social nasceu no seio da família, em uma época em que as pessoas viviam em aglomerados familiares, de forma que os mais jovens trabalhavam para manter os mais idosos e incapacitados.
Com o passar dos anos, as entidades familiares passaram a tornarem-se cada vez mais frágeis e, conseqüentemente, a antiga forma de proteção social foi se esvaindo, passando a gerar a necessidade de que o Estado suprisse esta proteção antes obtida no seio das próprias famílias. Surge exatamente desta necessidade o princípio do solidarismo, uma vez que obriga os segurados que se encontram em pleno gozo de suas atividades a contribuírem para a subsistência dos inativos.
No Brasil, embora a Constituição de 1891 já trouxesse indícios da necessidade de proteção social, foi apenas com a atual Constituição, promulgada em 05 de outubro de 1988, que o país consolidou a Seguridade Social, trazendo em seu texto um capítulo[3] inteiro que trata do tema (arts. 194 a 204).
Atualmente, a legislação não tem dado grandes passos a respeito da legislação previdenciária. No entanto, a jurisprudência surge muitas vezes para dar interpretação conforme os princípios e valores da Seguridade Social, como será demonstrado adiante, dando inclusive interpretação à lacuna legislativa tema do presente artigo.
Ademais, muito se tem falado nas últimas décadas de uma possível falência do INSS, a qual não será objeto de estudo no presente artigo, porém que serve para alertar da necessidade de concessão de benefícios apenas àqueles que necessitam do sistema e não àqueles que vivem independentemente dele.
2.3 Conceito de seguridade social
Para alguns autores, seguridade vem do espanhol seguridad, que significa, em nossa língua, segurança. Daí porque alguns doutrinadores entendem que a melhor opção seria utilizar, assim como os portugueses, a expressão segurança social.
Segundo Celso Barroso (1992 apud TAVARES, 2011, p. 01): “a seguridade social é o conjunto de medidas destinadas a atender às necessidades básicas do ser humano.” Fábio Zambitte (2011, p. 05), por sua vez, afirma que:
a seguridade social pode ser conceituada como a rede protetiva formada pelo Estado e por particulares, com contribuições de todos, incluindo parte dos beneficiários dos direitos, no sentido de estabelecer ações para o sustento de pessoas carentes, trabalhadores em geral e seus dependentes, providenciando a manutenção de um padrão mínimo de vida digna
Já Sérgio Pinto Martins (2011, p. 08) define a Seguridade Social como:
um conjunto de princípios, de regras e de instituições destinado a estabelecer um sistema de proteção social aos indivíduos contra contingências que os impeçam de prover as suas necessidades pessoais básicas e de suas famílias, integrado por ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, visando assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social
É importante ainda mencionar o conceito de Seguridade Social definido pela Organização Internacional do Trabalho na Convenção 102, de 1952:
“proteção que a sociedade oferece aos seus membros mediante uma série de medidas públicas contra as privações econômicas e sociais que, de outra forma, derivam do desaparecimento ou em forte redução de sua subsistência, como conseqüência de enfermidade, maternidade, acidente de trabalho ou enfermidade profissional, desemprego, invalidez, velhice e também proteção em forma de assistência médica e ajuda às famílias com filhos”[4].
Desse modo, observa-se que o conceito de seguridade social, embora visto de perspectivas distintas, vem sempre aliado à idéia de proteção e solidarismo, objetivando sempre a universalidade da cobertura e do atendimento, ou seja, a segurança social será prestada a quem dela necessitar.
2.4 Previdência Social
A seguridade social é gênero que compreende as espécies Previdência Social, Assistência Social e Saúde. O tripé junto objetiva consolidar a proteção social dos indivíduos. No entanto, no presente trabalho nos deteremos apenas à Previdência Social para chegarmos à correta compreensão da espécie de presunção de dependência econômica na pensão por morte, sem que haja um desvio do tema.
Nas palavras de Tavares (2011, p. 28):
“a previdência social é conceituada como seguro público, coletivo, compulsório, mediante contribuição e que visa coibir os seguintes riscos sociais: incapacidade, idade avançada, tempo de contribuição, encargos de família, morte e reclusão.”
Objetiva, precipuamente, garantir uma proteção mínima e relativamente padronizada, garantindo a todos dignas condições de vida.
Faz-se mister, observar que tanto o objetivo geral da Seguridade Social, como o objetivo da Previdência Social é amparar segurados e dependentes caso ocorram contingências previstas em lei. Com efeito, segurados e dependentes são responsáveis pelo próprio sustento, apenas em caso de impossibilidade de uns e outros é que entra em cena a seguridade social/previdência social, a fim de ampará-los.
3 PENSÃO POR MORTE
3.1 O benefício
A pensão por morte encontra previsão legal nos arts. 74 a 79 da Lei nº 8.213/91 e nos arts. 105 a 155 do Regulamento da Previdência Social. E é nas palavras de Ibrahim (2011, p. 654) o benefício destinado aos dependentes do segurado[5], visando à manutenção da família, em caso de morte do responsável pelo sustento do lar.
Conforme o disposto no art. 74 da referida lei, o benefício será pago aos dependentes do instituidor a contar da data do óbito, quando requerido até trinta dias depois deste; do requerimento, quando requerido após os referidos 30 dias; ou da decisão judicial, no caso de morte presumida.
Ademais, em linhas gerais, cabe salientar que a pensão por morte consiste numa renda de 100% do valor da aposentadoria que o segurado recebia ou daquela a que teria direito se estivesse aposentado por invalidez na data de seu falecimento.
Desse modo, observa-se que é notória a intenção do legislador em amparar os dependentes do segurado falecido, visando à continuidade da manutenção do lar. Não está evidenciado, no entanto, em nenhum dispositivo legal a intenção de proteger pessoas que possuíam relação de parentesco com o falecido, mas que dele não dependiam financeiramente.
3.2 Os dependentes
De acordo com o art. 16 da Lei 8.213/91 são beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes[6] do segurado: I. o cônjuge[7], a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente; II. os pais; III. o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente.
Ocorre que para que seja reconhecida a dependência dos membros acima relacionados, para a concessão da pensão por morte, é preciso que haja cumulativamente à condição de parentesco, a dependência econômica para com o segurado, segundo melhor doutrina. Neste ínterim, tem-se que alguns destes dependentes irão gozar de presunção de dependência econômica, enquanto outros necessitarão comprovar a mesma.
Corroborando com esta tese, o § 4º do art. 16 da Lei 8.213/91 informa que a dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida, exceto a do menor tutelado e do enteado, e a das demais deve ser comprovada. Ou seja, enquanto o cônjuge, o companheiro e o filho possuem dependência econômica presumida, os pais, os irmãos e os tutelados ou enteados devem comprovar esta dependência.
Esta presunção legal de dependência econômica para os dependentes de primeira classe existe a fim de facilitar a aplicação da própria lei que a estabelece, conferindo maior efetividade às normas constitucionais que disciplinam a seguridade social. É notório que o legislador conferiu tal presunção às pessoas mais próximas do segurado, as quais integram o núcleo familiar, a fim de facilitar a aplicação da lei, cabendo às outras a comprovação de tal dependência.
4 A INTERPRETAÇÃO DADA AO ARTIGO 16, § 4º DA LEI Nº 8.213/91 PELA JURISPRUDÊNCIA
Faz-se mister observar que a legislação ao estabelecer presunção em favor de alguns dependentes, apenas desobriga-os de comprovar dependência econômica, senão vejamos o que diz o artigo 16, § 4º da Lei nº 8.213/91: a dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada. Logo, resta claro que o referido artigo foi omisso quanto à espécie de presunção da dependência econômica, seja ela relativa ou absoluta.
Logo, pode-se dizer que o fato de a dependência econômica ser presumida para algumas pessoas, não quer dizer que seja necessariamente absoluta, não cabendo prova em contrário, mas tão somente que a eles não caberá o ônus da prova. Neste ínterim, diante da lacuna apresentada, é possível concluir que tanto a Administração, quanto terceiros interessados poderiam apresentar prova em contrário.
Diante de tal problemática, não havendo consenso na doutrina e na jurisprudência, surgem três linhas de pensamento, quais sejam: a) a presunção é sempre absoluta, não admitindo prova em contrário, b) a presunção é sempre relativa, c) a presunção apenas é absoluta se se tratar de cônjuge ou companheiro.
Em via administrativa é comum que o benefício de pensão por morte requerido pelos dependentes ditos de primeira classe seja de pronto concedido, uma vez que tenha sido comprovado tão somente o grau de parentesco do beneficiário para com o instituidor/falecido. Ocorre que uma vez não definida se a presunção destes dependentes é absoluta ou relativa, não é possível afirmar que basta a comprovação do grau de parentesco para que o benefício seja deferido de plano.
Se considerarmos que esta dependência é absoluta, bastaria, de fato, apenas a comprovação do parentesco. Por outro lado, se considerarmos que embora haja a presunção de dependência, ela seja meramente relativa, tem-se que ademais do grau de parentesco, seria necessário comprovar a dependência econômica para com o instituidor.
Nesta seara a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça surge a fim de dar interpretação à lacuna deixada pelo artigo 16, § 4º da Lei 8.213/91, conferindo presunção absoluta apenas quando se tratar de cônjuge ou companheiro, sendo esta a interpretação mais aceita na atualidade e a que conta com mais adeptos. Desse modo, a jurisprudência dominante divide os dependentes de primeira classe em duas espécies de dependentes, quais sejam: a) os que gozam de presunção de dependência absoluta – cônjuges e companheiros; b) os que gozam de dependência meramente relativa - o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente.
A diferenciação entre os dependentes de primeira classe, é justificada com base no que se extrai do REsp 203722/PE e das seguintes considerações do voto condutor da decisão adotada, o Ministro Edson Vidigal:
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 201, V, reza que “os planos de Previdência Social, mediante contribuição, atenderão, nos termos da lei, a pensão por morte de segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes, obedecido o disposto no § 5º do artigo 202”
Se é certo que o cônjuge ou companheiro são também dependentes do segurado falecido, para fins de concessão de benefício previdenciário, qual a razão de o Constituinte ter-lhes mencionado separadamente dos dependentes em geral? Por certo que pretendeu conferir-lhes a presunção absoluta de dependência, o que já é suficiente para a concessão da pensão por morte.
(...)
O direito à percepção da pensão, constitucionalmente garantido, somente pode ser restringido em não havendo cônjuge ou companheiro, que gozam de presunção absoluta de dependência, ou ainda quaisquer dependentes que provem tal condição.
Este interpretação dada ao artigo 201 da Constituição Federal também foi adotada pelo Tribunal de Contas da União, senão vejamos a seguinte passagem do voto condutor do Acórdão 1006/2004-Plenário, adotado no Processo 021.253/2003-1:
15. De volta à Constituição Federal, na parte em que trata do regime geral de benefícios, tem-se que a previdência social compreenderá a "pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes", consoante o inciso V do caput do art. 201. É de se esperar o uso do mesmo critério no regime dos servidores públicos, na forma do já citado § 12 do art. 40 do texto constitucional.
16. Na literalidade constitucional, o cônjuge ou companheiro não se caracterizaria como dependente, uma vez que assim não é tratado. Ou, como sustenta o STJ, ainda que conduza ao mesmo efeito, goza "de presunção absoluta de dependência", a qual não admite prova em contrário (REsp 203722/PE, 461150/RS, 303346/RS). De fato, presumir a dependência, mesmo de forma absoluta, é melhor do que ignorá-la, já que ela fundamenta a pensão. E é absoluta por questão de segurança econômica familiar, para a conservação do seu poder aquisitivo, sem que possa alguém opor dúvidas que ponham embaraços à tranqüilidade doméstica. Não é causa, portanto, de opulência, mas de simples manutenção de status quo. Todos os outros pretensos beneficiários de pensão, que não o cônjuge ou companheiro, ficarão sujeitos, todavia, ao reconhecimento da dependência, seja por exigência de comprovação prévia, seja por presunção relativa, que admitirá prova em contrário.
O Acórdão 468/2006 – Primeira Câmara, adotado no Processo 004.833/2005-4 também corrobora com a terceira posição apontada anteriormente, conforme a passagem a seguir:
Com efeito, a jurisprudência desta Corte entende que, de acordo com o art. 215 da Lei 8.112/90, a pensão é devida somente aos dependentes, e que a hipótese da letra 'b' do inciso II do art. 217 - menor sob guarda ou tutela até 21 anos de idade - apenas caracteriza a presunção juris tantum de dependência, que pode ser afastada, por prova em contrário, em razão da inexistência de tal dependência.
O Sumário do Acórdão 1985/2008 – Primeira Câmara, adotado no Processo 002.455/2008-5 é no mesmo sentido:
PESSOAL. PENSÃO CIVIL. FILHA MAIOR INVÁLIDA. APOSENTADORIA NO SERVIÇO PÚBLICO. DESCARACTERIZAÇÃO DA DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. INCLUSÃO INTEGRAL DE GRATIFICAÇÃO DE DESEMPENHO E DE VANTAGEM PECUNIÁRIA INDIVIDUAL EM PROVENTOS PROPORCIONAIS. ILEGALIDADE. 1. É ilegal a concessão de pensão civil a filha maior inválida que recebe proventos de aposentadoria no serviço público, por estar descaracterizada a dependência econômica em relação ao instituidor.
Constata-se, portanto, que a tese de que a presunção absoluta aplica-se apenas quanto ao cônjuge ou companheiro vem evoluindo no sentido de corroborar com os princípios da Seguridade Social. Observa-se que esta posição do Superior Tribunal de Justiça respeita a diferenciação estabelecida pela Constituição Federal em separar o cônjuge e o companheiro como sendo dependentes privilegiados, ao mesmo tempo em que confere interpretação ao artigo 16, § 4º da Lei nº 8.213/91, em conformidade com os princípios da Seguridade Social, afastando da tutela Estatal todos aqueles dependentes que não logrem êxito em comprovar a dependência financeira para com o falecido.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante da conceituação, explanação dos objetivos e princípios da seguridade social, é possível concluir que o Estado ao definir os benefícios previdenciários objetivou amparar os dependentes e segurados, garantindo-lhes suas necessidades básicas. Tem-se que segurados e dependentes são responsáveis pelo próprio sustento, cabendo ao Estado apenas em caso de impossibilidade de uns e de outros provê-los do necessário.
Neste sentido, o benefício previdenciário da pensão por morte é cabível sempre que houver dependência econômica do futuro beneficiário para com o segurado. Entendimento contrário iria de encontro com toda a base principiológica da Seguridade Social analisada anteriormente. Desse modo, uma vez omisso o art. 16, § 4º da Lei nº 8.213/91 quanto à espécie de presunção de dependência econômica, a melhor interpretação seria aquela que toma por base os princípios, informando que, em regra seria relativa, cabendo prova em contrário, porém respeitando a intenção da Constituição Federal em proteger majoritariamente o cônjuge e o companheiro, conferindo-lhes presunção absoluta de dependência.
Ora, porque estaria o Estado obrigado a garantir pensão por morte a filho menor de vinte e um anos, por exemplo, caso fosse possível comprovar que o mesmo possui total independência econômica? Uma vez concedido um benefício sob tais condições, estaria a Previdência Social recebendo uma transferência indevida de encargo, garantindo ao dependente não uma necessidade básica, mas sim um verdadeiro enriquecimento sem causa, não coadunando com a natureza da seguridade social.
Assim sendo, dos dependentes de primeira classe, apenas terá presunção absoluta de dependência econômica o cônjuge e o companheiro, segundo jurisprudência e doutrina majoritárias. Isto porque assim desejou a Constituição Federal, elencando ambos isoladamente no art. 201, V da Constituição Federal de 1988. E contra a vontade do Constituinte Originário não há o que se discutir.
[1] Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado: I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente; II - os pais; III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente; § 1º A existência de dependente de qualquer das classes deste artigo exclui do direito às prestações os das classes seguintes; § 2º .O enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento; § 3º Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal; § 4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada.
[2] Art. 194 - A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social. Parágrafo único - Compete ao Poder Público, nos termos da lei, organizar a seguridade social, com base nos seguintes objetivos: I - universalidade da cobertura e do atendimento; II - uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais; III - seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços; IV - irredutibilidade do valor dos benefícios; V - eqüidade na forma de participação no custeio;
VI - diversidade da base de financiamento; VII - caráter democrático e descentralizado da administração, mediante gestão quadripartite, com participação dos trabalhadores, dos empregadores, dos aposentados e do Governo nos órgãos colegiados.
[3] Capítulo II da Constituição Federal de 1988
[4] A aludida convenção foi ratificada pelo Brasil por meio do Decreto-Legislativo nº 269/08.
[5] São as pessoas físicas filiadas ao Regime Geral de Previdência Social.
[6] Havendo mais de um dependente, o benefício será dividido em cotas.
[7] Apenas será considerado dependente quando à época do óbito mantiver sociedade conjugal com o segurado ou dele estiver separado ou divorciado, porém percebendo alimentos.