Sabemos que é pela linguagem que ocorre a manifestação da vontade para que os atos jurídicos se promovam e as convenções ou contratos se formalizem, validamente, e é nesses textos que os termos jurídicos são um desafio para o conhecimento dos leigos, que se veem obrigado a traduzir, as expressões usadas pela justiça.
O juridiquês é definido por doutrinadores, como Arrudão (2007), como o uso de um português arrevesado, palavrório cheio de raciocínio labiríntico e expressões pedantes, ou seja, que se expressa exibindo conhecimento que realmente não possui a necessidade de tornar a linguagem jurídica.
Sendo assim tal comunicação não é acessível e não chega a ser um consenso ao meio, onde a opinião é que a simplificação da linguagem jurídica não é só útil, como aconselhável, onde o principal foco da questão é ter conhecimento do ponto de equilíbrio entre simplicidade e precisão.
Defende ainda que, os termos técnicos têm de ser mantidos, pois têm significados próprios, mas a técnica de como serem usados deve ser corretamente usada, pois assim torna as coisas mais rápidas e compreensíveis.
Freitas (2008) ressalta que a ciência jurídica também cunhou uma linguagem específica, técnica como resultado de seu próprio desenvolvimento, ao qual devemos boa parte da riqueza do saber jurídico. Entretanto, por se tratar de uma ciência que tem por objetivo último auxiliar na resolução de conflitos de interesse que nascem no seio de uma sociedade.
Não se pode admitir que o advogado, o magistrado e demais operadores do Direito se fechem numa torre de marfim, para serem inatingíveis genericamente tomados, precisam ter um razoável entendimento a respeito de seus direitos, a fim de chamar o judiciário para lutar por estes.
Nesse sentido, algumas peças jurídicas são redigidas de uma forma tal que se torna impossível a compreensão desses textos por alguém que não faça parte do meio jurídico. De acordo com Bakthin (1979) a linguagem pressupõe um processo que se dá coletivamente, no qual sujeitos de uma determinada sociedade ou grupo social, historicamente, através da interação verbal, criam e recriam um sistema de significados articulado e visão de mundo.
Além disso, a linguagem não pode ser vista fora do homem. Como um sistema simbólico construído e reconstruído pelo homem, ao longo do tempo, ela é instrumento de poder, de comunicação entre as pessoas, de meio para aquisição de conhecimento e circulação da cultura e, sobretudo, pressuposto para o desenvolvimento os processos mais elaborados do pensamento humano.
A linguagem forense é considerada por alguns linguistas como opaca por não haver essa interação com a sociedade, que a considera uma forma burocrática e distante do uso da língua, talvez isso ocorra porque o Direito é uma ciência que ainda mantém, por causa de suas tradições, muitas formalidades e, é evidente que o universo jurídico representa, efetivamente, um espaço de extremo poder.
Apesar de toda a evolução do mundo informatizado, da internet que requer uma comunicação rápida e eficaz, já que a língua é um código social, em uso, que está o tempo todo sofrendo alterações. A linguagem representa o pensamento e funciona como instrumento mediador das relações sociais.
As variações socioculturais contribuem para diversificação da linguagem, só não sendo mais graves as dificuldades em razão do esforço social de uma linguagem comum, controlada por normas linguísticas. No mundo jurídico, o ato comunicativo não pode enfrentar à solta o problema da diversidade linguística de seus usuários.
Afinal, o Direito é uma ciência que disciplina a conduta das pessoas, portanto, o comportamento exterior é objetivo, e que se faz por meio de uma linguagem prescritiva e descritiva. Assim, quando os interesses se mostram conflitantes ou uma ação humana fere os valores da norma jurídica, exige-se reparação dos mesmos, formando-se a lide (conflito), criando um novo centramento na relação entre os interlocutores processuais: a polêmica.
No confronto de posições, a linguagem torna-se mais persuasiva por perseguir o convencimento do julgador que, por sua vez, resguarda-se da forma de sua decisão, explicando, na motivação da sentença, os mecanismos racionais pelos quais decide.
O ato comunicativo jurídico não se faz, pois, apenas como linguagem enquanto língua (conjunto de probabilidade linguísticas postas à disposição do usuário), mas também, e essencialmente, como discurso, assim entendido o pensamento organizado à luz das operações do raciocínio, muitas vezes com estruturas preestabelecidas.
O judiciário, como todos os poderes, está sob o jugo da lei, tem a função de dizer o Direito, julgando as demandas conforme as leis e a Constituição. Dos três poderes, é o único que sofre apenas uma influência indireta do poder popular, já que seus membros não são escolhidos pelo povo.
A linguagem oficial, que segue a linguagem jurídica padrão, é tão inacessível para o leigo quanto esta última, quase impossível de decifrar. Para exercer seus direitos e cumprir seus deveres o cidadão precisa ter ciência deles. O pluralismo jurídico proposto por WOLKMER coloca a participação da comunidade e dos sujeitos coletivos de direito como condição para a construção de um Direito aberto e democrático, capaz de absorver as necessidades e carências da população e transformá-las em direitos.
É através da vigilância, da reflexão e do voto que o povo elegerá políticos que verdadeiramente representem seus interesses que continuem a fazê-lo enquanto durar o mandato. O mundo jurídico é o mundo abstrato e fechado das normas, uma criação científica do homem.
No mundo nas normas as ações humanas são sempre descritas e reguladas para o dever ser, cheia de enunciados genéricos incapazes de oferecer uma interpretação unificada, mesmo para os que conhecem sua linguagem técnica. Logo, quando as possibilidades jurídicas são desconhecidas não há que se falar em direito exercido ampla e plenamente.
"Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece", é o que determina o artigo 3º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro. A maior das ficções jurídicas, uma presunção que nem o mais dedicado dos juristas concebe como real.
Nenhuma pessoa pode se apoiar no fato de desconhecer uma lei para deixar de cumpri-la ou cumpri-la de modo diverso do prescrito: todos têm obrigação de conhecer a lei. Neste sentido, também o artigo 21 do Código Penal: "O desconhecimento da lei é inescusável". Mas, qual é a parcela da população brasileira possui o conhecimento jurídico adequado para conhecer a leis vigentes, saber interpretá-las e acompanhar novas publicações?
Uma contradição do Estado Democrático de Direito: conhecer a lei é dever de todos, mas compreender a lei é uma tarefa exclusiva para alguns poucos. E sem o conhecimento, ainda que básico, da linguagem jurídica o cidadão nunca terá condições nem liberdade para discutir nos espaços públicos.
Por não compreender o que dizem, ele acaba exposto a ameaças e lesões que nunca chegarão ao conhecimento do Poder Judiciário. Vulnerabilidade diante da dominação linguística, a impossibilidade de questionar o que se desconhece. Para o drama de Josef K. e de muitas pessoas: "Há muitas sutilezas em que a justiça se perde! [...]" e "Todas as coisas dependem da justiça". (KAFKA, 2007, p. 176 e 177)
Os deputados constituintes fizeram do princípio da igualdade também um direito e garantia, que serve como pilar para os outros direitos (artigo 5º, caput): "todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza". Mas, se somos todos iguais, somos iguais a quem?
Em um Estado em que o conhecimento jurídico é obrigatório e, no entanto, presumido, essa igualdade é passível de questionamento. Algumas poucas pessoas que trabalham na área do Direito certamente não são iguais a maioria da população da brasileira que desconhece, inclusive, suas obrigações como cidadão. Essa igualdade é meramente formal e continuará a ser enquanto a democratização do saber jurídico não acontecer.