Comissão de Corretagem - Quando pode e quando não pode ser restutuída ao consumidor


11/02/2019 às 10h23
Por Oscar Karnal

O corretor de imóveis é uma categoria profissional autônoma. Isso quer dizer que as imobiliárias, construtoras e incorporadoras geralmente não possuem relação de emprego com seus corretores, que não ganham salários ou rendimentos fixos, sobrevivendo unicamente da comissão em cima dos imóveis que efetivamente vendem. Essa comissão é geralmente chamada de “comissão de corretagem” ou “taxa de corretagem”, e é paga ao corretor sempre que ele vende o imóvel.

 

As incorporadoras geralmente não embutem essa taxa no preço do imóvel, o que faz com que o consumidor, ao comprar o imóvel, tenha ainda que pagar uma comissão de corretagem “por fora”, valor que é diretamente transferido ao corretor responsável pela venda.

 

Durante muito tempo, muitos consumidores ingressaram na justiça alegando que essa prática era abusiva, de acordo com o Código de Defesa do Consumidor e, por muito tempo, boa parte da jurisprudência concordou com esse posicionamento, e condenou as incorporadoras a devolverem esse valor aos consumidores.[1]

 

Esse entendimento foi, a princípio, abolido pela jurisprudência com o julgamento do Tema 938 do Superior Tribunal de Justiça, especificamente do recurso especial nº 1.599.511/SP. Ali, ficou firmado que a transferência da comissão de corretagem para o consumidor não é, por si só, abusiva.[2]

 

Esse recurso foi julgado sob rito especial que faz com que todos os Tribunais e Juízes do país têm que seguir o entendimento.

 

No entanto, esse entendimento não se aplica imediatamente a todos os casos em que se pleiteia a devolução de valores pagos a título de comissão de corretagem, sendo possível imaginar que ainda seja cabível em alguns casos, desde que a ação seja proposta dentro do prazo prescricional de três anos.

 

Casos de Desrespeito ao Dever de Informação

 

Embora a transferência da obrigação de pagamento da comissão de corretagem não seja, por si só, abusiva, a construtora/incorporadora é obrigada a informar a cobrança de maneira clara, destacando especificamente no contrato o valor que é devido a esse título.[3]

 

Muitas vezes, só após a venda já estar concretizada, inclusive com pagamento de valor de sinal é que se informa ao consumidor que existe um preço “surpresa”, que é a comissão de corretagem. Essa prática segue sendo considerada abusiva.

 

A comissão de corretagem deve estar descrita no contrato firmado pelo consumidor e destacada, de modo que o consumidor saiba exatamente que tem que pagar aquele valor e qual é o valor a ser pago.

 

O mesmo vale para a oferta. Se um panfleto, propaganda ou anúncio do imóvel trouxer a descrição de determinado preço, sem ressalvar que outras taxas podem ser aplicadas, aquele preço vincula a vendedora, sendo abusiva a inclusão de comissão de corretagem além deste valor.

 

Assim, em casos em que o consumidor seja surpreendido pela cobrança de comissão de corretagem, ainda é possível que esta seja considerada abusiva, por ofensa ao dever de informação, cabendo a sua restituição, talvez até mesmo em dobro dependendo do caso.[4]

 

Casos em Que a Negociação Não se Concretiza

 

Conforme exposto, a Comissão de Corretagem é um valor pago pela intermediação de um negócio. Isso quer dizer que o corretor não é remunerado por seu trabalho, mas por seus resultados. Se o negócio não se aperfeiçoa, não importa quanto o corretor trabalhou, não há que se falar em pagamento de Comissão de Corretagem. [5]

 

Isso quer dizer, por exemplo, que se o consumidor paga um valor a título de sinal, e depois desiste do negócio, por qualquer razão que seja, não é devida comissão de corretagem.

 

Não raro também é a ocorrência de um caso em que o consumidor inicia as tratativas com um corretor, mas acaba não fechando negócio. Tempos depois, conversa com outro corretor e acaba convencido a comprar o imóvel. Nesse caso, a comissão é devida unicamente ao corretor que efetivamente auxiliou na concretização da venda, não sendo cabível a cobrança pelo primeiro corretor, que não teve êxito na venda.

 

Casos de Rescisão do Contrato de Promessa de Compra-e-venda

 

A Rescisão do Contrato de Promessa de Compra-e-venda é cada vez mais comum no Brasil. Com o fim do “boom” econômico vivido nos últimos tempos, e a imediata crise em que o país se afundou, muitas empresas não têm conseguido mais vender imóveis com a mesma facilidade. Isto faz com que tenham menos dinheiro para terminar de construir imóveis que venderam “na planta”.

 

Aliado a isso, existem dificuldades inerentes ao cenário brasileiro, como a morosidade do serviço público, greves de algumas categorias, falta de materiais etc., que acabam fazendo com que muitas construtoras atrasem a entrega de imóveis vendidos “na planta”.

 

Apesar de considerar razoável um prazo de até cento e oitenta dias de tolerância para o atraso, muitas empresas não conseguem entregar os imóveis dentro desse prazo, o que faz com que o consumidor ingresse com uma ação para rescindir o Contrato de Promessa de Compra-e-venda.

 

Quer seja nesse caso, quer seja em casos em que o consumidor rescinde contrato por sua própria culpa – porque não consegue pagar o financiamento ou simplesmente porque desiste do negócio –, o entendimento da jurisprudência é o de que deve haver a devolução dos valores pagos pelo consumidor, integralmente, se a rescisão for por culpa da construtora/incorporadora; e parcialmente, se a rescisão for por culpa do próprio consumidor.[6]

 

Nesse caso, entre os valores a serem restituídos, está também a Comissão de Corretagem, não por se tratar de uma cobrança abusiva, mas simplesmente como uma forma de resolução do Contrato de Promessa de Compra-e-venda.

 

Casos em Que Não Há Prestação de Serviço de Corretagem

 

Mais do que um serviço de venda de imóveis, o serviço de corretagem é um serviço de consultoria. Ainda que o Superior Tribunal de Justiça já tenha aceitado o que a sociedade já aceitara, ou seja, que os corretores de imóveis podem ter interesse final de fechar o negócio, o bom Serviço de Corretagem é muito mais complexo, e envolve a adequação da venda ao perfil e às necessidades do consumidor.

 

Como todo serviço, existe a possibilidade de o consumidor optar por não o contratar, não sendo obrigatório que contrate.

 

Assim, um imóvel comprado pela internet, sobretudo no exterior, por exemplo, não precisa necessariamente envolver um corretor de imóveis. Se não há prestação de serviço de corretagem, obviamente não há que se falar em pagamento de Comissão de Corretagem, sob pena de enriquecimento sem causa.

 

Igualmente, em casos em que um imóvel vendido ou alugado diretamente por seu proprietário para alguém que tenha interesse em compra-lo ou aluga-lo, sem intervenção de um corretor de imóveis, não há cabimento na cobrança de qualquer valor a título de Comissão de Corretagem.

 

Assim, é possível concluir que, embora a transmissão da obrigação de pagamento da comissão de corretagem não seja considerada, por si só, abusiva, existem casos em que sua cobrança pode ser ilegal. Desse modo, existem casos em que o consumidor pode se recusar a pagar ou ter restituídos os valores eventualmente pagos em virtude dos serviços de corretagem imobiliária.

 

[1] TJDFT - Acórdão n.933463, 20140111005626APC, Relator: VERA ANDRIGHI 6ª TURMA CÍVEL, Data de Julgamento: 06/04/2016, Publicado no DJE: 19/04/2016. Pág.: 435/484

[2] STJ – REsp 1.599.511/SP, Relator: Min. Paulo de Tarso Sanseverino 2ª Seção, Julgamento: 24/08/2016, Publicação: 06/09/2016.

[3]  Art. 6º São direitos básicos do consumidor: (...) III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;

[4] Acórdão n.868230, 20120111089672APC, Relator: ALFEU MACHADO, Revisor: FÁTIMA RAFAEL, 3ª TURMA CÍVEL, Data de Julgamento: 20/05/2015, Publicado no DJE: 29/05/2015. Pág.: 128

[5] Acórdão n.973365, 20150710102887APC, Relator: CARLOS RODRIGUES 6ª TURMA CÍVEL, Data de Julgamento: 21/09/2016, Publicado no DJE: 18/10/2016. Pág.: 393/422.

[6] Súmula 543/STJ: Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador - integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento.

  • direito imobiliário
  • direito do consumidor
  • comissão de corretagem
  • rescisão promessa de compra-e-venda
  • direito de informação

Referências

[1] TJDFT - Acórdão n.933463, 20140111005626APC, Relator: VERA ANDRIGHI 6ª TURMA CÍVEL, Data de Julgamento: 06/04/2016, Publicado no DJE: 19/04/2016. Pág.: 435/484

[2] STJ – REsp 1.599.511/SP, Relator: Min. Paulo de Tarso Sanseverino 2ª Seção, Julgamento: 24/08/2016, Publicação: 06/09/2016.

[3]  Art. 6º São direitos básicos do consumidor: (...) III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;

[4] Acórdão n.868230, 20120111089672APC, Relator: ALFEU MACHADO, Revisor: FÁTIMA RAFAEL, 3ª TURMA CÍVEL, Data de Julgamento: 20/05/2015, Publicado no DJE: 29/05/2015. Pág.: 128

[5] Acórdão n.973365, 20150710102887APC, Relator: CARLOS RODRIGUES 6ª TURMA CÍVEL, Data de Julgamento: 21/09/2016, Publicado no DJE: 18/10/2016. Pág.: 393/422.

[6] Súmula 543/STJ: Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador - integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento.


Oscar Karnal

Advogado - Brasília, DF


Comentários