Matheus Fernandes da Silva¹
Raul Felipe Silva Carlos²
Edgar Clementino de Souza Neto³
RESUMO
O Superior Tribunal de Justiça, por meio de suas terceira e quata turmas, em recentes precedentes firmou o entendimento de que é possível a penhora de imóvel caracterizado como bem de família dado como garantia. O bem de família representa uma proteção às condições mínimas de vida, prestigiando a dignidade da pessoa humana, sendo princípio de ordem pública. Nesse prisma, a Lei 8.009/1990 trata da sua impenhorabilidade. De acordo com o entendimento do STJ, a impenhorabilidade pode ser afastada em caso de confronto com a boa-fé, valorizando a vontade livremente manifestada. Dessa maneira, cumpre analisar se a proteção ao bem de família deve se sobressair diante de questões patrimoniais, como a alienação fiduciária. Aferir se há (in) constitucionalidade na relativização à restrição da responsabilidade patrimonial diante do instituto do bem de família.
Palavras-Chave: Impenhorabilidade; garantia; constitucionalidade; boa-fé; vontade livre.
SUMÁRIO: Introdução; 1. Bem de família: apontamentos iniciais; 2. Alienação Fiduciária; 3. Diagnóstico do posicionamento do STJ; Considerações finais; Referências Bibliográficas.
INTRODUÇÃO
O presente artigo tem como objetivo apresentar uma análise tomando por base o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça acerca do bem de família na alienienação fiduciária.
Trabalho a partir do estudo bibliográfico levantado sobre a temática, compreendendo livros, artigos científicos, manuais de Direito Civil e jurisprudências. Busca-se empregar o método dialético em que há a justaposição de ideias tendo como premissa o entendimento do Superior Tribunal de Justiça.
Desta feita, refletir sobre a discussão no ordenamento pátrio acerca da possibilidade de impenhorabilidade dos bens de família, sobretudo na ótica do instrumento da alienação fiduciária. Percebe-se que a temática é palco de diversos e relevantes julgados no Superior Tribunal de Justiça, urgindo assim reflexos de sua aplicabilidade.
1. BEM DE FAMÍLIA: APONTAMENTOS INICIAIS
O direito civil, historicamente encontra-se intimamente ligado a orientação liberal da economia trazida pela Revolução Francesa, refletindo uma sobreposição do patrimônio sobre a pessoa, sob a máxima do brocado latim “pacta sunt servanda”, em que o contrato faz lei entre as partes.
Todavia, o panorama jurídico pátrio vem se transformando com fulcro de garantir maior proteção à pessoa, essa mudança jurídica ocorre em virtude do advento da Constituição da República, como bem ensina os modernos civilistas Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald (2017, p. 552):
Com a definição de uma nova tábua axiomática pela Constituição da República de 1988, promovendo ideias sociais, no entanto, impõe-se uma releitura dos institutos clássicos (fundamentais) do estatuto patrimonial das relações privadas, funcionalizando-os para a promoção da dignidade da pessoa humana e da solidariedade social, além da impositiva igualdade substancial, afirmadas constitucionalmente (arts. 1º,III, 3º e 5º). Em outras palavras, vem se empreendendo elevado esforço no sentido de recuperar a preponderância da pessoa em relação ao patrimônio,"abandonando o caráter neutro e despreocupado do ordenamento jurídico, para o aproximar da realidade social brasileira.
Desta feita, a Constituição impõe uma nova moldura jurídica para o direito civil, passando a privilegiar o ser ao invés do ter, elencando expressamente como fundamento da república, a dignidade da pessoa humana, além de constituir objetivos sociais no sentido de buscar a erradicação da pobreza e da marginalização, fundada também na ideia de patrimônio mínimo, revelando um dos aspectos concretos da dignidade da pessoa humana, e o exemplo mais forte que se pode dar deste desdobramento da dignidade da pessoa humana é, sem dúvida, a proteção ao bem de família.
No tocante a origem do bem de família, conforme Álvaro Villaça Azevedo (1974, p. 19), citado por Flávio Tartuce (2019, p. 186), escreve que a origem do bem família encontra-se na República do Texas, com um tratamento diferenciado, no qual o direito americano visa proteger a pequena propriedade agrícola, residencial, da famíla.
O bem de família é o imóvel utilizado como residência da entidade familiar, e nos dias atuais em que o conceito de família e cada vez mais amplo, fundado nas relações de afeto, que se mostra um modelo familiar descentralizado, democrático e plural, não poderiam deixar de gozar desta proteção o imóvel onde reside a pessoa solteira, viúva ou separada, nesse sentido é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, estampado na súmula 364.
Importa salientar que o ordenamento pátrio possui duas formas de bem de família, o bem de família voluntário ou convencional, tratado pela codificação civil de 2002 entre seus artigos 1711 a 1722, e por outro lado, existe o bem de família legal, regulado pela lei 8009 de 1990.
1.1 BEM DE FAMÍLIA VOLUNTÁRIO OU CONVENCIONAL
O bem de família voluntário é aquele prescrito pelo código civil, e pode ser instituído pelos cônjugues, pela entidade familiar ou por terceiro, por meio de escritura pública, testamento ou doação, limitando-se a um terço do patrimônio líquido das pessoas que fazem a instituição, nesse sentido é o artigo 1711 do código civil.
Destarte, com a instituição do bem de família atráves do registro no cartório de registro de imóveis do local em que o mesmo está situado, o prédio se torna inalienável e impenhorável, é necessário esclarecer que o direito não é absoluto e comporta limitações, até mesmo para evitar fraudes e proteger os credores. Tal proteção nos casos previstos no artigo 1715, ou seja, dívidas anteriores à constituição do bem, dívidas posteriores, relacionadas com tributos relativos ao prédio, e também as despesas de condomínio.
Segundo Cristiano Chaves e Nelson R. (2017, p. 558) o código Reale inova ao trazer proteção também aos valores imobiliários cuja renda venha ser aplicada na conservação do imóvel, bem como, no sustento da família, inspirado na inovação legiferante, o Superior Tribunal de Justiça editou a súmula 486:
É impenhorável o único imóvel residencial do devedor que esteja locado a terceiros, desde que a renda obtida com a locação seja revertida para a subsistência ou a moradia da sua família.
1.2 BEM DE FAMÍLIA LEGAL
O bem de família legal é aquele regulamentado pela lei 8009 de 1990, norma de ordem pública que visa proteger tanto pessoa como supramencionado bem como a entidade familiar.
Em virtude de a norma ser de ordem pública e protetiva em perfeita harmonia com a Carta Magna de 1988, o Superior Tribunal de Justiça editou a súmula 205 com a finalidade de atingir penhoras constituídas antes da entrada da lei em vigor, desde modo, possuindo um efeito retroatrivo.
A impenhorabilidade não atinge somente o bem utilizado como residência da família, mas também em decorrência do entendimento do STJ atráves da súmula 486, compreende-se também protegido os imóveis locados, em que a renda se reverta em favor da manutenção da familiar, bem como para locação de outro imóvel, é o que a doutrina chama de bem de família indireto.
Covém destacar que as pessoas que não tem imóvel próprio também se encontram cobertas pelo parágrafo único do artigo 1º da lei 8009, a impenhorabilidade recai sobre os móveis quitados que guarneçam a rsidência e que sejam da propriedade do locatário, desta forma atingindo os veículos, obras de arte e adornos, em contraposição a legislação e ao princípio da gravitação jurídica (o acessório segue o principal), entendeu o Superior Tribunal de Justiça e estampou na súmula 449, que a vaga da garagem que possui matrícula própria no registro de imóveis não constitui bem de família para efeito de penhora.
2. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA
A alienação fiduciária de bens imóveis é o negócio jurídico em que o adquirente ou devedor, transfere a propriedade resolúvel de coisa imóvel, como forma de garantia.
Este tipo de negócio pode ser executado para garantir o pagamento de qualquer dívida, podendo ser instituído entre pessoas físicas ou jurídicas. Dessa forma, a alienação fiduciária representa um benefício para ambas as partes contratantes, pois este instituto pode ser utilizado para dar garantia a um empréstimo, por exemplo, como também pode ser utilizado para dar garantia de pagamento do saldo devedor relativo à aquisição de um bem imóvel.
Dessa forma, ao honrar o pagamento da dívida, o credor-fiduciário deverá entregar ao devedor-fiduciante o Termo de Quitação, que autoriza o Oficial do Registro de Imóveis a dar baixa na liberação fiduciária. Liberando, dessa forma, o imóvel do encargo.
Contudo, caso a dívida não seja saldada, o imóvel será a garantia real em favor do credor, que poderá promover os atos de cobrança extrajudicial, notificando o devedor a pagar as parcelas, por meio do Cartório de Registro de Imóveis e, posteriormente, promovendo atos de alienação do bem, através de leilão, conforme prevê a lei 9.514/97. Este é o procedimento pelo qual o credor executa a garantia real recebida por ocasião da contratação, com vistas ao recebimento dos valores contratados, ressaltando-se que tal situação pode ocorrer em qualquer momento, durante a vigência do contrato, de modo que se houver parcelas futuras a serem pagas, estas vencerão antecipadamente, diante da inadimplência, já referida.
Outrossim, a alienação fiduciária, com o decorrer dos tempos, também passou a ser admitida como garantia de débitos civis incidente sobre bens imóveis com a edição da lei 9.514/97, conforme inteligência do § 1º do artigo 22 da lei.
Inicialmente admitida apenas como garantia de operações de financiamento imobiliário, com o advento da Lei n. 10.931/04 a alienação fiduciária de bem imóvel passou a ser expressamente admitida como garantia de quaisquer obrigações por força do disposto em seu artigo 51: “Art. 51. Sem prejuízo das disposições do Código Civil, as obrigações em geral também poderão ser garantidas, inclusive por terceiros, por cessão fiduciária de direitos creditórios decorrentes de contratos de alienação de imóveis, por caução de direitos creditórios ou aquisitivos decorrentes de contratos de venda ou promessa de venda de imóveis e por alienação fiduciária de coisa imóvel”
Neste cenário, o devedor (fiduciante), sendo proprietário de um bem imóvel, aliena-o ao credor (fiduciário) a título de garantia, ficando o credor com a propriedade deste imóvel até que seja satisfeita a obrigação. Em razão da constituição da propriedade, o credor fiduciário passa a ter a posse indireta do bem, enquanto que o devedor fiduciante permanece com a posse direta, na qualidade de depositário.
Do exposto, a alienação fiduciária pode ser definida como um negócio contratual, norteado pela confiança recíproca das partes, cuja finalidade é propiciar maior facilidade ao consumidor na aquisição de bem imóvel, ou para a obtenção de empréstimo bancário, e, ao mesmo tempo, oferecer uma garantia mais eficaz aos financiadores e aos credores, protegidos pela propriedade resolúvel da coisa financiada na constância da dívida, conferindo-lhe o legislador, instrumentos processuais eficientes para a proteção de seu direito.
3. DIAGNÓSTICO DO POSICIONAMENTO DO STJ
O Superior Tribunal de Justiça vem reconhecendo a validade da cláusula contratual que prevê a alienação fiduciária de imóvel caracterizado como bem de família. Recursos especiais, julgados pelas turmas de direito privado, vieram a consagrar tal entendimento.
O raciocínio parece ter assentado pacificamente no Egrégio Tribunal, que já teve oportunidade de se pronunciar mais de uma vez sobre o tema. Sob tal perspectiva, cite-se:
RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC/1973. NÃO OCORRÊNCIA. INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. CONVENIÊNCIA E OPORTUNIDADE. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. TRANSMISSÃO CONDICIONAL DA PROPRIEDADE. BEM DE FAMÍLIA DADO EM GARANTIA. VALIDADE DA GARANTIA. VEDAÇÃO AO COMPORTAMENTO CONTRADITÓRIO. [...] 3. A jurisprudência desta Corte reconhece que a proteção legal conferida ao bem de família pela Lei n. 8.009/90 não pode ser afastada por renúncia do devedor ao privilégio, pois é princípio de ordem pública, prevalente sobre a vontade manifestada. 4. A regra de impenhorabilidade aplica-se às situações de uso regular do direito. O abuso do direito de propriedade, a fraude e a má-fé do proprietário devem ser reprimidos, tornando ineficaz a norma protetiva, que não pode tolerar e premiar a atuação do agente em desconformidade com o ordenamento jurídico [...] 7. Sendo a alienante pessoa dotada de capacidade civil, que livremente optou por dar seu único imóvel, residencial, em garantia a um contrato de mútuo favorecedor de pessoa diversa, empresa jurídica da qual é única sócia, não se admite a proteção irrestrita do bem de família se esse amparo significar o alijamento da garantia após o inadimplemento do débito, contrariando a ética e a boa-fé, indispensáveis em todas as relações negociais. 8. Recurso especial não provido. (REsp Nº 1.559.348/ DF, RELATOR : M. LUIS FELIPE SALOMÃO, quarta turma) (grifo nosso).
DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE BEM IMÓVEL RECONHECIDO COMO BEM DE FAMÍLIA. POSSIBILIDADE. CONDUTA QUE FERE A ÉTICA E A BOA-FÉ. [...] 4. A questão da proteção indiscriminada do bem de família ganha novas luzes quando confrontada com condutas que vão de encontro à própria ética e à boa-fé, que devem permear todas as relações negociais. 5. Não pode o devedor ofertar bem em garantia que é sabidamente residência familiar para, posteriormente, vir a informar que tal garantia não encontra respaldo legal, pugnando pela sua exclusão (vedação ao comportamento contraditório). 6. Tem-se, assim, a ponderação da proteção irrestrita ao bem de família, tendo em vista a necessidade de se vedar, também, as atitudes que atentem contra a boa-fé e a eticidade, ínsitas às relações negociais. 7. Ademais, tem-se que a própria Lei 8.009/90, com o escopo de proteger o bem destinado à residência familiar, aduz que o imóvel assim categorizado não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, mas em nenhuma passagem dispõe que tal bem não possa ser alienado pelo seu proprietário. 8. Não se pode concluir que o bem de família legal seja inalienável e, por conseguinte, que não possa ser alienado fiduciariamente por seu proprietário, se assim for de sua vontade, nos termos do art. 22 da Lei 9.514/97.9. Recurso especial conhecido e não provido. (RECURSO ESPECIAL Nº 1.560.562 – SC, terceira turma) (grifo nosso).
Insta destacar que a questão já vem sendo palco de discussões nas instâncias inferiores. Citamos precedente do Tribunal de Justiça de Minas Gerais que segue a linha de pensamento do Tribunal Superior (TJ – MG – AC: 10452140021885003 MG, Relator: Tiago Pinto, Data de Julgamento: 07/07/2016, Câmaras Cíveis / 15ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 15/07/2016).
Inicialmente importa entender que a proteção legal ao bem de família representa um reflexo do mínimo existencial, concretização do princípio da dignidade da pessoa humana, um dos fundamentos da República brasileira. Assim é que a já citada Lei 8.009 de 1990 se preocupa em regular a matéria.
Nesse sentido, FACHIN (2006) defende a garantia de um patrimônio mínimo, cujo escopo seria assegurar uma existência digna. Tal percepção perpassa a noção de um Direito civil constitucionalizado, consequentemente desarraigando a concepção estritamente individual/patrimonialista dos institutos de direito privado.
Em voto-vencido no recurso especial nº 1.559.348/DF, o Ministro Raul Araújo destaca: “[...] o legislador, ao proteger essa instituição, o bem de família, o faz, a meu ver, muito mais voltado para o aspecto da fragilidade momentânea da pessoa, quando tomadora de empréstimo junto a instituições financeira”.
Os fundamentos usados pelo Eminente Ministro conformam os ensinamentos da doutrina que melhor se adequam aos parâmetros civís-constitucionais vigentes. Desta forma, se pode concluir que o bem de família, a despeito de a lei somente mencionar sua impenhorabilidade, seja inalienável e, por conseguinte, que não possa ser alienado fiduciariamente por seu proprietário.
Tem-se que a proteção ao bem de família deve ser entendida amplamente, de modo a justificar a interpretação restritiva de institutos que operem sua mitigação. Assim, se impõe sobre a boa-fé, uma vez que coaduna preceito de ordem pública, sob o qual não deve caber disposição de vontade do indivíduo. Nesse sentido é o Código de Defesa do Consumidor, ao considerar nulas de pleno direitos as cláusulas que impliquem renúncia ou disposição de direitos (artigo 51, I).
Apesar de a boa-fé se mostrar como coluna estruturante para o Direito Civil, há de se concordar com a postura do Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, ao proferir voto (vencido): “a proteção conferida pela lei ao bem de família é irrenunciável o que, por si só, é suficiente para reputar nula a cláusula de garantia fiduciária dada ao contrato de mútuo em virtude da sua impenhorabilidade” (STJ- REsp nº 1.677.015/SP, relator: min. Paulo de Tarso Sanseverino).
Portanto, o alcance hermenêutico que apurado nos institutos de Direito Privado deve coincidir com a proteção máxima à pessoa humana em sua integridade existencial. Neste caso, trata-se de conferir proteção à entidade familiar, ao mínimo patrimonial para que se possa viver. Desta maneira é a Carta Maior brasileira, ou seja, expressa inconstitucionalidade há se assim não se interpreta o bem de família.
A jurisprudência já teve a oportunidade de assim se posicionar:
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO ANULATÓRIA. ACORDO HOMOLOGADO
JUDICIALMENTE. OFERECIMENTO DE BEM EM GARANTIA. PEQUENA
PROPRIEDADE RURAL. IMPENHORABILIDADE. EQUIPARAÇÃO À GARANTIA REAL HIPOTECÁRIA. DESCABIMENTO. 1- A proteção legal assegurada ao bem de família pela Lei 8.009/90 não pode ser afastada por renúncia, por tratar-se de princípio de ordem pública, que visa a garantia da entidade familiar. 2- A ressalva prevista no art. 3º, inciso V, da Lei 8.009/90 não alcança a hipótese dos autos, limitando-se, unicamente, à execução hipotecária, não podendo benefício da impenhorabilidade ser afastado para a execução de outras dívidas. Por tratar-se de norma de ordem pública, que visa a proteção da entidade familiar, e não do devedor, a sua interpretação há de ser restritiva à hipótese contida na norma. 3- Recurso Especial improvido (REsp 1.115.265/RS, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 24/04/2012, DJe 10/05/2012).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir das reflexões neste trabalho, aduz-se que o bem de família representa uma concretização do princípio da dignidade da pessoa humana. Com vistas à proteção da integridade do indivíduo, compreendendo suas necessidades vitais, o instituto privilegia aspectos existenciais à solidificação da propriedade privada. Esta base axiológica é invocada, principalmente, após o advento de um Direito Civil constitucionalizado.
Neste sentido, nada justifica institutos privados, pensados sobre égide patrimonial, devorem a real intenção do legislador ao conferir especial proteção ao bem de família. Nada obstante, o STJ tem entendido de forma diversa, privilegiando a disposição de vontade e a boa-fé dos contratantes. Sobre tais argumentos, entende-se que o instituto legal referido é norma de ordem pública e se impõe imperativamente, portanto não podendo ser objeto de disposição. Se assim o for, estaria desidratando a própria cadeia normativo-axiológica constitucional.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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