A PRESTAÇÃO JURISDICIONAL E O ACESSO À JUSTIÇA COMO GARANTIAS CONSTITUCIONAIS: PANORAMA DAS NOVAS NORMAS GERAIS DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL BRASILEIRO
A CONSTITUTIONAL PROVISION AND ACCESS TO JUSTICE AS A CONSTITUTIONAL GUARANTEES: OVERVIEW OF NEW GENERAL RULES OF NEW BRAZILIAN CIVIL PROCEDURE CODE
Samantha Caroline Ferreira Moreira
Advogada. Mestra em Direito Privado. Especialista em Direito Empresarial com ênfase nas relações de mercado. Especialista em Direito Civil e Processo Civil. E-mail: sthmoreira@yahoo.com.br
RESUMO
A deficiência técnica na prática dos procedimentos judiciais, bem como a cultura da litigância excessiva brasileira acabam por implicar em um dos maiores obstáculos à missão do Poder Judiciário, qual seja, a tempestividade na entrega da prestação jurisdicional. Nesse contexto, o CPC/2015, enfatiza a necessidade da eficiência da prestação jurisdicional e convoca as partes, sempre que possível, a resolver seus conflitos de forma amigável, possibilitando a prévia designação de audiência de conciliação ou de mediação, antes mesmo de a parte contrária protocolar sua defesa. Para tanto, prevê a criação de centros com profissionais especializados, com a devida formação de mediadores e conciliadores. O presente artigo tem por escopo estudar se as novidades trazidas nas normas gerais, bem como os dispositivos concernentes à postura das partes no processo judicial, serão benéficas e proporcionarão celeridade e eficiência aos procedimentos judiciais. A pretensão é de que a presente pesquisa seja útil à comunidade jurídica e à sociedade, a fim de contribuir para pacificação e diminuição de litígios no cenário nacional.
Palavras-chave: Efetividade; Prestação jurisdicional; Acesso à justiça; Novo Código de Processo Civil; Conciliação;
ABSTRACT
A technical failure in practice of judicial procedures and the culture of Brazilian excessive litigation ultimately result in a major obstacle to the mission of the judiciary, namely, the timeliness in the delivery of judicial services. In this context, the CPC / 2015 emphasizes the need for efficiency of adjudication and calls the parties, whenever possible, to resolve conflicts amicably, enabling the prior designation of hearing conciliation or mediation, even before the part contrary to file his defense. Therefore, it provides for the establishment of centers with specialized professionals with proper training of mediators and conciliators. Still, this article is scope to study whether the novelties introduced in the general rules and the provisions concerning the position of the parties in the judicial process will be beneficial and will provide speed and efficiency of judicial proceedings. The claim is that this research will be useful to the legal community and society in order to contribute to peace and decrease disputes in the national scene.
Keywords: Effectiveness; Access to justice; New Civil Procedure Code; Conciliation;
1 Introdução
A razoável e tempestiva duração do processo são formas de se alcançar um Poder Judiciário célere, anseio de toda a sociedade, inclusive dos operadores do Direito.
A permanente demora das decisões judiciais e no trâmite do processo como um todo incide na verdadeira denegação ao acesso à justiça e violação dos ditames constitucionais, inclusive no que concerne à necessária segurança para a realização dos negócios jurídicos empresariais (CAPPELLETTI, 1988, p. 39).
Especificamente no art. 5º, inc. LXXVIII, da CF/88, o legislador constitucional estabelece o direito de todos terem "assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação” (BRASIL, 1988).
É primordial que a prestação jurisdicional e o acesso à justiça, como pressupostos constitucionais, observem a legislação, especificamente de ordem econômica, para diminuir os custos envolvidos na manutenção de um processo e minimizar a quantidade de falhas nas decisões judiciais (CAPPELLETTI, 1988, p. 19).
De um lado, a demora no processo representa a falibilidade do Direito na proteção das situações concretas, que sofrem deformações com o decurso do tempo. De outro, a precipitação dos chamados provimentos sumários ou medidas de cognição parcial resulta na fragilização da ampla defesa e do estabelecimento do contraditório.
Nas palavras do presidente da comissão de juristas encarregada da elaboração do Anteprojeto do CPC, Ministro do Supremo Tribunal de Justiça, Luiz Fux: “O Brasil clama por um processo mais ágil, capaz de dotar o país de um instrumento que possa enfrentar de forma célere, sensível e efetiva, as misérias e as aberrações que passam pela Ponte da Justiça” (BRASIL, 2010).
O processo é um instrumento destinado à vontade da lei, devendo, na medida do possível, desenvolver-se mediante um procedimento célere, a fim de que a tutela jurisdicional seja oportuna e efetiva, sendo certo que a tempestividade e a efetividade da referida tutela são elementos primordiais para se determinar o grau de eficiência dos tribunais.
Em trabalho sobre o tema, destacamos que o sentido da palavra “justiça” há muitos anos é objeto de investigação jurídica e filosófica. Na acepção do jurisconsulto Ulpiano, "a justiça consiste em dar a cada um o que é seu". Podemos citar ainda estudos analisando a ideia de justiça em Aristóteles, Kant, Hegel e Radbruch . No aspecto jurídico, a justiça tem por finalidade a garantia dos direitos e deveres previstos no ordenamento legal, propiciando o convívio harmônico. (SANTOS, 2013, p. 22).
Destarte, o Poder Judiciário desempenha a relevante função de assegurar a efetiva aplicação da justiça, sendo que a administração judiciária eficaz é fundamental até para aquele que perde a demanda, já que, sob o enfoque psicológico e econômico, a espera demorada e desnecessária da jurisdição causa descrédito na legislação e no próprio Poder Judiciário.
Desse modo, o novo diploma processual, CPC/2015, enfatiza a noção da prestação jurisdicional como serviço público adequado e eficiente, a partir da concepção de um novo formalismo, cujo objetivo é buscar a “solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa”, em “prazo razoável” (art. 4º), bem como será enfatizado o importante papel das partes no curso do processo, onde será exigido o dever de lealdade, boa-fé e cooperação processual.
2 A prestação jurisdicional e o acesso à justiça como garantias constitucionais
O processo é um instrumento destinado à vontade da lei, devendo, na medida do possível, desenvolver-se mediante um procedimento célere, a fim de que a tutela jurisdicional seja oportuna e efetiva, sendo certo que a tempestividade e a efetividade da referida tutela são elementos primordiais para se determinar o grau de eficiência dos tribunais.
A Constituição Federal em seu art. 5º, inc. XXXIV, onde se assegura o direito de petição aos Poderes Públicos, a obtenção de certidões em repartições públicas e a gratuidade das taxas judiciárias; assim como em seu inc. XXXV, onde se afirma taxativamente que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito”, consagra o direito a jurisdição. (BRASIL, 1988).
A prestação jurisdicional, por óbvio, não se esgota com a prolação da sentença, mas também nos provimentos cautelares e antecipatórios, sendo imprescindível a condução do processo de forma eficaz pelo magistrado, haja vista o crescente número de demandas, sendo imprescindível que, ao final da demanda, esteja solucionado o conflito e não a lide (SANTOS; MOREIRA, 2015, p. 15).
Mauro Cappelletti (1988, p. 98-103) aborda a questão do acesso à justiça sob o prisma da efetividade e apontam que os obstáculos para alcançá-la são: os custos do processo, condições financeiras das partes, capacidade de suportar as delongas do processo (também relacionada às condições financeiras) e habitualidade da parte na participação em litígios[1]. O autor relaciona os obstáculos acima citados, dentre outros, especialmente à jurisdição estatal e apontam que os obstáculos criados por nosso sistema jurídico são mais pronunciados em pequenas causas e autores individuais, especialmente os pobres.
Destarte, o acesso à justiça deve ser visto como o mais básico dos direitos em um sistema jurídico igualitário que tenha por finalidade realmente garantir, e não apenas proclamar os direitos de todos. Portanto, a democratização da justiça deve se dar com a efetiva aproximação do cidadão ao Judiciário.
O entendimento de que a jurisdição deve atender ao cidadão de forma efetiva e tempestiva traz à tona o questionado problema da morosidade judicial.
Sobre a efetividade do processo e técnica processual, José Carlos Barbosa Moreira listou um “programa básico em prol da efetividade”, a saber:
a) o processo deve dispor de instrumento de tutela adequados, na medida do possível, a todos os direitos contemplados no ordenamento, quer resultem de expressa previsão normativa, que se possam inferir do sistema.
b) esses instrumentos devem ser utilizáveis.
c) impende assegurar condições propícias à exata e completa reconstituição dos fatos relevantes, a fim de que o convencimento do julgador corresponda, tanto quanto puder à realidade.
d) em toda a extensão da possibilidade prática, o resultado do processo há de ser tal que assegure à parte vitoriosa o gozo pleno da específica utilidade a que faz jus segundo o ordenamento.
e) cumpre se possa atingir semelhante resultado com o mínimo de dispêndio de tempo e energias. (BARBOSA MOREIRA, 2000, p. 161-162).
Fredie Didier Jr. e Hermes Zaneti Jr. ressaltam que a Corte Europeia dos Direitos do Homem pacificamente entendeu que:
[...] respeitadas as circunstâncias de cada caso, devem ser observados três critérios para se determinar a duração razoável do processo, quais sejam: a) a complexidade do assunto; b) o comportamento dos litigantes e de seus procuradores ou da acusação e da defesa no processo; c) a atuação do órgão jurisdicional. (DIDIER JR; ZANETI JR., 2009, p. 54).
A Corte Europeia adquire importância no desenvolvimento de uma jurisprudência a respeito da matéria, tendo em vista que a grande maioria das reclamações a ela submetidas refere-se à lentidão dos processos, em virtude da violação da garantia da tutela jurisdicional efetiva. Assim, Carlos Henrique Ramos reconhece que:
A Corte Europeia de Direitos Humanos ocupa papel primordial na proteção dos direitos humanos no continente europeu. Primeiramente, por se tratar de órgão bem aparelhado, estruturado e organizado. Além do mais, sua jurisprudência, em muitos casos, serve como mecanismo de controle, pois muitas vezes uma condenação perante a Corte pode despertar a responsabilidade dos governantes em virtude do constrangimento sofrido em face da comunidade internacional. (RAMOS, 2008, p. 87).
Destarte, o ideal é a distribuição racional do tempo do processo com efetividade do resultado e decisão tempestiva, na medida em que o julgamento tardio faz perder seu sentido reparador, por isso a Constituição Federal brasileira de 1988 assegura, em seu art. 5º, § 1º, o direito ao processo sem dilações indevidas.
O “fator tempo, que permeia a noção de processo judicial, constitui, desde há muito tempo, a mola propulsora do principal motivo de crise da justiça”, e afirma que a demora processual é fonte de “injustiça e corresponde a verdadeira denegação da justiça”, citando Elio Fazzalari ao referir-se à demora do processo como a “tormenta das tormentas”. (CRUZ E TUCCI, 1997, p. 72)
Nessa linha, o processo, para cumprir a missão que lhe atribui o Estado Democrático de Direito[2], tem que se apresentar como instrumento capaz de propiciar efetividade à garantia de “acesso à Justiça”.
Superada a enorme crise político-social causada pela 2ª Guerra Mundial, as atenções dos estudiosos do Direito voltaram-se para problemas da prestação jurisdicional até então não cogitados.
Nota-se que, depois de um século de extensos e profícuos estudos sobre os conceitos e as categorias fundamentais do Direito Processual Civil, os doutos atentaram para um fato muito singelo e muito significativo: a sociedade como um todo continuava ansiosa por uma prestação jurisdicional mais efetiva.
Sobre o ideal de justiça, com pertinência, o processualista Humberto Theodoro Júnior afirma que:
Aspirava-se, cada vez mais, a uma tutela que fosse mais pronta e mais consentânea com uma justa e célere realização ou preservação dos direitos subjetivos violados ou ameaçados; por uma Justiça que fosse amoldável a todos os tipos de conflitos jurídicos e que estivesse ao alcance de todas as camadas sociais e de todos os titulares de interesses legítimos e relevantes; por uma Justiça, enfim, que assumisse, de maneira concreta e satisfatória, a função de realmente implementar a vontade da lei material, com o menor custo e a maior brevidade possíveis, tudo através de órgãos adequadamente preparados, do ponto de vista técnico, e amplamente confiáveis, do ponto de vista ético. (THEODORO JR., 2004).
O fator tempo, que permeia a noção de processo judicial, constitui, desde há muito, a mola propulsora do principal motivo de crise da justiça.
Além disso, tais obstáculos ocasionam a diminuição dos investimentos e da utilização do capital disponível, reduzindo, por fim, a qualidade da política econômica.
A demora recorrente retira do Poder Judiciário a legitimidade que dele se espera como pacificador social por excelência. Ademais, causa na sociedade um descrédito da força normativa das leis.
O Poder Judiciário, em geral, “é visto como uma alternativa pouco eficiente, dotada de uma relação custo-benefício desequilibrada, apta a ser acionada apenas em último caso, já que a Justiça é morosa, extremamente formalizada, imprevisível e, na maioria dos casos, onerosa” (BORGES, 2002, p. 26).
Assim, é imperiosa a ocorrência de uma mudança estrutural no Poder Judiciário, a qual também resta caracterizada pela Súmula Vinculante[3], pelo necessário aumento do número de juízes e pela descentralização da Justiça através de medidas[4] extrajudiciais de resoluções de conflito.
3 O Novo Código de Processo Civil Brasileiro e a busca pela eficiência da prestação jurisdicional
Os processualistas[5] sempre se preocuparam com um valor fundamental ínsito à tutela dos direitos, qual seja: a imprescindibilidade da efetividade do processo como instrumento de realização da justiça.
A efetividade e celeridade no Novo Código de Processo Civil restam sedimentadas, conforme enfatizado no texto de apresentação do Projeto do Novo Código de Processo Civil: “É que; aqui e alhures não se calam as vozes contra a morosidade da justiça. O vaticínio tornou-se imediato: “justiça retardada é justiça denegada” e com esse estigma arrastou-se o Poder Judiciário, conduzindo o seu desprestígio a índices alarmantes de insatisfação aos olhos do povo. Esse o desafio da comissão: resgatar a crença no judiciário e tornar realidade a promessa constitucional de uma justiça pronta e célere”. (BRASIL, 2010)
Desse modo, verifica-se que a noção da prestação jurisdicional como serviço público adequado e eficiente, a partir da concepção de um novo formalismo, cujo objetivo é a satisfação e solução dos conflitos em um prazo razoável, está amparada pela maioria dos dispositivos do novo instrumento processual.
3.1 Panorama das novas normas gerais do novo código de processo civil brasileiro
Nas normas gerais do novo Código de Processo Civil Brasileiro (CPC/2015), Lei nº 13.105, de 18 de março de 2015,[6] cumpre destacar, sem a pretensão de se esgotar o tema, algumas inovações que buscam eficiência da prestação jurisdicional, tais como as normas expressas no o art. 4º, onde temos a determinação de que as partes têm o direito da solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa; art. 9º o estabelecimento do reforço das garantias ao contraditório.
O art. 3º do CPC/2015 reproduz, com pequena distinção redacional, o teor do art. 5º, inc. XXXV, da CF/88, assento legal do denominado direito fundamental à jurisdição ao dispor que “Art. 3º. Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito. § 1º É permitida a arbitragem[7], na forma da lei. § 2º O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos. § 3º A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial. (BRASIL, 2015)
Diante desse panorama, é imperioso que o Poder Judiciário não só consiga nortear as decisões dos juízes de instância inferiores e a vida social, mas também que recupere seu crédito perante a sociedade como um todo ao otimizar seu desempenho.
As normas legais têm de ser reinterpretadas em face da nova Constituição, não se lhes aplicando automática e acriticamente, a jurisprudência forjada no regime anterior. Deve-se rejeitar uma das patologias crônicas da hermenêutica constitucional brasileira, que é a interpretação retrospectiva, pela qual se procura interpretar o texto novo de maneira a que ele não inove nada, mas, ao revés, fique tão parecido quanto possível com o antigo (BARROSO, 1996, p. 67/68)
Fred Didier Jr. (2015. P. 237) observa que o novo CPC, Lei 13.105, de 16 de março de 2015, não contém apenas normas jurídicas novas, havendo, é claro, normas antigas. Mas ressalta, especialmente, as: normas jurídicas novas; pseudonovidades normativas; e normas de caráter simbólico:
Normas jurídicas novas: além de compreender as normas que não existiam (v.g., art. 319, VII), também compreendem as normas que reforçam tendências doutrinárias e jurisprudenciais (v.g. art. 1.023, § 2º), ou corrigem as teses jurisprudenciais dominantes (v.g., art. 85, § 18, que se opõe à Súmula 453/STJ: “Os honorários sucumbenciais, quando omitidos em decisão transitada em julgado, não podem ser cobrados em execução ou em ação própria”).
Pseudonovidades normativas: normas jurídicas que já estariam implícitas no sistema processual (por decorrerem de princípios constitucionais), mas que foram explicitadas no novo CPC (v.g., art. 373, § 1º).
Normas simbólicas: conceito decorrente da teoria de Marcelo Neves, referindo-se às normas em que o sentido político predomina sobre o normativo jurídico (v.g., art. 3º, § 3º).
Na Parte Geral – Livro I, são previstas verdadeiras normas gerais de direito processual, destacando-se: a) o direito das partes em obter a solução integral do mérito (art. 4º); b) o reforço da garantia ao contraditório (art. 8º ao 10); e c) a previsão de ordem cronológica para se proferir sentença ou acórdão (art. 12).
No que se refere à Parte Geral – Livro II, são definidos e disciplinados vários mecanismos de cooperação internacional (art. 26 a 34, especialmente).
A Parte Geral – Livro III, confere uma regulamentação mais minuciosa dos honorários de sucumbência inclusive com previsão de sucumbência recursal, bem como regulamenta os procedimentos do incidente de desconsideração da personalidade jurídica (art. 133 a 137) e do “amicus curiae” (art. 138). Ainda, merecem destaques a possibilidade de as partes estipularem mudanças no procedimento (art. 190), inclusive com fixação de calendário processual (art. 191), a alteração da forma de contagem dos prazos, contando-se apenas os dias úteis (art. 219), reputando-se tempestivo o ato praticado antes do início do prazo (art. 218, § 4º; em oposição à Súmula 418/STJ).
Já a Parte Geral – Livro V, enfatiza o “fim” do processo cautelar, com instituição da tutela de provisória, de urgência[8] ou de evidência (art. 294).
A Parte Geral – Livro VI - traz a previsão de que, antes de proferir decisão sem resolução de mérito, “o juiz deverá conceder à parte oportunidade para, se possível, corrigir o vício” (art. 317).
No que concerne a Parte Especial – Livro I, adota o procedimento comum e procedimentos especiais, com extinção de alguns dos antigos procedimentos especiais (v.g., nunciação de obra nova). e estabelece a previsão da improcedência liminar (art. 332), com tratamento mais minucioso que o atual art. 285-A do antigo CPC.
As principais exigências, porém, dirigem-se ao Estado-Juiz, cuja conduta deve se pautar por um novo formalismo cujo objetivo, é a busca pela solução integral de mérito. Assim, o juiz deve permitir a correção de vícios formais, determinando, v.g, o suprimento de pressupostos processuais e o saneamento de outros vícios (art. 139, IX, CPC/2015), cabendo-lhe ainda, antes de extinguir o feito sem resolução do mérito, conceder a parte oportunidade para corrigir os vícios (art. 317, CPC/2015).
4 A postura processual das partes e o incentivo à conciliação no CPC/2015
As partes terão importante papel durante a condução do processo na medida em que, a partir da vigência do NCPC/2015, poderão convencionar, de forma ampla, em causas sobre direitos que admitam autocomposição.
A previsão dos deveres das partes e de seus procuradores, bem como da responsabilidade das partes por dano processual estava prevista nos arts. 14 a 18 do CPC/1973, com disposições parecidas com as do texto da nova legislação. Contudo é preciso apontar alguns acréscimos[9] e avanços da redação da legislação de 2015, que procurou ampliar a abordagem da questão, bem como dar mais organicidade e coesão ao texto como um todo.
Destarte, verifica-se um avanço da nova legislação quando prevê a possibilidade de responsabilização dos advogados públicos e dos membros do Ministério Público e da Defensoria Pública, sendo que eventual responsabilidade disciplinar deve ser apurada pelo respectivo órgão de classe ou corregedoria, ao qual o juiz oficiará. O art. 78 também amplia a vedação de empregar expressões ofensivas nos escritos apresentados para, além das partes e procuradores, os juízes, membros do Ministério Público e da Defensoria Pública, e a qualquer pessoa que participe do processo, o que se mostra muito coerente e razoável, uma vez que todos os participantes do processo devem manter postura de probidade e boa-fé processual em respeito ao princípio da colaboração processual (MITIDIEIRO, 2009, p. 42).
O art. 81 do CPC/2015 tem previsão similar à do art. 18 do CPC/1973, porém se mostra mais severo quanto ao valor da multa a ser paga pelo litigante de má-fé, prevendo o percentual de 1 a 10% do valor corrigido da causa (o CPC/1973 previa “multa não excedente a um por cento sobre o valor da causa”), e ainda quanto ao valor da indenização por dano processual, o qual será fixado pelo juiz ou, no caso de não ser possível mensurá-la, liquidado por arbitramento ou pelo procedimento comum (§ 3º), nos próprios autos, mas sem limitação ao percentual de 20% (vinte por cento) sobre o valor da causa, conforme dispunha o § 2º do art. 18 do CPC/1973.
O presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), Desembargador José Renato Nalini, em reportagem concedida ao site UOL, relata que o brasileiro alimenta a cultura do processo e assim define:
[...] o processo – ciência que estuda o instrumento de realização do justo concreto – converteu-se em finalidade em si, e muito mais importante do que o direito substancial. Por isso é que, ciência sofisticada, o processo gera inúmeras respostas a uma pretensão posta em juízo, todas elas periféricas, epidérmicas, sem exame do mérito. Ou seja: o processo termina e o conflito continua, com certeza mais agravado ante a decepção de quem acreditou numa solução ditada pelo Judiciário. Essa é a situação presente. A sociedade demandista se submete à cultura do litígio. (NALINI, 2015).
Aponta o magistrado a necessária pacificação entre as partes através de conciliação, mediação e arbitragem ou de qualquer uma das “dezenas de estratégias já adotadas pelo direito anglo-saxão”; segundo ele, é preciso “repensar com urgência o sistema de justiça”, para que possa atingir a “funcionalidade esperada” (NALINI, 2015).
No CPC/2015, a atuação das partes também interfere sobremaneira no convencimento do julgador. Como exemplo, o art. 10 dispõe que o juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício (BRASIL, 2015).
Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero (2010, p. 55-61) reconhecem que o CPC/2015 apresentou avanços, tornando as previsões mais claras e coerentes com os preceitos informadores da nova legislação quanto à celeridade, efetividade e segurança jurídica, além de contribuir para a efetivação da boa-fé e colaboração processuais.
É objetivo fundamental no CPC/2015 a solução consensual dos conflitos postos à apreciação judiciária, contudo é importante que não haja prejuízo ao reconhecimento do direito ao amplo e irrestrito acesso aos tribunais a todo e qualquer jurisdicionado.
No âmbito da jurisdição contenciosa, é evidente que existem interesses contrapostos; cada um dos envolvidos no trâmite processual deve comportar-se de maneira irretocável, contribuindo para que, de acordo com os valores eleitos pelo ordenamento jurídico pátrio, o Estado-Juiz possa entregar a melhor solução possível ao caso concreto (TORRES, 2015, p. 25).
Ao analisar a postura processual das partes, Artur Torres afirma que o processo é um jogo:
[...] a existência do processo judicial justifica-se, in concreto, face à ocorrência de um conflito de interesses (real ou virtual). Cada qual dos contendores, bem compreendida a afirmativa, pretende ver sua posição jurídica triunfar e, como regra, por determinação legal, entrega a “defesa” dos seus interesses aos advogados, públicos ou privados. São eles, no mundo real, que conduzem os feitos. Os patronos, em tese experts, respeitados os limites éticos de seu ofício, defendem uma “bandeira”, ou seja, são parciais. O projeto de cada causídico ao assumir seu posto é, quando mais na seara não criminal, o de ver, ao fim e ao cabo, o interesse daquele que lhe confiou o patrocínio prosperar. Trata-se, gostemos ou não, de uma constatação fática, não raro transparente, como dissemos alhures, aos apontamentos doutrinários. Assim sendo, por vestirem uma “camisa” (são parciais e não imparciais), os experts do foro passam a laborar, em cada um de seus processos, no afã de ver despontar o interesse de seus clientes, “jogando o jogo”.
O “jogo só termina quando acaba!”. O processo, de um ponto de vista prático, em última análise, revela-se um “jogo” em que, não raro, vence o mais eficiente (processualmente falando). (TORRES, 2015, p. 26).
O incentivo à conciliação judicial, em detrimento da construção de uma solução estatal impositiva ao conflito, e o estímulo à utilização de técnicas alternativas de composição de conflitos (não judiciais) estão expressos no CPC/2015.
4.1 A exigência de cooperação das partes no CPC/2015
Em seu art. 6º, o CPC/2015 traz a ideia de cooperação das partes: “Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva”. Prestígio à cooperação e ao diálogo, segurança jurídica, prestação jurisdicional mais completa e razoabilidade no tempo para a solução justa do litígio; eis o que busca o CPC/2015.
Importante e objetivo é o papel atribuído às partes, que, a partir da vigência do CPC/2015, poderão convencionar, de forma ampla, em causas sobre direitos que admitam autocomposição. Nesse sentido, o entendimento de Hugo de Brito Machado:
As raras possibilidades que a lei hoje concede para a transação processual tomam como referência, não a natureza do direito material em conflito, mas da norma processual que se almeja relativizar (CPC, art. 111). É exatamente por este motivo, que a eleição de foro somente é admissível nas hipóteses de regras de competência relativa (normas processuais desenhadas visando diretamente o interesse das partes), independentemente da natureza do litígio que, em muitos casos, pode tratar de bens absolutamente indisponíveis (e.g. direito de família, direitos da personalidade, estado das pessoas, etc.). O Projeto, diferentemente, preocupa-se em tratar da possibilidade de transação com referência no direito material, e não no processo, exigindo que a matéria ou o bem da vida em disputa possa vir a ser objeto de transação, conforme as regulações do próprio direito material. (MACHADO, 2014, p. 347).
A previsão se encontra no art. 190 do CPC/2015, sendo lícito às partes plenamente capazes estipularem mudanças no procedimento para ajustá-lo às especificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, antes ou durante o processo. O parágrafo único desse artigo dispõe que, o juiz controlará a validade das convenções.
As raras possibilidades que a lei atualmente concede para a transação processual tomam como referência não a natureza do direito material em conflito, mas também a norma processual que se almeja relativizar (CPC/1973, art. 111). É exatamente por este motivo, que a eleição de foro somente é admissível nas hipóteses de regras de competência relativa (normas processuais desenhadas visando diretamente ao interesse das partes), independentemente da natureza do litígio, que, em muitos casos, pode tratar de bens absolutamente indisponíveis (e.g. direito de família, direitos da personalidade, estado das pessoas, dentre outros).
Destarte, o CPC/2015 convoca as partes, sempre que possível, a resolver seus conflitos de forma amigável, possibilitando a prévia designação de audiência de conciliação ou de mediação, antes mesmo de a parte contrária protocolar sua defesa; para tanto, prevê a criação de centros com profissionais especializados.
De fato, o incentivo à conciliação judicial, em detrimento da construção de uma solução estatal impositiva ao conflito, e o estímulo à utilização de técnicas alternativas de composição de conflitos (não judiciais) estão expressos no CPC/2015.
A jurisdição é, então, atividade exercida exclusivamente pelo Estado através do Poder Judiciário, contudo, além do juiz, terão importante papel na resolução dos conflitos não somente os mediadores como as próprias partes.
5 Considerações finais
No que diz respeito à tempestividade e busca pela eficiência da prestação jurisdicional, é possível observar grandes avanços, fruto das reformas legislativas no âmbito do novo Código de Processo Civil Brasileiro (CPC/2015), como são exemplos o prestígio à cooperação e diálogo entre as partes como requisitos fundamentais do processo, e o incidente de resolução de demandas repetitivas.
Registra-se, contudo, que os precedentes judiciais devem ser emitidos sem demora para que possam ser compreendidos de maneira clara e precisa e atenda seu escopo principal, qual seja, a busca pela celeridade processual.
As partes litigantes deverão cooperar e agir sempre com lealdade e boa-fé processual, sendo lícito estipularem mudanças no procedimento para ajustá-lo às especificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus, antes ou durante o processo, tudo com a fiscalização e controle judicial.
Em suma, não sobejam dúvidas que o CPC/2015 enfatiza a noção da prestação jurisdicional como serviço público eficiente, e busca a concepção de um novo formalismo, exigindo para tanto que o magistrado, determine o suprimento de pressupostos processuais e o saneamento de outros vícios procedimentais, a fim de se buscar a solução integral do mérito.