1 INTRODUÇÃO
O estudo aplicado busca analisar as diversas situações que surgem com o abalroamento entre veículos, demonstrando a aplicação do Código de Defesa do Consumidor no prazo que a prestadora de serviços dispõe para repará-los.
Devido às recorrentes colisões entre veículos, surge a necessidade de se desvendar todo e qualquer ponto obscuro que possa existir na tutela dos direitos ali evidentes, levando-se em conta que o Código de Defesa do Consumidor ampara todos os consumidores que estão dentro de uma relação de consumo.
Um dos problemas mais recorrentes que surge com o reparo de veículos colididos é o prazo exagerado que as oficinas especializadas utilizam para reparar os veículos, sendo este o objeto da presente pesquisa.
Primeiramente, antes de adentrar nos detalhes mais específicos desta relação de consumo, devemos observar, à luz do Código de Defesa do Consumidor (CDC), quem é Consumidor, quem é Fornecedor, o que é Produto e Serviço, e, o que vem a ser uma Relação de Consumo.
No segundo tópico, daremos a devida atenção ao artigo 18 do CDC, destrinchando suas aplicações, dispostas em seu parágrafo primeiro, bem como os prazos que estão ali estabelecidos.
Outro ponto a ser observado é a existência ou não de seguradora de veículos na relação, visto que, com a presença dessa, os prazos a serem observados são outros, possuindo etapas que inexistem quando a relação se dá diretamente com a prestadora de serviços. É considerando essas hipóteses que o trabalho será desenvolvido.
O quarto tópico, enfoque do trabalho, busca analisar os prazos que são aplicados às empresas que reparam estes veículos, demonstrando a existência de divergência jurisprudencial para defini-los.
2 RELAÇÕES DE CONSUMO
Quando o assunto é aplicação do Código de Defesa do Consumidor, o primeiro ponto a ser observado é a relação de consumo, que é o ponto crucial para entender os casos que serão regidos por esta lei.
A Lei nº 8.078 de 1990 será aplicada sempre que houver uma relação de consumo devidamente configurada.
Como bem explica Luiz Antônio Rizzato Nunes (2013, p. 120), “haverá relação jurídica de consumo sempre que se puder identificar num dos polos da relação o consumidor, no outro, o fornecedor, ambos transacionando produtos e serviços. ”
Complementando este conceito, João Batista de Almeida (1993, p. 1) traz os elementos que a caracterizam, aduzindo que:
As relações de consumo são bilaterais, pressupondo numa ponta o fornecedor que pode tomar a forma de fabricante, produtor, importador, comerciante e prestador de serviços a terceiros, e, na outra ponta, o consumidor, aquele subordinado as condições e interesses impostos pelo titular dos bens ou serviços, no atendimento de suas necessidades de consumo.
Podemos dizer então que, em uma relação de consumo, deverá existir a figura do consumidor, adquirindo um produto ou serviço de um fornecedor, tudo em uma relação única. Quando todos os elementos estiverem presentes, aplica-se a Lei 8.078 de 1990.
2.1 ELEMENTOS DA RELAÇÃO DE CONSUMO
Em uma relação de consumo há elementos que são essenciais para sua caracterização.
Estes elementos são o consumidor, o fornecedor e o produto ou o serviço. Sem estes não há relação de consumo e consequentemente não estamos diante de uma relação regida pelo Código de Defesa do Consumidor. Por isso, é de extrema importância os estudos desses elementos.
2.1.1 Consumidor
Devemos observar, segundo o artigo 2º do Código de Defesa do Consumidor, que:
Art. 2. Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.
Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.
Melhor dispondo sobre o assunto, José Geraldo Brito Filomeno (2012, p. 24) entende que:
[...] consumidor, abstraídas todas as conotações de ordem filosófica, tão somente econômica, psicológica ou sociológica, e concentrando-nos basicamente na acepção jurídica, vem a ser qualquer pessoa física que, isolada ou coletivamente, contrate para consumo final, em benefício próprio ou de outem, a aquisição ou a locação de bens, bem como a prestação de serviços. Além disso, há que se equiparar o consumidor a coletividade que, potencialmente, esteja sujeita ou propensa à referida contratação. Caso contrário se deixaria à própria sorte, por exemplo, o público-alvo de campanhas publicitárias enganosas ou abusivas, ou então sujeito ao consumo de produtor ou serviços perigosos ou nocivos à sua saúde ou segurança.
Não há dúvidas de que qualquer pessoa física ou jurídica pode ser consumidor. Contudo, o ponto crucial a ser definido para se saber quem, de fato, é consumidor, será o destinatário final.
Havia três correntes doutrinárias que disputavam espaço para definir o destinatário final. A primeira delas, a Teoria Finalista, como bem definida por Markus Samuel Leite Norat (2015, p. 44), defende que:
[...] destinatário final seria apenas aquela pessoa física ou jurídica que adquire o produto ou contrata o serviço para utilizar para si ou para outrem de forma que satisfaça uma necessidade privada, e que não haja, de maneira alguma, a utilização deste bem ou deste serviço com a finalidade de produzir, desenvolver atividade comercial ou mesmo profissional.
Observamos que esta era uma teoria que acabava privando as pessoas jurídicas e os profissionais liberais de serem consumidores, pois, na maioria dos casos, os produtos por eles adquiridos são utilizados para desenvolver atividade comercial.
A segunda teoria, denominada Maximalista, foi bem definida por Flávio Tartuce e Daniel Amorim Assumpção Neves (2014, p. 97), citando Cláudia Lima Marques (2010, p. 85), assim dispondo:
[...] os maximalistas viam nas normas do CDC o novo regulamento do mercado de consumo brasileiro, e não normas orientadas para proteger somente o consumidor não profissional. O CDC seria um código geral sobre o consumo, um código para a sociedade de consumo, que institui normas e princípios para todos os agentes do mercado, os quais podem assumir os papéis ora de fornecedores, ora de consumidores. A definição do art. 2º deve ser interpretada o mais extensamente possível, segundo esta corrente, para que as normas do CDC possam ser aplicadas a um número cada vez maior de relações de consumo.
O grande problema desta corrente foi que praticamente todos seriam considerados consumidores, já que para esta teoria o consumidor seria aquele que adquirisse e retirasse o produto ou o serviço. Uma empresa que adquire matéria prima para a produção de outras coisas seria considerada consumidora de seu fornecedor.
De acordo com Markus Samuel Leite Norat (2015, p. 45), só não seriam consumidores as pessoas que estivessem vinculadas ao processo de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização do produto que está sendo adquirido.
A terceira teoria utilizada atualmente, inclusive consolidada pelo STJ, é a Teoria Finalista Aprofundada, que, segundo Flávio Tartuce e Daniel Amorim Assumpção Neves (2014, p. 105), utiliza o conceito de consumidor por equiparação, previsto no artigo 29 do CDC, como base, considerando destinatário final a pessoa que adquire um produto ou serviço, junto ao fornecedor, e apresenta alguma vulnerabilidade.
Essa vulnerabilidade pode ser técnica (ausência de conhecimento específico), jurídica (falta de conhecimento jurídico e de seus reflexos na relação), fática (situação de insuficiência econômica, física ou psicológica do consumidor) ou informacional (ausência de dados suficientes sobre o produto ou serviço, capaz de influenciar na decisão de compra).
Outro ponto que merece destaque é que o Código de Defesa do Consumidor traz, em seus artigos 17 e 29, hipóteses onde pessoas que não estão ligadas diretamente na relação de consumo podem ser consumidores por equiparação.
O artigo 17 do CDC dispõe que:
Art. 17. Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento.
Esse artigo traz a figura do consumidor equiparado, trazido à relação de consumo através de um dano sofrido, mesmo que não fosse consumidor de fato. Tomando por exemplo, caso ocorra a explosão de um shopping center e haja transeuntes atingidos por ela, esses serão considerados consumidores, pois foram vítimas do evento.
Além das vítimas do evento, o CDC dispõe em seu artigo 29 que:
Art. 19. Para os fins deste Capítulo e do seguinte, equiparam-se aos consumidores todas as pessoas determináveis ou não, expostas às práticas nele previstas.
Esse artigo traz a figura dos consumidores por exposição a práticas abusivas, visando reprimir os abusos que grande parte das potências econômicas mundiais praticam.
2.1.2 Fornecedor
O Artigo 3º do Código de Defesa do Consumidor define fornecedor como sendo toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira ou ente despersonalizado, massa falida por exemplo, que desenvolva atividades tipicamente profissionais, como produção, criação, construção, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços, de forma habitual.
Fabrício Bolzan (2014, p. 96) citando Claudia Lima Marques, dispõe que fornecedor seria todos os que participam da cadeia de fornecimento de produtos ou de serviços, não importando se a relação com o consumidor é direta ou indireta, contratual ou extracontratual. Cita também Cavalieri Filho que dispõe que “fornecedor é gênero – quer no que respeita ao sujeito em si (pessoa física ou jurídica; pública ou privada; nacional ou estrangeira), quer no que se refere às atividades que desenvolve – e não por acaso.”
Rizzatto Nunes (2008, p. 86) exemplifica de uma forma mais direta quem vem a ser fornecedor, vejamos:
São fornecedores as pessoas jurídicas, públicas ou privadas, nacionais ou estrangeiras, com sede ou não no País, as sociedades de responsabilidade limitada, as sociedades civis, com ou sem fins lucrativos, as fundações, as sociedades de economia mista, as empresas públicas, as autarquias, os órgãos da Administração direta.
Em suma, o fornecedor, seja ele de produto ou de serviço, é aquele que exerce suas atividades de forma habitual, com profissionalismo, não precisando auferir lucro, mas apenas uma remuneração pelo produto ou serviço ofertado.
2.1.3 Produto e Serviço
O produto e o serviço são as figuras que unem o fornecedor e o consumidor. Os parágrafos 1º e 2º do artigo 3º do CDC os definem.
Primeiramente falaremos do produto, definido pelo parágrafo 1º do artigo 3º do Código de Defesa do Consumidor, como sendo “qualquer bem móvel ou imóvel, material ou imaterial”.
Este conceito é muito vasto, José Geraldo Brito Filomeno (2010, p. 52), de forma mais simplificada, define produto como sendo qualquer objeto de interesse dentro da relação de consumo que se destina a satisfazer uma necessidade de quem o adquire, como destinatário final.
Em outro sentido, Fabrício Bolzan (2014, p. 103) cita Sergio Cavalieri Filho que assim define o objeto da relação de consumo:
[...] o objeto da relação jurídica de consumo é a prestação à qual tem direito o consumidor e à qual está obrigado o fornecedor, em razão do vínculo jurídico que os une. {...} O objeto desta prestação, este sim, será um produto ou serviço.
Bolzan (2014, p. 103) cita também Cláudia Lima Marques, que define produto como “qualquer bem, consumível fisicamente ou não, móvel ou imóvel, novo ou usado, material ou imaterial, fungível ou infungível, principal ou acessório”
A partir desses conceitos podemos extrair que há diversos tipos de produtos, dentre eles os imóveis, definido pelo artigo 79 do CDC, como sendo o solo e tudo que lhe incorporar natural ou artificialmente; os móveis, estabelecido no artigo 82 do mesmo códex, como sendo os bens de movimento próprio ou de remoção por força alheia sem alteração de substância ou de sua destinação; os materiais, definido pelo artigo 84 da lei 8.078 de 1990, como sendo os destinados a alguma construção, antes de sua utilização, com qualidade de móveis.
Os imateriais, definido por Makus Samuel Leite Norat (2015, p. 51), como sendo as coisas incorpóreas, que não sentimos fisicamente. Em complementação, Rizzatto Nunes (2013, p. 141) exemplifica os produtos imateriais como sendo os utilizados nas atividades bancárias, mútuo, aplicação em renda fixa, caução, etc.
Existem também os bens duráveis e os não duráveis, incorporados no CDC no artigo 26, incisos I e II. Nele observamos que os produtos duráveis são os que não se extinguem com o uso, havendo expectativa de que dure muito tempo antes que perca sua utilidade, já os não duráveis são aqueles que se extinguem com o uso, com o espaço de tempo para consumo, consideravelmente menor que o dos duráveis.
Outro produto bastante utilizado é a amostra grátis, trazida pelo artigo 39 do CDC, no parágrafo único c/c seu inciso III. No referido artigo, vemos que vem a ser amostra grátis, os serviços prestados ou os produtos remetidos ou entregues ao consumidor sem solicitação prévia.
O produto não é o único elo entre consumidor e fornecedor, deve se atentar que existem também os serviços. O parágrafo 2º do artigo 3º do CDC dispõe que:
[...] §3º Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.
O serviço para ser enquadrado em uma relação de consumo deve ser prestado por um fornecedor e contratado por um consumidor. Uma das exigências do serviço é a remuneração, porém esta pode se dá de forma direta ou indireta, sem prejudicar a relação de consumo.
Citando Lima Marques, Fabrício Bolzan (2014, p. 110) dispõe que há três tipos de remuneração, a saber, a remuneração diretamente adimplida pelo consumidor, com o pagamento de uma contraprestação diretamente; o serviço não oneroso ao consumidor, mas remunerado indiretamente, é o caso dos estacionamentos dos shoppings centers onde o valor a ser adimplido está dissolvido nos produtos ali ofertados; e o serviço não oneroso de maneira nenhuma, onde não há qualquer remuneração envolvida, seja direta ou indiretamente.
Outro tipo de serviço regulado pelo CDC são os serviços públicos em que há um pagamento destinado a administração pública. Porém, aqueles serviços que são financiados através de impostos não podem ser inseridos na relação de consumo.
3 ARTIGO 18 DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
Após definir o que vem a ser uma relação de consumo, consumidor, fornecedor, produto e serviço, passaremos a destrinchar as relações que são objeto do presente trabalho.
Devemos nos atentar ao disposto no artigo 18 do Código de Defesa do Consumidor para então aplicá-lo ou não nas relações de consumo em que o objeto é o serviço de reparo de veículos abalroados. Vejamos:
Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.
§ 1° Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha:
I - a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso;
II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos;
III - o abatimento proporcional do preço.
§ 2° Poderão as partes convencionar a redução ou ampliação do prazo previsto no parágrafo anterior, não podendo ser inferior a sete nem superior a cento e oitenta dias. Nos contratos de adesão, a cláusula de prazo deverá ser convencionada em separado, por meio de manifestação expressa do consumidor.
§ 3° O consumidor poderá fazer uso imediato das alternativas do § 1° deste artigo sempre que, em razão da extensão do vício, a substituição das partes viciadas puder comprometer a qualidade ou características do produto, diminuir-lhe o valor ou se tratar de produto essencial.
§ 4° Tendo o consumidor optado pela alternativa do inciso I do § 1° deste artigo, e não sendo possível a substituição do bem, poderá haver substituição por outro de espécie, marca ou modelo diversos, mediante complementação ou restituição de eventual diferença de preço, sem prejuízo do disposto nos incisos II e III do § 1° deste artigo.
§ 5° No caso de fornecimento de produtos in natura, será responsável perante o consumidor o fornecedor imediato, exceto quando identificado claramente seu produtor.
§ 6° São impróprios ao uso e consumo:
I - os produtos cujos prazos de validade estejam vencidos;
II - os produtos deteriorados, alterados, adulterados, avariados, falsificados, corrompidos, fraudados, nocivos à vida ou à saúde, perigosos ou, ainda, aqueles em desacordo com as normas regulamentares de fabricação, distribuição ou apresentação;
III - os produtos que, por qualquer motivo, se revelem inadequados ao fim a que se destinam.
Após demonstrar o disposto no artigo devemos esmiuçar suas disposições, demonstrando sua aplicação e suas implicações.
3.1 APLICAÇÕES
O artigo 18 do CDC dispõe que os fornecedores respondem solidariamente com os fabricantes, pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo ou lhes diminuam o valor.
O primeiro ponto a ser observado são os vícios. Rizzatto Nunes (2013, p. 229) entende que:
São considerados vícios as características de qualidade ou quantidade que tornem os produtos ou serviços impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam e também que lhes diminuam o valor. Da mesma forma são considerados vícios os decorrentes da disparidade havida em relação às indicações constantes do recipiente, embalagem, rotulagem, oferta ou mensagem publicitária.
Markus Samuel Leite Norat (2015, p. 160), destaca que o caput do artigo 18 do Código de Defesa do Consumidor trata exclusivamente de vício de qualidade ou de quantidade.
Esses vícios são definidos pelo caput do artigo 18 do CDC como sendo aqueles que tornem os produtos impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou que diminuam seu valor.
O referido artigo dispõe, ainda, em seu parágrafo 6º, que os produtos impróprios são aqueles cujos prazos de validade estejam vencidos, os que estejam deteriorados, alterados, adulterados, avariados, falsificados, corrompidos, fraudados, nocivos à vida ou à saúde, perigosos ou, ainda, aqueles em desacordo com as normas regulamentares de fabricação, distribuição ou apresentação, além dos que se revelem inadequados ao fim que se destinam.
O Código de Defesa do Consumidor impõe a aplicação do seu artigo 18º nos casos em que exista um vício de qualidade ou de quantidade no produto.
Devemos atentar que o referido artigo deve ser utilizado apenas nos casos em que há vício e não um dano externo, como ocorre nos casos de abalroamento de veículos.
3.2 SANÇÕES
O parágrafo primeiro do artigo 18 do Código de Defesa do Consumidor impõe aos fornecedores que não cumprem o prazo de 30 dias para repararem os vícios apresentados pelos seus produtos, sansões, as quais destacamos que não se aplicam aos casos de abalroamento de veículos.
Caso o fornecedor não sane o vício no prazo máximo de trinta dias, cabe ao consumidor exigir, à sua escolha, a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso, a restituição da quantia paga, monetariamente atualizada, ou o abatimento proporcional do preço.
Tendo o consumidor exigido uma dessas alternativas e o fornecedor não obedecendo, poderá ingressar com medidas judiciais para garantir seus direitos. Essas medidas variam conforme o interesse do consumidor, caso queira a substituição do produto, poderá ingressar com uma Ação de Obrigação de Fazer, se o pedido for a restituição da quantia paga poderá ingressar com uma Ação de Rescisão Contratual, nesta haverá a atualização monetária da quantia paga, além das possíveis perdas e danos sofridos, a última opção é o abatimento proporcional do valor arcado, sendo possível ingressar com uma Ação Quanti Minoris.
Dependendo do caso, além do pedido relativo ao parágrafo primeiro do artigo 18 do CDC, poderá o consumidor requerer indenização a título de danos morais.
Cumpre destacar que o prazo de trinta dias estabelecido pelo CDC não é absoluto, as partes podem convencionar o prazo para que o vício seja sanado, desde que este prazo não seja inferior a sete nem superior a cento e oitenta dias, conforme dispõe o parágrafo segundo do artigo 18 do CDC.
4 APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR NO REPARO DE VEÍCULOS ABALROADOS
O artigo 18 da Lei nº 8.078 de 1990 que versa sobre a responsabilidade dos fornecedores em reparar os produtos que apresentem vícios no prazo de 30 dias, sob pena de substituição do produto por outro da mesma espécie, restituição imediata da quantia paga ou o abatimento proporcional do preço, não deve ser aplicado nos casos de abalroamento de veículos. Havendo outros artigos que podem ser utilizados para calcular, de forma mais correta, o prazo para que o reparo seja efetuado.
4.1 DIREITOS DOS CONSUMIDORES
À relação de consumo, cujo objeto é o reparo de veículos abalroados, não se aplica o prazo nem as sanções dispostas no artigo 18 do Código de Defesa do Consumidor, mas há outros artigos que podem reger esta relação de consumo.
Com a colisão de um veículo e a solicitação de reparo surgem dois tipos de consumidores, os que possuem seguro automotivo e os que não possuem.
4.1.1 Consumidores segurados
Deve ser dada a devida atenção aos consumidores que possuem seguro em seus veículos. Estes consumidores possuem um prazo diferenciado, onde há etapas a serem ultrapassadas antes de se iniciar o prazo para o reparo.
O que determina a existência de uma seguradora é a celebração de um contrato de seguro, assim conceituado por Arnaldo Rizzardo (2005, p. 176):
Pelo seguro, um dos contratantes (segurador) se obriga a garantir, mediante o recebimento de uma determinada importância, denominada prêmio, interesse legítimo de uma pessoa (segurado), relativamente ao que vier a mesma a sofrer, ou aos prejuízos que decorrerem a uma coisa, resultantes de riscos futuros, incertos e especificamente previstos.
Observamos que o contrato de seguro, previsto no artigo 757 do Código Civil, é relativo à obrigação do segurador garantir o interesse do segurado, mediante o pagamento do prêmio, contra riscos predeterminados. Este artigo versa que:
Art. 757. Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados.
Com a celebração de um contrato de seguro surge uma terceira pessoa na relação de consumo, a seguradora. Para os consumidores segurados, um abalroamento entre veículos passa a se chamar de sinistro, que significa a ocorrência de acontecimentos de natureza súbita, involuntária, que estão previstos no contrato celebrado com a seguradora. Nesses casos, a contagem do prazo para reparo do veículo é ampliada, visto que surgem várias etapas antes de se iniciar o conserto.
O veículo, ao chegar à prestadora de serviços, passa por uma série de etapas antes, primeiro há a apuração dos danos. Um perito analisa a extensão dos danos e sua causa, em seguida, passa para a etapa de regularização, onde se verifica se o evento está coberto ou não, define ainda o beneficiário e o valor da cobertura. Somente depois de ultrapassar essas duas etapas é que se passará para a etapa de liquidação, onde será realizado o pagamento da quantia levantada na fase de regularização.
O que ocorre nesses casos é a demora exagerada da seguradora em autorizar o reparo, o que acarreta um atraso no reparo dos veículos. Há diversos julgados onde foi preciso o segurado acionar o judiciário para conseguir a autorização de seu reparo, vejamos:
CIVIL. COLISÃO DE VEÍCULO SEGURADO. DEMORA INJUSTIFICADA DA SEGURADORA PARA AUTORIZAR O REPARO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. 1 - A DEMORA, INJUSTIFICADA, IMPOSTA PELA SEGURADORA À APELADA PARA AUTORIZAR O CONSERTO DE SEU AUTOMÓVEL, INCLUSIVE OBRIGANDO-A A MUDAR DE CONCESSIONÁRIA, CARACTERIZA DANO MORAL, IMPONDO-SE A CONDENAÇÃO DA APELANTE EM REPARÁ-LO. 2 - RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA
(TJ-DF - ACJ: 20040710014890 DF, Relator: LEILA ARLANCH, Data de Julgamento: 06/10/2004, Segunda Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do D.F., Data de Publicação: DJU 07/03/2005 Pág.: 34)
Por causa desse atraso, os reparos dos veículos acabam demorando um tempo excessivo. Contudo há, também, casos onde os segurados têm seu direito negado pela seguradora e, posteriormente, têm que acionar o judiciário para obrigar o pagamento do reparo, por estar coberto pela garantia.
O reparo do veículo acaba sendo extremamente demorado, podendo acarretar uma série de danos ao consumidor. No entanto, devemos observar que nos casos em que o atraso se deu por culpa da seguradora, por não autorizar rapidamente o reparo, os consumidores costumam receber indenização pelo dano moral sofrido.
4.1.2 Consumidores não segurados
Nas relações onde os consumidores não haviam celebrado contratos de seguro, não há a presença de uma seguradora para atrasar o prazo do reparo, todavia, de igual forma, em muitos casos, há um atraso no reparo.
Em muitos desses casos o que acaba postergando o reparo é a falta de peças no mercado e a falta de compromisso com os consumidores pelas fabricantes dos veículos.
Muitos dos casos em que ocorre uma demora no reparo dos automóveis se dá por culpa das fabricantes que acabam enviando as peças de maneira tardia, prejudicando as prestadoras de serviço.
O Código de Defesa do Consumidor acaba sendo omisso nesse ponto, pois o único artigo que oferece prazo para reparo é o 18º, não se aplicando, porém, ao presente caso por não existir vício. Nessas relações, devemos utilizar o artigo 32º que dispõe sobre a oferta de componentes e peças de reposição, todavia esse artigo não impõe prazo para cumprimento, o que acaba prejudicando o consumidor.
Pela inexistência de prazo para o envio de peças, as fabricantes dos veículos acabam retendo as peças e não disponibilizado no mercado, prejudicando os consumidores.
Por isso, muitas vezes, os consumidores acabam ficando meses sem seus veículos e não veem outra opção, a não ser acionar o judiciário para reaver seus direitos e obrigar as fabricantes a enviarem as peças correspondentes de seus veículos.
4.2 DIREITOS DAS PRESTADORAS DE SERVIÇOS
Por outro lado, quando um consumidor deixa seu veículo para ser reparado com em uma oficina especializada, o direito dessa varia de acordo com a relação estabelecida.
Igualmente ao consumidor, os direitos das prestadoras de serviço variam de acordo com a existência ou não de uma seguradora na relação de consumo.
Quando o veículo abalroado possui contrato de seguro e o consumidor o utiliza para o pagamento, diversas etapas são percorridas até o reparo ser realizado. Nesses casos, o veículo, ao ser levado à prestadora de serviços, passa por uma vistoria para identificar os danos e, posteriormente, será emitido o aval que determina as peças que serão substituídas e/ou recuperadas.
Neste ínterim, nada pode ser feito em relação ao reparo, pois, apenas após a liberação da seguradora, a oficina pode iniciar seus serviços. Enquanto a autorização para execução do serviço não é expedida, a prestadora de serviços está segura, caso o consumidor intente qualquer ação nesse sentido, visto que a relação de consumo ainda não foi estabelecida, sendo configurada apenas quando o aval para execução do reparo estiver devidamente lavrado.
A partir da autorização dos serviços passa a se iniciar a contagem do prazo para execução do serviço.
O que diferencia o consumidor que possui contrato de seguro e o consumidor que não o celebrou é exatamente o início da contagem do prazo para o reparo do veículo, pois, quando o consumidor trata diretamente com a prestadora, a contagem se inicia com a deixada do veículo e a consequente autorização.
4.3 DO PRAZO PARA REPARO
O Código de Defesa do Consumidor não estabelece um prazo exato para que o produto, veículo neste caso, seja reparado, trazendo um único artigo que podemos utilizar como base, o 32º, que, em resumo, dispõe que os fornecedores e os importadores deverão assegurar a oferta de componentes e peças por prazo razoável.
Apesar de não determinar um prazo exato, em seu artigo 40, o CDC dispõe que a prestadora de serviço deve elaborar um orçamento prévio dispondo sobre o prazo a ser cumprido, todavia, o que ocorre é que muitos consumidores acabam autorizando o serviço mesmo sem concordar ou sem observar, o prazo acordado e terminam por acreditar que o prazo é exagerado e descumpre o famoso artigo 18. Por isso, muitas vezes, cabe aos julgadores dispor sobre o prazo a ser seguido, quando ingressado uma medida judicial.
Parte dos julgadores entendem que não se deve aplicar o prazo estabelecido no artigo 18 do CDC, uma vez que não há vício a ser sanado.
Os julgadores que defendem essa tese levam em consideração a existência de um prazo razoável para o reparo, estabelecendo uma média de tempo que julgam suficiente para solução do problema.
A controvérsia se dá uma vez que existem julgadores que defendem que o prazo estabelecido pelo artigo 18, da Lei nº 8.078/90, é suficiente para o reparo do veículo sinistrado e, independentemente da inexistência de vício, este deve ser aplicado.
Como já mencionado, uma corrente de julgadores entende que devido à omissão da Legislação Consumerista em um prazo para reparar veículos, deve ser aplicado o prazo estabelecido no parágrafo único do artigo 18 do CDC, que julgam, como sendo um prazo razoável. Vejamos:
DIREITO DO CONSUMIDOR. ATRASO NO CONSERTO DE VEÍCULOS - AUSÊNCIA DE FIXAÇÃO DE PRAZO - FALTA DE PEÇAS NA CONCESSIONÁRIA. MÁ PRESTAÇÃO DE SERVIÇO - PRAZO DE 30 DIAS (ART. 18, § 1º do CDC) TIDO POR RAZOÁVEL - ANALOGIA COM A CORREÇÃO DE VÍCIO DO PRODUTO. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. 1.São partes legítimas para figurar na ação de reparação de danos decorrentes do atraso no conserto de veículo, por falta de peças de reposição, o fabricante e a concessionária. Dever de oferta de componentes e peças de reposição não ilidido (art. 32, do CDC). Preliminar rejeitada. 2.A política das empresas montadoras de veículos de concentrar as peças para destinação às concessionárias em centro único de distribuição, sem mecanismos remessa rápida e eficiente constitui defeito na prestação de serviços. 3.A má prestação de serviço, com reflexos na utilização do bem por mais de 60 dias, como no caso em exame, enseja a reparação por dano moral, nos termos do art. 18, parágrafo primeiro, II do CDC. 4.Em respeito ao princípio do duplo grau de jurisdição, é defeso às partes apresentar para apreciação matéria antes não ventilada na oportunidade da contestação. Trata-se de inovação recursal, vedada pelo ordenamento jurídico e abrangida pelo instituto da preclusão. 5.RECURSOS CONHECIDOS E IMPROVIDOS. 6.Custas pelos recorrentes. Sem honorários, posto que não houve contrarrazões. 7.Decisão proferida na forma do art. 46, da Lei nº 9.099/95, servindo a ementa como acórdão. (TJ-DF - ACJ: 20140710112383 DF 0011238-38.2014.8.07.0007, Relator: ASIEL HENRIQUE DE SOUSA, Data de Julgamento: 24/03/2015, 3ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, Data de Publicação: Publicado no DJE: 31/03/2015. Pág.: 337)
Porém, em outros casos, vemos os julgadores aplicarem prazos que julgam como razoáveis. Abaixo vemos um julgado, cujo prazo foi de 60 dias.
RECURSO INOMINADO. RESPONSABILIDADE CIVIL. CONSUMIDOR. REPAROS EM VEÍCULO SINISTRADO. PRAZO DE SESSENTA DIAS QUE NÃO SE MOSTRA EXCESSIVO, NÃO SE APLICANDO O TRINTÍDIO PREVISTO NO ART. 18 DO CDC. DANOS MATERIAIS E MORAIS INOCORRENTES. SENTENÇA REFORMADA. RECURSOS DAS RÉS PROVIDOS. RECURSO DA AUTORA PREJUDICADO. UNÂNIME. (Recurso Cível Nº 71004732863, Primeira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Pedro Luiz Pozza, Julgado em 12/08/2014)
(TJ-RS - Recurso Cível: 71004732863 RS, Relator: Pedro Luiz Pozza, Data de Julgamento: 12/08/2014, Primeira Turma Recursal Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 14/08/2014)
Podemos observar que não há qualquer disposição legal que estabeleça um prazo para que os reparos sejam efetuados, ficando, tanto o consumidor quanto o prestador de serviços, à mercê do judiciário para que se estabeleça um prazo que julguem suficientes, podendo uma das partes sair prejudicada dessa decisão.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente artigo científico teve por finalidade expor todos os problemas enfrentados pelos consumidores diante da ausência de um prazo legal, estabelecido pelo Código de Defesa do Consumidor, que disponham sobre o reparo de veículos abalroados.
Como bem evidenciado, não há qualquer dispositivo que estabeleça prazos ou parâmetros a serem aplicados nesta relação, contudo há artigos que dispõem sobre um prazo razoável para que mantenham as peças em circulação. Esse artigo, deve ser aplicado subsidiariamente a esta relação, tendo em vista que a justificativa das oficinas é a falta de peças no mercado.
Outro grande problema observado foi a existência de seguradoras na relação de consumo, que, devido às várias etapas enfrentadas antes que o serviço se inicie, acaba prejudicando o consumidor que fica um tempo maior sem seu veículo. Há diversos casos, também, em que as seguradoras não autorizam o serviço dentro de um prazo razoável e acabam fazendo com que o proprietário do veículo fique dezenas de dias sem que os serviços sejam iniciados. Além desses, há aqueles que as seguradoras não autorizam a realização do serviço, tendo os segurados que recorrerem à justiça para que seus veículos sejam reparados.
. Quando inexiste seguradora, o serviço deve se iniciar no momento que o consumidor aprova a execução do serviço, não existindo qualquer razão para postergar seu início. Sendo, qualquer prazo exagerado, motivo para que o consumidor seja indenizado.
Vimos que o Código de Defesa do Consumidor é omisso quanto a existência de um prazo para reparo de produtos, porém, dispõe que em um orçamento deve existir a data estimada para o término do reparo. O podemos perceber é que em alguns casos, o consumidor se sente prejudicado, pois, muitas vezes, acredita que o prazo acordado é exagerado e acaba recorrendo ao judiciário onde o julgador entende como prazo razoável algo bem distante da realidade, ficando comprovado pela existência de decisões que divergem. Adotam-se posicionamentos que ora prejudicam o consumidor e ora prejudicam o fornecedor.
Diante dessa situação, espera-se que no futuro seja adotado um critério mais preponderante, com mais tecnicidade, capaz de analisar, de uma forma geral, um prazo cuja aplicação seja mais eficiente e fundamentada, de modo que o consumidor tenha seus direitos garantidos.
No Brasil, no que tange à relação de consumo, cujo objeto seja o reparo de veículos abalroados, o prazo varia de acordo com o entendimento do magistrado que jugará a causa, havendo casos em que o prazo para reparo é de 30 dias, utilizando como base o prazo de 30 dias do artigo 18 do CDC, e outros em que se utiliza um prazo que o magistrado considere razoável, que acredite ser o suficiente para que todos os direitos da parte hipossuficiente da relação, o consumidor, sejam defendidos.
Esse trabalho se encerra concluindo que não deveria se aplicar o artigo 18 do CDC, devendo sim estabelecer um critério que variaria de acordo com cada caso, sendo calculado um prazo de acordo com a extensão dos danos sofridos pelo veículo e levando-se em conta as peças envolvidas no reparo, visto que não há vício no produto.
Além disso, deveria haver uma intervenção direta dos órgãos de proteção ao consumidor para controlar as fabricantes dos veículos e forçá-las a manter, em seus estoques, peças suficientes para atender a quantidade de veículos comercializadas, para que não faltem peças no mercado e que seu fornecimento seja mais célere. Assim, os consumidores estariam mais amparados e protegidos, sabendo que os órgãos que os protegem estariam interferindo para ampliar seus direitos.