A autodefesa do condenado na execução da pena


29/04/2018 às 21h25
Por Valter dos Santos

Sabe-se que após o cidadão responder a um doloroso processo penal, há apenas duas possibilidades, a absolvição ou a indesejável condenação.

 

O processo penal inicia-se com o recebimento da denúncia, o oferecimento da peça acusatória representa o início da ação penal, pois é por meio dela que se provoca a manifestação do Poder Judiciário.

 

Superada essa fase explicativa, há que retornarmos ao parágrafo inicial, pois iniciado o processo penal, obrigatoriamente haverá uma sentença, que nesse caso, iremos considerá-la como uma decisão condenatória que atualmente, ocorrendo em primeiro grau e sendo confirmada em segundo grau, ou mesmo que seja prolatada em segundo grau, o sentenciado já pode dar início ao cumprimento da pena.

 

Cabe aqui tecermos brevíssimos comentários, acerca desse último tópico, achamos por evidente muito temerário, pois, no Brasil, na segunda instância não se analisa provas.

 

O que se tem é uma análise superficial da letra morta e fria do que consta nos autos. Pois, o juiz (julgador) não tem contato com o réu, ao  nosso ver, oportunidade de elevada importância, pois é nesse momento processual que o juiz pode ver nas entrelinhas e, assim, analisar o comportamento do denunciado, causa de grande preocupação quando o réu é absolvido em primeira instância e condenado em segunda instância, vez que, quando a sentença é prolatada apenas em segundo grau, diferentemente de quando ocorre a confirmação da sentença em segundo grau não houve uma apreciação a embasar uma condenação e exaurir toda a matéria probatória.

 

Dito isto, o fato é que havendo uma sentença ou confirmação em segunda instância, dar-se-á cumprimento do processo de execução penal, o que via de regra acontece em um estabelecimento prisional.

 

Sem tecermos comentários às mazelas do sistema carcerário brasileiro, o fato é que o individuo uma vez preso padece da deficiência do Estado na prestação jurisdicional, maiormente quando está nessa condição, eis aqui o intuito principal deste singelo artigo. Que se inclinará na defesa dos direitos dos presos a serem exercidos por eles mesmos enquanto encontram-se no cárcere.

 

Sabe-se que a Constituição assegura o direito de petição. Nessa mesma linha fora o legislador ao elaborar a lei de execução penal, que preceitua em seu artigo 41, inciso XIV, da LEP, senão vejamos:

 

Art. 41 - Constituem direitos do preso:

(...) XIV - representação e petição a qualquer autoridade, em defesa de direito; (grifei)

 

Nesse ponto é oportuno tecermos breves comentários sobre um dos mais importantes direitos do preso, pois permite que este exerça seus direitos mesmo nessa desgraçada situação.

 

Cabe aqui enfatizarmos que o DIREITO DE PETIÇÃO está intimamente ligado à defesa de direitos do preso, que tiver qualquer tipo de interesse junto à Administração Pública, poderá peticionar (requerer) que esta, analise e atenda à sua pretensão.

 

Assim, seja para controlar a atuação dos atos da Administração e de seus agentes, seja para respeitar e atender aos direitos do cidadão - é no zelo pela legalidade que deve imbuir, exemplarmente o Estado, que reside o fundamento maior para que o Poder Público consista que com ele discuta qualquer pessoa, mesmo na condição de preso deve este denunciar irregularidades ou deduzir pretensões.

 

Acresça-se que o DIREITO DE PETIÇÃO é o direito de formular reclamação escrita, deduzindo (fazendo) algum pedido, seja para atender a um interesse pessoal, seja para defender o interesse social contra alguma ilegalidade ou contra algum abuso de poder. Podemos assim, peticionar (escrever) para a autoridade competente e ela será obrigada a tomar conhecimento de nosso escrito (petição) e apreciar nosso pedido (ou defesa), tomando a decisão de forma fundamentada e motivada.

 

A fim de firmar o que vem se delineando, é assegurado legalmente a qualquer pessoa, o direito de petição contra ilegalidade ou abuso de poder, e para defesa de direitos. Nos exatos termos do Art 5º, XXXIV, da CF/1988 - são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas:

 

a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder; (grifo nosso).

 

Assim, podemos afirmar que qualquer pessoa poderá peticionar, reclamar, sobre abusos ou em defesas dos seus direitos, e, por isso mesmo disponibilizamos o modelo de petição abaixo para ser usado por qualquer preso que pretenda usufruir desse benefício e não esteja devidamente assistido por profissional competente, poderá fazê-lo você mesmo ou um familiar, a fim de que possa usufruir da AUTORIZAÇÃO PARA SAÍDAS TEMPORÁRIAS.             

              

 

________________________________________________________________________________________

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA DE EXECUÇÕES PENAIS DA COMARCA DE ..... (OU JUSTIÇA....., DO ESTADO DE ....

 

Ref.: execução nº 0000

 

 

 

NOME COMPLETO DO SENTENCIADO, já qualificado nos autos da execução acima referenciada, vem, respeitosamente à presença de Vossa Excelência, expor e requerer

 

AUTORIZAÇÃO PARA SAÍDAS TEMPORÁRIAS

 

O que o faz com fundamento no nos arts. Art. 5º, XXXIV, alínea "a", da CF/88, C/C art. 41, XIV, da lei nº 7.210/1984 (LEP), pelos fatos e fundamentos a seguir aduzidos:

 

I – DOS FATOS

O peticionário em detrimento da condenação exarada nos autos do processo nº.............., que tramitou perante a 00ª vara da Comarca de ....., cumpre pena no regime semiaberto no estabelecimento penal (colocar o nome do presídio), desde a data de 00/00/0000, ostentando bom comportamento carcerário, além de ser um exímio cumpridor das atividades que lhes são atribuídas (trabalho etc).

 

É sabido que, conforme preconizado pela lei nº 7.210/1984, (Lei da Execução Penal), em seu dominante firmado pelos eminentes ministros do Supremo Tribunal Federal, a exigência objetiva do cumprimento de 1/6 (um sexto) da pena para autorização das saídas temporárias não se enquadra aos presos do regime semiaberto. Logo Preso do semiaberto pode sair temporariamente sem cumprir 1/6 da pena.

 

Conforme demostraremos abaixo.

 

II – DA FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA 

De acordo com o artigo 123 da LEP, o juiz deve autorizar a saída temporária quando o apenado preencher os seguintes requisitos: bom comportamento; cumprimento mínimo de um sexto da pena, se o condenado for primário, e um quarto, se reincidente; e compatibilidade do benefício com os objetivos da pena.

 

Ocorre que, a exigência do cumprimento de um sexto da pena para quem teve fixado o regime semiaberto é manifestamente ilegal, uma vez que é o mesmo requisito para a progressão ao regime aberto.

 

Ora, é notório que o cumprimento de um sexto da pena já permite a progressão de regime. Conclui-se, assim, que tal exigência do lapso temporal tornará a concessão do benefício inócua, pois não necessitará de autorização alguma no regime aberto.

 

A saída temporária foi criada dentro do espírito de ressocialização, possibilitando ao presidiário uma readaptação social. Além disso, também representa uma espécie de prêmio pelo bom comportamento. Abstraindo-se a questão do lapso temporal, há que se admitir como bastante benéfica para ressocialização as saídas temporárias, que são festas da família. São sete dias que só poderão contribuir para a reeducação, reflexão e maior aproximação da família (o apenado tem direito a 5 saídas temporárias, cada uma de, no máximo, 7 dias). 

Art. 124. A autorização será concedida por prazo não superior a 7 (sete) dias, podendo ser renovada por mais 4 (quatro) vezes durante o ano.

(...)

 

Vejamos, portanto, algumas considerações atinentes, ao aspecto subjetivos para obtenção de certos benefícios, ao mérito do condenado de se concentrar no que diz respeito ao bom comportamento carcerário e aptidão para retorno ao seu convívio social.

 

O Requerente ostenta bom comportamento carcerário e há compatibilidade entre a concessão da benesse com os objetivos da pena. Além do mais, a exigência do cumprimento de 1/6 (um sexto) da pena para quem teve fixado o regime semiaberto é manifestamente ilegal, já que se trata do mesmo lapso temporal exigido para a progressão ao regime aberto.

 

Destaque-se que tal concessão certamente assegura a segurança jurídica necessária ao sistema de execuções penais.

 

Destarte, o STJ e o STF já decidiram que a exigência não é válida para presos no regime semiaberto.

 

É oportuno mencionarmos que no julgamento do HC em 1999, o eminente Ministro do STJ Luiz Vicente Cernicchiaro afirmou que, "se a personalidade do condenado recomendar, urge permitir o trabalho externo ainda que não superado o regime fechado. Só assim, socialmente, a decisão atenderá a finalidade da pena — reintroduzir o delinquente ao meio social de modo a que se conduza de acordo com as exigências do Direito".

 

Cabe reforçar que em 2014, em manifestação nos autos da Ação Penal 470, (processo do mensalão), o Supremo Tribunal Federal enfatizou esse entendimento ao autorizar o trabalho externo a cinco condenados. Em voto da lavra do Excelentíssimo senhor ministro Luis Roberto Barroso, o qual asseverou que, há mais de 15 anos, o Superior Tribunal de Justiça, órgão encarregado de uniformizar a interpretação do Direito federal, consolidou esse entendimento, que é seguido pelos tribunais de Justiça dos Estados, responsáveis pela execução direta das penas aplicadas aos condenados.

 

Igualmente, a Súmula Vinculante nº 56, aprovada em julho de 2016, STF, a qual tem por objetivo evitar que o condenado cumpra pena em regime mais gravoso do que o determinado na sentença, ou do que o autorizado por lei, em razão da inexistência de vagas ou de condições específicas que o possibilitem. Vejamos:

 

Súmula Vinculante 56

A falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso, devendo-se observar, nessa hipótese, os parâmetros fixados no RE 641.320/RS. (grifo nosso)

 

Frise-se que tal circunstancia evidencia o FUMUS BONI IURIS, por haver cristalinos apontamentos de que o reeducando tem direito ao que está pedindo. Outrossim, resta evidente o PERICULUM IN MORA, pois conceder tal benesse somente quando o sentenciado cumprir 1/6 (um sexto) de sua pena é manifestamente ilegal, uma vez que é o mesmo requisito para a progressão ao regime aberto, logo será muito tarde, ou seja, o direito do apenado já terá sido danificado de forma irreparável.

 

Assim, resta insofismável a necessidade das saídas temporárias, enquanto perdurar o encarceramento do Requerente, nos exatos termos do inciso I, do art. 122, da LEP, pois o sentenciado tem família constituída, estando preenchidos os requisitos previstos nos arts. 122, I, e 123, da LEP, não havendo razão para não CONCESSÃO ao apenado (NOME DO SENTENCIADO) autorização para 5 (cinco) saídas temporárias por ano, com duração de 7 (sete) dias cada, para visita à família, que deverá ser realizada nas seguintes datas:

I – Páscoa - dias XX a XX;

II – dia das mães - dias XX a XX;

III – dia dos pais - dias XX a XX;

IV – Natal - dias XX a XX;

V – Ano Novo - dias XX a XX.)   

 

É incontestável que,  se o condenado iniciar o cumprimento da pena em regime semiaberto e preencher os requisitos de ordem subjetiva (boa conduta social), personalidade sensível à função motivadora da norma penal, só vem aquilatar o entendimento de que poderá desde os primeiros dias do processo executório penal, mesmo sem que para tanto tenha cumprido 1/6 (um sexto) da pena pode usufruir dos benefícios das saídas temporárias.

 

Vejamos, do contrário, ao cumprir um sexto de sua pena e apresentar mérito prisional, quando o sentenciado alcançar o dito direito objetivo já não mais será apenas para os benefícios ora pretendidos em regime semiaberto, mas sim para a progressão ao regime aberto como determina o art 112, da LEP, senão vejamos:

 

Art. 112. A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e ostentar bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão. (grifamos)

 

O que por evidente é bem mais favorável. Portanto, não tem sentido a exigência desse lapso temporal em relação aos sentenciados em regime semiaberto.

 

III – DOS PEDIDOS

Ante a plausibilidade demostrada do pedido e por tratar-se de benefício a que faz jus, REQUER-SE digne-se Vossa Excelência a CONCESSÃO dos benefícios das saídas temporárias, por tudo que fora arguido.

           

Por fim, pugna-se que todos os argumentos sejam motivadamente cotejados, sob pena de serem reivindicados nas próximas fases recursais, a aplicação analógica do princípio de que todo argumento que não for contestado, deverá ser considerado como verdadeiro.

 

Termos em que,

pede deferimento

 

 

São Paulo, 00 de abril de 2018

 

 

(NOME COMPLETO DO SENTENCIADO)

  • Direitos dos presos

Valter dos Santos

Bacharel em Direito - Sorocaba, SP


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