Ordenamento Jurídico: O Conceito de Justiça e suas influências na seara jurídica sob a visão aristotélica.


03/03/2022 às 12h44
Por Antonia Leonida Advocacia

Ordenamento Jurídico: O Conceito De Justiça E Suas Influências Na Seara Jurídica Sob A Visão Aristotélica.[1]

Antonia Leonida Pereira de Oliveira[2]

Sarah Camila Barbosa Ewerton[3]

Thales da Costa Lopes[4]

RESUMO

Este estudo objetiva analisar o conceito de justiça e suas influências na seara jurídica sob a visão aristotélica, utilizando livros e artigos científicos. Pretende-se esclarecer a perspectiva aristotélica e demonstrar as classificações de justiça relacionando-as com o ordenamento jurídico. Parte-se dos conceitos de justo e injusto e as categorias de justiça definidos por Aristóteles que foram utilizados para definir esses conceitos na atualidade. Por fim, conclui-se que as definições de Aristóteles sobre justiça foram de suma relevância para induzir os princípios basilares do ordenamento jurídico, trazendo equivalência entre os polos, através do juiz, e enfatizando o papel da virtude no que tange aos cidadãos, que os torna justos ou injustos dependendo de seus atos para alcançar a finalidade primeira do homem, a felicidade.

Palavras-chave: Justiça. Ordenamento Jurídico. Justo. Injusto. Virtude.

1 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

1.1 A PERSPECTIVA ARISTOTÉLICA DA JUSTIÇA

É comum da natureza humana classificar atitudes como justas e injustas. Assim, pode se entender que “a ciência moral não tem outro objeto senão ensinar o que é justo fazer e ao que é injusto renunciar”. (PERELMAN, 2005, p. 7). Um dos ensinamentos mais conhecidos de Aristóteles é que o homem é um ser político, criado para viver na polis, local onde é possível exercer plenamente suas atividades virtuosas, como a ética e a moral, que só é possível de ser exercida a partir do momento em que o homem passa a viver em sociedade.

Destarte, toda atitude humana está vinculada na constante procura do fim supremo (summum bonum), que é a felicidade, sendo a virtude um meio-termo para o alcance da referida finalidade. Com base nisso, Aristóteles faz uma análise das virtudes éticas e das concepções de justiça relacionando essas as espécies de ações. (ARISTÓTELES, 2006). Para Aristóteles as pessoas deveriam refletir sobre suas ações e colocar a razão acima dos desejos, pois o ser humano é um ser social e estas ações devem refletir o bem comum, in verbis:

Pelos atos que praticamos em nossas relações com as outras pessoas, tornamo-nos justos ou injustos; pelo que fazemos em situações perigosas e pelo hábito de sentir medo ou de sentir confiança, tornamo-nos corajosos ou covardes. O mesmo vale para os desejos e a ira: alguns homens se tornam temperantes e amáveis, outros intemperantes e irascíveis, portando-se de um ou de outro modo nas mesmas circunstâncias. (ARISTÓTELES, 2002, p. 41).

É no livro Ética a Nicômaco que Aristóteles trata especificamente sobre a justiça, onde analisa os conceitos e sentidos, como a justiça particular, que é a própria relação entre particulares, justiça universal, que leva em consideração o todo que deve ser aplicado a comunidade, justiça distributiva, que muito assemelha-se ao que hoje se conhece como princípio da isonomia onde o filósofo percebe que o conceito de igualdade depende da concepção de quem a está definindo, e a justiça corretiva que trata da correção das injustiças a partir da intervenção dos juízes, especificamente, pois é necessária a intervenção de um terceiro para consertar a injustiça. (ARISTÓTELES, 2006).

Este ainda afirma que justiça significa uma excelência insuperável: o justo é aquele que possui todas as excelências e as une num caráter nobre; as leis que servem à justiça são aquelas que conduzem os cidadãos à criação de uma excelência diferenciada. Mas não foi por causa desse assim chamado conceito geral da justiça que o quinto livro da Ética a Nicômaco, causou tanto efeito, o livro da justiça tornou-se tão importante na história da filosofia prática por ter desenvolvido uma distinção tipológica da chamada ‘justiça específica com múltiplas consequências’. (KERSTING, 2002).

Dado o exposto, conclui-se que a justiça constitui a base da sociedade, sendo esta a equivalência do justo e do injusto, cabendo ao magistrado o encargo de guardá-la, mostrando que através de princípios éticos, da virtude e da prudência os homens enfim, chegarão ao seu fim último, a felicidade.

1.2 AS CLASSIFICAÇÕES DE JUSTIÇA DE ARISTÓTELES

Importante ressaltar que o conceito de justiça de Aristóteles tem fundamento na virtude ética, sendo justiça é a maior delas, pois visa o bem do outro, onde o caráter torna as pessoas predispostas a agirem de forma justa ou injusta, e a forma como o homem percorre caminhos a procura da eudaimonia é que define um ato como justo. Aristóteles divide a justiça em:

1.2.1 Justiça geral:

A conceito de justo universal parte do fato de que um cidadão justo é um cumpridor da lei, logo este obedece aos nomos, ou seja, ao ordenamento jurídico revelado pelas normas. (PEGORATO, 1995). Se nomos tem caráter genérico, mas que a todas conecta, então sua finalidade é a cumprimento do bem comum. A ação do justo legal é uma ação que se vincula a todos em disso decorrência sua consequência é caracterizada como justiça legal. (BITTAR, 2010).

1.2.2 Justiça particular:

Para Bittar (2010) a justiça particular é uma espécie de justiça que é correspondente a uma parte da virtude e não ela totalmente, ela é representada pelo próprio homem que se torna virtuoso ao praticar a justiça a partir do cumprimento da lei, contudo, Aristóteles explicita que o cidadão justo é mais aquele que é formado por virtudes e na justiça, que pela lei pura, pois de nada vale a lei sem cidadãos virtuosos. (PEGORATO, 1995). Esta se subdivide em duas espécies:

1.2.2.1 Justiça distributiva

Nesta é que é manifestada a distribuição de funções elevadas do governo, ou de bens, ou de quaisquer coisas que sejam divididas aos cidadãos, nesta concepção o justo é que terá o papel de proporcionalidade ao invés de justiça, e só haverá justiça se for dividido a um seu benefício na medida que estes merecem. (BITTAR, 2010).

1.2.2.2 Justiça corretiva

Caberá ao juiz aplicar esse tipo de justiça, ele será o mediador dos conflitos, tal espécie é utilizada para a correção das relações entre particulares. (ARISTÓTELES, 2006).

1.2.3 Justiça Política

Esta se dá na seara das relações dos indivíduos na polis, ela organiza um modo de vida que tende a autossuficiência da sociedade, tem vigência entre os próprios indivíduos que convivem no mesmo local, essa justiça era exclusa a alguns membros da sociedade por isso não se enquadravam na classificação de justiça política, estes eram apenas atingidos obliquamente. (ARISTÓTELES, 1996).

Nesta é espécie são divididas ainda dois gêneros:

1.2.3.1 Justiça Legal

Esta corresponde às determinações derivadas do nómos, isto é, das regras vigentes entre os cidadãos políticos, ela se fundamenta na lei e por isso é definida pela vontade do próprio legislador, ela também é fundada na convenção, pois a vontade do órgão que se origina do legislador é soberana e ela tem caráter obrigatório e vincula todos os cidadãos. (ARISTÓTELES, 1996).

1.2.3.2 Justiça Natural

Esta encontra fundamento na própria natureza, sua força rompe com barreiras políticas, ela transcende a vontade humana e são imutáveis, e tem a mesma forma em todos os locais. (BITTAR, 2010).

1.2.4 Justiça Doméstica

A justiça doméstica é aplicada aos indivíduos exclusos da justiça política, ela atua dentro da casa e não na polis, Aristóteles sustenta que não há que se falar em justiça ou injustiça, pois ninguém é capaz de fazer mal a si. (ARISTÓTELES, 1959).

Por fim, conclui-se que as concepções Aristotélicas sobre justiça se localizam na seara das virtudes, porém, em posição de destaque, visto que é a virtude que se manifesta ao lidar com o outro, as influências de tais definições hodiernamente são de suma importância para o âmbito jurídico, pois este se legitima também pela confiança dos indivíduos na outorga da competência de garantir a justiça.

1.3 A INFLUÊNCIA DA CONCEPÇÃO ARISTOTÉLICA DE JUSTIÇA NO ORDENAMENTO JURÍDICO

Aristóteles afirma que os atos e as disposições de caráter se atualizam no hábito, ou seja, um homem justo pratica atos justos, e praticando atos justos se torna um homem virtuoso.

Assim, explicamos suficientemente que a virtude é um meio termo, em que sentido devemos entender essa expressão, e que é um meio termo entre dois vícios, um dos quais envolve excesso e o outro falta, e isso porque a natureza da virtude é visar à mediania nas paixões e nos atos. Por conseguinte, não é fácil ser bom, pois em todas as coisas é difícil encontrar o meio. Por exemplo, determinar o meio de um círculo não é para qualquer pessoa, mas só para aquela que sabe; do mesmo modo, qualquer um pode encolerizar-se, dar ou gastar dinheiro, pois isso é fácil; mas proceder assim em relação à pessoa que convém, na medida, ocasião, motivo e da maneira que convém não é para qualquer um, e nem é fácil. Por isso agir bem tanto é raro como nobre e louvável. (ARISTÓTELES, 2002a, p. 54).

A jurisprudência brasileira tem utilizado as obras de Aristóteles como base para fundamentar sua prerrogativa, pois esta tem como preocupação a aplicação e eficiência da lei, em seus escritos o renomado filósofo apresenta a teoria da justiça de conveniência ou adaptação, que equivale a equidade. Destaca ainda, que em alguns casos o excesso é louvável, e em outros a falta é louvável, onde um dos vícios é mais errôneo que o outro, sendo preferível o outro na dificuldade de encontrar o meio termo, mostrando que existem, portanto, vários fatores que complicam a regra. (PERELMAN, 2005).

Destarte, o direito não pode partir de premissas consideradas verdadeiras, pois uma decisão não pode ser obrigatória levando em consideração que é necessário analisar as possíveis decisões ao caso concreto, portanto, através da dialética é que se pode contestar as premissas obrigatórias. (BITTAR, 2010).

Por isso, resulta-se a relação entre justiça e dialética, que Aristóteles legou aos juristas atuais. Assim, o direito terá como escopo primordial a justiça e para alcança-la os raciocínios jurídicos decorrentes de um sistema jurídico são estabelecidos em bases formais, em compensação, os casos concretos não se repetem e por isso não podem ser tratados de modo universal.

Dado o exposto, justiça é aquela disposição da alma de dar a cada um o que é seu na medida de seus méritos, obedecendo ao nómos político, não se apropriando de nada mais e nada menos daquilo que lhe é devido, é compreensível afirma que dentro de cada indivíduo existe uma moral que é justa, e é algo inerente ao indivíduo, mas para o estudo do direito, à justiça particular é que vem a ser enfatizada, haja vista ela corresponder a definição da arte do direito. A importância de Aristóteles tem sido notável ao se analisar a gênese do direito, e para que se entenda a ontologia jurídica se faz necessário tal conhecimento.

REFERÊNCIAS

ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Texto integral. Tradução: Pietro Nassetti. São Paulo: Martin Claret, 2006.

­­­­­­­­­­­­_______. Arte Retórica e Arte Poética: Difusão Européia do Livro, 1959.

_______. Ética a Nicômaco. Trad. Pietro Nassetti. São Paulo: Martin Claret, 2002.

BITTAR, Eduardo Carlos Bianca. Curso de filosofia do direito. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2010.

Com base neste livro foram trabalhadas as classificações de justiça e também as prerrogativas jurídicas atuais baseadas na visão aristotélica.

KERSTING, W, A. Ética Nicomaquéia. Philósophos, v. 7, n. 1, p.115-137, 2002.

PERELMAN, Chaïm. Ética e direito. Tradução: Maria Ermantina de Almeida Prado Galvão. São Paulo: Martins Fontes, 2005.

PEGORATO, Olinto A. Ética é Justiça. Petrópolis, RJ: Vozes, 1995.

ESBOÇO DO TEXTO COM A ESTRUTURA DAS SEÇÕES BEM DEFINIDAS

1 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA.......................................................................................01

1.1 A Perspectiva Aristotélica da Justiça..............................................................................01

1.2 As Classificações de Justiça de Aristóteles.....................................................................02

1.2.1 Justiça geral......................................................................................................................03

1.2.2 Justiça particular...............................................................................................................03

1.2.2.1 Justiça distributiva.........................................................................................................03

1.2.2.2 Justiça corretiva.............................................................................................................03

1.2.3 Justiça Política..................................................................................................................04

1.2.3.1 Justiça Legal .................................................................................................................04

1.2.3.2 Justiça Natural...............................................................................................................04

1.2.4 Justiça Doméstica.............................................................................................................04

1.3 A Influência Da Concepção Aristotélica De Justiça No Ordenamento Jurídico.................05

REFERÊNCIAS......................................................................................................................07

 

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  • filosofia

Antonia Leonida Advocacia

Advogado - São Luís, MA


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