O sistema carcerário brasileiro segundo os dados do INFOPEN e a possibilidade de solução da superlotação por meio do monitoramento eletrônico.


03/03/2022 às 12h48
Por Antonia Leonida Advocacia

O SISTEMA CARCERÁRIO BRASILEIRO SEGUNDO OS DADOS DO INFOPEN E A POSSIBILIDADE DE SOLUÇÃO DA SUPERLOTAÇÃO POR MEIO DO MONITORAMENTO ELETRÔNICO[1]

Emilly Dayana Silqueira Furtado²

Antônia Leonida Pereira de Oliveira²

José Cláudio Cabral Marques³

RESUMO

O presente artigo tem como objetivo tratar sobre o sistema carcerário brasileiro segundo os dados do INFOPEN e a possibilidade de solução da superlotação por meio do monitoramento eletrônico. Para tanto disporemos de uma abordagem descritiva no que concerne a conjuntura do sistema carcerário feminino brasileiro. Abordar-se-á também os dados relativos ao o aumento da população carcerária feminina nos anos de 2000 a 2014 com base nos dados do Levantamento Nacional de Informações Prisionais - INFOPEN. Demonstraremos também a problemática da insuficiência de vagas no sistema carcerário brasileiro à luz da súmula 56 do Supremo Tribunal Federal - STF e a possibilidade de resolução por meio do monitoramento eletrônico. Destarte, toda esta análise foi devida para melhor compreensão da condição de gênero no sistema prisional, o aumento crescente das mulheres encarceradas, a insuficiência de vagas no sistema carcerário, fazendo uma análise da súmula 56 do STF, trazendo como possível medida de resolução dessa conjuntura o monitoramento eletrônico de mulheres.

Palavras-chave: Monitoramento Eletrônico. Sistema carcerário. Superlotação feminina. INFOPEN. Súmula 56 do STF.

1 INTRODUÇÃO

O Brasil possui a quinta maior população carcerária feminina do mundo. Segundo dados do Departamento Penitenciário (2014) em todo território nacional somam-se cerca de 37.380 detentas, que equivale a 6,4% da população prisional total. Nos últimos anos o percentual de mulheres encarceradas vem crescendo espantosamente e tem sido motivo de grande preocupação para o Estado, ensejando numa pressão maior para a criação de projetos voltados para melhoria infraestrutural do sistema carcerário e para o combate ao crescimento exacerbado que alcançou uma variação de cerca de 547% nos últimos anos. (DEPEN, 2014).

Destarte, o caráter ressocializador da pena se torna ineficaz, uma vez que o cumprimento da pena se torna um violador de direitos fundamentais, e quando se aplica essa realidade a mulher se torna mais complexo ainda, pois as condições de gênero desencadeiam necessidades diferenciadas e estabelecimentos penais próprios para recebimento da população feminina. (PIMENTEL, 2008).

Diante do que foi mencionado, percebemos que o sistema punitivo brasileiro se encontra aquém de um sistema prisional igualitário, justo e digno, verificando-se a ausência de infraestrutura nos estabelecimentos penais e o despreparo para o recebimento da alta demanda de mulheres nas unidades prisionais, respeitando suas particularidades e necessidade especificas.

A despeito dessa situação, o uso da tecnologia tem sido absolvido pelo direito penal, substituindo o caráter cautelar das penas, quando adequadamente regulamentado e aplicado com base nos limites constitucionais e processuais penais, podendo inclusive ser uma forma de resolução do problema da superlotação do sistema prisional, além de evitar que o condenado passe pelas mazelas decorrentes do encarceramento. Neste sentido, a utilização do monitoramento eletrônico no que concerne a superlotação dos presídios tem suscitado alguns questionamentos no que concerne a sua efetividade, tendo em vista que permite que o apenado cumpra o regime dentro do convívio familiar, se reintegrando a sociedade, fechando o ciclo de ressocialização. (FILHO, 2012).

Neste viés, a despeito do crescente aumento de condenadas no sistema prisional brasileiro, a que se pensar nas violações não apenas a dignidade do indivíduo encarcerado, mas também na integridade e direitos básicos que são cerceados quando permanecem em estabelecimentos similares aos que a lei dispõe que deveria ser, mas pela superlotação e inexistência de Casas de Albergado e Colônias, a utilização do monitoramento eletrônico se mostra uma possível saído para este problema, mesmo com questões de direito a intimidade sendo discutidas no uso dessa ferramenta, os direitos fundamentais são relativizados pela convivência entre si, logo a que se equilibrar a segurança social e os próprio direitos garantidos sine qua non pelo Estado Democrático de Direito e Declaração Universal de Direitos Humanos. (RUDOLFO, 2015).

Com base nessa conjuntura, questiona-se: de que maneira a utilização do monitoramento eletrônico como instrumento de controle das condenadas, possibilita a resolução do problema da superlotação dos presídios femininos.

Este estudo é relevante para a sociedade, pois é uma fonte de esclarecimento da atual conjuntura do sistema prisional e seu desprezo em relação a condição de mulher, das péssimas condições de estrutura das unidades prisionais, e ainda, através desse artigo, poderemos mostrar a possibilidade de o monitoramento eletrônico ser eficiente para resolução do problema da falta de vagas no sistema prisional.

A importância acadêmica deste artigo, decorre do fato de este ser fonte de conhecimento aos juristas e estudantes sobre a referida temática, fazendo uma abordagem analítica para demonstrar a situação das mulheres e a violação as suas garantias no sistema prisional e como a inserção de meios tecnológicos pode ser substancial para sanar o problema.

Destarte, a razão pessoal de escolha do artigo originou-se pela curiosidade em analisar a forma que a mulher tem sido tratada, frente a sua condição de gênero, afim de que possamos compreender o cenário atual do sistema carcerário, com o intuito de haver enriquecimento sobre o tema, tanto pelas origens patriarcais e conservadoras, quando pela discriminação e segregação enfrentada por elas e, não obstante, a questão bastante difundida na doutrina do monitoramento eletrônico.

Para tanto, partiu-se do seguinte objetivo geral: Analisar o sistema carcerário brasileiro segundo os dados do INFOPEN, bem como o crescimento no quantitativo de presidiárias e a possibilidade de solução da superlotação por meio do monitoramento eletrônico. Afim de alcançá-los foram desenvolvidos os seguintes objetivos específicos: Apresentar a conjuntura do sistema carcerário feminino brasileiro; demonstrar o aumento da população carcerária feminina nos anos de 2000 a 2014 com base nos dados do INFOPEN e descrever a problemática da insuficiência de vagas no sistema carcerário brasileiro a luz da súmula 56 do STF e a possibilidade de resolução por meio do monitoramento eletrônico.

No que se refere a metodologia, este artigo será exibido com base nas condições das mulheres no sistema prisional brasileiro. De início iremos explanar a situação do sistema carcerário feminino brasileiro, bem como a forma que são tratadas, o despreparo estrutural para demanda e para adequar os presídios a sua condição biológica. Posteriormente, analisaremos o aumento da população carcerária feminina, com dados de 2000 a 2014, segundo o INFOPEN, a súmula 56 do STF e a possibilidade da utilização do monitoramento eletrônico no que concerne a superlotação dos presídios femininos brasileiros. Para tanto, usamos livros, artigos, monografias, sumulas, dados do Infopen, código penal e a Constituição.

2 A CONJUNTURA DO SISTEMA CARCERÁRIO FEMININO BRASILEIRO

Até o ano de 1940, as mulheres eram detidas no mesmo estabelecimento dos homens, sendo algumas vezes, separadas em celas e salas específicas para mulheres. Foi apenas com a promulgação do Código Penal e Processual Penal, que surgiu a primeira norma legal determinando que as mulheres cumpririam pena em um estabelecimento especial, em secção adequada ou prisão comum. (PIMENTEL, 2008).

Ocorre que, as normas legais garantidoras de um sistema prisional diferenciado para as mulheres, não resolveu os graves problemas que caracterizam o sistema prisional brasileiro, tendo este se intensificado cada vez mais, haja vista o aumento dos encarceramentos em tais presídios, pois desde os primórdios há uma omissão dos poderes públicos, e a maioria encontra-se em estabelecimentos adaptados, que não cumprem integralmente com suas especificidades de gênero. (PINHEIRO, 2012).

Conforme o entendimento de Pimentel (2015), o sistema penitenciário feminino brasileiro se encontra defasado, em desacordo com toda a abstração de garantias mínimas idealizadas. Pode-se perceber que o estado despreza as questões de gênero, visto que a dinâmica prisional brasileira oferece estabelecimentos penais iguais para acolher homens e mulheres, isto é revelado nas adaptações feitas pelo poder público com o advento das cadeias mistas, demonstrando a despreocupação com a estadia de mulheres que nos estabelecimentos penais e com suas necessidades particulares de gênero, negligenciando todo o aparato necessário para a permanência delas nas prisões, aumentando o ricos de vida e saúde na permanência de mulheres nas cadeias brasileiras.

Tal situação tem ocorrido em virtude dos órgãos garantidores de direitos fundamentais, idealizarem as detentas como pessoas que não possuem dignidade, afinal, poderia se pensar que em função de serem autoras dos mais diversos crimes, sua dignidade estaria comprometida. Este é um típico pensamento que deve ser repudiado, vez que a dignidade da pessoa humana é qualidade intrínseca a todas as pessoas, independentemente de o indivíduo ser autor de um delito, ou seja, a dignidade de todas as pessoas, mesmo daquelas que cometem as ações mais indignas e infames, não poderá ser objeto de desconsideração. (SARLET, 2001).

A noção de proteção e segurança do sistema prisional, expressos na legislação infraconstitucional e na Carta Magna, são teorias que não se aplicam a realidade fática, vez que a privação de liberdade se torna desumana na medida que viola condições básicas de sobrevivência como alimentação e higiene (SARLET, 2001).

Neste atual cenário, percebe-se que as detentas não estão sofrendo limitações apenas de ir e vir, porém, por conta da negligência e omissão do Estado, há diversos direitos violados, que vão desde os direitos inerentes à saúde, alimentação, limpeza até os direitos que implicam na forma de reintegração social, são eles, a educação, trabalho e principalmente as relações familiares.

3 O AUMENTO DA POPULAÇÃO CARCERÁRIA FEMININA NOS ANOS DE 2000 A 2014 COM BASE NOS DADOS DO INFOPEN

Em junho de 2014, o Departamento Penitenciário Nacional- Ministério da Justiça (DEPEN) lançou a primeira versão do INFOPEN- MULHERES com dados referentes à população carcerária feminina num intervalo de tempo que vai de 2000 a 2014. É interessante frisar que esse é o primeiro informativo voltado para análise exclusiva da figura da mulher no sistema prisional, com nuances de comparação entre gêneros e que visa conceder maior visibilidade a essa temática (DEPEN, 2014).

A conclusão geral do INFOPEN- MULHERES é que o Brasil conta com uma população prisional de 607.731 pessoas, somando os custodiados em carceragens de delegacias ou estabelecimentos similares mais os que se encontram no Sistema Penitenciário, sendo que 37.380 mulheres estão nesta modalidade de sistema (DEPEN, 2014).

No período de 2000 a 2014 o aumento da população feminina foi de 567,4%. Esse percentual é crescente entre a população prisional feminina e gera certa apreensão frente a esse assustador aumento de mulheres nas prisões do Brasil. Em um comparativo com a população prisional masculina temos que a média de crescimento foi menos da metade, 220,20% (DEPEN, 2014).

A partir dos dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) podemos estipular que existem cerca de 1.424 estabelecimentos penais (AGÊNCIA CNJ DE NOTÍCIAS, 2015). O INFOPEN- MULHERES leva ao conhecimento do leitor que apenas 7% destes são penitenciárias femininas e que em 17% são cadeias mistas (DEPEN, 2014). Compreendemos, assim, que a população prisional feminina carece de alojamentos próprios, e transparece a despreocupação estatal para construções de prisões exclusivamente femininas, principalmente no que tange ao significativo aumento dessa população e as necessidades e particularidades que lhes são específicas.

Frente aos dados supramencionados, percebemos o completo despreparo e a calamitosa infraestrutura das penitenciárias femininas no Brasil. O poder público parece desprezar as questões de gênero oferecendo um "pacote padrão" com alto grau de similitude às prisões masculinas, nas quais são ignoradas as especificidades femininas como menstruação, maternidade, cuidados específicos de saúde, dentre outras (SILVA, 2014).

­Um documento nominado “Reglas de las Naciones Unidas para el tratameiento de las reclusas y medidas no privativas de la libertad para las mujeres delincuentes”, proferido pela ONU, versa sobre algumas regras acerca das particularidades femininas nas cadeias e prioriza o respeito ao princípio de “não descriminação” sempre se atendo às necessidades específicas da figura da mulher, garantido o efetivo respeito ao princípio da isonomia em seu sentido material (BORGES, 2011).

Segundo Borges (2011 p. 62) ainda o tratamento diferenciado entre homens e mulheres não se trata de ações de desigualdade, ao contrário, refere-se à situação como “descriminação positiva” devido à precisão de cuidados diferenciados em face das diferenças biológicas entre os gêneros.

A regra 5 das “Reglas de Bangkok” estabelece que:

Os presídios destinados ao alojamento das mulheres presas deverão contar com instalações e artigos necessários para satisfazer as necessidades de higiene próprias do seu gênero, incluídas toalhas sanitárias gratuitas e o fornecimento permanente de água para cuidados pessoais, dos filhos e das mulheres, em particular as que cozinham, as grávidas e as que se encontram em período de amamentação ou menstruação (ONU, 2011, [tradução])

O Departamento penitenciário (2014) também divulgou dado a respeito do aumento da população carcerária por estados, mostrando a variação em um intervalo de sete anos, de 2007 a 2014, apresentaram também a comparação entre gêneros e suas progressões percentuais.

Conforme os dados do Departamento penitenciário (2014), o Brasil teve um aumento da população carcerária feminina de 19.034 mulheres para 37.380, um crescimento percentual de 96%. Destaque para o Paraná que apresentou redução na população carcerária em 43%. Atenção ao estado de Alagoas que apresentou o maior aumento nesses sete anos contemplados na tabela, alcançando a marca de 444%, com uma população prisional ainda insignificante de 337 mulheres perto da maior população carcerária feminina que é no Estado de São Paulo que é de 14.810 mulheres. O Maranhão apresenta uma variação preocupante de 134% alcançando o número de 229 de detentas.

Ainda, o sistema penitenciário do Maranhão está em uma conjuntura degradante em relação à alta demanda de mulheres no sistema prisional, contando apenas com uma penitenciária feminina e com mais 3 unidades mistas que acolhe mulheres envolvidas com o crime no estado (DEPEN, 2014).

Por conseguinte, compreendemos que a situação carcerária brasileira não atende à demanda de mulheres sentenciadas ao cumprimento de penas, são baixos os números de estabelecimentos penais oferecidos e ainda se encontram em estado precário, desrespeitando diversas garantias individuais previstas na constituição. É notório o desrespeito à condição biológica das mulheres, principalmente em virtude da superlotação dos presídios e despreocupação com políticas públicas que respeitem a condição de mulher e afira a real função social da pena, que é a ressocialização.

4 A PROBLEMÁTICA DA INSUFICIÊNCIA DE VAGAS NO SISTEMA CARCERÁRIO BRASILEIRO A LUZ DA SÚMULA 56 DO STF E A POSSIBILIDADE DE RESOLUÇÃO POR MEIO DO MONITORAMENTO ELETRÔNICO

Ante a análise realizada sobre o cenário do sistema prisional brasileiro, um dos problemas mais notórios e debatidos é em relação a estrutura física dos presídios. A conjuntura das prisões demonstra superlotação, higiene precária, estruturas antigas e que apresentam risco de desabamento, falta de saneamento básico, assistência médica, psicológica, entre outros.

Partindo do pressuposto de que a pena tem a função de ressocializar o indivíduo, é pacífico o entendimento que tal incumbência não tem sido obedecida, uma vez que os locais onde os apenados cumprem suas penas são desumanos, sendo a pena privativa de liberdade a pior alternativa, pelo nível de reincidência e pela extensa violação a direitos fundamentais. (COELHO NETTO; BORGES, 2013).

No que se refere as prisões femininas, o cenário é o mesmo, apesar de estar em número inferior em relação aos homens. A Constituição Federal de 1988 prevê que é devido o acesso à justiça a todos, entretanto são numerosos os processos criminais em que os apenados progridem de regime, mas continuam no regime mais gravoso por não haver acompanhamento devido a condição de hipossuficiência. (PIMENTEL, 2008).

Segundo o art. 33 do Código Penal, que regulamenta as penas privativas de liberdade, o regime fechado deve ser cumprido em estabelecimento de segurança máxima ou média, por penas superiores a oito anos; o regime semiaberto tem severidade intermediária, e é cumprido em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar, sendo direcionada aos apenados com penas privativas de liberdade superiores a quatro e inferiores a oito anos, sendo condenados primários, e também aos que progridem de regime, do fechado para o aberto, cumprindo 1/6 ou, se for crime hediondo, 2/5 réu primário e 3/5 se for reincidente; o regime aberto é menos rigoroso de todos e deve ser cumprido em casa de albergado, sendo direcionado aos apenados primários com penas iguais ou inferiores a quatro anos ou aos que progridem de regime. (BRASIL, 1940).

Assim, quando o apenado apresenta bom comportamento e obtém o tempo necessário, ele progride de regime e transferido para o local respectivo ao regime. Destarte, ele começaria no regime fechado, por exemplo, em um presídio, seria retirado do convívio social para ser ressocializado, depois seria transferido para um estabelecimento menos restritivo, e depois para o regime aberto, por meio dessa gradação o detento teria maior liberdade e conforme seu comportamento e cumprimento de pena, retornaria a sociedade totalmente ressocializado e apto ao convívio social. (ALMEIDA, 2014).

Outrossim, a realidade fática é outra, quase inexistem as unidades prisionais das colônias agrícolas e industriais e casas de albergado, que são adequadas para o cumprimento da pena nos regimes semiaberto e aberto. (ALMEIDA, 2014).

Diante desse cenário, a súmula 56 do STF dispõe que “A falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso, devendo-se observar, nessa hipótese, os parâmetros fixados no RE 641.320/RS”. (BRASIL, 2016)

Assim, a falta de vagas nos regimes semiabertos e aberto não legitima a permanência em regime mais gravoso, o que não se sucede, o próprio STF destacou que o sistema progressivo não tem funcionado, pois os presos estão sendo mantidos no regime fechado, mesmo havendo a progressão, violando suas garantias constitucionais. (ALMEIDA, 2014).

Quando o condenado é mantido em regime mais gravoso do que é o correspondente é caracterizado como “excesso de execução”, havendo violação aos direitos do apenado, sendo permitido ao Estado a execução da pena de forma excessiva o princípio maior da dignidade da pessoa humana é transgredido, mesmo que o ilícito cometido pelo condenado tenha sido grave, a condenação não afasta a humanidade da pessoa condenada. (CAVALCANTE, 2016).

Outrossim, como existem poucas colônias agrícolas e industriais, os Estados mantem os presos que estão no regime semiaberto em estabelecimentos similares, que são unidades prisionais que disponibilizam um pouco mais de liberdade que o regime fechado. (CAVALCANTE, 2016).

No que tange as Casas de Albergado, são quase que irreais, os detentos que estão no regime aberto e não tem como irem para Casa de albergado, ficam em unidades diferentes dos demais presos. Todavia, essa “solução temporária” tem sido muito discutida entre os magistrados do STF, que possuem competência para decidir se determinado estabelecimento é adequado ou similar, se forem considerados os presos podem ficar neste. (BRASIL, 2016)

A despeito disso, o entendimento do STF foi, in verbis:

Os juízes da execução penal podem avaliar os estabelecimentos destinados aos regimes semiaberto e aberto, para qualificação como adequados a tais regimes. São aceitáveis estabelecimentos que não se qualifiquem como “colônia agrícola, industrial” (regime semiaberto) ou “casa de albergado ou estabelecimento adequado” (regime aberto) (art. 33, § 1º, b e c, do CP). No entanto, não deverá haver alojamento conjunto de presos dos regimes semiaberto e aberto com presos do regime fechado. STF. Plenário. RE 641320/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 11/5/2016 (repercussão geral) (Info 825). (BRASIL, 2016).

Com fundamento na resolução nº 641329/ RS o STF decidiu que quando houver insuficiência de vagas no estabelecimento adequado deve ser determinada: a saída antecipada de sentenciado no regime com falta de vagas, ou seja, aqueles que estão a mais tempo tem a saída antecipada; a liberdade eletronicamente monitorada ao sentenciado que sai antecipadamente ou é posto em prisão domiciliar por falta de vagas e o cumprimento de penas restritivas de direito e/ou estudo ao sentenciado que progrida ao regime aberto. (BRASIL, 2016).

Assim, o STF deliberou que uma solução seria antecipar a saída de sentenciados que já estão no regime semiaberto ou aberto, abrindo vaga para aquele que acaba de progredir, pois o critério isonômico tem que ser levado em conta, ou seja, quem está aguardando a mais tempo poderá, quando houver insuficiência de vagas, ter liberdade antecipada para dar lugar aos que progrediram de regime. (CAVALCANTE, 2016).

Com a crescente inclusão de meios tecnológicos no Direito Penal, uma possível resolução desse contexto seria a utilização do monitoramento eletrônico, que tem a função de supervisionar a distância o condenado ou investigado por algum ilícito. Entretanto, discussões a respeito da provável violação ao direito fundamental a intimidade tem sido comum, mas é notável que nenhum direto é absoluto, sendo mais benéfico monitorar o indivíduo que lhe inserir num sistema prisional como o que foi relatado nesse artigo. (GRECO, 2010).

Assim, o excesso da atividade legislativa na proteção do direito a dignidade e intimidade, acaba por relativizar a aplicação de uma medida que poderia ser crucial para mudança do cenário prisional, a proibição pertinente a esse excesso equilibra as liberdades dos indivíduos, onde temos a intimidade do indivíduo condenado e a segurança da sociedade. (RUDOLFO, 2015).

Entretanto, a apesar da alegação violação a intimidade pelo uso de aparelhos eletrônicos na fiscalização de apenados, faz mais sentido a utilização desses meios que colocar esses indivíduos em estabelecimentos ditos similares, uma vez que alguns direitos são restringidos no momento em que se tem uma sentença transitada em julgado, mas a aplicação da monitoração eletrônica respeita não apenas a dignidade do indivíduo, mais sua integridade física e psicológica, que é infringida pelo descaso do cárcere, além de que o equilíbrio também se dá na medida que a sociedade e vítimas tem seus direitos resguardados. (RUDOLFO, 2015).

Neste sentido, a ADIN 3.510 dispõe que “O Estado, para cumprir com seu dever de proteção, deve empregar medidas suficientes de caráter normativo e material, que levem a alcançar – atendendo à contraposição de bens jurídicos – a uma proteção adequada, e como tal, efetiva (proibição de insuficiência)”. (BRASIL, 2008).

Neste diapasão, o sistema de monitoramento eletrônico é perfeitamente cabível, mas padece de regulamentação por parte de alguns Estados e em outros só é utilizado nas saídas temporárias e prisões domiciliares, nada ajudando na questão da superlotação ou no caráter ressocializador dos presos. (RUDOLFO, 2015)

Assim, trazendo para problemática envolvendo as penitenciárias femininas, a utilização de monitoramento eletrônico como instrumento de controle da condenada, quando apresentasse bom comportamento e progredisse de regime, deve-se ter em mente que com essa medida a reinserção da condenada seria muito mais eficiente, uma vez que o reingresso ao seio familiar é crucial para completar a função da pena, a convivência com os familiares ajuda na recuperação, além de evitar que a condenada continue a sofrer as mazelas do sistema penitenciário, mesmo quando progride de regime.

5 CONCLUSÃO

Em virtude dos fatos mencionados, objetivou-se explicitar que desde a antiguidade as mulheres presas têm tido um tratamento masculino, pois o tratamento era igualado aos dos homens, onde muitas vezes eram punidas por não perpetuarem os padrões e valores predominantes. Ainda, a legislação padece de efetividade no que se refere as condições biológicas das mulheres, mesmo garantindo pouquíssimas prisões, a superlotação tem sido comum e ainda, seguem um padrão que atende as necessidades masculinas, desprezando as necessidades femininas.

Ainda, o crescente aumento das mulheres encarceradas tem gerado uma situação ainda mais gravosa, vez que a quantidade de estabelecimentos penais não é compatível com a demanda, mesmo que, como demonstrado, a população feminina carcerária se apresente em menor número, ainda assim, nenhuma política pública foi efetiva para solucionar o problema, e ainda nenhuma política pública tem sido plena na garantia de penitenciárias que se adequem aos aspectos femininos que garantiriam uma vida menos sofrida e dolorosa, que de fato tivessem o intuito de ressocializar apenas via isolamento com a sociedade e não tratando as detentas de forma desumana.

Também, a falta de vagas nos regimes têm sido um problema enfrentado pelas mulheres que conseguem progredir de regime, que pela situação caótica acabam por ter que adotar medidas urgentes, onde trouxemos a sumula 56 do STF e a Resolução 641320 para expor a forma que se tem utilizado para “remediar” a insuficiência de vagas.

Partindo desse cenário desastroso trouxemos o monitoramento eletrônico como medida viável para superlotação dos presídios femininos, de forma que o uso desde possibilitaria que a detenta estivesse em seio familiar, não se afastando dos filhos, nem sofrendo as mazelas das prisões brasileiras, sendo uma alternativa viável de menor custo que construir tantas prisões quantas forem suficientes e com estruturas dignas, além de possibilitar que o ciclo da ressocialização seja cumprido e que a detenta retorne ao convívio social.

Assim, conclui-se que é a situação das penitenciarias femininas têm sido uma grande violadora de garantias constitucionalmente previstas, da dignidade da pessoa humana, tem fugido da função social da penal que é ressocializar, ensejando em uma urgência na tomada de medidas de contensão e resolução do problema por parte do Estado que se mantém inerte diante de uma conjuntura que se perpassa pelos anos e tem se multiplicado, caracterizando uma clara omissão, frente as “poucas” previsões eu vislumbram direitos das mulheres que presas, que já são punidas mais ainda que os homens por serem retirados do seio familiar, que na maioria das vezes são as genitoras, e ainda são desfiguradas de sua condição de mulher por serem obrigadas a viver num local que as desrespeita de todas as formas e lhes retire até mesmo sua honra. Neste sentido, a medida do monitoramento eletrônico é a solução mais adequada para garantir que a detenta tenha suas garantias mínimas protegidas e asseguradas, lhes permitindo a preservação da estrutura familiar e reduzindo a superlotação nos presídios femininos.

REFERÊNCIAS

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Antonia Leonida Advocacia

Advogado - São Luís, MA


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