MODELOS DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA


19/05/2020 às 15h20
Por Diego Jardim Machado

1 Introdução

A administração pública tem sido o grande desafio em milhares de anos por todas as nações. Alcançar o modelo ideal, livre de corrupção e onde todos atuam de forma harmônica para proteger primeiramente os interesses da coletividade, tem se mostrado uma tarefa árdua e, historicamente falando, o Brasil tem sido alvo de uma gestão falha e muitas vezes ineficiente.

Inicialmente a ideia era implantar o modelo Patrimonialista de administração pública, que determinava sempre o interesse pessoal como sendo mais importante que o respeito à coletividade. Nisso, surgiram inúmeros casos de corrupção e nepotismo, que tornou inviável o bom funcionamento da governança. Posteriormente, para derrubar esse modelo falho, foi idealizado o denominado Burocrático, que atuava de forma bastante rígida nos processos e também para com os governantes, objetivando a prevalência do bem público para maior eficiência da gestão.

Mostrando-se este último também falho porque o acesso dos cidadãos ao atendimento se tornou burocrático e oneroso, passou a vigorar o Gerencial, que veio justamente para dinamizar a forma de fazer gestão e priorizar os interesses coletivos.

 

2 Administração Pública patrimonialista

Esta modalidade de administração pública consiste em transferir a capacidade de poder do Estado para as mãos de seu governante e os auxiliares, de um jeito que não prevaleça a soberania da coisa pública: o poder de administração facilmente se confunde com o status particular de cada membro. O próprio governante absorve os benefícios oriundos do patrimônio do Estado e, por isso, o interesse de toda uma sociedade fica comprometido pela ausência de soberania sobre os interesses particulares dos governantes.

Os princípios norteadores da administração pública (indisponibilidade do interesse público, isonomia, legalidade e publicidade) são claramente ignorados pelo administrador, fato que contribui fortemente para a depredação dos bens públicos, perda da credibilidade na administração e demais prejuízos para a população como um todo.

É comum, para esta modalidade, a corrupção e a contratação de familiares (nepotismo) e amigos próximos, o que dificulta ainda mais a transparência na atuação dos líderes do governo e, principalmente, a prevalência dos interesses da sociedade.

Muito embora a Constituição defina hoje os princípios norteadores da administração pública, no passado, mais especificamente do período colonial até a década de 1930, este era o modelo de administração que vigorava no Brasil.

Algumas características do Patrimonialismo ainda podem ser vistas nos modelos de gestão pública atual. Apesar de acontecer de forma disfarçada, tem-se nepotismo, interesse pessoal acima do público por parte de muitos governantes, obtenção de vantagens ilícitas e, principalmente, o que é o maior dos males, a corrupção.

Por isso, é possível observar o histórico de falhas na qualidade da gestão pública no Brasil, que inclusive permanecem até os dias de hoje, tendo em vista que algumas características Patrimonialistas, mesmo que não permitidas, ainda podem ser percebidas em prefeituras, câmaras e no Congresso.

 

3 administração pública burocrática

O modelo de administração pública conhecido como Burocrática surgiu em meados do século XIX para inibir os abusos cometidos pelo sistema Patrimonialista. A ideia principal é constituir governantes com capacitação profissional para que exerçam amplo controle e evitem o nepotismo, a obtenção de vantagens pessoais e a corrupção.

É esta a modalidade que cobra rigorosamente a distinção entre propriedade pública e privada, como forma de assegurar que os interesses comuns à todos prevaleçam sobre os privilégios próprios dos governantes. Eles, por sua vez, são escolhidos para atuar com impessoalidade e sob regime de hierarquia funcional, partindo do pressuposto de que o desenvolvimento das suas atividades deve estar sempre relacionada a um controle rígido dos processos.

É importante ressaltar que esse modelo de administração passou a tornar ineficiente o funcionamento da máquina pública. Isto porque há excesso de formalismo e maneiras muito rígidas de exercer os mais variados tipos de controle, limitando o acesso coletivo aos serviços essenciais, que deveria ser a prioridade de qualquer gestão pública. Ao mesmo tempo em que a qualidade da administração Burocrática está em controlar os abusos cometidos por aqueles que utilizavam de forma inadequada dos bens e recursos públicos, seu defeito é não atender de forma ampla e eficiente a todos os cidadãos.

Todos os atos inerentes da administração pública passaram a ser lentos, com alto custo e de pouca qualidade, fugindo completamente da proposta principal que era atender à coletividade e suprir as demandas sociais de forma ampla e eficiente.

Não surpreendentemente, o modelo Burocrático cujo principal objetivo era eliminar a forma Patrimonialista de gestão pública não durou muito tempo e logo foi substituído pelo Gerencial.

 

4 administração pública gerencial

Em razão da ineficiência de outros modelos de gestão pública, diversos países pelo mundo começaram a observar um número crescente de problemas sociais causados pelo desemprego, inflação e valores de impostos fora de controle. Isso gerou uma crise generalizada e motivou o surgimento e a implantação de um novo jeito de se conduzir a administração pública, que ficou conhecido como Gerencial.

Nesta modalidade de administração pública, o objetivo principal é retomar a eficiência do atendimento ao cidadão, reduzindo os custos operacionais e melhorando a qualidade do serviço. Ou seja, aqui o cidadão é o centro das atenções e o foco principal dos governantes, que devem implantar no Estado uma reforma baseada em qualidade na condução dos serviços para atender à coletividade, bem como na recepção prestativa e funcional.

Algumas características são predominantes neste processo de transição. A descentralização da administração, por exemplo, é o que visa retirar o poder soberano das mãos de um único governante, delegando tarefas para diversos outros gerentes para que atuem de forma autônoma. Ainda, diferentemente da modalidade Burocrática, a Gerencial busca o controle de qualidade mediante a apresentação de resultados positivos, e não realizando o controle minucioso do que é feito durante o processo. Além disso, os procedimentos devem se voltar para o atendimento do cidadão (que seria o “cliente”), evidenciando a preocupação desta modalidade em atender o interesse da coletividade.

Este é o modelo de gestão pública onde é possível ver, ainda que em teoria, sua aplicação na máquina pública brasileira. A criação das autarquias, empresas públicas e sociedades de economia mista descentralizou a concentração do poder que havia no passado e estreitou a distância entre o Estado e o cidadão, dando maiores oportunidades de livre acesso ao atendimento prestativo.

O modelo Gerencial tem nuances de influência nos aspectos positivos implantados pelo Burocrático, que dizem respeito à descentralização do poder e a busca pela transparência nos atos dos governantes, e buscou descartar e melhorar os aspectos falhos, que distanciavam o cidadão do acesso ao atendimento e tornava a prestação de serviços onerosa e ineficiente.

 

5 RELAÇÃO DO MODELO GERENCIAL COM O BRASIL DE HOJE

Alguns anos se passaram desde que o Plano Diretor foi implantado no sistema de gestão pública no Brasil. De lá pra cá, é possível perceber a influência de alguns modelos de administração e os reflexos que ela causaram na atual forma de governança.

A derrubada dos modelos Patrimonialista e Burocrático é algo utópico e praticado apenas em teoria, porque mesmo que a ideia seja priorizar a coletividade e diminuir as vantagens pessoais absorvidas por certos governantes, muito ainda se vê dessa prática, bem como o nepotismo e a corrupção, que assolam os cofres públicos e vivem colocando à prova a credibilidade da administração pública. Mas hoje o cenário ainda é melhor que nos dias passados, pois existem comissões especiais para fiscalizar e julgar os casos de desrespeito e má-fé, que se mostram cada dia mais eficientes em resolver tais problemáticas.

O modelo Burocrático trouxe uma nova perspectiva para o funcionamento da máquina pública ao passo que fez surgir a prática de fiscalização mais rígida. Porém, os recursos não são suficientes para a manutenção deste tipo de gestão, e os gastos e a lentidão dos processos tornou inviável a manutenção desta modalidade. Foi quando surgiu o modelo Gerencial, que buscava os ideais Burocráticos mas com conceitos mais céleres, econômicos e eficientes.

Há, atualmente, a coexistência dos três modelos, sendo o mais predominante o Gerencial, que lentamente trabalha para extirpar os resquícios negativos dos modelos Patrimonialista e Burocrático.

A própria Constituição, ao longo desses anos, trouxe emendas que tratam da organização da administração pública e definem os princípios norteadores da servidão e das finanças do Estado. Um deles é o princípio da eficiência, que passou a ser buscado pela gestão pública e amplamente adotada, tanto em repartições que lidam com o atendimento direito ao “cliente” (cidadão) quanto pelo setor responsável pelo gerenciamento dos procedimentos e da organização da estrutura.

O princípio da eficiência está diretamente relacionado ao treinamento de servidores públicos e o aperfeiçoamento das suas capacidades, para que possam atender os cidadãos com eficiência, economia, celeridade e transparência e para que sejam capazes de resolver as questões sociais de forma diferenciada. Para isso, uma parte do orçamento é destinada à capacitação e valorização desse pessoal, bem como na melhoria do seu ambiente e condições de trabalho.

Além disso, é assegurado ao cidadão, com a ajuda da tecnologia, participar das decisões dos governantes e através da oportunidade de manifestação disponibilizada pelos portais de transparência e contribuir com seus pareceres.

 

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente artigo científico buscou diferenciar e elucidar quais são as três modalidades de administração pública, suas ideologias, forma de atuação e como se comportam em relação à coletividade, que deve sempre ser a principal interessada em todo o processo.

Inicialmente, o modelo Patrimonialista já extinto era a forma mais egocêntrica e prejudicial que uma administração poderia adotar para gerir suas questões e atuar na proteção dos direitos da coletividade. O fato de que os governantes detinham do poder soberano e podiam adotar a filosofia de que a propriedade e os interesses particulares eram mais importantes que a coisa pública, comprometia a credibilidade dos governantes e favorecia situações de corrupção.

Mostrando-se insustentável, o segundo modelo, conhecido como Burocrático, veio muito rígido e controlador para quebrar a ideia de centralização, monopólio e abuso de poder. O Estado passaria a ser governado por pessoas capacitadas para tal tarefa e os processos de gestão seriam muito bem fiscalizados e organizados, de modo que o nepostismo e a corrupção perdessem seus espaço e que os interesses coletivos prevalececem sobre os particulares dos governantes.

Inicialmente, a intenção era implantar a forma ideal de fazer funcionar a máquina pública, mas o acesso da população ao atendimento ficou extremamente comprometido e tudo passou a ser difícil, caro e lento. Resultado: o sistema idealizador passou a apresentar falhas e a comprometer seriamente o funcionamento do país, deixando rastros de inflação, desemprego e crise econômica.

Logo após veio a modalidade de administração pública conhecida como Gerencial, onde a intenção principal foi colocar os interesses dos cidadãos acima de qualquer coisa e facilitar o acesso dos mesmos às questões da gestão. Passaram a diminuir a onerosidade dos processos, que recaía sempre para a parte mais fragilizada que era a coletividade, e a descentralização do poder, de modo que vários governantes pudesses atuar de forma independente e harmônica entre si.

Como o Brasil ainda precisa evoluir muito a sua forma de gerenciar os aparatos disponibilizados pela administração pública, o futuro promete o surgimento de outras modalidades de governança cada vez mais preocupadas com a transparência e com o extermínio da corrupção. Para isso, é importante a mudança de consciência do povo para maior participação ativa nos processos e engajamento dos servidores públicos que recebem de volta a devida valorização.

Entretanto, por mais que a forma de fazer gestão pública tenha sido lapidada durante anos para alcançar o estágio mais aperfeiçoado, é possível perceber que alguns aspectos negativos ainda se façam presentes no dia-a-dia da administração. O princípio constitucional norteador define que a coisa pública deve, sob qualquer circunstância, prevalecer sobre o particular, mas não é incomum ver situações de corrupção ocasionadas justamente pela vontade do governante de obter vantagens pessoais, independente do mal que possa ser causado à coletividade.

É evidente que a gestão perfeita é quase impossível de ser conquistada, mesmo porque o processo é lento e inúmeros fatores influenciam na melhora da forma de governar. Porém, ainda é preciso que se trabalhe amplamente alguns aspectos da administração pública, para que o relacionamento da mesma com os cidadãos seja cada dia mais eficiente para a resolução das questões sociais mais urgentes.


 

Por Diego Machado

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Referências

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

 

ARAUJO, Edmir Netto de. Curso de direito administrativo. São Paulo: Saraiva, 2005.


Diego Jardim Machado

Advogado - Dom Pedrito, RS


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