POSSO INTEGRALIZAR O CAPITAL SOCIAL COM PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS?


04/11/2015 às 16h52
Por Faria Cendão e Maia Advogados

Recebemos semana passada uma pergunta que achamos interessante compartilhar.
Um de nossos leitores nos questionou acerca da possibilidade de integralizar o capital social de uma sociedade com prestação de serviços, ou seja, apenas com o trabalho de um ou mais sócios.

Este assunto tira o sono de diversos empreendedores, principalmente os que estão buscando investimentos, adotando práticas de Bootstrapping ou que possuem sócios que ingressam na startup apenas com seu próprio trabalho.
Diante disso, resolvemos abordar algumas sociedades e a possibilidade de integralização do Capital Social com prestação de serviços.
Vale ressaltar que a regra é a da integralização por meio de dinheiro, bens ou créditos, sendo certo que a característica mais importante para análise será a natureza da sociedade a ser analisada, ou seja, se é simples ou empresária.
De forma breve e resumida, a diferença:

a) As sociedades simples são as sociedades que não dispõem de uma estrutura organizacional ou que se dedicam a atividades intelectuais ou rurais, devendo o registro ser realizado junto ao Registro Civil de Pessoas Jurídicas (RCPJ). Como exemplo, temos atividades de agricultura, pecuária, sociedade de médicos, contadores, advogados, etc.

b) As sociedades empresárias, por sua vez, são as que exercem atividades próprias de empresários (É claro!), ou seja, exercem a atividade de forma organizada no que diz respeito aos fatores de produção, quais sejam: natureza, capital e trabalho. Estas sociedades exercem a atividade econômica organizada para a produção e/ou circulação de bens ou de serviços e são registradas na Junta Comercial. Como exemplo, atividades de padaria, restaurante, indústria, etc.
A título de exemplo, um consultório formado por médicos presta serviço de natureza intelectual e por isso é considerado uma sociedade simples. Contudo, um Hospital precisa de uma estrutura organizacional bem maior, com outros profissionais, equipamentos, etc, pelo que este é considerado uma sociedade empresária.

1) SOCIEDADE SIMPLES
Conforme falado, as sociedades simples se caracterizam pela pessoalidade e intelectualidade dos sócios ou atividades rurais e sem estrutura organizacional.
Deste modo, é possível compreender a permissão constante no artigo 997, V, do Código Civil, que abre possibilidade de sócios contribuírem com serviços apenas, uma vez que é uma atividade predominantemente intelectual ou desorganizada.
Vejamos:
Art. 997. A sociedade constitui-se mediante contrato escrito, particular ou público, que, além de cláusulas estipuladas pelas partes, mencionará:
III - capital da sociedade, expresso em moeda corrente, podendo compreender qualquer espécie de bens, suscetíveis de avaliação pecuniária;
V - as prestações a que se obriga o sócio, cuja contribuição consista em serviços;
Nesses casos, devem ser observadas as regras previstas nos artigos 1.006 e 1.007 do Código Civil.

Vejamos:
Art. 1.006. O sócio, cuja contribuição consista em serviços, não pode, salvo convenção em contrário, empregar-se em atividade estranha à sociedade, sob pena de ser privado de seus lucros e dela excluído.
Art. 1.007. Salvo estipulação em contrário, o sócio participa dos lucros e das perdas, na proporção das respectivas quotas, mas aquele, cuja contribuição consiste em serviços, somente participa dos lucros na proporção da média do valor das quotas.
Entretanto, vale ressaltar que, no âmbito empresarial (startups de tecnologia, por exemplo), não há que se falar em contribuição com prestação de serviços, pois dificilmente teremos uma sociedade simples (sociedades de publicitários, por exemplo).

2) SOCIEDADE ANÔNIMA
De acordo com o artigo 7º da Lei nº. 6.404/76, o Capital Social das Sociedades Anônimas somente poderá ser formado por contribuições em dinheiro ou bens suscetíveis de avaliação em dinheiro, ou seja, não há possibilidade legal de ingressar na sociedade contribuindo apenas com prestação de serviços.
Vejamos:
Art. 7º O capital social poderá ser formado com contribuições em dinheiro ou em qualquer espécie de bens suscetíveis de avaliação em dinheiro.

3) SOCIEDADE EMPRESÁRIA LIMITADA
Da mesma forma, a sociedade empresária limitada também está impedida de constituir seu Capital Social por meio de prestação de serviços de seus sócios, pois o § 2º do artigo 1.055 do Código Civil veda expressamente esta possibilidade, conforme abaixo:
Art. 1.055. O capital social divide-se em quotas, iguais ou desiguais, cabendo uma ou diversas a cada sócio.
§ 2o É vedada contribuição que consista em prestação de serviços.

4) EIRELI
A Empresa Individual de Responsabilidade Limitada, prevista no Artigo 980-A do Código Civil, não estabelece expressamente nenhuma vedação.
Contudo, à EIRELI se aplicam as regras previstas para as sociedades limitadas, pelo que a contribuição com prestação de serviços também está vedada na forma do artigo 1.055 citado acima.
Vejamos:
Art. 980-A. A empresa individual de responsabilidade limitada será constituída por uma única pessoa titular da totalidade do capital social, devidamente integralizado, que não será inferior a 100 (cem) vezes o maior salário-mínimo vigente no País.
§ 6º Aplicam-se à empresa individual de responsabilidade limitada, no que couber, as regras previstas para as sociedades limitadas.

5) SOCIEDADE EM CONTA DE PARTICIPAÇÃO
Como já abordado em outra publicação, a Sociedade em Conta de Participação (SCP) não é uma opção de sociedade personificada, mas possui Capital Social a ser integralizado, o qual constitui patrimônio especial, objeto da conta de participação relativa aos negócios sociais, na forma do artigo 994 do Código Civil.
De acordo com o Código Civil, às Sociedades em Conta de Participação se aplicam as normas da sociedade simples subsidiariamente.
Vejamos:
Art. 996. Aplica-se à sociedade em conta de participação, subsidiariamente e no que com ela for compatível, o disposto para a sociedade simples, e a sua liquidação rege-se pelas normas relativas à prestação de contas, na forma da lei processual.
Sendo assim, da mesma forma que ocorre nas sociedades simples, pode ocorrer a contribuição de sócio com prestação de serviços, seguindo as mesmas regras das sociedades simples.
Contudo, não há como pensar nesta hipótese no âmbito empresarial, pois se a natureza da SCP for empresária, entendemos que a regra da sociedade simples não será compatível para permitir a contribuição com prestação de serviços pela própria natureza da sociedade.

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Referências

Artigo escrito por: Dr. Fabio Cendão (Sócio do escritório Faria, Cendão & Maia Advogados)

Apoio: Blog Parceiro Legal ( www.parceirolegal.com )

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Faria Cendão e Maia Advogados

Advogado - Rio de Janeiro, RJ


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