Terceirização: os benefícios e malefícios para empregado e empregador


28/08/2015 às 10h38
Por Faria Cendão e Maia Advogados

  1. I) Introdução:

A Constituição Federal de 1988 é um marco para o Brasil e principalmente um marco para os direitos fundamentais tendo sido de suma importância a positivação de rol extenso quanto aos direitos trabalhistas.

Em regra, nas relações de emprego tem-se um empregador, que necessita que certos serviços sejam prestados, e o empregado, que realiza serviços em troca de remuneração.

Contudo, é possível verificar que o mundo empresarial vem criando novas formas de obter mão de obra de forma indireta, isto é, através da contratação de empresas que fornecem essa mão de obra.

Essas formas de contratação indireta, é necessário dizer, são excepcionais e por isso trazem regramento rígido, sob pena de serem consideradas ilegais, como será exposto adiante.

  1. II) Evolução histórica:

A CLT, em seu nascimento, apenas vislumbrou a existência de dois sujeitos na relação de trabalho, mas já em 1974 com a Lei 6.019 surgiu a primeira forma de terceirização no ordenamento jurídico brasileiro: o regime de trabalho temporário.

Anos depois, com a Lei nº 7.102/83, surge nova modalidade de terceirização, a terceirização de serviços de vigilância por estabelecimentos financeiros através de empresa prestadora especializada.

Em 1986, pelo mundo a fora a terceirização era o meio utilizado pelo mundo empresarial para a redução de custos e isto estimulou o Tribunal Superior do Trabalho a editar a Súmula 256, contudo esta não foi bem recebida nem pela doutrina nem pelo empresariado.

Já nos idos de 1993 foi editada nova súmula sobre o tema, a Súmula 331, que deu margem a terceirização da atividade meio, já sofreu duas modificações desde sua edição até o presente momento, e atualmente encontra-se com a redação que merece ser transcrita:

CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE (nova redação do item IV e inseridos os itens V e VI à redação) – Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011

I – A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).

II – A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988).

III – Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.

IV – O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.

V – Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.

VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral.

Esta súmula tem sido o “regulamento” da terceirização lícita bem como esclarece as situações em que se verifica a intermediação ilícita na relação trabalhista.

  1. II) Conceito de terceirização:

É relação trilateral formada entre o trabalhador, intermediador de mão de obra e o tomador do serviço, caracterizada pela não coincidência entre o empregador real e aparente. A terceirização é lícita enquanto a intermediação de mão de obra é ilícita. (conceito dado pela professora Vólia Bonfim)

III) Diferenças entre terceirização e intermediação de mão de obra:

Nas palavras de Sergio Pinto Martins:

“A terceirização legal ou licita é a que observa os preceitos legais relativos aos direitos dos trabalhadores, não pretendendo fraudá-los, distanciando-se da existência da relação de emprego. Já a terceirização ilegal ou ilícita é a que se refere a locação permanente de mão de obra, que pode dar ensejo a fraudes e a prejuízos aos trabalhadores.”

Para o autor, não há norma que impeça a contratação de serviços por terceiros, mas apenas limites legais e constitucionais da terceirização. Explica que a terceirização se difere da mera intermediação da mão de obra justamente por respeitar os limites impostos pelo ordenamento jurídico, de forma a harmonizar o princípio da dignidade humana (Art.3º, inciso III da CF/88) com o princípio da livre iniciativa (Art.170, CF).

A intermediação de mão de obra caracteriza-se como a terceirização ilícita, não respeitadora das regras legais buscando apenas o menor preço pelo serviço.

O doutrinador Rodrigo Carelli estabelece alguns indícios da ocorrência de mera intermediação de mão de obra, citando-o: a organização do trabalho pelo contratante; a falta de especialidade da contratada; a fiscalização da execução do contrato de trabalho pelo contratante; a emissão de ordens e orientações procedimentais pelo contratante, remuneração do contrato com base no número de trabalhadores; prestação de serviços a apenas uma única empresa tomadora; e a realização de um mesmo serviço por empresas distintas que permanecem com os mesmos trabalhadores.

O que todos esses indícios têm em comum é a presença de elementos típicos de uma relação de emprego que não deveriam estar presentes em uma terceirização, qual seja, a pessoalidade e a subordinação.

O autor realiza forte crítica à intermediação de mão de obra entendendo que o trabalhador que se vê nessa relação, na maioria das vezes, é prejudicado no recebimento de seus direitos trabalhistas.

Esses serviços terceirizados, como se verá a seguir, tem a característica de não se ligar a atividade fim da empresa. Como consequência, por serem atividades acessórias, a tomadora apenas se importa com o serviço não tendo relação com “quem” esta realizando-o (elemento pessoalidade).

Ainda, o tomador, por não ter conhecimento técnico nem ser o empregador do trabalhador, não realiza fiscalização sobre a atuação de cada empregado da contratada bem como não controla o modo, tempo e forma que o serviço deve ser desempenhado (elemento subordinação). O tomador apenas pode realizar um controle finalístico, isto é, verificar se o serviço que contratou esta sendo cumprido a contento.

A seguir expõem-se as hipóteses aceitas pelo ordenamento de terceirização lícita.

  1. IV) Hipóteses de terceirização lícita:

Mauricio Godinho Delgado entende que a Súmula 331 do TST dividiu em 4 grupos de situações sociojurídicas bem delimitadas onde é aceita a terceirização, que são: Situações empresariais que autorizem contratação de trabalho temporário (inciso I); atividades de vigilância (III, ab initio); atividades de conservação e limpeza (inciso III); e serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador.

  1. O trabalho temporário é rígido e estabelece duração dos contratos por curtos períodos (só 3 meses) com o mesmo empregado, exigência de contrato escrito e por tempo determinado e só é admitido em duas hipóteses: prestação de serviço destinado a atender a necessidade transitória de substituição de pessoal regular e permanente ou a acréscimo extraordinário de tarefas de outras empresas.

Seu diferencial é a possibilidade de exercício de atividade meio ou atividade fim.

  1. A Lei 7.102/83 que traz o regramento das empresas de vigilância impõe algumas exigências como a formação dos vigilantes e curso profissional e autorização pelo Ministério da Justiça para o exercício desse tipo de atividade, pois os trabalhadores portam armas de fogo. Além disso exige-se ainda a idade mínima de 21 anos dos trabalhadores contratados.
  2. Nas Atividades de conservação e limpeza são aquelas necessárias a manutenção do bom ambiente de trabalho mas que não se relacionam diretamente a atividade da empresa.
  3. Nos Serviços de Atividade Meio as atividades não se ajustam ao núcleo das atividades empresarias do tomador de serviços, isto é, “são atividades periféricas à essência da dinâmica empresarial do tomador de serviços” (DELGADO,2013). Ex. serviço de transporte.

V) Benefícios para o empregador:

Na introdução do presente texto foi informada a razão para adoção desse tipo de relação trilateral: ela reduz os gastos do empregador. E por que faz isso?

No Brasil há um rol extenso de direitos para os empregados, uma vitória para os primados da dignidade humana. Contudo, em que pese os benefícios trazidos por esses direitos aos trabalhadores, deve-se reconhecer o ônus que impõe ao empregador arcar com todos eles.

É justo que o empresário custeie todos esses direitos para os funcionários que atuam em prol da atividade fim da empresa, pois estes detém todos os elementos contidos em uma relação de emprego, sendo esses empregados essenciais a existência da empresa.

Mas e aqueles que não são essenciais a essa atividade? E aqueles que somente atuaram na empresa por curto espaço de tempo em razão de situação excepcional passada pela empresa? Esses trabalhadores não são essenciais à existência da empresa ou a prestação da sua atividade fim. Estes apenas prestam serviços acessórios a empresa não a integrando de verdade.

Pois bem, o empresário se vê de mãos atadas se não houver a terceirização pois a contratação desses empregados onera demais os custos da empresa sem que sejam essenciais a sua finalidade. Resta a ele poucas opções: contrata e onera excessivamente a empresa ou não contrata, obtendo serviço informal não respeitando a lei.

A regulamentação da terceirização veio para “tirar do sufoco” as empresas em relação a essas atividades de natureza específica e ao mesmo tempo se propõe a diminuir o trabalho informal.

A empresa especializada assume os ônus trabalhistas dos empregados que prestam o serviço vendido pela empresa e a empresa tomadora supre suas necessidades sem gerar todo o ônus da contratação direta, podendo investir seu capital na atividade que se propõe.

Não é possível fechar esse tópico sem falar que, apesar da proposta da Terceirização ser louvável, o instituto infelizmente tem sido utilizado para fraudar direitos trabalhistas dos empregados terceirizados com empresas interpostas fraudulentas. Esse tipo de prática macula a visão do instituto no meio social e desvia-se da proposta inicial prejudicando empresas e trabalhadores.

  1. VI) Benefícios para o empregado:

É muito raro ver a doutrina reconhecendo os benefícios da Terceirização para o empregado, pois a economia para empresa sempre é exaltada, entretanto é possível vislumbrar aspectos positivos para os trabalhadores.

Primeiramente, é possível vislumbrar um novo mercado tomador de mão de obra que não existia até pouco tempo atrás. Diversas profissões que antes se desenvolviam na ilegalidade, que aqui significa o exercício do labor sem pagamento dos direitos trabalhistas, agora são consideradas especialidades e garantem um contrato de trabalho e todos os direitos dele decorrentes.

Empresas pequenas, que antes não pensariam em ter certos serviços acessórios, contratam as Empresas especializadas, gerando mais empregos nestas pelo aumento na demanda.

Em verdade o fim buscado pelos indivíduos em um trabalho costuma ser a estabilidade que somente se encontra nos contratos de trabalho por tempo indeterminado. A contratação de empregados por essas empresas interpostas garante exatamente isso para essas profissões específicas: estabilidade e os direitos decorrentes pela frustração dessa expectativa.

Por fim, o direito do trabalho fornece os mecanismos para esses empregados se protegerem de eventuais ilegalidades perpetradas nessa relação trilateral, assegurando ainda mais concretização dos direitos trabalhistas propostos na Constituição Federal.

  1. VI) Conclusão:

As relações de trabalho vêm acompanhando as dinamizações ocorridas no mundo empresarial e financeiro, modificando-se e flexibilizando-se segundo as necessidades do mercado. Como bem observa Sergio Pinto Martins, a flexibilização pretendida pela terceirização nada mais é do que “(…) o retorno a sistemas de locação de serviços e de empreitada do Direito Civil, embora sob outros rótulos, diante da necessidade de competitividade interna e externa (…)”

Entretanto o direito do trabalho também deve se atualizar, criando adaptações e impondo restrições a essas mudanças de modo a proteger os indivíduos sujeitos a essas relações.

A terceirização de serviços é uma dessas formas de adaptação das exigências de mercado que vem a ser positiva tanto para empresas quanto para os trabalhadores como se pretendeu demonstrar anteriormente.

Contudo, nota-se que algumas empresas utilizam o instituto de forma desviada. Essas fraudes são extremamente prejudiciais aos trabalhadores e por isso devem ser fortemente reprimidas e, quando não for possível, devidamente punidas conservando a essência da Terceirização, que é trazer benefícios tanto para empresas quanto para os trabalhadores.

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Referências

Por Nydia Milhomem, colaboradora do FCM Advogados. Bacharel em Direito pela UFRJ. Advogada. Pós Graduanda em Direito Público pela UCM.Bibliografia:

CARELLI, Rodrigo de Lacerda. Terceirização e intermediação de mão de obra: ruptura do sistema trabalhista, precarização do trabalho e exclusão social. Rio de Janeiro: Renovar, 2003.

CASSAR, Vólia Bomfim, Direito do Trabalho. Niteroi: Impetus, 3ª edição, 2009.

DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2013.

MARTINS, Sergio Pinto. A terceirização e o direito do trabalho. São Paulo: Atlas, 2009.


Faria Cendão e Maia Advogados

Advogado - Rio de Janeiro, RJ


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