O STF decidiu que a multa tributária qualificada deve ser limitada a 100% do tributo devido, exceto em caso de reincidência, quando pode chegar a 150%. A medida protege contribuintes contra o efeito de confisco e garante aplicação proporcional das sanções fiscais.
A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) no Recurso Extraordinário nº 736.090 (Tema 863), trouxe novos parâmetros jurídicos para a aplicação da multa tributária qualificada em casos de sonegação, fraude ou conluio. O tribunal, por unanimidade, entendeu que a aplicação de multa no percentual de 150% sobre o valor do tributo devido, sem reincidência, fere o princípio constitucional que veda o efeito de confisco.
Com a nova diretriz, essa penalidade passa a ter um teto mais justo e proporcional, alinhando-se aos princípios da razoabilidade e da segurança jurídica. Essa decisão é relevante para empresas, contadores, advogados tributaristas e contribuintes em geral que estejam sob fiscalização ou discussão tributária.
Neste artigo, produzido pela equipe de advogados especialistas do escritório Galvão & Silva Advocacia, explicaremos os principais pontos do julgamento e como ele pode impactar a sua vida financeira e empresarial.
O que é a multa tributária qualificada?
A multa tributária qualificada é uma penalidade aplicada quando a autoridade fiscal identifica condutas intencionais do contribuinte para fraudar o pagamento de tributos. Entre essas condutas estão a sonegação, a apresentação de informações falsas ou incompletas, e o conluio com terceiros para enganar o Fisco. A legislação previa que, nesses casos, a multa poderia ser de até 150% do valor do tributo devido.
Essa sanção tem caráter punitivo e pedagógico. Busca desestimular condutas fraudulentas e garantir o cumprimento das obrigações tributárias. No entanto, há um limite que não pode ser ultrapassado: a multa não pode ser tão alta a ponto de comprometer o patrimônio do contribuinte, sob pena de configurar confisco, o que é vedado pela Constituição.
A discussão chegou ao STF justamente para decidir se essa multa, quando aplicada sem reincidência, viola ou não o princípio da proporcionalidade. O Supremo entendeu que sim, e por isso definiu novos parâmetros a serem seguidos pela Administração Tributária em todo o país.
O que diz a Constituição sobre o efeito de confisco?
O artigo 150, inciso IV, da Constituição Federal proíbe a utilização de tributos com efeito de confisco. O confisco ocorre quando a carga tributária é tão elevada que, em vez de cumprir uma função arrecadatória ou regulatória, passa a retirar de forma excessiva os bens do contribuinte. Vejamos:
Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
IV - utilizar tributo com efeito de confisco;
O STF entendeu que o princípio também se aplica às multas tributárias. Embora não sejam tecnicamente tributos, elas são acessórias da obrigação tributária e têm forte impacto patrimonial. Assim, devem obedecer aos mesmos limites constitucionais.
Com isso, a Corte reafirmou a necessidade de observar a proporcionalidade na fixação de penalidades fiscais. O objetivo é evitar abusos e garantir um sistema tributário mais equilibrado, que arrecade sem destruir a capacidade econômica do contribuinte.
Qual foi a decisão do STF no caso RE 736.090?
No julgamento do RE 736.090, o STF decidiu, por unanimidade, que a multa tributária qualificada deve ser limitada a 100% do tributo devido quando não houver reincidência. A aplicação de 150% somente é permitida se ficar comprovado que o contribuinte repetiu a conduta infratora.
A tese fixada com repercussão geral diz: “Até que seja editada lei complementar federal sobre a matéria, a multa tributária qualificada em razão de sonegação, fraude ou conluio limita-se a 100% do débito tributário, podendo ser de até 150% do débito tributário caso se verifique a reincidência”.
Essa definição tem efeitos vinculantes para todos os tribunais e administrações públicas. A decisão uniformiza o entendimento e impede interpretações abusivas ou divergentes entre entes da federação, garantindo maior segurança jurídica.
Quais são os impactos práticos para contribuintes e empresas?
Para as empresas e demais contribuintes, a decisão representa uma proteção contra penalidades fiscais excessivas. A limitação da multa tributária qualificada à razoabilidade permite a revisão de autuações anteriores que aplicaram valores superiores sem fundamento legal.
Essa nova jurisprudência também afeta processos administrativos e judiciais em andamento. Caso a multa ultrapasse 100% sem haver reincidência, há fortes argumentos para pedir sua redução com base no entendimento do STF.
Além disso, a decisão previne novos abusos, uma vez que a administração fiscal precisará fundamentar a aplicação de qualquer sanção no novo teto estabelecido, sob pena de nulidade.
Atuação do Congresso Nacional e o futuro das sanções fiscais
O STF reconheceu que cabe ao Congresso Nacional editar uma lei complementar para disciplinar de forma clara os limites das multas tributárias no país. Essa norma deverá garantir segurança jurídica, isonomia e respeito à capacidade contributiva.
Enquanto essa legislação não é aprovada, os órgãos de fiscalização devem adotar os parâmetros da Lei 9.430/96, que trata da legislação tributária, alterada pela Lei 14.689/23, que prevê a multa tributária qualificada de 100%, podendo chegar a 150% apenas em caso de reincidência.
O papel do Congresso é essencial para evitar disputas judiciais e promover um sistema sancionador claro e coerente, que respeite tanto o interesse arrecadatório quanto os direitos fundamentais dos contribuintes.
Conclusão
A decisão do Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE 736.090 impõe novos limites à aplicação da multa tributária qualificada, garantindo que essa penalidade respeite os princípios constitucionais da razoabilidade e da proporcionalidade. O tribunal fixou o limite de 100% do valor do tributo para a primeira infração, admitindo 150% apenas se comprovada a reincidência.
Essa orientação traz mais segurança jurídica para contribuintes e empresas, ao passo que protege o patrimônio dos cidadãos contra medidas confiscatórias. Além disso, fortalece o papel do STF como guardião dos direitos fundamentais e do equilíbrio no sistema tributário.
Portanto, é fundamental que contribuintes estejam atentos a essas mudanças e busquem orientação jurídica especializada para revisar penalidades aplicadas, defender seus direitos e evitar prejuízos decorrentes de sanções irregulares.