Subordinação Jurídica e as Medidas Disciplinares


21/11/2018 às 15h12
Por João Francisco Schuvaizerski

1 INTRODUÇÃO

A relação entre patrão e subordinado é fundamentada na legislação trabalhista, assim, para nascer formalmente e materialmente pede por alguns requisitos legais. Destarte, abordaremos neste artigo, a subordinação jurídica e as medidas disciplinares, onde estas são ações do empregador para tentar recuperar a relação quando eventualmente prejudicada, e aquela é caracterizada pelo dever de obediência profissional do trabalhador ao empregador.

2 SUBORDINAÇÃO JURÍDICA

Primeiramente, indispensável elucidar que a subordinação jurídica entre empregado e empregador se estabelece por meio de uma relação de emprego, onde institui o vínculo de obediência do prestador de serviços, (pessoa física) ao empregador (pessoa jurídica), detentor do poder diretivo.[1]

Ainda, podemos citar o conceito de Vólia Bomfim Cassar sobre a subordinação:

"A subordinação nada mais é que o dever de obediência ou o estado de dependência na conduta profissional, a sujeição ás regras, orientações e normas estabelecidas pelo empregador inerentes ao contrato, à função, desde que legais e não abusivas".[2]

Partindo deste pressuposto, a relação jurídica passa a existir legalmente a partir do momento em que é acordado e consentido por ambas as partes a prestação de serviço, onde o trabalhador, como dito, sempre pessoa física, labora de maneira contínua mediante recompensa salarial, conforme decretado pelo artigo 3º da CLT - Consolidação das Leis do Trabalho:

"Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário".

De outro lado, para enriquecer, o caput do artigo 2º, define empregador da seguinte forma:

"Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviços".

Ademais, a relação de emprego, o vínculo empregatício, se consolida com a indispensável existência de 5 (cinco) elementos fáticos-jurídicos. São eles:

"Trabalho por Pessoa Física: A prestação de serviços que o Direito do Trabalho toma em consideração é aquela pactuada por uma pessoa física (ou natural).

Pessoalidade: (...) deve ser, desse modo, intuitu personae com respeito ao prestador de serviços, que não poderá, assim fazer-se substituir intermitentemente por outro trabalhador ao longo da concretização dos serviços pactuados.

Não eventualidade: (...) é necessário que o trabalho prestado tenha caráter de permanência (ainda que por curto período determinado), não se qualificando como trabalho esporádico.

Onerosidade: (...) manifesta-se pelo pagamento, pelo empregador, de parcelas dirigidas a remunerar o empregado em função do contrato empregatício pactuado.

Subordinação jurídica: (...) consiste, assim, na situação jurídica derivada do contrato de trabalho, pela qual o empregado compromete-se a acolher o poder de direção empresarial no modo de realização de sua prestação de serviços" .[3] (Sem grifos no original)

Isto posto, podemos concluir que ocorrendo qualquer um dos elementos supracitados, uma vez comprovados, estará caracterizado o vínculo empregatício, e consequentemente gera todos os Direitos advindos de uma relação de emprego.

3 MEDIDAS DISCIPLINARES

Em uma relação empregatícia, temos o papel do empregador e do empregado. Entretanto, quando essa relação é desrespeitada por indisciplina, o empregador pode utilizar-se do direito de corrigir isso através de medidas disciplinares. Sua hierarquia na relação permite essa punição (ARTS. 3º e 482, CLT).

"O direito disciplinar está intimamente ligado à idéia de poder disciplinar, de autoridade disciplinar e, portanto, de hierarquia". [4]

As sanções poderão ser impostas pelo empregador ao empregado sem a interferência do judiciário, obviamente desde que não sejam adotadas ações ilegais dentro da relação de emprego[5].

3.1 Espécies de Penalidade

As espécies de penalidade são:

Advertência ou admoestação (verbal ou escrita);

Suspensão disciplinar;

Ruptura contratual por justa causa (falta grave do empregado ou do empregador).[6]

Ainda, conforme Alice Monteiro Barros [7] algumas penalidades não podem ser aplicadas no Brasil. A exemplo de transferências sem consenso, rebaixamentos, nome em "lista negra”, multas, redução salarial, supressão de benefícios ou qualquer sanção que mascare a real punição.

3.2 Princípios a serem observados na aplicação da penalidade

O poder disciplinar da empresa ou do gestor não permite qualquer tipo de punição, alguns princípios Constitucionais e do Direito do Trabalho sempre deverão ser observados antes de uma aplicação de sanção, entre elas:

"Princípio do respeito à dignidade da pessoa humana: É hoje encontrado até mesmo na Constituição Federal de 1988 (art. 1º, III), como um dos objetivos da República Federativa do Brasil. Há de se respeitar a personalidade humana, como um direito fundamental.

Princípio da primazia da realidade: No Direito do Trabalho os fatos são muito mais importantes do que os documentos registram. São privilegiados, portanto, os acontecimentos, a realidade, sobre a forma ou a estrutura empregada.

Princípio da razoabilidade: (...) esclarece que o ser humano deve proceder conforme a razão, de acordo como procederia qualquer homem médio ou comum. Estabelece-se, assim, um padrão comum que o homem médio teria em qualquer situação.

Princípio da inviolabilidade à intimidade: (...) ter respeito à vida privada, à honra e à imagem das pessoas / trabalhadores (...)". [8] (Sem grifos no original)

Portanto, o empregador deve atentar e observar criteriosamente a aplicação de uma sanção, pois do outro lado existe um trabalhador sujeito de Direitos amparado pela Constituição Federal.

3.3 Elementos a serem observados na aplicação da penalidade

Sempre necessário a certeza de poder aplicar determinada punição, de modo a verificar que todos os elementos evidenciam o ato faltoso, impedindo assim erros e injustiças contra ou favor de outrem.

Para, Maurício Godinho Delgado, os elementos a serem observados se dividem em objetivos, subjetivos e circunstanciais, são eles:

"A) Requisitos Objetivos:

É requisito objetivo para o exercício do poder disciplinar no contrato a tipicidade da conduta obreira, inclusive com respeito à natureza da matéria envolvida. Também integra o presente grupo de requisitos a gravidade da conduta do trabalhador, que determinará a dosagem da pena.

(...) o que pode ser tido como infração laboral será exclusivamente um comportamento do trabalhador que prejudique o cumprimento de suas obrigações contratuais trabalhistas.

B) Requisitos Subjetivos:

São requisitos subjetivos para a aplicação do poder disciplinar a autoria obreira da infração e seu dolo ou culpa com respeito ao fato ou omissão imputados.

O requisito da autoria é autoevidente. Apenas se ficar configurada a efetiva participação do trabalhador no ato ou omissão tipificados é que se pode aventar a possibilidade de exercício do poder punitivo a seu respeito.

O requisito do dolo ou culpa é também de grande relevância. Não será válido o exercício de prerrogativas punitivas se a conduta obreira não tiver sido intencional ou, pelo menos, decorrente de imprudência, negligência ou imperícia.

C) Requisitos Circunstanciais:

Circunstanciais, (...), são os requisitos que dizem respeito à atuação disciplinar do empregador em face da falta cometida e do obreiro envolvido.

São inúmeros tais requisitos, a saber: nexo causal entre a falta e a penalidade; adequação entre a falta e a pena aplicada; proporcionalidade entre elas; imediaticidade da punição; ausência de perdão tácito; singularidade da punição (non bis in idem); inalteração da punição; ausência de discriminação; caráter pedagógico do exercício do poder disciplinar, com a correspondente gradação de penalidades.

No que concerne ao nexo causal entre a falta e a penalidade, quer a ordem justrabalhista que a punição seja efetivamente atada à conduta tida como faltosa.

No que diz respeito à adequação entre a falta e a penalidade, quer a ordem justrabalhista que haja correspondência substantiva entre a conduta infratora e a punição aplicada.

No que tange à imediaticidade da punição, exige a ordem jurídica que a aplicação de penas trabalhistas se faça tão logo se tenha conhecimento da falta cometida.

O critério da ausência de perdão tácito (...) é o silêncio empresarial prolongado, após conhecida uma falta obreira, gera a presunção de que a falta foi implicitamente perdoada pela contraparte contratual.

O critério da singularidade da punição (ausência de duplicidade punitiva).

A penalização não pode ser efetuada com intuito – ou com efeitos – discriminatórios.

O caráter pedagógico do exercício do poder disciplinar (...) Considera-se fundamental que o poder punitivo seja exercido com a finalidade de ajustar o obreiro à sadia convivência laborativa, em um contexto de regras lícitas adotadas pela empresa".[9]

Assim sendo, anterior a uma aplicação de correção, necessária a convicção de que o objetivo será alcançado com tal providência, sempre com a devida observância da legislação e na medida adequada. Pois do contrário, o imbróglio poderá não ser sanado e ainda resultará na extensão de outros contratempos.

3.4 Advertência Verbal

A advertência verbal é de cunho da normatividade autônoma e dos costumes trabalhistas (fontes do Direito art. 8º da CLT), além também de ser encontrado em Acordos e Convenções Coletivas de Trabalho[10].

Embora não tipificada em lei, não é ilegal, ao contrário, é pacifico pelos doutrinadores e a jurisprudência em considerar como razoável, ao passo que é a primeira instância do exercício do poder disciplinar do empregador diante de conduta faltosa do empregado. Ademais, sempre necessário em uma advertência verbal, correlacionar durante a comunicação o ato faltoso com o artigo 482 da CLT.

"Art. 482 - Constituem justa causa para rescisão do contrato de trabalho pelo empregador:

a) ato de improbidade;

b) incontinência de conduta ou mau procedimento;

c) negociação habitual por conta própria ou alheia sem permissão do empregador, e quando constituir ato de concorrência à empresa para a qual trabalha o empregado, ou for prejudicial ao serviço;

d) condenação criminal do empregado, passada em julgado, caso não tenha havido suspensão da execução da pena;

e) desídia no desempenho das respectivas funções;

f) embriaguez habitual ou em serviço;

g) violação de segredo da empresa;

h) ato de indisciplina ou de insubordinação;

i) abandono de emprego;

j) ato lesivo da honra ou da boa fama praticado no serviço contra qualquer pessoa, ou ofensas físicas, nas mesmas condições, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;

k) ato lesivo da honra ou da boa fama ou ofensas físicas praticadas contra o empregador e superiores hierárquicos, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;

l) prática constante de jogos de azar.

Parágrafo único - Constitui igualmente justa causa para dispensa de empregado a prática, devidamente comprovada em inquérito administrativo, de atos atentatórios à segurança nacional". (Incluído pelo Decreto-lei nº 3, de 27.1.1966)

Assim, a advertência verbal poderá ser entendida como uma maneira mitigada de punição, além de ser um alerta ao trabalhador sobre sua atitude negativa, e uma vez não se adequando, sanções maiores serão decretadas.

3.5 Advertência Escrita (Formal)

A advertência escrita é considerada menos leve que a verbal, pelo fato de ser formalizada, e consequentemente poderá ter um peso maior no histórico jurídico da relação empregatícia. Da mesma maneira que a verbal, a advertência escrita não é amparada por texto de lei, mas é considerada lícita pelos especialistas e estudiosos. Ainda, a advertência formal deverá ser elaborada correlacionando-a com um dos itens do artigo 482 da CLT.[11]

Então, se conclui que a advertência formal obrigatoriamente será composta pelo ato faltoso fundamentado na lei, e com os devidos procedimentos e orientações que a situação pede.

3.6 Suspensão disciplinar

Este tipo de punição disciplinar é classificada como a segunda na proporção de gravidade. A suspensão poderá ser de 1 (um) a 30 (trinta) dias, se superior a 30 (trinta) dias, configura rescisão injusta do contrato de trabalho, conforme preconiza o art. 474 da CLT.[12]

" Art. 474 - A suspensão do empregado por mais de 30 (trinta) dias consecutivos importa na rescisão injusta do contrato de trabalho ".

Não são recomendáveis períodos muitos longos ou suspensões continuadas, pois dependendo da gravidade do ato faltoso, a melhor ação será a demissão (a verificar se por justa causa ou não). A carta de suspensão necessita dos mesmos critérios citados anteriormente para aplicação da advertência verbal ou escrita.

A vista disso, a suspensão pode ser considerada como uma das sanções mais vigorosas, obviamente antes de uma resilição (demissão sem justa causa), pois impreterivelmente deve ser aplicada apenas para atitudes graves, embasada na CLT ou outra legislação pertinente.

3.7 Ruptura contratual por justa causa

A mais gravíssima punição recebida por um trabalhador certamente é a demissão por justa causa. Necessariamente se dá na mesma proporção do ato faltoso, resultando na extinção do contrato de trabalho, fundamentado indispensavelmente na legislação trabalhista. Nesse aspecto, o pacto e a continuidade do trabalho são rompidos entre empresa e empregado, e para o trabalhador ainda é negado o pagamento de parte das verbas rescisórias, o que seria devido em qualquer outra modalidade de dispensa, de forma integral. Para reflexão, ficará na vida profissional deste trabalhador uma “mancha” em função desta dispensa constrangedora, embora obviamente não esteja autorizado esse registro (resolução contratual por justa causa) na Carteira de Trabalho.[13]

A relação hierárquica é extremamente importante do início ao fim do contrato empregatício, considerando que as pessoas têm seus valores e princípios, a maneira, por exemplo, de demitir alguém, com rudez e hostilidade, além de já ser um momento delicado, poderá ser determinante se o trabalhador provocará ou não a jurisdição. Além do mais, arrisco a dizer que, a motivação de demandar a Justiça, surge de algum sentimento ruim provocado pela empresa naquele trabalhador, que poderá ser agravada em uma forma inadequada de demissão.[14]

"(...) o processo de demissão interfere demais na intenção de o empregado propor ou não ação trabalhista. Muitos empregados ao serem demitidos se sentem rebaixados, humilhados, discriminados e outras vezes são comunicados por alguém com quem sequer mantinham algum contato. Outros são praticamente “escorraçados” no processo de demissão. Esses são os maiores de todos os incentivos para desencadear uma ação trabalhista".[15] (Sem grifos no original)

Por isto, para um procedimento de dispensa, além da observância a legislação, sempre serão bem-vindas ações de cordialidade e respeito, evitando, por exemplo, que um dano moral seja pleiteado na Justiça e em decorrência deste outros pedidos acessórios e principais.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo demonstrou que os fatores envolvidos na relação entre empregador e empregados, além de sensível, são também complexos, pois engloba necessariamente os aspectos legais e ainda questões subjetivas demasiadamente importantes.

Conclui-se, que a subordinação jurídica se caracteriza pela obediência a ordens do trabalhador ao empregador. Ainda, na aplicação das medidas disciplinares exige-se antes, a observância de Princípios e Elementos que evidenciam o ato faltoso e que, sem Estes, a sanção poderá apresentar vícios.

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Referências

5 REFERÊNCIAS

[1] BARROS, Alice Monteiro. Curso de Direito do Trabalho. 9. Ed. São Paulo: Ltr, 2013. 1104p, p.185.

[7] Ibidem, p.480.

[2] CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. 8º. Ed. São Paulo: Método, 2013, p.246.

[4] CAVALCANTI, Themístocles Brandão. Direito e Processo Disciplinar. 2. Ed. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1966. 217p, p.25.

[3] DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 11. Ed. São Paulo: Ltr, 2012, p.284.

[5] Ibidem, p.691.

[6] Ibidem.

[10] Ibidem.

[11] Ibidem.

[12] Ibidem, p.692.

[13] Ibidem.

[9] Ibidem, p.695.

[8] MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. 27. Ed. São Paulo: Atlas, 2011, p.66.

[14] YAZIGI, Cintia. Empregadores x Empregados na Justiça do Trabalho. Disponível em: http://www.deducao.com.br/noticia/1172-empregadoresxempregados-na-justiça-do-trabalho Acesso em: 27 fev. 2016

[15] Ibidem.

 

Joao Francisco Schuvaizerski

Bacharel em Administração de Empresas pela Faculdade Padre João Bagozzi e Advogado formado pela PUC-PR - Pontifícia Universidade Católica do Paraná.


João Francisco Schuvaizerski

Advogado - Curitiba, PR


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