A Justiça Federal da 5ª Vara de São Gonçalo/RJ proferiu decisão determinando a reintegração de militar da Marinha do Brasil, que havia sido indevidamente licenciado ex officio. O caso levanta questões importantes sobre a contagem de tempo de serviço militar entre diferentes forças armadas e os limites da discricionariedade administrativa no licenciamento de praças temporários.
O case.
O militar autor da ação prestou serviços ao Exército Brasileiro por 10 meses e 10 dias no período de março de 2013 a janeiro de 2014, posteriormente ingressando na Marinha do Brasil em janeiro de 2015, onde permaneceu até maio de 2024, acumulando 9 anos e 4 meses de serviço nesta força.
A Administração Naval, computando apenas o tempo de serviço na Marinha, determinou o licenciamento do praça por meio da Portaria nº 958/DPMM, de 07/05/2024, sob o fundamento de que não havia completado os 10 anos de efetivo serviço exigidos pelo art. 50, IV, "a", da Lei nº 6.880/80 (Estatuto dos Militares) para aquisição da estabilidade.
A tese defendida: o Cômputo do Tempo de Serviço Militar – Exército e Marinha.
O magistrado fundamentou sua decisão na interpretação sistemática do art. 136 da Lei nº 6.880/80, que define tempo de efetivo serviço como "o espaço de tempo computado dia a dia entre a data de ingresso e a data-limite estabelecida para a contagem ou a data do desligamento em consequência da exclusão do serviço ativo, mesmo que tal espaço de tempo seja parcelado".
A decisão reconheceu que a soma dos períodos de serviço no Exército (10 meses e 10 dias) e na Marinha (9 anos e 4 meses) ultrapassava o decênio legal exigido para aquisição de estabilidade, totalizando mais de dez anos de efetivo serviço militar.
Princípio Jurídico aplicado ao caso: A Instrumentalidade das Formas no Direito Administrativo Militar.
O julgado afastou a tese defensiva da União de que seria necessária averbação formal do tempo de serviço anterior, aplicando os princípios da verdade material e da instrumentalidade das formas. Conforme fundamentado na sentença, "a averbação do tempo de serviço anterior é ato meramente declaratório, e não constitutivo do direito".
A decisão enfatizou que o que confere estabilidade ao militar é o efetivo exercício das funções por mais de dez anos, e não a formalização prévia do cômputo em seus assentamentos funcionais, não podendo a Administração eximir-se da observância de um direito adquirido sob o fundamento de omissão burocrática.
A prática da Marinha do Brasil rechaçada pelo Poder Judiciário: Ilegalidade do Licenciamento Ex Officio.
O magistrado concluiu pela ilegalidade do ato administrativo que determinou o licenciamento, uma vez que o militar já havia adquirido estabilidade pelo decurso do tempo de serviço, ainda que distribuído entre diferentes forças armadas. A ausência de vedação legal ou constitucional à soma dos períodos corroborou o entendimento jurisdicional.
Considerações Finais.
A decisão é reflexo da jurisprudência sobre a interpretação do tempo de efetivo serviço militar para fins de estabilidade, especialmente nos casos em que o militar presta serviços em diferentes forças armadas. O julgado reafirma a prevalência da verdade material sobre aspectos meramente formais no direito administrativo militar.
O caso demonstra a necessidade de maior cuidado da Administração Militar na análise dos assentamentos funcionais de seus integrantes, evitando licenciamentos precipitados que possam violar direitos adquiridos. A decisão também evidencia a importância da documentação adequada do tempo de serviço anterior, ainda que sua ausência não impeça o reconhecimento judicial do direito quando devidamente comprovado.
A sentença encontra respaldo na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que reconhece a possibilidade de cômputo de tempo de serviço anterior em outra força armada, desde que haja prova inequívoca do exercício efetivo da função. Tal entendimento harmoniza-se com os princípios constitucionais da segurança jurídica e da proteção ao direito adquirido, fundamentais no Estado Democrático de Direito.
Informações disponíveis no TRF2.
O provimento judicial é fruto do zeloso trabalho exercido pelas ilustríssimas advogadas Larissa Otelagio e Sigrid Bueno, que atuam em todo o Brasil.
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