TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA: DO RECONHECIMENTO À PROTEÇÃO JURÍDICA DAS PESSOAS PORTADORAS DE TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA


06/10/2022 às 14h26
Por Stefania Martinielle

 

 

 

 

 

STEFANIA MARTINIELLE XAVIER BARROS

 

TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA: DO RECONHECIMENTO À PROTEÇÃO JURÍDICA DAS PESSOAS PORTADORAS DE TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA

 

O autismo pode ser identificado através da observação e avaliação do comportamento das pessoas, sendo certo que esses comportamentos variam de uma pessoa para a outra.  

A palavra autismo deriva do grego autós, a qual significa “de si mesmo”. Essa expressão foi inicialmente inserida pelo estudioso Eugene Blueler nos idos de 1911, no entanto, há de se registrar que muitos estudiosos se dedicaram em avançar o conhecimento sobre o autismo, dentre eles, destaca-se Temple Grandim, que, em causa própria, desenvolveu várias teorias que pudesse explicar o autismo em sua essência.

Antes, o autismo era tido como um resultado de um possível mau relacionamento de uma criança com seus pais, o que geraria conflitos de ordem neuropsicológica, aguçando os sintomas próprios da síndrome. 

Entretanto, sabe-se que autismo engloba alguns diagnósticos que variam conforme a área de menor ou maior prejuízo para o indivíduo.

Pode haver comprometimento nas áreas da interação social e na comunicação. No campo comportamental pode ser visto através de comportamentos restritivos, estereotipias e repetitivos. Esse trabalho trata de uma análise do portador de TEA diante de suas limitações para praticar atos da vida civil, tendo em vista que o autismo apresenta variados níveis de discernimento e a Lei nº 12.764/2012 considera, para todos os efeitos legais, que as pessoas com TEA são deficientes.

O problema se apresenta na forma como são diagnosticadas e, consequentemente, avaliadas as pessoas com o transtorno e como elas se enquadram nos níveis de capacidade civil que o Código Civil Brasileiro adota, buscando analisar o âmago dessa capacidade e suas mudanças perante o Estatuto do Deficiente. Contudo, tem-se que o Espectro Autista é um transtorno de ordem geral e que possui uma abordagem jurídica relativamente recente no Brasil, posto que somente se estabeleceu uma política de proteção aos direitos destas pessoas em 27 de dezembro de 2012, com o advento da Lei nº 12.764.

É importante ressaltar que as pessoas com TEA têm os mesmos direitos garantidos a todos os cidadãos do país pela Constituição Federal de 1988 e outras leis nacionais. Dessa forma, as crianças e adolescentes autistas possuem todos os direitos previstos no Estatuto da Criança e Adolescente (Lei 8.069/90), assim como os maiores de 60 anos estão protegidos pelo Estatuto do Idoso (Lei 10.741/2003). Os direitos e benefícios sociais dos autistas foram estabelecidos através da Lei Berenice Piana (12.764/12).

Com os avanços dos estudos sobre o tema, o Estado brasileiro passou a se preocupar com a inclusão da pessoa com TEA, concluindo que a melhor forma de inclusão seria através de uma educação diferenciada, a qual fora denominada educação inclusiva.

Apesar de ser uma problemática antiga, somente em 1994 o autismo foi incorporado nas políticas educacionais, a chamada PNEE – Política Nacional de Educação Especial.

Com isso, passou-se a ter um olhar mais atencioso para a educação de pessoas com TEA, ocasião em que, a partir de então, algumas conquistas foram observadas, tais como: a própria garantia de escolarização em escolas comuns, atendimento educacional especializado, o incentivo a formação e a capacitação de profissionais especializados para lidarem corretamente com pessoas com TEA em salada de aula.

Apesar de ser grandes conquistas, passados quase 30 anos, muito ainda precisa ser feito para o alcance de uma educação inclusiva ou a mais próxima desse conceito, tendo em vista que nem todas escolas possuem assistentes terapêuticos que auxiliam no dia a dia em sala de aula, falta estrutura e tecnologias móveis na inclusão digital para crianças com TEA.     

Nesse contexto, surge a necessidade de buscar entender como o Poder Judiciário, de modo geral, tem atuado em relação aos direitos à educação das pessoas com deficiência, sobretudo àquelas que possuem TEA. Necessário entender qual o posicionamento mais frequente da Justiça quando se depararam com a necessidade de julgar uma demanda relacionada ao tema, considerando que a inclusão é direito constitucionalmente previsto.

Este debate mostra-se relevante tendo em vista a crescente necessidade de judicialização para efetivação do direito à educação inclusiva na tentativa de se garantir os direitos já expressos no ordenamento jurídico brasileiro. Por exemplo, há situações em que se mostra necessário a presença de um monitor para auxiliar a criança em sala de aula. A falta de efetivação desta medida é justificada tanto pela falta de profissionais capacitados, quanto por questões de restrições orçamentárias. Neste sentido, havendo descumprimento de tais medidas, o Poder Judiciário assume o papel de destaque para a concretização dos valores constitucionais. Nessas hipóteses, o Supremo Tribunal Federal já é pacífico em afirmar que é atribuição do Poder Judiciário resguardar a integridade e eficácia da Constituição. 

No presente trabalho, vários estudos foram realizados para que fosse alcançado, o mínimo de entendimento sobre qual o comportamento mais aplicado do Judiciário frente as demandas que envolvem os direitos do autista. O método utilizado quanto a abordagem é o dedutivo, quanto aos objetivos é o exploratório e, por fim, quanto à técnica é o bibliográfico, tendo como metodologia, no tocante ao método de abordagem o dedutivo, metodologia aplicada, quanto aos objetivos, exploratório e, por fim, quanto a técnica, bibliográfico.

O presente trabalho estrutura-se da seguinte forma: O primeiro capítulo trata do conceito do autismo, surgimento e a sua evolução quanto ao diagnóstico, abordando as formar comportamentais, trazendo uma noção das principais necessidades da pessoa portadora do Transtorno do Espectro Autista e os meios de inclusão social, abordando como parte inicial da inclusão a forma de recebimento do diagnóstico no âmbito familiar.

No segundo capítulo discorrer-se-á sobre a garantia constitucional a educação inclusiva e o surgimento das leis de proteção ao deficiente e, sobretudo, especificamente em relação ao autismo. Fazendo um estudo sobre a lei Berenice Piana.

No terceiro e último capítulo, tem-se um estudo sobre como vem se posicionando o Poder Judiciário País afora frente as demandas surgidas em face da não aplicação da lei quanto a promoção da inclusão do autista na educação, na saúde e nas mais variadas necessidades surgidas pela pessoa portadora do Transtorno do Espectro Autista (TEA), trazendo julgados relacionados ao tema.   

 

 

 

                                                           

 

2 COMPREENSÃO DO AUTISMO OU TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA) A PARTIR DA SUA EVOLUÇÃO HISTÓRICA, CONCEITO E CARACTERÍSTICAS

 

Para uma melhor compreensão é necessário elencar os diferentes termos correlatos às crianças com dificuldade de comunicação, comportamento e socialização, quais sejam: o espectro autista, transtorno autista, transtorno de asperger, transtorno desintegrativo da infância e o transtorno invasivo do desenvolvimento.

Uma pessoa portadora do autismo necessita do apoio de todos, pais, professores e sociedade em geral em um verdadeiro mergulho em seu mundo, que é um mundo um pouco paralelo ao conceito de normal. É um mundo de percepções, sentimentos, sentidos mais sensíveis.

Diante disto, tem-se que a palavra e seu significado, autismo, derivado do grego que traduz “voltar-se para si mesmo”, ou seja, seu mundo. Alguns psiquiatras, como Eugênio Bleuler (1911), Leo Kanner (1943) e adentrando na década de 1960, Lorna Wing (1962), relacionaram o autismo a um tipo de esquizofrenia, e apenas na década de 80, o autismo foi reconhecido diferente e não mais como esquizofrenia, mas sim como uma síndrome ou um distúrbio do desenvolvimento (BRASIL, 2018)

 

2.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO CONCEITO DE AUTISMO

 

Na idade média, a ideia que se tinha é que as origens de transtornos da mente humana eram causadas por uma possessão por demônios e o tratamento adequado estava ligado às práticas religiosas.

Posteriormente, como mencionado acima, os portadores de autismo passaram a ser tratados como pessoas esquizofrênicas e viviam em constante isolamento social, tais crianças que eram consideradas insanas e conviviam, inclusive, no mesmo espaço físico que os adultos nos manicômios.

 No entanto, com o passar do tempo, foram surgindo novas e intensas pesquisas com algumas crianças que, desde o início da sua vida, apresentavam diferentes traços em relação a outras. Passou a se observar que essas crianças não gostavam de mudanças na rotina, preferiam objetos ao invés da interação social com pessoas, o uso de repetição de fala, além de outras características.

No ano de 1943, Leo Kanner, um psiquiatra infantil lançou o seu livro sobre “Distúrbios Autísticos ao contato afetivo”, que era a história de 11 casos de crianças que tinham atrasos em seu desenvolvimento e que tinham em comum o isolamento social, dificuldades em suas comunicações e em seus comportamentos (MERCADANTE; ROSÁRIO, 2009 p. 35).

Em 1944, o estudioso e psiquiatra Hans Asperger, descreveu crianças que, em comum, tinham déficit de atenção na linguagem não verbal, e suas interações sociais eram com movimentos desajeitados. Com esse estudo, ele publicou um artigo intitulado “A psicopatia Autistica na Infância”, no qual observou que antes dessas dificuldades mencionadas, as crianças apresentaram preferências por assuntos e vivências, tais como a matemática, jogos, placas e mapas, levando a crer que a parte cognitiva dessas crianças se mantinha preservada, que era a inteligência. Com isso, eram chamados de gênios, ou como o próprio Asperger chamava, “pequenos professores”, uma inteligência acima da média das crianças normais, não que elas não fossem (NOTBOHN, 2005.).

Chegando a década de 50 e 60, houve diversos estudos baseados praticamente na etimologia da palavra “autismo”. Dentre eles estava o estudo apoiado por Kanner (1968), que tinha uma visão que a origem do autismo era culpa dos pais. Ele acreditava que os genitores não estavam inseridos emocionalmente com seus filhos, não estavam interligados com eles. Essa crendice, por assim dizer, só veio a ser abandonada com novos e mais avançados estudos e a constatação que o autismo afetava crianças em todos os cantos do planeta, sem levar em consideração sua cor, raça, religião e nível social e sua cultura, sendo sim, de ordem genética ou como assim dizer, um transtorno de ordem cerebral desde a primeira infância (ROCHA; CALVALCANTE, 2007).

Em 1950, passou-se a dar nomes ao autismo que vieram a ter sua classificação em dois manuais, como DSM-1 (DiagnosticandStatistical Manual) e o CID – 10 (Classificação Internacional de Doenças). Chegando ao ano de 2013, o DSM recebeu uma repaginada, surgindo sua nova versão DSM – V. Neste a nova nomenclatura para o autismo foi: Transtorno do Espectro Autista (TEA), e com isso, todas as categorias dos transtornos foram englobadas em um só espectro, passando a ser assim uma tríade do comprometimento (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos mentais DSM – v, 2014, p. 32).

Não se pode deixar de citar que à Organização das Nações Unidas (ONU), no ano de 2007, tornou oficial o dia 02 de abril como sendo o dia Mundial da Conscientização do Autismo” e até os dias atuais vê-se muitas campanhas de conscientização em todo o mundo. Com simbologia azul, pessoas vão as ruas para tentar conscientizar políticos e a própria sociedade, para buscar mais e melhores políticas públicas, bem como um novo e melhor olhar para os portadores do TEA, na busca por maior diminuição de preconceito com os portadores e até mesmo seus familiares.

Foi com essas lutas, que em 2012, no Brasil, foi aprovada a Lei nº 12.764 a qual traz maiores garantias de saúde aos portadores do autismo e faz previsão de princípios básicos como: universalidade, integralidade e igualdade. Tal lei é denominada como Lei Berenice Piana.

 

2.2. DO DIAGNÓSTICO DO AUTISMO NO AMBIENTE FAMILIAR

 

Choque, essa é a primeira reação de uma família ao receber o diagnóstico do autismo. Fala-se também sobre o medo quando se trata de um filho ainda em seu início de vida, devido aos diversos obstáculos a serem enfrentados e que eles não estavam preparados. É uma nova rotina, uma nova realidade, uma nova forma de se viver, na verdade, uma desconstrução de um sonho, e isso afeta, mesmo sem querer as relações familiares, principalmente o fator saúde emocional da família.

Ser mãe ou pai de uma criança ou adolescente com autismo não é uma tarefa fácil, sem dúvida. Esse exercício diário requer muito mais zelo, paciência, persistência, fiscalização, disciplina, criatividade e aumento da estrutura familiar, com participação ativa de todos diretamente envolvidos (inclusive irmãos, babás e cuidadores).

É comum que os pais caiam na armadilha de apontar apenas os comportamentos problemáticos das crianças. Ao fazerem isso, podem perder de vista as habilidades e os pontos fortes que elas possuem. Quais são os dons e habilidades inatas de seus filhos? Após identificarem essas áreas, é possível estimular e direcionar seus talentos e potencialidades de forma correta.

            Com um imensurável impacto ao receber o diagnóstico sobre o TEA, é quase que comum os familiares passarem por um momento de negação, meio que um luto inicial por uma idealização de uma criança pelos entes familiares, até que eles posteriormente superem e identifiquem as enormes potencialidades que as crianças autistas possuem. Mas para que isso ocorra, o ambiente familiar deve também realizar fora a criança, um acompanhamento psicológico. Realizar estudos, acompanhamentos e seu fortalecimento mental, para que se tornem uma família pronta e compreensiva para o novo mundo que vão conviver, um mundo triste? Não! Um mundo mais ativo, intelecto e especial. E é aí que entra a parte do apoio, onde os pais devem estar preparados para dar todo suporte e apoio e vivenciar esse mundo. Não só a criança deve ser levada para acompanhamento, mas os entes familiares também. Outra palavra que deve ser usada é essencial, essencial o apoio, a força, a mente aberta e sadia, com isso cria um ambiente e família harmônica.

Algumas crianças costumam ser muito "teimosas" e "birrentas". Elas agem assim porque sabem que os pais normalmente cedem e, com isso, obtêm o que querem. Desta forma, as crianças mantêm esses comportamentos, de maneira contínua, mesmo com ensinamentos de que estão erradas.

            É muito comum que os pais tentem eliminar os comportamentos inadequados dos filhos com punições, repreensões e até com castigos físicos — como forma de aliviar sua raiva. Porém, essas atitudes não são capazes de ensiná-los a fazer o que é certo, só geram efeitos "colaterais" e consequências desastrosas. Além de se sentirem culpados com seus métodos punitivos, esses pais acabam por ceder novamente às exigências das crianças.

            O acolhimento e a orientação para as famílias são fundamentais para que elas deixem de lado crenças errôneas, e não se desgastem com culpas desnecessárias e sem propósitos. Cuidar dos familiares, especialmente das mães, é tão importante quanto cuidar das próprias crianças.

            Tudo isso deve ser fortalecido ante o impacto que os diversos questionamentos familiares que se formaram e ocorrerem com frequência em todo ambiente familiar, dos parentes, dos vizinhos, amigos e sociedade em um contexto geral. Partem da causa de ter tido um filho com autismo, até mesmo de ter sido um castigo que estejam pagando na vida e é partir daí que vem os impactos que negativam o ambiente familiar e diante disto, acarreta um grande e perigoso sintoma, o estresse, por tudo que eles passam, convivem, escutam e se questionam, bem como há em alguns casos, o levam a se tornarem pessoas ansiosas, algo muito ruim na vida de pais de crianças que requer, paciência, calma, amor e união.

            As famílias de portadores diagnosticados com o autismo, em especial nas crianças, encontram-se travados em uma batalha, adaptação à realidade do filho e o reajuste dos seus planos para o futuro, pois cada portador do TEA, irá apresentar ritmos distintos de aprendizagens e podendo demonstrar avanços rápidos em sua intelectualidade ou retardos de suas potencialidades. De acordo com Schimidt e Bosa (2003, p. 15):

 

As dificuldades das crianças com algum transtorno do desenvolvimento podem ser consideradas como um estressor apenas em potencial, podendo esses pais sofrer ou não efeitos de um estresse real. O impacto das dificuldades próprias da síndrome sobre os pais vai depender de uma complexa interação entre a severidade das características próprias da criança e a personalidade dos pais, bem como a disponibilidade de recursos comunitários.

 

            Sprovieri e Assumpção (2001, p. 231), relatam que “o autismo leva o contexto familiar a interromper suas atividades sociais normais, transformando o clima emocional no qual vive”. A família se une à disfunção da criança, sendo que tal fator é determinante no início da adaptação familiar.

            Partindo desse contexto, para falar da grande dificuldade em que os familiares enfrentam para exercer o desenvolvimento da comunicação, da interação social e do afeto, pois é o núcleo familiar que pode, juntamente com os profissionais capacitados, estimular e interagir de maneira adequada, tanto em casa como na escola, para que o indivíduo tenha bons resultados no seu desenvolvimento. Sendo assim, a família deve trabalhar junto ao filho autista em parceria com os educadores, focando-se no desenvolvimento adequado da criança.

            Com isso, afirma Cunha (2012, p.20) que:

 

Ensinar para a inclusão social, utilizando os instrumentos pedagógicos da escola e inserindo também a família, é fortalecê-la como núcleo básico das ações inclusivas e de cidadania. Para a escola realizar uma educação adequada, deverá, ao incluir o educando no meio escolar, incluir também a sua família nos espaços de atenção e atuação psicopedagógica. (p. 90).

 

            Deve haver uma preparação da família, não somente para esperar da escola o ensinamento, a compreensão, o apoio, pois a melhor escola parte do ambiente familiar. O diagnóstico ao ser apresentado, é um sinal, a família deve se renascer, se rescrever.

            A família é considerada, atualmente, um suporte essencial para o desenvolvimento da pessoa com autismo junto às terapias multiprofissionais (SILVA, 2012).

Além disso, os pais têm uma função muito importante, que é a busca de estudos, porquanto, através destes estudos é possível obter ótimas orientações para que as famílias possam se apoiar e melhorar seus desempenhos, tais como: Informar-se, incentivar o filho a se cuidar sozinho, obviamente com sua orientação e cuidado, dar tarefa para ele realizar, treinar a generalização do aprendizado, dividir as responsabilidades dentro de casa, estabelecer uma refeição ao menos por dia em conjunto com toda família, manter diálogos com pais de filhos autistas, procurar oportunidades para seu filho desenvolver habilidades em meio social, fazer parte da escola, trabalhar em parceria com a escola do filho, e a principal, buscar ajuda especializada, com todo esses cuidados, há uma maior probabilidade de um cotidiano mais adequado para essas crianças.

 Os pais devem estar bem preparados, pois sabe-se que o lar jamais será o mesmo com a chegada de uma criança com autismo, pois reestruturações radicais deverão ser feitas para o seu bom desenvolvimento, e para que a harmonia familiar se preserve.

É preciso entender que ela olha, sente e percebe o mundo de forma muito diferente da nossa. Ela o vê fragmentado, aos pedacinhos, como se fosse um enorme quebra-cabeça, cujas peças precisam ser aos poucos encaixadas para que o mundo dela se mostre minimamente parecido com o nosso. E, mesmo que consiga montá-lo, as fendas e rachaduras estarão sempre por lá.

            Escola e família são instituições fundamentais para o desenvolvimento da pessoa humana. Ambas são propulsoras ou inibidoras do crescimento físico, intelectual, emocional e social do ser humano; a escola preocupa-se com o processo ensino-aprendizagem e com a sua instrução e apreensão do conhecimento, a família por sua vez preocupa-se com a socialização, proteção, as condições básicas de sobrevivência e com o desenvolvimento no âmbito social, afetivo e cognitivo.

            A relação entre a família e a escola é fundamental para que aconteça uma evolução para qualquer criança, seja ela com necessidades educacionais especiais ou não, essa parceria deve acontecer a partir do momento da matrícula dessa criança, é interessante que a escola procure ter um bom relacionamento com essa família, é relevante que as famílias sejam respeitadas, dentro da escola, em todos os aspectos culturais, religiosos dentre outros.

            Partindo desta perspectiva, acredita-se que “a escola e a família compartilham funções sociais, políticas e educacionais, na medida em que contribuem e influenciam a formação do cidadão” (REGO, 2003 apud DESSEN; POLONIA, 2007, p. 22). Assim, constituem os dois principais ambientes de desenvolvimento humano, sendo responsáveis pela transmissão e construção do conhecimento culturalmente organizado.

 

2.3 A IMPORTÂNCIA DA EDUCAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO DA PESSOA COM AUTISMO

 

A porta de entrada para o desenvolvimento da pessoa com autismo é o alcance de uma interação social satisfatória e isso é facilmente conseguido na escola, onde as crianças com TEA passam a conviver com outras crianças, desenvolvendo um ciclo de convivência, aprendizado e, sobretudo, socialização.

Como as principais Declarações e Resoluções que amparam o direito à educação, temos a Declaração Universal dos Direitos Humanos (ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS,1948), que deflagra que toda a criança tem direito à educação e a Declaração Mundial sobre Educação Para Todos, proferida em Jomtien/Tailândia (BRASIL,1990) que fundamenta a educação como um direito de todos e destaca como real papel da escola a garantia de aprendizagem (BRASIL, 1990).

Voltando um pouco no tempo, pode-se falar sobre a declaração de Salamanca (Espanha) que foi assinada em 1994, que nela, estabeleceu princípios, políticas e práticas educacionais e que visavam garantir os direitos das pessoas com necessidades educativas especiais (UNESCO, 1994). Configura-se como uma grande contribuição para o enfrentamento das barreiras impostas tanto pelas escolas, quanto pela sociedade com relação à inclusão de alunos com transtornos do espectro autista e deficiências nas escolas regulares; bem como no incentivo de se construírem práticas nas instituições de ensino, que colaborem para a construção de métodos, técnicas, tecnologias assistivas e na contratação de recursos humanos, que contribuam para fortalecer o ensino aprendizado no ambiente escolar.

A Declaração de Salamanca estabelece a necessidade de parceria entre família, professores e profissionais da escola, com a finalidade de maximizar os esforços para a inclusão, da melhor forma possível, dos alunos com necessidades educativas especiais no ensino regular. Sem o desenvolvimento dessa relação de "parceria" família/ professores e profissionais da escola, não serão alcançados o nível e a qualidade de envolvimento necessário para assegurar ganhos educacionais possíveis para “todos” os alunos.

Ressalta-se que desde a década de 60, nos Estados Unidos, antes de se pensar em uma educação inclusiva centrada no aluno, os trabalhos de Bruner (2012) já indicavam a ideia de que os alunos, deveriam ter um papel mais ativo em seu próprio processo de educação.

A educação inclusiva pode ser definida como um sistema educacional livre de preconceitos e em que práticas educacionais sejam planejadas e executadas voltadas para a construção do aprendizado de todos os alunos inseridos na escola, com ênfase no público alvo da educação especial, que são as pessoas com deficiência, transtornos do espectro autista e altas habilidades, que também possuem direitos a terem uma educação de qualidade que os envolvam em metodologias ativas e que colaborem para ampliar os seus conhecimentos e estimular o aprendizado.

Conforme Machado (2013, p.92) para que seja efetivada a inclusão no ambiente escolar são necessárias mudanças significativas nas atitudes de todas as pessoas envolvidas na escola, a consciência de que as pessoas com deficiência, autistas e altas habilidades precisam ser inseridas e que o currículo deve abranger também o aprendizado destes alunos.

A escola é fundamental para a mitigação do maior fator de limitação da criança com autismo, que é a falta de interação social. O trabalho realizado em conjunto por professores, pais e profissionais deve ser pautado, principalmente pelo fomento da interação social. Através dela, a criança melhora significativamente no aprendizado e na inclusão social.

Hoje em dia, cada vez mais, as crianças são criadas em apartamentos e isoladas dos seus pares por uma questão logística da vida moderna. Muitas crianças vivem em famílias pequenas e só encontram um grupo de amigos no ambiente escolar. Até mesmo os esportes têm sido realizados nas escolas; as crianças chegam pela manhã, fazem tudo por lá e voltam para casa no final do dia.

A vida escolar é especial e todos têm o direito de vivenciar essa experiência. Afinal, é na instituição de ensino que se aprende a conviver em grupo, a se socializar, trabalhar em equipe, conviver com as diferenças: são os primeiros passos rumo ávida adulta.

Enquanto a criança com autismo convive apenas em seu meio familiar, muitas características permanecem em estado de latência ou ainda não são totalmente perceptíveis. Muitos podem ter notado que ela tem algo diferente, mas é com o ingresso na escola que essa desconfiança se concretiza e aparecem as potenciais dificuldades. A mãe e os professores, mesmo sem querer, acabam comparando a criança com seus colegas, e a diferença fica mais evidente. Ali, os pais já não estão mais presentes para facilitar as coisas, mediar as brincadeiras e atender a todas as vontades da criança. Agora ela precisará caminhar sozinha e revelar suas reais aptidões.

O dia a dia escolar, o desenvolvimento de atividades escolares, seja ela pedagógica, desportiva e/ou recreativa com a participação efetiva da criança com TEA tem se mostrado uma boa ferramenta no desenvolvimento da interação social, fazendo com que essa criança, interaja com outras pessoas de níveis comportamentais diversos.

Com isso, desde 2002 tem-se verificado um aumento significativo em matrículas escolares na educação especial, isto porque os pais passaram a obter a informação quanto aos direitos de inclusão educacional, além dos bons resultados obtidos na diminuição das sequelas sociais do autismo.

Entretanto, não se pode olvidar que deve haver um certo cuidado nessa inclusão escolar, tendo em vista a existência de diferentes níveis de comprometimento do autismo, e as situações devem ser analisadas pontualmente, caso a caso, pois determinada criança pode não assimilar as atividades.

Segundo Menezes (2012; p.51), uma inclusão realizada sem as devidas ponderações a respeito de todo o conceito em questão pode ser tornar a mais perversa das exclusões.  

No Brasil, de acordo com Bragin (2011), a educação das pessoas com autismo, assim como das demais deficiências, foi oferecido inicialmente na educação especial, por meio de instituições especializadas. A partir das transformações nas políticas educacionais, atualmente, a educação das pessoas com deficiência – abrangendo, neste sentido, os autistas -, tem sido priorizada a partir da perspectiva inclusiva.

A segregação imposta às pessoas com deficiência as impedia de terem acesso ao ambiente da escola regular, bem como a oportunidade de aprender e interagir com os outros alunos (GALVÃO FILHO, 2013). Este fato contribuía para que fosse intensificado o nível de defasagem na aprendizagem desta população em diversos aspectos, seja em seu desenvolvimento cognitivo e social, bem como no desenvolvimento de suas habilidades e potencialidades, visto que não eram estimuladas. A estas pessoas eram negados o direito à educação e ao conhecimento, assim como as oportunidades de poderem interagir com as outras pessoas e de criar laços (GALVÃO FILHO, 2013).

O professor interessado pode fazer muito pelas crianças com autismo, mesmo que não seja especialista nessa área. Com amor, dedicação e paciência poderá ganhar a confiança eterna de uma criança. O primeiro passo é o conhecimento. Informações específicas sobre o funcionamento autístico são ferramentas essenciais para orientar o professor no trato com esse aluno e, sobretudo, auxiliá-lo em seu desenvolvimento.

Para isso, é importante avaliar os pontos fracos de seu aluno e colocar em prática as estratégias. Seu empenho pode fazer uma enorme diferença na vida dele. Pode tirá-lo de um mundo com repertórios restritos e redirecioná-lo a um universo repleto de novidades e atrativos. Além disso, pode facilitar sua convivência em grupo de maneira harmônica e prazerosa. Mais do que ensinar, a escola possui o importante papel de ser o local dos primeiros grupos sociais dos pequenos. Lá eles encontrarão coleguinhas que, por vezes, os acompanharão pela vida por muitos anos.

O professor tem total condição de perceber que determinadas crianças não se encaixam em grupo algum, têm dificuldades na interação social e não conseguem compartilhar momentos. Muitas vezes, ele precisará intervir nas atividades. As crianças com autismo ou síndrome de Asperger até tentam se relacionar, mas, depois de constantes fracassos, tendem a associar a vida em grupo com algo pouco prazeroso. Intermediando esse contato por meio de brincadeiras, jogos e atividades, o professor consegue incluir, verdadeiramente, essa criança no ambiente escolar. Com o tempo, a criança desenvolve seus próprios instrumentos para manter as relações, se tornando mais hábil socialmente. O contato social com crianças com necessidades especiais é importante também para os demais alunos, que aprendem a lidar com as diversidades, quebrar preconceitos e construir um mundo mais tolerante e solidário.

É importante que, na medida do possível, o aluno seja o ajudante do professor em pequenas tarefas, tal como entregar folhas aos coleguinhas, pronunciando o nome de cada um. Mesmo que, para isso, seja preciso pegar em sua mão e realizar a atividade junto com ele. E fundamental que ele receba o máximo de dicas possíveis para que a tarefa seja bem-sucedida. Ele se sentirá acolhido, valorizado e mais integrado.

Falado um pouco sobre a grande importância do professor, volta-se a falar um pouco ainda mais sobre a educação inclusiva. No que concerne a este tema, a educação especial mostra-se completamente interligada à necessidade de ser estudada e melhorada juntamente com recursos e estratégias que estejam completamente ligadas à sala de aula comum, como salienta Machado et al. (2010):

 

A educação especial perpassa todos os níveis, etapas e demais modalidades de ensino, sem substituí-los, oferecendo aos seus alunos serviços, recursos e estratégias de acessibilidade ao ambiente e aos conhecimentos escolares. Nesse contexto, deixa de ser um sistema paralelo de ensino, com níveis e etapas próprias (MACHADO, et al., 2010, p. 06).

 

Nesse contexto, não se pode perder de vista a relevância de se ter conhecimento de quando e de onde partiu a ideia de que o deficiente passa a ter uma maior oportunidade de inclusão através, justamente, da educação. Marcos José Silveira Mazzotta, no livro “Educação especial no Brasil: história e políticas públicas” afirma que o pontapé inicial de apoio aos portadores de deficiências se deu com a política de educação inclusiva, onde, na ocasião, diversos líderes de nações espalhados mundo afora passaram a estudar, chegando a conclusão que a inclusão se dá, necessariamente, por meio da educação, afirmando que “é importante conhecer algumas medidas tomadas por alguns desses líderes que, de uma forma ou de outra, tiveram importância decisiva na evolução da educação especial" (MAZZOTA, 2005, p. 17).

            Sendo assim, as primeiras maneiras que objetivavam atenuar os problemas dos portadores de necessidades especiais surgiram dentro das escolas e, posteriormente, passaram a ser estudadas com maior cautela para que pudessem ser expandidas para outras áreas:

 

Foi principalmente na Europa que os primeiros movimentos pelo atendimento aos deficientes, refletindo mudanças na atitude dos grupos sociais, se concretizaram em medidas educacionais. Tais medidas educacionais foram se expandindo, tendo sido primeiramente levadas para os Estados Unidos e Canadá e posteriormente para outros países, inclusive o Brasil (MAZZOTA, 2005, p. 17).

 

            A partir de então, a temática relacionada à educação especial passou a ganhar importância em todos os setores, especialmente, no setor educacional, o que proporcionou diversas discussões sobre o assunto e que fez com que novas nomenclaturas relacionadas ao tema fossem criadas e ligadas a essa que, então, era considerada uma nova modalidade educacional e, por isso, passou a merecer maior atenção de vários pesquisadores e educadores da época.       

            Tais nomenclaturas puderam mostrar que a partir do século XIX, a área da educação especial pôde ser de fato, estudada e analisada como uma verdadeira proposta educacional pedagógica. Prova disso é a de que alguns dos nomes que foram criados na época para algumas das modalidades relacionadas à educação especial, são utilizados até os dias de hoje, afinal, foi durante esse período que a educação especial foi efetivada no meio pedagógico educacional.

            O desenvolvimento da educação especial no Brasil se deu aproximadamente em meados do século XX, ocasião em que se iniciou debates acerca de um redimensionamento das políticas nacionais em relação a educação de pessoas especiais, sendo certo que a partir de então constantes transformações foram surgindo, a fim de aprimorar o ensino dessa gama de alunos.

Como salienta Mazzota (2005), os pesquisadores brasileiros puderam se basear no processo de transformação e de evolução das pesquisas que foram, incialmente, concretizadas no continente europeu:

 

Inspirados em experiências concretizadas na Europa e Estados Unidos da América do Norte, alguns brasileiros iniciaram, já no século XIX, a organização de serviços para atendimento a cegos, surdos, deficientes mentais e deficientes físicos. Durante um século, tais providências caracterizaram-se como iniciativas oficiais e particulares isoladas, refletindo o interesse de alguns educadores pelo atendimento educacional dos portadores de deficiências. A inclusão de "educação de deficientes", da "educação dos excepcionais" ou da "educação especial" na política educacional brasileira vem a ocorrer somente no final dos anos cinquenta e início da década de sessenta do século XX (MAZZOTA, 2005, p. 27).

 

Portanto, o desenvolvimento dos estudos no Brasil acerca inclusão de pessoas deficientes, se deu a partir de experiências já vivenciadas na Europa, o que, de certa forma, propiciou uma certa facilidade, uma vez que foi oportunizado ao Brasil identificar quais políticas eram consideradas ineficazes, proporcionando uma diminuição nos erros e um aumento nos acertos nas politicas empregadas.

3 DA PROTEÇÃO JURÍDICA E DIREITOS FUNDAMENTAIS DAS PESSOAS PORTADORAS DE TEA

 

            Desde o seu preâmbulo, em nossa Constituição Brasileira, consta uma demonstração de manutenção do Estado Democrático de Direito, que visa assegurar a todos os brasileiros, diversos direitos, tais quais os sociais, de liberdade, individuais, segurança, bem-estar, igualdade e justiça. Sendo todos eles, bem descritos, em seu segundo Título, onde se intitula “Dos direitos e Garantias Fundamentais”, que são facilmente aduzidos:

 

a- Direitos individuais e coletivos: são os direitos ligados ao conceito de pessoa humana e à sua personalidade, tais como à vida, à igualdade, à dignidade, à segurança, à honra, à liberdade e à propriedade. Estão previstos no artigo 5º e seus incisos;

b- Direitos sociais: o Estado Social de Direito deve garantir as liberdades positivas aos indivíduos. Esses direitos são referentes à educação, saúde, trabalho, previdência social, lazer, segurança, proteção à maternidade e à infância e assistência aos desamparados. Sua finalidade é a melhoria das condições de vida dos menos favorecidos, concretizando assim, a igualdade social. Estão elencados a partir do artigo 6º;

c- Direitos de nacionalidade: nacionalidade, significa, o vínculo jurídico político que liga um indivíduo a um certo e determinado Estado, fazendo 25 com que este indivíduo se torne um componente do povo, capacitando-o a exigir sua proteção e em contra partida, o Estado sujeita-o a cumprir deveres impostos a todos;

d- Direitos políticos: permitem ao indivíduo, através de direitos públicos subjetivos, exercer sua cidadania, participando de forma ativa dos negócios políticos do Estado.

e- Direitos relacionados à existência, organização e a participação em partidos políticos: garante a autonomia e a liberdade plena dos partidos políticos como instrumentos necessários e importantes na preservação do Estado democrático de Direito. (SILVA, 2006, p. 1).

 

            Traduzindo com isso que, todo ser humano já nasce tendo direitos e garantias reconhecidos na Lei Maior, sem que, para tanto, tenha que mobilizar instituições para o seu reconhecimento primário.

            Devido a isso, deve-se exigir respeito a sua dignidade humana para poder garantir suas necessidades básicas para que se possa conviver tranquilamente em sociedade.

            “Os direitos humanos têm uma posição bidimensional, pois por um lado tem um ideal a atingir, que é a conciliação entre os direitos do indivíduo e os da sociedade; e por outro lado, assegurar um campo legítimo para a democracia” (SILVA, 2006, p. 1).

            Nesse contexto, elenca-se as principais características dos direitos fundamentais, os quais demonstram-se a seguir:

 

a- Historicidade: os direitos são criados em um contexto histórico, e quando colocados na Constituição se tornam Direitos Fundamentais;

b- Imprescritibilidade: os Direitos Fundamentais não prescrevem, ou seja, não se perdem com o decurso do tempo. São permanentes;

c- Irrenunciabilidade: os Direitos Fundamentais não podem ser renunciados de maneira alguma;

d- Inviolabilidade: os direitos de outrem não podem ser desrespeitados por nenhuma autoridade ou lei infraconstitucional, sob pena de responsabilização civil, penal ou administrativa;

e- Universalidade: os Direitos Fundamentais são dirigidos a todo ser humano em geral sem restrições, independentemente de sua raça, credo, nacionalidade ou convicção política;

f- Concorrência: podem ser exercidos vários Direitos Fundamentais ao mesmo tempo;

g- Efetividade: o Poder Público deve atuar para garantir a efetivação dos Direitos e Garantias Fundamentais, usando quando necessário meios coercitivos;

h- Interdependência: não pode se chocar com os Direitos Fundamentais, as previsões constitucionais e infraconstitucionais, devendo se relacionarem para atingir seus objetivos;

i- Complementaridade: os Direitos Fundamentais devem ser interpretados de forma conjunta, com o objetivo de sua realização absoluta. (SILVA, 2006, p. 1).

 

            Assim, os direitos fundamentais são devidamente reconhecidos, mas não somente no Brasil, mas em todo o mundo, lembrando que, todos já nascem com estes direitos, tendo que apenas ter a devida proteção e /ou a devida regulamentação deles.

O ordenamento jurídico brasileiro possui muitas leis que visam regulamentar situações que afligem as pessoas portadoras de deficiência, de modo a protege-las, bem como, outras tantas leis direcionadas exclusivamente às pessoas portadoras do transtorno do espectro autista. Nesse contexto, há uma certa confusão no que tange à discussão se o autista é, ou não, considerada pessoa com deficiência. Isto porque, os estudiosos sobre o tema, afirmam que, clinicamente falando, a pessoa com autismo não é considerada deficiente. É constantemente por eles afirmado que o autismo é um transtorno de ordem neurológica que afeta na interação social e no modo de viver dessas pessoas, não havendo, necessariamente, limitação no desenvolvimento, entretanto, existem os níveis de comprometimento do desenvolvimento desse indivíduo, que são os graus do autismo, que pode ser leve, moderado e severo, sendo que nesses dois últimos, poderá haver comprometimento no desenvolvimento.

Já a legislação brasileira, sobretudo a de maior abrangência especificamente em relação aos autistas, que é a lei Berenice Piana (Lei 12.764/12), trata o autista como deficiente, aumentando, desta forma, a proteção através de outras legislações não específicas. Daí porque a problemática entre o autista ser, ou não, deficiente.

Entende-se que por ser uma oportunidade de maior proteção através de outras leis, que não sejam específicas em relação aos autistas, que a melhor interpretação seja aquela derivada da lei, considerando-o deficiente, propiciando um raio maior de abrangência, sendo certo que os direitos garantidos a pessoa com autismo independe do grau de autismo ou de comprometimento do desenvolvimento neurológico.

No entanto, registre-se que a pessoa com autismo possui capacidade para todos os atos da vida civil, e somente será impedida se comprovada a incapacidade de expressar sua vontade, ainda assim dentro de alguns limites. 

Considerando o fato de que o autista, nos ternos da lei, é considerado pessoa com deficiência, a proteção se torna bem mais ampla, que vai desde o direito a atendimento prioritário até o direito a percepção de benefício de prestação continuada (BPC), sujeitando-se as mesmas regras e condições.

No tocante ao tema, tem-se a Lei Federal nº 13.146/2015 que dispõe sobre o Estatuto do Deficiente que visa assegurar e promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando à sua inclusão social e cidadania.

Nos termos do seu parágrafo único, esta lei tem como base a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, ratificados pelo Congresso Nacional por meio do Decreto Legislativo nº 186, de 9 de julho de 2008, em conformidade com o procedimento previsto no § 3º do art. 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, em vigor para o Brasil, no plano jurídico externo, desde 31 de agosto de 2008, e promulgados pelo Decreto nº 6.949, de 25 de agosto de 2009 , data de início de sua vigência no plano interno.

Esta lei considera pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, abrangendo, neste conceito, as pessoas autistas.

Outro exemplo de preceito normativo para deficientes que abrange o autista, partindo da premissa que este é deficiente, é do Decreto nº 7.611/2011 que dispõe sobre a educação especial e o atendimento educacional especializado, afirmando que é dever do Estado a promoção de um sistema educacional inclusivo, sem discriminação e com igualdade de oportunidades, garantindo que à educação especial os serviços de apoio especializado voltado a eliminar as barreiras que possam obstruir o processo de escolarização de estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação. 

Em continuidade, a lei nº 7.853/89, cuja ementa possui a seguinte redação:

 

dispõe sobre o apoio às pessoas portadoras de deficiência, sua integração social, sobre a Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência - CORDE, que institui a tutela jurisdicional de interesses coletivos ou difusos dessas pessoas, disciplinando a atuação do Ministério Público, definindo crimes

 

Sobretudo, estabelecendo normas gerais que asseguram o pleno exercício dos direitos individuais e sociais das pessoas portadoras de deficiências e sua efetiva integração social.

Outra lei, que embora não especifique sua abrangência em relação aos autistas, garantem à estes a proteção no tocante a normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida.

Trata-se da Lei nº 10.098/2000, a qual estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, mediante a supressão de barreiras e de obstáculos nas vias e espaços públicos, no mobiliário urbano, na construção e reforma de edifícios e nos meios de transporte e de comunicação, cujo art. 1º da precitada lei possui a seguinte redação. Verbis:

 

Art. 1o Esta Lei estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, mediante a supressão de barreiras e de obstáculos nas vias e espaços públicos, no mobiliário urbano, na construção e reforma de edifícios e nos meios de transporte e de comunicação.

 

 

Por sua vez, a lei nº 10.048/2000, alterada pela lei 13.146/20215, que regulamenta o direito de atendimento prioritário à pessoas com deficiência, os idosos com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos, as gestantes, as lactantes, as pessoas com crianças de colo e os obesos.

Assim, por considerar que o autista é pessoa com deficiência, terá atendimento prioritário nas repartições públicas e empresas concessionárias de serviços públicos.

Por fim, e não menos importante, por considerar a pessoa com transtorno do espectro autista como pessoa com deficiência, nos termos da lei, a lei 8.742/93, que dispõe sobre a estrutura organizacional da assistência social, regulamentando o BPC – Benefício de Prestação Continuada, garante ao autista, preenchido os requisitos, o recebimento do referido benefício.

Tais leis demonstram a importância do conceito da lei em definir o autista como deficiente.

 

3.1 DIREITOS E PROTEÇÃO DE PESSOAS COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA

 

A lei precursora, específica, de proteção ao autista é a lei nº 12.764/2012, que leva o nome de sua idealizadora, Berenice Piana, que é mãe de um filho autista que lutou para ver reconhecidos os direitos do seu filho. 

            Foi devidamente consolidada através da Lei nº 12.764/2011, a proteção jurídica do autismo antes desse marco, podia-se dizer que o autista era um nada jurídico, ou seja, não era uma pessoa normal, capaz, e nem era um deficiente. Com a referida Lei, passou-se a ser equiparado ao deficiente. Indiscutivelmente esta consolidação e conquista representa um avanço de proporções imensas para a vida dessas pessoas, de tal forma que agora opõem a obrigatoriedade de inclusão em escolas, em empregos específicos e outras proteções, além de fazer jus aos mesmos direitos prestacionais que os deficientes, inclusive em âmbito internacional.

            A Lei em questão, ganhou o nome de Lei Berenice Piana, em que assegura aos portadores de TEA e demais deficientes, igualdade de direitos em relação aos demais cidadãos, onde não possa haver qualquer tipo de discriminação, seguindo o que se preconiza na Carta Magna, em seus Art. 3º e 5º, que aduzem:

 

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: [...] IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. [...]

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição; [...] (BRASIL, CRFB, 2020, p.1).

           

Esses são os preceitos básicos da igualdade e avessos à discriminação.

Já trazendo a Lei Berenice, podemos inicialmente citar o seu Art. 1º, que trata especificamente do Transtorno de Espectro Autista, determinando que:

 

Art. 1º Esta Lei institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista e estabelece diretrizes para sua consecução.

§ 1º Para os efeitos desta Lei, é considerada pessoa com transtorno do espectro autista aquela portadora de síndrome clínica caracterizada na forma dos seguintes incisos I ou II:

I - deficiência persistente e clinicamente significativa da comunicação e da interação sociais, manifestada por deficiência marcada de comunicação verbal e não verbal usada para interação social; ausência de reciprocidade social; falência em desenvolver e manter relações apropriadas ao seu nível de desenvolvimento;

II - padrões restritivos e repetitivos de comportamentos, interesses e atividades, manifestados por comportamentos motores ou verbais estereotipados ou por comportamentos sensoriais incomuns; excessiva aderência a rotinas e padrões de comportamento ritualizados; interesses restritos e fixos.

§ 2º A pessoa com transtorno do espectro autista é considerada pessoa com deficiência, para todos os efeitos legais.

 

Neste artigo primeiro, trata-se da instituição da lei, que foi como já dito, o marco de conquista essencial para os portadores de TEA. Com isso, segue-se art. 3º da mesma, que é onde se encontra os direitos dos portadores de TEA garantidos, vejamos:

 

Art. 3º São direitos da pessoa com transtorno do espectro autista:

I - a vida digna, a integridade física e moral, o livre desenvolvimento da personalidade, a segurança e o lazer;

II - a proteção contra qualquer forma de abuso e exploração;

III - o acesso a ações e serviços de saúde, com vistas à atenção integral às suas necessidades de saúde, incluindo:

a) o diagnóstico precoce, ainda que não definitivo;

b) o atendimento multiprofissional;

c) a nutrição adequada e a terapia nutricional; d) os medicamentos;

e) informações que auxiliem no diagnóstico e no tratamento;

IV - o acesso:

a) à educação e ao ensino profissionalizante;

b) à moradia, inclusive à residência protegida;

c) ao mercado de trabalho;

d) à previdência social e à assistência social.

Parágrafo único. Em casos de comprovada necessidade, a pessoa com transtorno do espectro autista incluída nas classes comuns de ensino regular, nos termos do inciso IV do art. 2º, terá direito a acompanhante especializado.

 

Os portadores de Transtorno do Espectro Autista também encontram seus direitos assegurados e protegidos na Lei Federal nº 7.853 de 1989, que em seu art. 2º aduz:

 

Art. 2º Ao Poder Público e seus órgãos cabe assegurar às pessoas portadoras de deficiência o pleno exercício de seus direitos básicos, inclusive dos direitos à educação, à saúde, ao trabalho, ao lazer, à previdência social, ao amparo à infância e à maternidade, e de outros que, decorrentes da Constituição e das leis, propiciem seu bem-estar pessoal, social e econômico.

[...]

c) a criação de uma rede de serviços especializados em reabilitação e habilitação;

d) a garantia de acesso das pessoas portadoras de deficiência aos estabelecimentos de saúde públicos e privados, e de seu adequado tratamento neles, sob normas técnicas e padrões de conduta apropriados;

[...]

f) o desenvolvimento de programas de saúde voltados para as pessoas portadoras de deficiência, desenvolvidos com a participação da sociedade e que lhes ensejem a integração social;

 

Em se tratando de saúde, os portadores de TEA, também estão amparados pelo Art. 196 da Constituição Federal, onde diz que “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.

            Ainda se falando em Art. 2º, acima descrito, assegurados pelo princípio da igualdade, que é o que todo devem ser tratados de forma igual perante a lei, sem qualquer tipo de discriminação, devendo ter direito a saúde pública e particular, mas nosso sistema público de saúde não tem suporte necessário e ainda passa por grande dificuldade e está longe de atender a todos os portadores de TEA com uma estrutura adequada, também, não existe ainda uma capacidade boa de servidores com capacidade para tal atendimento.

Não distante, a lei nº 12.764/12, ainda deixa em aberto uma possibilidade aos municípios que são desprovidos de recursos financeiros para que haja a contratação de profissionais que tenham capacidade, que é a forma de realização de convênio com a rede privada de saúde.

            Que é aduzido em seu Parágrafo único onde “Para cumprimento das diretrizes de que se trata esse artigo, o poder público poderá firmar contrato de direito público ou convênio com pessoas jurídicas de direito privado”. O que também está assegurado em nossa Constituição Federal, em seu Art. 197, que estabelece que

 

São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado.

 

            Exposto isso, para que se tenham uma efetividade dos direitos assegurados, deve haver a efetiva cobrança do Estado, muito embora, em tese, nem deveria haver necessidade de cobrar, onde, em verdade, o próprio Estado é quem deveria cobrar através do seu poder de polícia e realizar constante fiscalização das atividades que são prestadas por estes entes privados que tem convênio com o mesmo. Tais convênios apresentam vantagens e desvantagens para o Estado. O que se considera como vantagens é a não necessidade de contratação de servidores, flexibilização de locação de gastos e uma ausência de previsão de gastos a longo prazo e como desvantagens, no sentido0 de que o ente da administração pública se torna um dependente de mão de obra terceirizada e não consegue ter aquele controle mais rigoroso de atendimentos.

            Falando em rede privada, a Lei nº 12.764/12, em seu Art. 5º, traz o seguinte “a pessoa com transtorno do espectro autista não será impedida de participar de planos privados de assistência à saúde em razão de sua condição de pessoa com deficiência, conforme dispõe o art. 14 da Lei 9.656, de 3 de junho de 1998”. Perante as empresas responsáveis e os Portadores de Espectro Autista vivem verdadeiras batalhas em relação as empresas que prestam serviços privados à saúde. Pois os planos da rede privada tentam eximir as suas responsabilidades nos custeios dos planos, mesmo tendo respaldo jurídico dos Portadores de Espectro Autista (O DIREITO..., s.d., p.1). Finalizando em questões de saúde, ainda no art. 2º, agora em seu inciso III, traz sobre a atenção integral às necessidades de saúde da pessoa com transtorno do espectro autista, objetivando o diagnóstico precoce, os atendimentos de forma multidisciplinar com equipe formada por diversos profissionais da área de saúde como médicos, fonoaudiólogos, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, psicólogos e assistentes sociais tem direito ainda ao acesso a medicamentos e nutrientes, que é através disto que se conseguem seus tratamentos contínuos.

            Trazendo agora sobre os direitos que os Portadores de Transtornos do Espectro Autista têm enquanto educação, cita-se inicialmente o que se elenca no Art. 54, inciso III, do Estatuto da Criança e Adolescente: “III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino”.

            Como sabido de todos, toda criança e adolescente tem direito a educação, é através desta educação que visa garantir o seu crescimento como pessoa e de uma carreira profissional. Esta educação merece uma melhora robusta para que seja de melhor qualidade e sem qualquer tipo de distinção, para que, com isso, tenhamos não só profissionais melhores, mas questões de tratamento sociais melhores, com crescimento social em questão, como em suas palavras, a autora Cátia Aparecida Frazão (2018, p.1) nos traz o seguinte “Examina-se que o direito ao acesso à educação é um direito social fundamental para a vida do indivíduo, sendo essencial para sua integração na sociedade e seu pleno exercício de cidadania”.

            O Brasil possui o sistema público e privado de educação, onde o serviço público é mantido e prestado pelo estado e o privado é administrado e mantido por pessoa jurídica de direito privado. O surgimento da inclusão escolar fez com que as pessoas portadoras de deficiência tivessem seu direito de acesso à educação assegurado, e que as instituições de ensino não pudessem negar a realização da matrícula, sendo estas instituições obrigadas a prover meios necessários para permanência desses indivíduos em sala de aula, e a ajuda necessária para seu desenvolvimento. O objetivo da inclusão escolar é fazer com que a diversidade seja respeitada entre os cidadãos e que seus direitos não sejam violados, respeitando assim a singularidade de cada indivíduo.

            O que tem se observado é a constante ocorrência da segregação pedagógica onde as instituições de ensino aceitam as pessoas com deficiência por que são obrigadas, porém não oferecem a mínima estrutura para que essa pessoa tenha seu devido acesso ao ambiente escolar, o que torna impossível manter a pessoa com deficiência na escola, um total descaso.

            De se entender desta forma, que os que são portadores de TEA, tem assegurados através da Lei Berenice Piana, não só o seu direito, mas acesso a ter profissionais na educação que seriam mediadores para auxilia-los, com isso as instituições de ensino, não só as públicas, mas também as da rede privada tem o dever de oferecer tais profissionais.

            Frazão (2018) ainda reforça em seu pensamento que não bastam somente direitos aos cidadãos com transtorno do espectro autista, ou seja, vai muito mais além, para que seja efetivamente feito justiça, vejamos, o poder público precisa garantir que essas pessoas tenham seus direitos respeitados, reconhecer que eles fazem parte da sociedade, não bastando apenas fazer campanhas contra atos discriminatórios e sim fazer valer seus direitos sociais fundamentais mudando esse contexto de exclusão do qual a pessoas com Transtorno Espectro Autista fazem parte. Aceitar as diferenças é essencial para constituição de uma sociedade democrática, todas as pessoas têm o direito de participar da constituição de uma sociedade de forma atuante e em condições de igualdade. As garantias da pessoa com Transtorno Espectro Autista estão envolvidas diretamente as prestações positivas do poder público, que deve promover o pleno acesso à educação inclusiva sendo em instituições públicas ou privadas estabelecendo uma justiça social.

            Falado um pouco sobre a educação, podemos citar e falar sobre o direito dos portadores de transtorno do espectro autista em questões de trabalho, pois os mesmos têm direito de exercer seu trabalho dentro das suas aptidões, trazendo com isso, resultados positivos para o empregador, para os familiares e os portadores, que resultam na interação no meio social, que é fundamental na vivência de todos.

            Vejamos o que diz o art. 93 da Lei nº 8.213 de 1991, que aduz que:

 

A empresa com 100 (cem) ou mais empregados está obrigada a preencher de 2% (dois por cento) a 5% (cinco por cento) dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência, habilitadas, na seguinte proporção:

I - até 200 empregados........................................................................2%;

II - de 201 a 500...................................................................................3%;

III - de 501 a 1.000...............................................................................4%;

IV - de 1.001 em diante. .....................................................................5%.

           

            Com tal previsão legal, tem-se uma maior e mais ampla participação dos portadores de transtorno do espectro autista no ingresso ao disputado mercado de trabalho. Ainda relacionado a trabalho, pode-se mencionar que os portadores de TEA, possuem direito ao BPC que é o Benefício de Assistência Continuada, ou também chamado de LOAS, Lei Orgânica da Assistência Social, lembrando que não se trata de uma aposentadoria, tal benefício é muito restrito a pessoas, com previsão legal em seu Art. 20 da Lei nº 8.742 de 1993, onde se decreta que o

 

benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.

 

            Em tal tema, cita-se que a previdência dos portadores de TEA está devidamente amparada na Lei Complementar nº 142/13, citamos o Art. 1º e 2º, que aduz: Art. 1o Esta Lei Complementar regulamenta a concessão de aposentadoria da pessoa com deficiência segurada do Regime Geral de Previdência Social - RGPS de que trata o § 1o do art. 201 da Constituição Federal. Art. 2o Para o reconhecimento do direito à aposentadoria de que trata esta Lei Complementar, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.

            Em síntese, podemos finalizar falamos brevemente do direito a assistência social dos portadores de TEA, que “é um direito do cidadão e dever do Estado, prestada independente de contribuição, sendo prevista na Constituição Federal de 1988 e regulamentada pela Lei Orgânica da Assistência Social” (LOAS – Lei 8.742/93) (DIREITOS..., 2011, p. 7).

           

É um direito do cidadão e dever do Estado, prestada independente de contribuição, sendo prevista na Constituição Federal de 1988 e regulamentada pela Lei Orgânica da Assistência Social” (LOAS – Lei 8.742/93). (DIREITOS..., 2011, p. 7).

 

            Feitas tais exposições, em que se tratou dos direitos e proteção dos portadores de transtorno de espectro autista, eles estão amparados por sua lei especial, já mencionada, mas será tratada mais seguramente e ampla a seguir, estamos falando da Lei nº 12.764 de 2012.

 

3.2 A CRIAÇÃO DA LEI Nº 12. 764/2012 – LEI BERENICE PIANA

 

            Em sua origem, faz-se um breve resumo do porquê da Lei em questão levar este nome, Berenice Piana, é uma, uma mulher batalhadora, dentre um dos significados da expressão mãe, a mesma, mãe do garoto Dayan, um autista, foi por ele, que Berenice lutou para que o portador do autismo possuísse uma proteção jurídica em nível nacional.

            Berenice, pioneira em falar sobre o autismo, estudou ainda mais e foi a Brasília procurar algum político que pudesse ajudar nessa causa. Após muitas idas a Brasília um senador a ouviu e convocou a primeira audiência, que teve um público muito expressivo. Depois desse primeiro encontro a luta nunca mais parou, logo em seguida, mais precisamente seis meses depois, Berenice, outras mães e apoiadores protocolaram o projeto de lei (BELIN, 2018).

            A Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno de Espectro Autista (PNPP-TEA), descreve em seu primeiro artigo os sintomas que a pessoa com autismo apresenta, como por exemplo: a dificuldade na interação social, na comunicação e padrões repetitivos e restritivos no comportamento. No parágrafo 2º e 3º do artigo 1º, a lei reconhece a pessoa com transtorno do espectro autista como pessoa com deficiência e estabelece a prioridade da pessoa autista em estabelecimentos públicos e privados.

 

§ 2º A pessoa com transtorno do espectro autista é considerada pessoa com deficiência, para todos os efeitos legais. § 3º Os estabelecimentos públicos e privados referidos na Lei nº 10.048, de 8 de novembro de 2000, poderão valer-se da fita quebra-cabeça, símbolo mundial da conscientização do transtorno do espectro autista, para identificar a prioridade devida às pessoas com transtorno do espectro autista (BRASIL, 2012).

           

            Em tais diretrizes expostas no artigo 1º, tivemos um grande avanço para a população com autismo e seus familiares, pois por muitas vezes eles tiveram o acesso negado em ações de proteção a pessoa com deficiência. Por mais que tivesse explícito a necessidade de uma atenção especial, os autistas não eram reconhecidos como tal (HUGUENIN E ZONZIN, 2014).

            Cita-se também o Art. 2º, que estão aduz:

 

Art. 2º São diretrizes da Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista:

I - a intersetorialidade no desenvolvimento das ações e das políticas e no atendimento à pessoa com transtorno do espectro autista;

II - a participação da comunidade na formulação de políticas públicas voltadas para as pessoas com transtorno do espectro autista e o controle social da sua implantação, acompanhamento e avaliação;

III - a atenção integral às necessidades de saúde da pessoa com transtorno do espectro autista, objetivando o diagnóstico precoce, o atendimento multiprofissional e o acesso a medicamentos e nutrientes; (BRASIL, 2012)

           

            Com a criação da Lei, tem-se um aumento significativo em termos sociais, um avanço por assim dizer, fazendo um comparativo com os direitos dos portadores de TEA, com isso reafirmando concepções que estão presentes na Convenção Internacional sobre Direitos das Pessoas com Deficiência, que foi em nosso ordenamento jurídico brasileiro como à emenda a constituição. Trazendo um alívio em um caminho das famílias dos autistas.

 

Por tratar-se de um fenômeno complexo, de causa ainda desconhecida e de abrangência biopsicossocial, o conhecimento sobre o Transtorno do Espectro do Autismo carece de avanços em pesquisas e estudos sobre a origem, desenvolvimento e prognóstico das pessoas afetadas. É sabido, porém que o desenvolvimento dos autistas varia de pessoa para pessoa, mas que ele pode ser fortemente determinado pelas condições sociais vivenciadas pelas famílias. Nesse contexto, a lei nº 12.764/2012 visa atender as principais reivindicações das famílias com relação ao acesso às informações de qualidade, serviços especializados e acessíveis, apoio aos cuidadores familiares e garantia de direitos de cidadania. Atento. À NOVA LEI e as medidas necessárias ao acesso das pessoas com autismo à saúde, educação e assistência social, o Governo Federal, por meio do Ministério da Saúde (MS), produziu documento técnico intitulado DIRETRIZES DE ATENÇÃO À HABILITAÇÃO/REABILITAÇÃO DAS PESSOAS COM TRANSTORNO DO ESPECTRO DO AUTISMO NO SUS. Este documento traz importante avanço na sua concepção ao reafirmar o direito universal de acesso à saúde dessas pessoas e indicar a importância de ações intersetoriais e articuladas com a Educação e Assistência Social. (CRUZ, s.d., p. 5-6, grifo do autor).

           

            Foi através deste documento mencionado, documento este técnico do Ministério da Saúde que se rendeu uma maior, ainda frágil, atenção das pessoas portadoras de TEA.

 

Envolvendo um conjunto de medidas nos níveis de atenção do SUS a partir da atenção básica, com acesso a orientações sobre a identificação, em bebês, de sinais e sintomas com risco de evolução para Transtorno do Espectro do Autismo; diagnóstico diferencial até três anos; acesso a tratamento e medicamento; atendimento em Habilitação e Reabilitação e cuidados com a saúde mental nos serviços de atendimento psicossocial. Na mesma direção o MEC destaca o direito à educação inclusiva e ao Atendimento Educacional Especializado (AEE) reafirmando o direito à 44 educação em todos os níveis, etapas e modalidades de ensino, em todo o território nacional, bem como, a receber os apoios necessários para o atendimento às necessidades específicas individualizadas ao longo de toda a trajetória escolar. Significa tomar uma série de medidas de capacitação dos professores e gestores; instituição do Plano Individual de Atendimento Educacional Especializado que considere as potencialidades do aluno; a viabilização de recursos educacionais, mediações e estratégias para o acesso à rotina escolar, dentre outras medidas (CRUZ, s.d., p.7-8).

 

            Com isso, afirma-se que ao ser Promulgada, a Lei Berenice Piana, deu oportunidades a estes cidadãos a ter voz e vez, superando seus desafios tendo seus direitos nos três níveis do governo, havendo uma igualdade entre todos, sem qualquer tipo de desumanização. Um verdadeiro avanço para nossa democracia Brasileira (CRUZ, s.d., p.10).

 

 

 

           

 

 

4 COMO VEM SE POSICIONANDO O PODER JUDICIÁRIO ACERCA DAS DEMANDAS ENVOLVENDO OS DIREITOS DOS AUTISTAS E SUAS LEGISLAÇÕES REGULADORAS

 

Hoje em um cenário de incertezas jurídicas diárias, onde entendimentos e jurisprudências perdem seu valor ou validade a quase que a velocidade da luz. Conflito entre instâncias e políticos, tem levantado uma insegurança jurídica jamais vista anteriormente. Mas trazendo ao tema em questão, que é sobre saber como anda o posicionamento do Poder Judiciário em questões que de se trata sobre o autismo, pode-se falar inicialmente sobre um princípio, que é o do livre convencimento motivado, que serve com base, principalmente, para o convencimento dos magistrados em suas decisões. O Código de Processo Civil de 2015, apresenta um modelo processual de precedentes vinculantes que modifica o atual sistema. Além disso, foi retirado do seu âmago a expressão literal que falava do livre convencimento do juiz. A exclusão da expressão “livremente” existente no código de processo civil de 1973 para se referir à forma que o juiz tinha para apreciação das provas, estabelece agora que tal apreciação não pode mais ser feita de forma discricionária, mas com larga fundamentação. A respeito disso, Braga, Didier e Oliveira afirmam (2015, p. 103):

 

Todas as referências ao livre convencimento motivado foram extirpadas do texto do Código. O silêncio é eloquente. O convencimento do julgador deve ser motivado: isso é quando basta para a definição do sistema de valoração da prova pelo juiz adotado pelo CPC-2015.

 

            A busca da verdade não pode prevalecer em detrimento de outras exigências como da segurança jurídica, da isonomia, da estabilidade, além da exigência constitucional de uma duração razoável para o sistema processual.

            Com o atual Código de Processo Civil, mais do que nunca, incumbe ao juiz, ao proferir uma decisão pelo mérito, apontar as razões que formam o seu convencimento racional, discursando sobre seus desfechos em relação à apreciação da prova, para demonstrar que a decisão proferida é a decisão correta para o caso em exame, desde que não seja fruto apenas da sua autossuficiência. Em um sistema de precedentes vinculantes, o magistrado deve seguir o entendimento previamente estabelecido e dado como paradigma, o qual foi resultado de exaustivo debate com direito ao contraditório, portanto, ele não pode decidir conforme a sua consciência apenas.

            Por isso, alguns doutrinadores entendem não haver mais espaço para o princípio do livre convencimento motivado do juiz no atual Código de Processo Civil, mas entende-se que isso não corresponde à verdade como passa-se a demonstrar. Logo, a formação do convencimento do magistrado se dá pela análise das provas em busca da mais aproximada verdade real, para em seguida fazer a subsunção à norma aplicável, que mesmo sendo a ratio decidendi de um precedente vinculante, não haveria a supressão da formação racional do juiz.

            Para se entender melhor tal assertiva, é necessário identificar a finalidade do princípio do livre convencimento motivado do juiz, os seus objetivos. Ressalta-se que, a concepção do referido princípio extirpou a injustiça dos antigos sistemas de valoração da prova, conforme nos ensina Gajardoni (2015, p. 01):

 

[…] o princípio do livre convencimento motivado jamais foi concebido como método de (não) aplicação da lei; como alforria para o juiz julgar o processo como bem entendesse; como se o ordenamento jurídico não fosse o limite. Foi concebido, sim, como antídoto eficaz e necessário para combater os sistemas da prova legal e do livre convencimento puro, suprimidos do ordenamento jurídico brasileiro, como regra geral, desde os tempos coloniais.

 

            Por fim, é de relevância elevada entender que, desde o código processual de 1973, a discricionariedade do juiz não se dava na aplicação da norma, afinal, o juiz sempre foi vinculado à lei, em sentido estrito de norma. Atualmente, e de igual forma, o juiz permanece vinculado aos precedentes judiciais, às súmulas vinculantes, bem como aos princípios e jurisprudência, por exemplo, estando estes institutos incluídos no bojo do sentido amplo da norma jurídica.

            Os autistas demoraram a conquistar direitos, principalmente por não serem considerados pessoas com deficiência e desta forma, foram excluídos da proteção das políticas públicas que as pessoas com deficiência conquistaram com sua militância política, tendo suas formas de assistência reduzidas à solidariedade dos pais e associações. As pessoas com este tipo de transtorno e seus familiares encontram uma sociedade despreparada, sem serviços adequados nas diversas áreas setoriais, como a saúde e educação, com profissionais não capacitados que desconhecem o transtorno gerando desconforto para os sujeitos promovendo a exclusão social.

            Dentro da temática deste capítulo, não se pode deixar de inicialmente falar sobre um termo que é de suma importância, que é “precedente”, por si só nos remete a algo que precede ou que ocorreu anteriormente. Precedente se refere a um caso sentenciado ou uma decisão de um tribunal considerada como modelo, exemplo, ou um paradigma a ser observado para o julgamento de um caso similar ou idêntico, posteriormente surgido. Mais uma vez conforme Welsch (2016, p. 46) citando Didier: “precedente judicial é a decisão dada por um órgão jurisdicional a um caso concreto, cujo núcleo essencial tem o poder de servir como paradigma para posterior julgamento de casos análogos”.

            Desta forma não se confundem os conceitos de jurisprudência com precedente judicial, pois a jurisprudência possui maior extensão, inicialmente, como ciência do Direito, e mais atualmente como reiteradas decisões análogas proferidas pelos tribunais. Nesse sentido mais atual, a jurisprudência seria formada pela sequência de utilização de um mesmo precedente. Assim, segundo Roque Antônio Carrazza (2009, p. 35), o precedente é: “um julgado individual que, somado a outros, pode, ou não, formar jurisprudência”.

            Também há diferença a ser considerada entre precedentes e súmulas, e entre precedentes e súmulas vinculantes. As súmulas são genéricas e abstratas, elas apenas expressam uma correta assertiva jurídica, não apresentando os fatos que levaram à sua criação. Os precedentes, por sua vez, carregam a tese jurídica sempre relacionada com as razões de fato do paradigma para confrontar com o caso julgado. Já as súmulas vinculantes, mesmo tendo a semelhante força obrigatória dos precedentes, é o resumo de vários julgados pretéritos, não criando nova regra jurídica, mas apenas aplicando o entendimento pacificado sobre uma norma existente (WELSCH, 2016).

            Igualmente, ainda segundo Welsch (2016), há diferenças entre os precedentes judiciais e a coisa julgada, pois, enquanto essa traz segurança jurídica para a parte, os precedentes conferem essa segurança para todos os jurisdicionados. A coisa julgada confere inalterabilidade ao conteúdo da sentença nos limites do referido processo, enquanto os precedentes dão força aos fundamentos da decisão para serem considerados em julgamentos futuros.

            Vencidas essas questões, é relevante esclarecer que a formação do precedente é exclusivamente a razão de decidir do julgado, ou seja, a sua ratio decidendi. Em sumo, os fundamentos que dão sustentabilidade a uma decisão é que podem ser invocados em posteriores julgamentos. As circunstâncias de fato, basilares da lide, as quais fizeram parte do processo não têm o poder de tornar obrigatória ou sugestiva a referida norma para o caso especificado. E mais, os mesmos decorrem de um conjunto de julgados semelhantes, e não de um caso específico. Tratando sobre a formação dos precedentes, tem-se os dizeres de Koehler (2016, p. 331):

 

Os precedentes não são formados tão somente para a solução do caso concreto, mas sim de todos os casos em situação análoga, conferindo a todo o sistema, assim, um controle de racionalidade decorrente da regra de universalização. O afastamento da regra de universalização deve ser feito apenas excepcionalmente, e tem que ser fortemente justificado.

 

A partir daí, pode-se falar sobre os posicionamentos dos Tribunais, porque era preciso deixar claro essas diferenças acima mencionadas entre os termos, dentre eles o de precedentes, pois é através de precedentes que se baseiam muitas ações, é a chamada também de “brecha”, ali está contida os caminhos que se podem basear as ações.

            O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, bem como em diversos Tribunais brasileiros, trouxe o tema da Educação Inclusiva, e em destaque, a jurisprudência da Corte Gaúcha, de modo exemplificativo, foi o caso de matéria que trata da inclusão de uma criança com TEA e de forma favorável a esta inclusão, vejamos:

 

AGRAVO INTERNO. ECA. EDUCAÇÃO. ENSINO INFANTIL. VAGA EM ESCOLA PARTICULAR. CASO ESPECÍFICO. DIREITO À EDUCAÇÃO CONSTITUCIONALMENTE ASSEGURADO. LIMINAR CONCEDIDA. CABÍVEL O JULGAMENTO NA FORMA DO ART. 557 DO CPC, EM FACE DO ENTENDIMENTO DA CÂMARA SOBRE A MATÉRIA Constitui dever dos entes públicos assegurar às crianças o acesso à educação cabendo-lhe garantir vaga na rede pública ou, então, na rede privada, às suas expensas, conforme a necessidade da criança. RECURSO DESPROVIDO.         

 

            Também se menciona o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, onde está corte apresentou decisões favoráveis, citando como exemplo, um caso em que temos a ausência da interferência do Poder Público, com isso, provocado por meio de ação civil pública:

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO Execução de sentença proferida nos autos de ação civil pública promovida pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, onde a Fazenda Estadual foi condenada a providenciar unidades especializadas próprias e gratuitas, adequadas ao tratamento educacional de portadores de autismo. Decisão recorrida que determinou que o Estado custeie o tratamento do agravante em instituição particular, no valor de R$2.000,00 por mês, observando que a decisão é válida até que a Fazenda demonstre que já possui entidade conveniada, próxima à residência do autor, que preste o atendimento prescrito pelo médico - Agravante que não indicou outra unidade pública especializada e compatível com as necessidades do agravado, ou mesmo outra unidade privada com valor inferior Direito à saúde consagrado constitucionalmente como direito fundamental da dignidade da pessoa humana (inciso III do art. 1º da CF) - Decisão mantida - Recurso improvido. Relator(a): Maria Laura Tavares Comarca: São Paulo Órgão julgador: 5ª Câmara de Direito Público Data do julgamento: 22/10/2012 Outros números: 192302422012826000028

           

Em breve análise dos mencionados acórdãos, destaca-se o entendimento que os portadores de transtornos de espectros autistas têm o direito à educação. Por outro lado, é louvável perceber que os Tribunais recorrem com mais frequência aos artigos da Constituição do que às normas federais e estaduais para fundamentar suas decisões. Este fato revela a força e o alcance da Constituição Federal de 1988 e corrobora as considerações anteriores, de que esta representou um marco na defesa dos direitos das pessoas portadoras de deficiência. Indica, outrossim, que a argumentação de que tais normas seriam apenas programáticas é totalmente descabida, detendo o intuito de esvaziar a força normativa da Constituição e seu potencial transformador. 

            A respeito do posicionamento do Poder Judiciário, em contrapartida, ainda persiste divergências sobre a aplicação imediata ou não dos direitos fundamentais, dado a visão patrimonialista, esculpidas nos princípios da administração pública, restringindo-se estes direitos à previsão orçamentária e à estrita legalidade. Contudo, o posicionamento cada vez mais dominante é pela aplicação do direito à educação.

            O Poder Judiciário, então, demonstra por meio de suas decisões o cumprimento da filosofia do Estado Social, ao passo que se preocupa com desigualdades materiais e com o estabelecimento de condições para vencê-las, dentro da comunidade políticas, com fim específico: o desenvolvimento nacional sustentável.

            Todavia, se mostra plenamente legitima a atuação judiciaria, pois, se trata de interferência legitima de um poder sobre outro, buscando compeli-lo a promover os atos já fixados como sendo de sua competência, quanto a esse fato ensina CARMONA (2015, p. 281):

 

De outra parte, o controle judicial da atividade da administração pública não macula o princípio constitucional da separação de poderes. O referido princípio não pode ser empregado para justificar a burla à constituição federal e para contrariar o interesse público. A propósito, convém esclarecer que não se trata de ativismo judicial. Ao contrário, ativista é a constituição federal de 1988, que, dentre diversos exemplos afirmou que “as normas definidoras de direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata” (§1º, art. 5º). O poder judiciário tão somente está dando efetividade aquilo que a carta magna prescreveu com todas as letras. Nesse ponto, anui-se completamente com as ideias propostas pelo Prof. Carlos Ayres Britto.

 

            Seguindo o entendimento ora exarado, o Supremo Tribunal Federal, definiu:

 

EMENTA: ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL. A QUESTÃO DA LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DO CONTROLE E DA INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO EM TEMA DE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS, QUANDO CONFIGURADA HIPÓTESE DE ABUSIVIDADE GOVERNAMENTAL. DIMENSÃO POLÍTICA DA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL ATRIBUÍDA AO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. INOPONIBILIDADE DO ARBÍTRIO ESTATAL À EFETIVAÇÃO DOS DIREITOS SOCIAIS, ECONÔMICOS E CULTURAIS. CARÁCTER RELATIVO DA LIBERDADE DE CONFORMAÇÃO DO LEGISLADOR. CONSIDERAÇÕES EM TORNO DA CLÁUSULA DA ‘RESERVA DO POSSÍVEL’. NECESSIDADE DE PRESERVAÇÃO, EM FAVOR DOS INDIVÍDUOS, DA INTEGRIDADE E DA INTANGIBILIDADE DO NÚCLEO CONSUBSTANCIADOR DO ‘MÍNIMO EXISTENCIAL’. VIABILIDADE INSTRUMENTAL DA ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO NO PROCESSO DE CONCRETIZAÇÃO DAS LIBERDADES POSITIVAS (DIREITOS CONSTITUCIONAIS DE SEGUNDA GERAÇÃO.

 

            Quanto as políticas públicas educacionais, o mesmo direcionamento vem sendo empregado pelos tribunais pátrios. No que tange, ao acompanhamento especializado, a jurisprudência tem entendido no sentido de deferir de maneira complementar à educação regular. Nesse sentido, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais tem demonstrado as consequências oriundas das violações dos direitos dos autistas:

 

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PUBLICA. MENOR COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA. PROFESSOR DE APOIO. POSSIBILIDADE. PRINCIPIO DO MELHOR INTERESSE DO MENOR EDUCAÇÃO. DIREITO CONSTITUCIONAL. POLITICA NACIONAL DE EDUCAÇÃO ESPECIAL. SISTEMA EDUCACIONAL INCLUSIVO. LIMINAR. PRESENÇA DOS PRESSUPOSTOS ATINENTES À MEDIDA MULTA COMINATORIA. CABIMENTO. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. INOBSERVANCIA. ADEQUAÇÃO. PROVIMENTO PARCIAL. A educação especial passou a ser oferecida como serviço complementar à escolaridade regular e não mais em caráter substitutivo. Deve o estado adotar as medidas cabíveis a viabilizar o acompanhamento da menor, por profissional de apoio a inclusão pelo tempo integral que permanecer no ambiente escolar, verificando-se que sua negativa poderá ocasionar graves danos à educação escolar do menor, além de perigo a sua integridade física, moral e mental, ocorrendo, pois o denominado perigo de dano inverso.

 

            Nesse contexto, ao refletir sobre a procura do poder judiciário, muitas vezes como único meio, para que se cumpra e atenda às necessidades dos portadores de TEA, observa-se uma realidade cruel, no qual existe um desinteresse velado, quanto a inserção do autista no meio educacional e social.

            Porquanto, verifica-se que o poder judiciário, surge como alternativa, para compor os conflitos envoltos na realidade dos autistas, assim o que se vislumbra é um cenário ainda meio utópico, no qual a sociedade de forma mais ativa e abrangente acolhendo os deficientes de forma geral, sem discriminações ou alegações de impossibilidades de sanar suas necessidades, uma realidade como a imaginada por LIMA (2006, p. 27):

 

A forma como a sociedade interage com as pessoas com deficiência se modificou e vem se transformando ao longo da história. Muitos forma consideradas incapazes, inválidos, inferiores, antes que fossem vistos como cidadãos de direitos e deveres [...], somente com a modificação da sociedade propiciada pela interação com as pessoas com deficiência, é que se pode vislumbrar uma sociedade mais fraterna e cooperativa.

 

            Falado sobre o entendimento do Poder Judiciário resumidamente, verifica-se, sobre questões de saúde, um gargalo enfrentado diariamente pelos portadores e seus familiares, principalmente em questões de planos de saúde por temos um quantitativo de demandas em nosso Brasil, pode-se notar que o entendimento tem sido o de determinar que as operadoras de saúde forneçam aos indivíduos com TEA o tratamento prescrito pelos médicos, conforme se observa a seguir:

 

Ação de obrigação de fazer. Plano de saúde. Tutela antecipada. Negativa de terapia ocupacional. Autora portadora de autismo. Demonstrada a relevância dos fundamentos da demanda e o receio de ineficácia do provimento final, conforme preconizado no artigo 497 do CPC, deve-se deferir a tutela específica, procedendo o julgador a avaliação, segundo critérios de cautela e prudência, dos interesses em conflito. Necessidade de resguardar o direito à vida. Escolha do tratamento que deve ser feita pelo médico que assiste a beneficiária e não pelo plano de saúde. Decisão mantida. Recurso improvido.

(Agravo de Instrumento 2166113-51.2016.8.26.0000; Relator (a): José Joaquim dos Santos; Órgão Julgador: 2ª Câmara de Direito Privado; Data do Julgamento: 13/12/2016). [Grifo nosso].

 

            Em um caso sobre o tratamento de Análise Aplicada do Comportamento, em que consiste em ensinar para o indivíduo autista inicialmente habilidades básicas como sentar, realizar contato visual, imitar, esperar sua vez, para depois ensinar situações de grupo e pedagógicas. Para isso, o profissional deve preparar o ambiente de forma que novas habilidades possam ser ensinadas, ou seja, o ambiente deve ser isento de ruído, interrupções e objetos que possam nesse primeiro momento distrair a criança. Cabe ao profissional, também, identificar as relações funcionais existentes entre os comportamentos inadequados, repertório do indivíduo e possíveis reforçadores que garantirão que os comportamentos ensinados façam parte do repertório da criança (BRAGA-KENYON, KENYON E COLS, 2005).

            Por ser um método específico, é corriqueiro que as operadoras de saúde da rede privada não disponham profissionais conveniados em sua rede. Desse modo, os indivíduos com TEA acabam arcando com as despesas fora do plano de saúde. Sobre esse tema, as decisões têm sido no sentido de compelir as operadoras de saúde a custear o tratamento fora de sua rede, conforme é demonstrado a seguir:

 

Plano de saúde – Autor portador de transtorno do espectro autista (CID10 – F 84.0) – Necessidade de assistência especializada consistente em psicologia e fonoaudiologia pelo método A.B.A. – Tratamento indisponível pelo plano de saúde – Ausência de locais credenciados para prestar o atendimento prescrito – Reembolso integral dos valores gastos com o tratamento de forma particular – Sentença mantida– Recurso não provido.

(Apelação 1126085-83.2015.8.26.0100; Relator(a): Luis Mario Galbetti; Órgão Julgador: 7ª Câmara de Direito Privado; Data do Julgamento:19/12/2016). [Grifo nosso].

 

            Houve alguns processos em que o sucesso se deu em favor dos planos de saúde quando se tratava da cobertura de tratamento psicopedagógico, porém ainda não está definida a jurisprudência no TJSP, tendo em vista a decisão a seguir que foi favorável ao consumidor:

 

TUTELA ANTECIPADA – Plano de saúde – Decisão que deferiu liminar para compelir a ré ao custeio de tratamento ocupacional de reabilitação e de estimulação cognitiva necessitada pelo autor, portador de autismo infantil – Urgência no tratamento indicado e especificação da sua duração e periodicidade demonstradas - Tratamento que, embora ocupacional e psicopedagógico, está ligado à patologia, presumivelmente não excluída pelo contrato, não podendo, a princípio, ser negado o seu custeio – Presentes os requisitos legais – Recurso desprovido.

(Agravo de Instrumento 2118448-39.2016.8.26.0000; Relator(a): Rui Cascaldi; Órgão Julgador: 1ª Câmara de Direito Privado; Data do Julgamento: 28/11/2016).

 

            Por mais que a ANS não siga a mesma linha de raciocínio da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, o Poder Judiciário age em conformidade com a mesma e representa um importante aliado aos indivíduos com TEA.

            Analisando a jurisprudência, é possível concluir que na maioria dos casos as decisões judiciais são proferidas em favor dos consumidores com Transtorno do Espectro Autista, por conta disso, é de suma importância que os responsáveis pelos mesmos busquem o Poder Judiciário para que seus direitos sejam de fato respeitados. Sendo assim, as operadoras privadas de saúde sofrem reprimendas na medida em que adotam condutas discriminatórias e/ou abusivas e, são compelidas a cumprirem adequadamente o disposto na legislação, sob pena de serem sancionadas.

            Em relação as legislações reguladoras, já muito dito em todo este trabalho, os portadores de TEA tem seus direitos, assegurados na Constituição Federativa do Brasil, bem como em leis especificas, onde cita-se, como por exemplo, a Lei que dispõe sobre o apoio às pessoas que são portadoras de deficiência, integração social e sobre interesses coletivos ou difusos, garantindo o tratamento adequado em estabelecimentos públicos e privados específicos.

            A Lei 8.899/94, concede passe livre às pessoas portadoras de deficiência no sistema de transporte coletivo interestadual. O passe livre é valido para transporte interestadual convencional público por ônibus, trem ou barca/balsa.

            A prioridade de atendimento às pessoas com deficiência encontra-se assegurada na Lei 10.048/00, conforme determina o art. 1º:

 

Art. 1º As pessoas com deficiência, os idosos com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos, as gestantes, as lactantes, as pessoas com crianças de colo e os obesos terão atendimento prioritário, nos termos desta Lei.

 

Destaca-se, ainda que a Lei 10.098/00 estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida:

 

Art. 1º Esta Lei estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, mediante a supressão de barreiras e de obstáculos nas vias e espaços públicos, no mobiliário urbano, na construção e reforma de edifícios e nos meios de transporte e de comunicação.

 

            Enquanto a Lei 13.370/2016, em seu preambulo altera:

 

§ 3º do art. 98 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, para estender o direito a horário especial ao servidor público federal que tenha cônjuge, filho ou dependente com deficiência de qualquer natureza e para revogar a exigência de compensação de horário.

 

            No qual pode ser reduzida a jornada de trabalho de servidores públicos com filhos autistas. Sem que haja qualquer tipo de compensação ou redução do salário dos funcionários públicos. Dispondo sobre a educação especial e o atendimento educacional especializado, determina o Decreto 7.611/2011, o que segue:

 

Art. 2º A educação especial deve garantir os serviços de apoio especializado voltado a eliminar as barreiras que possam obstruir o processo de escolarização de estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação.

§ 1º Para fins deste Decreto, os serviços de que trata o caput serão denominados atendimento educacional especializado, compreendido como o conjunto de atividades, recursos de acessibilidade e pedagógicos organizados institucional e continuamente, prestado das seguintes formas:

I - complementar à formação dos estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento, como apoio permanente e limitado no tempo e na frequência dos estudantes às salas de recursos multifuncionais; ou

II - suplementar à formação de estudantes com altas habilidades ou superdotação.

§ 2º O atendimento educacional especializado deve integrar a proposta pedagógica da escola, envolver a participação da família para garantir pleno acesso e participação dos estudantes, atender às necessidades específicas das pessoas público-alvo da educação especial, e ser realizado em articulação com as demais políticas públicas.

 

            A criação da Carteira de Identificação da Pessoa com transtorno do Espectro Autista, deu-se com a entrada em vigor da Lei 13.977/20. Conforme expressa no artigo:

 

Art. 3º-A. É criada a Carteira de Identificação da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (Ciptea), com vistas a garantir atenção integral, pronto atendimento e prioridade no atendimento e no acesso aos serviços públicos e privados, em especial nas áreas de saúde, educação e assistência social.

§ 1º A Ciptea será expedida pelos órgãos responsáveis pela execução da Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, mediante requerimento, acompanhado de relatório médico, com indicação do código da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID)

[...] § 2º Nos casos em que a pessoa com transtorno do espectro autista seja imigrante detentor de visto temporário ou de autorização de residência, residente fronteiriço ou solicitante de refúgio, deverá ser apresentada a Cédula de Identidade de Estrangeiro (CIE), a Carteira de Registro Nacional Migratório (CRNM) ou o Documento Provisório de Registro Nacional Migratório (DPRNM), com validade em todo o território nacional. [...]

§ 4º Até que seja implementado o disposto no caput deste artigo, os órgãos responsáveis pela execução da Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista deverão trabalhar em conjunto com os respectivos responsáveis pela emissão de documentos de identificação, para que sejam incluídas as necessárias informações sobre o transtorno do espectro autista no Registro Geral (RG) ou, se estrangeiro, na Carteira de Registro Nacional Migratório (CRNM) ou na Cédula de Identidade de Estrangeiro (CIE), válidos em todo o território nacional.

 

            No sentido de suma importância para identificação dos autistas, para diminuição do preconceito nos lugares em que frequentam e precisam de atendimento prioritários, como na saúde, educação, ou qualquer lugar assegurado por lei. Devendo ser renovadas a cada cinco anos. Assim melhorando sua qualidade de vida. Ainda, destaca-se que a Lei 16.756/18 da assembleia legislativa de São Paulo, dispõe sobre o dever de inserção do símbolo mundial da conscientização sobre o Transtorno do Espectro Autista - TEA nas placas de atendimento prioritário. Além dessas leis citadas acima, o Brasil ratificou algumas normas internacionais, como por exemplo, a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.

            Não se pode deixar de citar que em consonância com os direitos acima citados, existem ainda, a aplicabilidade, no que couber quanto aos previstos no Estatuto da Criança e Adolescente (Lei 8069/90) e na melhor idade, ou seja, maiores de 60 anos têm os direitos do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/2003).

Portanto, o que se vê é que, apesar do Brasil ter passado a se preocupar tarde com as questões relativas aos direitos dos deficientes, tem-se que as legislações aprovadas e em vigor, apesar de lançar de forma ampla e satisfatória os direitos, não possuem, na maioria das vezes, sua aplicabilidade automática, havendo a necessidade de intervenção judicial para se fazer valer aqueles direitos previstos em lei.

Com isso, os julgadores, utilizando-se do princípio do livre convencimento motivado, além de analisar a causa sob o aspecto científico (laudos médicos e exames) as necessidades dos autores, verifica também questões sociais, as quais, aliadas à permissibilidade jurídica completam as decisões, que em sua larga maioria têm sido favoráveis aos autores.

 

 

 

5  CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

O presente trabalho teve como principal objetivo compreender o que é o autismo sob o aspecto médico e, sobretudo, sob a ótica jurídica, destacando a importância da educação como método de inclusão e de abrandamento das sequelas sociais do autismo, uma vez que através da educação é possível promover a inclusão social, bem como, a interação social com outras pessoas.

Através da educação é possível propiciar o desenvolvimento cognitivo através da realização de inúmeras atividades estudantis comuns à outras crianças, como também, especificas em relação aos autistas, fazendo com que a criança desenvolva, aprenda e aplique esse conhecimento na vida cotidiana. 

Buscou-se estudar as reações familiares ao diagnóstico do autismo tendo em vista que a aceitação familiar é a porta de entrada para uma inclusão sócio educacional. Com isso, viu-se que a família, sobretudo os pais, exercem papel fundamental no desenvolvimento dessa pessoa.

Não só com a aceitação propriamente dita, pois simplesmente não relegar ao desprezo a pessoa com deficiente não é o suficiente. É preciso um engajamento na melhoria da qualidade de vida dessas pessoas, na busca de ajuda profissional, no uso adequado das terapias corretas, na socialização com outras pessoas, no estudo para melhorar o direcionamento a ser dado dentro de casa no seu cotidiano. É preciso que a família estude, se informe e aplique as orientações recebidas para uma melhoria na qualidade de vida dessa pessoa.

Esse engajamento resultará em um maior conhecimento sobre os direitos da pessoa autista e/ou deficiente, fazendo com que se obtenha interesse e coragem na busca da efetivação desses direitos.

Na verdade, os maiores causadores da chamada “evasão judicial”, quando alguém deixa de buscar um direito, está ligado ao medo de se buscar o provimento judicial, o famoso “medo de mexer com justiça”, e isso é causado pela desinformação, sobretudo, dos direitos previsto em lei. Na verdade, as famílias responsáveis por essas pessoas passam por muitas dificuldades desde a dor do diagnóstico, na falta de atendimento especializado e, sobretudo, nas incertezas quanto ao futuro. Sob esse aspecto, é muito importante a atuação correta de um profissional (advogado) preparado e fiel aos princípios da boa-fé no atendimento às famílias.

Nesse mesmo sentido, concluiu-se que para uma concreta integração e inclusão da pessoa com autismo no meio social é necessário um trabalho com objetivo de informar a população, a como lidar com essas pessoas especiais, e assim mitigar o preconceito, por isso, diversos municípios Brasil afora vem apresentado projetos de lei que visam instituir semana de conscientização autista, promovendo, através do Poder Público um período anual em que são promovidas palestras e distribuição de materiais e cartilhas objetivando levar conhecimento a população sobre o autismo, direitos, deveres e legislações.

 Verificou-se que a integração social das pessoas autistas depende da criação, aplicação e eficácia de políticas públicas, para garantir aos autistas acessos aos serviços de educação, inserção no trabalho, lazer e saúde.

Durante a pesquisa do tema foram encontradas diversas legislações que garantem direitos aos autistas, mas que nem sempre tem sua eficácia e efetivação plena, configurando realmente um processo lento de conquistas de espaços na sociedade sem sombra de dúvidas.

Em verdade, os direitos e prerrogativas de um cidadão não portador de TEA são os mesmos para os autistas, entretanto, os autistas possuem características e peculiaridades próprias, necessitando de atenção especial em algumas situações.

Nesse passo, foram trazidas diversas legislações que protegem a pessoa com deficiência, além de legislações específicas relacionadas à pessoa com autismo, dentre elas, um estudo mais aprofundado da legislação de maior relevância à essa gama de pessoas, que é a Lei Berenice Piana (lei nº 12.764/2012), fazendo uma explanação sobre a equiparação do autista ao deficiente, mostrando que sob esse entendimento, os direitos dos autistas passam a ter uma maior abrangência.

Por fim, após a análise das legislações em apreço, através do método de pesquisa de casos reais, foram trazidos alguns julgados onde foi observado quais as espécies de demandas comumente ajuizadas.

Observou-se que as ações geralmente ajuizadas são relativas à cobertura de plano de saúde, o direito à matrícula escolar, o cumprimento da lei no sentido de que as escolas tenham um atendente terapêutico em sala de aula a fim de auxiliar o aluno com TEA, sendo que foi notado que o judiciário vem se posicionando, em sua larga maioria, de modo favorável aos autores que buscam a tutela jurisdicional com o objetivo de ver seus direitos reconhecidos.

É certo que o Brasil ainda precisa melhorar muito nas políticas e legislações voltadas a garantir a inclusão e direitos em sua plenitude aos autistas, mas certo que avanços constantes são verificados e o mais importante, o olhar voltado para essas pessoas, o que motiva o Estado a promover a inclusão e, por consequência, qualidade de vida a essas pessoas.

     

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

 

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Referências

STEFANIA MARTINIELLE XAVIER BARROS

TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA: DO RECONHECIMENTO À PROTEÇÃO JURÍDICA DAS PESSOAS PORTADORAS DE TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA; 2021; Trabalho de Conclusão de Curso; (Graduação em Direito) - Faculdade de Ciências Humanas do Sertão Central; Orientador: Luize Êmile Cardoso Guimarães;


Stefania Martinielle

Bacharel em Direito - Salgueiro, PE


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