Em regra, a doutrina e a jurisprudência entendem que a responsabilidade civil do médico é de natureza contratual, podendo apresentar-se, em determinadas ocasiões como de natureza extracontratual.
Na Responsabilidade Civil Contratual, o próprio nome já sugere, decorre de um contrato existente entre as partes. Assim, se um dos contratantes comprovar os quatro elementos da responsabilidade civil (ação ou omissão, somados à culpa ou dolo, nexo causal e o dano) em relação ao outro contratante, decorrente desse vínculo jurídico (contrato), incorrerá na Responsabilidade Civil Contratual.
Já na Responsabilidade Civil Extracontratual, também conhecida como aquiliana, não há vínculo contratual com a vítima, mas há um vínculo decorrente da lei, em caso de descumprimento de um dever legal. O agente por ação ou omissão, causa um dano à vítima, com culpa ou dolo, estabelecendo-se um elo (nexo de causalidade) entre a conduta culposa ou dolosa e o dano.
Se, a partir da conduta do médico, sobrevier um dano causado ou provocado no paciente decorrente de ação ou omissão daquele, resultante de negligência, imprudência ou imperícia (sem a intenção de produzi-lo), estará caracterizado o erro médico.
O erro médico é uma das causas mais comuns de judicialização.
Assim, a conduta culposa do médico será punível quando caracterizada a negligência, imprudência ou imperícia.
Imperícia é a incapacidade, falta de conhecimentos técnicos no exercício da profissão, tendo como premissa que o agente causador do dano age sem possuir determinado conhecimento ou habilidade que necessariamente deveria ter. Por exemplo: Médico que realiza cirurgia plástica estética, sem possuir essa especialidade
Imprudência - Ato ou dito imprudente. A imprudência é um fato isolado, caracterizado pela ausência do devido cuidado em uma ação.
Por exemplo: o cirurgião que resolve operar sozinho sem o auxiliar.
Negligência - É a ausência de cuidado razoável exigido, é a omissão da conduta esperada e recomendável. O profissional da saúde não adota os devidos cuidados para proceder em determinado ato e, em razão dessa falha ou ausência do dever de cuidado, causa um dano ao paciente.
Por exemplo, o enfermeiro que não ministrou o remédio do paciente no horário, omitindo inconsequentemente, de não informar ao médico assistente.
Para configurar a Responsabilidade Civil, não é necessário que o profissional agiu com intenção de causar dano, basta apenas que tenha atuado com negligência, imprudência ou imperícia, inescusáveis.
Na esfera jurídica, a Responsabilidade é considerada como a obrigação de reparar prejuízo causado a outrem.
“A responsabilidade civil do médico em nosso sistema exige, necessariamente, a comprovação de erro médico, fruto da conduta culposa do médico, qualificada pelo atributo da negligência, imperícia e imprudência.
Além de tudo isso, é preciso não esquecer que, além de se tratar de obrigação de meio, o elementar nexo de causalidade deverá conectar de maneira fundamental e imprescindível, a conduta do médico e o suposto erro médico[1]”.
Tendo atuado com as devidas cautelas, e conforme prescreve o Código de Ética Médica, informando sobre os possíveis desdobramentos da atuação (Termo de Consentimento informado) e, conforme determina os padrões de procedimento profissional, melhores práticas, não há que se falar em dever de Responsabilidade do Profissional.
Segundo o Código Civil, in verbis:
“Art. 186. Aquele que por ação ou omissão voluntário, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente Moral, comete ato ilícito”.
“Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”.
“Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem fica obrigado a repará-lo”.
A título de curiosidade, já no Código de Hamurabi, há previsões que chamam a atenção sobre o tema obrigacional:
§ 218. Se um médico trata alguém de uma grave ferida com a lanceta de bronze e o mata ou lhe abre uma incisão com a lanceta de bronze e o olho fica perdido, se lhe deverão cortar as mãos.
§ 219. Se o médico trata o escravo de um liberto de uma ferida grave com a lanceta de bronze e o mata, deverá dar escravo por escravo.
§ 220. Se ele abriu a sua incisão com a lanceta de bronze o olho fica perdido, deverá pagar metade do seu preço.
Conforme mencionado acima, para caracterizar o dever de Responsabilidade, é necessário que estejam presentes no caso, os 4 elementos essenciais que configuram a Responsabilidade subjetiva – ação ou omissão, culpa, nexo causal e o resultado (dano).
A teoria da responsabilidade civil integra o direito obrigacional, pois a principal consequência de um ato ilícito é a obrigação que acarreta, para seu autor, de reparar o dano.
Contudo, há situações em que é possível afastar o nexo de causalidade para desconfigurar o dever de responsabilizar. São eles:
- Fato de Terceiro;
- Culpa exclusiva da vítima;
- Caso fortuito ou força maior; e,
- Informação.
Afastando-se o nexo de causalidade, por uma dessas possibilidades acima, entre a conduta culposa e o dano causado, exclui-se o dever de indenizar.
São deveres de conduta do médico – o dever de informação; dever de atualização; dever de vigilância e de cuidado e o dever de abstenção do abuso.
È importante mencionar que nem todo resultado adverso na assistência à saúde é sinônimo de erro médico, sendo necessário distinguir o erro médico de acidente imprevisível e de resultado incontrolável.
“O erro médico, quase sempre por culpa, forma de conduta profissional inadequada que supõe uma inobservância técnica.
No acidente imprevisível há um resultado lesivo, supostamente oriundo de caso fortuito ou força maior, à integridade física ou psíquica do paciente durante o ato médico ou em face dele.
Já o resultado incontrolável, seria aquele decorrente de uma situação grave e de curso inexorável, ou proveniente de sua própria evolução, para o qual as condições atuais da ciência e a capacidade profissional ainda não oferece solução[2]”.
Convém ainda, mencionar sobre a iatrogenia, que seria o dano causado ao paciente, decorrente de forma inafastável, da atuação correta do profissional.
O termo deriva do grego e significa de origem médica, e pode-se aplicar tanto a efeitos bons ou maus.
“As lesões supervenientes ao exercício da natural e regular atividade do médico afastam a responsabilidade civil do médico, desde que se tenha observado o livre consentimento informado, isto é, desde que o médico tenha previamente ao advento do tratamento terapêutico, prestado informações claras e precisas sobre todas as consequências, riscos e manifestações inerentes ao tratamento médico[3]”.
Daí a importância do Termo de Consentimento Informado, para que o profissional possa se resguardar de uma eventual responsabilização, que deriva do dever de informação do profissional, conforme prevê o CDC e o Código Civil.
Nesse sentido, segundo de Maria Helena Diniz:
“A boa-fé subjetiva é atinente ao dato de se desconhecer algum vício do negócio jurídico. E a boa-fé objetiva, prevista no artigo sub examine, é alusiva a um padrão comportamental a ser seguido baseado na lealdade e na probidade (integridade de caráter), proibindo o comportamento contraditório, impedindo o exercício abusivo de direito por parte dos contratantes, no cumprimento não só da obrigação principal, mas também das acessórias, inclusive do dever de informar, de colaborar e de atuação diligente (2014, p. 418)”
[1] Ana Claudia Silva Scalquette e Carlos Eduardo Nicoletti Camillo – Direito e Medicina – Novas Fronteiras da Ciência Jurídica, Ed. Gen, 2015, p. 82
[2] Genival Veloso de França – Direito Médico, Ed. Gen, 15ª ed., Revista e Atualizada, p. 276
[3] Ana Claudia Silva Scalquette e Carlos Eduardo Nicoletti Camillo – Direito e Medicina – Novas Fronteiras da Ciência Jurídica, Ed. Gen, 2015, p.87