Antes de entrar no tema propriamente dito, primeiro temos que conhecer mais a fundo o que diz o art. 13, §1º do Código Penal que diz:
Art. 13. O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem o qual o resultado não teria ocorrido.
A doutrina adotou a regra da teoria da equivalência dos antecedentes causais, num conceito bem simples e de fácil intelecção significa dizer que tudo o que influencia no evento concreto criminoso e que porventura gera um resultado é causa. Rogerio Sanches Cunha de maneira brilhante explica em poucas linhas o art. 13 “caput” do CP da seguinte maneira:
“em suma, tudo o que contribui, in concreto, para o resultado, é causa” (p. 51)
É nítido racionar que a teoria da equivalência dos antecedentes causais analisa todas as hipóteses que porventura possa influenciar no resultado danoso e se isso influencia no resultado naturalístico do crime é causa.
E como se analisa através da teoria da equivalência dos antecedentes causais? A doutrina munida em resolver esse impasse, pois o art. 13 “caput” do Código Penal carece de um detalhamento de informações, ou seja, o próprio art. 13 do diploma repressivo mais atrapalha do que ajuda com relação ao entendimento. A doutrina percebendo a falta de informações do art. 13 do CP criou um método de eliminação hipotética que ao analisar um determinado caso concreto, mentalmente você exclui um determinado evento dentro do contexto fático criminoso e com a exclusão desse evento você analisaria se o resultado deu causa a esse evento criminoso. Mais uma vez recorre-se aos ensinamentos do professor Rogério Sanches Cunha que diz:
“para saber se uma determinada conduta é ou não causa do evento, a doutrina criou o método da eliminação hipotética, segundo o qual uma ação é considerada causa do resultado se, suprimida mentalmente do contexto fático, esse mesmo resultado teria deixado de ocorrer (nas circunstâncias em que ocorreu).” (p. 52)
Ainda sobre o tema, Rogério Greco nos ensina também que:
“segundo o professor sueco Thyrén, autor do chamado processo hipotético de eliminação, para considerarmos determinado fato como causa do resultado é preciso que façamos um exercício mental da seguinte maneira:
1. temos de pensar no fato que entendemos como influenciador do resultado;
2. devemos suprimir mentalmente esse fato da cadeia causal;
3. se, como consequência dessa supressão mental, o resultado vier a se modificar, é sinal de que o fato suprimido mentalmente deve ser considerado como causa deste resultado.” (p. 328)
O art. 13 “caput” do Código Penal tenta nos explicar é que a teoria da equivalência dos antecedentes causais, adotada inclusive pelo Código Penal, analisa todos os fatos que antecederam o referido resultado, e também, analisa se são indispensáveis para a ocorrência do resultado. Todavia tal teoria de Von Buri tem um “calcanhar de Aquiles”, pois ao se analisar um determinado caso concreto utilizando dessa teoria o interprete pode cair no “regresso ao infinito”, em linhas gerais, se o interprete ao utilizar dessa teoria frente a um caso concreto e se ele for regredindo...regredindo...regredindo...provavelmente ele chegará nos tempos de “Adão e Eva”.
A teoria da equivalência dos antecedentes causais traz no seu bojo uma relação completamente independente, pois analisa-se precipuamente o resultado e se esse resultado deu causa ou não.
Tínhamos que comentar meio que resumidamente o entendimento do art. 13 “caput” do CP, agora passamos a analisar o contexto inserido no parágrafo primeiro do art. 13 do Diploma repressor, que diz:
Art. 13, §1º. CP. A superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando, por si só, produziu o resultado; os fatos anteriores, entretanto, imputam-se a quem os praticou.
O parágrafo primeiro transcrito acima, trabalha com a teoria da causalidade adequada elaborada pelo Von Kries, pelo estudo da referida teoria evidencia-se que a causa é condição importante, necessária e adequada para produção do evento (acontecimento), ou seja, a causa que é elemento essencial da teoria da causalidade adequada dentro do contexto fático precisa ser relevante, isto é uma causa sem relevância não condiz com essa teoria. Faço as palavras do professor Rogério Greco ao dizer que:
“a teoria da relevância entende como causa a condição relevante para o resultado.” (p. 326)
Chega a ser um tanto óbvio a referida teoria, mas a causa dentro da teoria da causalidade adequada tem que se mostrar relevante, já que a demonstração da relevância é que gera o resultado. O parágrafo primeiro do referido artigo trabalha também com as concausas independentes. Rogério Sanches Cunha nos ensina que:
“o assunto relativo ao nexo causal ganha ainda mais importância quando se verifica que o resultado não é efeito de um só comportamento, representando produto final de uma associação de fatores, em que a conduta do agente, não obstante apareça como principal elemento desencadeante, não é o único. Assim identificados quais antecedentes podem figurar como causa dentro de uma linha de eventos que se sucedem, nota-se que, no caso concreto, é possível haja mais de uma causa concorrendo para o resultado (concausa)” (p. 53)
Para entendermos melhor as concausas, segue um pequeno resumo a respeito do tema:
a. causa absolutamente independente: não tem origem na conduta. Ela produz o resultado mesmo se não tivesse acontecido outra conduta. E ela se subdivide em preexistente (antes), concomitante (durante) e superveniente (depois);
b. causa relativamente independente: aqui há uma origem na conduta do agente. Nas causas relativamente a produção do resultado tem que ser analisada conjuntamente com a conduta do agente. Não poderia ser diferente ela também se subdivide em preexistente (antes), concomitante (durante) e superveniente (depois).
Não poderíamos responder a seguinte indagação do trabalho sem antes fazer todo esse pequeno arcabouço teórico, agora sim! O que a expressão “por si só” significa? reescrevendo novamente o que diz o art. 13, §1º do Código Penal:
Art. 13. (...)
§1º. A superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando, por si só, produziu o resultado; os fatos anteriores, entretanto, imputam-se a quem os praticou. (grifo nosso)
O termo destacado significa que só se chegará a um resultado se a ação desse resultado fez parte da linha ou do contexto natural da ação. Ou seja, quando a ação gera um resultado o agente só responde se no contexto do desdobramento da ação essa ação teve alguma relevância, para ilustrarmos melhor o tema segue um exemplo extraído da obra do professor Rogério Greco: João querendo a morte de Pedro, efetua contra ele certeiros disparos. Pedro é socorrido por uma ambulância, que o conduz ao hospital. Durante o trajeto, a ambulância se vê envolvida num acidente de trânsito, vindo Pedro a falecer em virtude da colisão. Raciocinemos: se Pedro não tivesse sido ferido por João, não teria sido colocado na ambulância e, consequentemente, não teria falecido em razão da colisão dos veículos. Em virtude disso, deverá João responder pelo crime de homicídio doloso consumado? A resposta, de acordo com o §1º do art. 13 do Código Penal, só pode ser negativa. Isso porque a morte de Pedro não se encontrava na chamada linha de desdobramento físico da conduta praticada por João. Como podemos chegar a essa conclusão? Indagando o seguinte: será que aquele que recebe disparos de arma de fogo morre preso entre os veículos que colidem? Não. Esta forma de morte não se inclui como desdobramento natural de quem é alvejado por projéteis de pistola.
A jurisprudência do STJ de maneira bem didática explica através de um julgado a interpretação do termo “por si só”:
“o fato de a vítima ter falecido no hospital em decorrência das lesões sofridas, ainda que se alegue eventual omissão no atendimento médico, encontra-se inserido no desdobramento físico do ato de atentar contra a vida da vítima, não caracterizando constrangimento ilegal a responsabilidade criminal por homicídio consumado, em respeito à teoria da equivalência dos antecedentes causais adotada no Código Penal e diante da comprovação o animus necandi do agente” (STJ, HC 42559/PE, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 5ª Turma DJ 24/04/2006, p. 420)
O que se pretende dizer é que o agente só responderá se esse ato estiver na mesma linha de desdobramento natural da conduta inicial do agente, ou seja, se aparecer uma causa superveniente, essa causa precisa ser muito bem analisada e comparada com a conduta inicial do agente, se o resultado foge do desdobramento natural da conduta do agente, automaticamente, ele não vai responder por essa conduta, e sim só responderá pelo seu dolo.
Para que o entendimento sobre o tema seja de fácil compreensão trago uma importante passagem do professor Rogério Greco sobre esse tema bastante desafiador, que diz:
“linha de desdobramento físico e significância da lesão – como vimos, para que se possamos atribuir o resultado ao agente é preciso que este esteja na mesma linha de desdobramento físico da ação. Assim, se alguém é ferido com um instrumento cortante e, devido ao tratamento inadequado que recebe, contrai tétano e vem a falecer, temos, pelo menos inicialmente, que o tétano é um desdobramento natural da lesão.” (p. 335)