OS DIREITOS DOS PARLAMENTARES E SEUS ASPECTOS PENAIS


07/04/2022 às 17h41
Por Hugo Leandro dos Santos Barreira

1.    Introdução

A presente e breve obra tem o condão apenas de informar os direitos e deveres dos parlamentares federais, expondo tanto a Constituição Federal como também Regimentos Internos e Códigos de Decoro Parlamentar. Também mostra-se a preocupação com os aspectos processuais penais onde mostramos que o parlamentar pode responder a certos crimes, mas também possui imunidades contra outros crimes previstos no código penal.

2.        Estatuto do Congressistas.

Estamos presenciando um debate com relação as últimas decisões do STF acerca das Imunidades dos Parlamentares Federais, isto é da Câmara Federal e do Senado Federal. Primeiramente antes de adentrar ao tema, precisa-se conhecer onde estão os direitos dos parlamentares na Constituição Federal, vamos a ela.

Na seção V da Constituição Federal podemos encontrar direitos e deveres dos parlamentares federais, os artigos correspondentes a esse assunto estão nos dispositivos que vão dos artigos 53 a 56 da Constituição Federal.

A par disso, seria importante também estabelecer uma pequena diferença entra as imunidades que os congressistas têm quando são diplomados, as imunidades são: formal e material. As imunidades materiais estão devidamente descritas no artigo 53 do Constituição Federal que diz:

Os Deputados e Senadores são invioláveis civil, e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos.

O citado artigo acima que inclusive é de fácil intelecção preconiza que os Parlamentares no gozo e no exercício de suas funções são imunes a determinados crimes tipificados no código penal, tais como: injúrias e difamações, todavia merece atenção que não cabe o parlamentar munido desta imunidade abusar de tal direito se não estiver exercendo sua função de parlamentar, com relação ao tema é importante os ensinamentos dos Mestres Celso Spitzcovsky e Leda Pereira Mota na sua obra Curso de Direito Constitucional:

“O dispositivo descaracteriza a figura delituosa que sequer chega a existir, se as opiniões, palavras e votos tiverem sido emitidos no desempenho do mandato parlamentar.

Em outro dizer, as opiniões, palavras e votos por eles proferidos no exercício de sua função excluem, pois, a caracterização, por exemplo, dos crimes contra a honra, capitulados no Código Penal, como Calúnia, Injúria e difamação.” (p. 174)

 A imunidade material como podemos perceber “protege” o(a) parlamentar de que no exercício de sua função de parlamentar possa responder por esses crimes, contudo o parlamentar não está isento de sofrer as sanções previstas no CP, já que há crimes que mesmo o parlamentar tendo essa imunidade material ele responderá por esse determinado crime, só que essa análise será feita no item oportuno.

Outra imunidade que o(a) parlamentar tem é a imunidade formal ou como a doutrina chama de imunidade processual, essa imunidade está descrita no artigo 53, §2º da Constituição Federal, que diz:

Desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável. Nesse caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva, para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão.

 

Outrossim merece atenção o parágrafo primeiro do mesmo artigo 53 da CF que diz:

§1º. Os Deputados e Senadores, desde a expedição do diploma, serão submetidos a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal.

Percebe-se que o Parlamentar Federal também e submetido a julgamento pela Corte Constitucional, com fuste, também, no artigo 102, I, “b” da Constituição Federal de 1988, não obstante merece atenção que a prisão do(a) parlamentar dar-se-á nas hipóteses de cometimento de crimes inafiançáveis, onde tal explicação será detalhada no item correspondente.

Cabe lembrar que os artigos 53 a 56 da Magna Carta propõem direitos e deveres dos parlamentares, contudo merece atenção dizer que o parlamentar não está sujeito a esses artigos com relação a tanto a seus deveres e quanto os seus direitos no seu exercício de parlamentar, outras leis que estão abaixo da Constituição Federal também tutelam as condutas dos parlamentares, cito aqui o Regimento Interno da Câmara dos deputados e também o Código de Ética do decoro parlamentar.

Passamos agora a uma sucinta análise de alguns aspectos penais dos parlamentares, o(a) parlamentar pode ser preso(a)? Pode usar tornozeleira eletrônica?

3.    Aspectos penais sobre as condutas dos Parlamentares Federais

Agora que já se sabe a diferença entre as imunidades formais (processuais) e materiais, passamos agora a analisar alguns aspectos criminais sobre as condutas dos parlamentares frente a sua atuação como Deputado(a). Um parlamentar somente será preso se caso ele cometer um crime inafiançável em flagrante delito, ou seja, nos demais crimes onde a conduta criminosa for um crime afiançável o parlamentar não pode ser preso, todavia não que ele não possa responder por essa conduta no código de ética e decoro parlamentar, isto é o parlamentar é punido não só pelo Regimento Interno como também pelo Decoro Parlamentar, onde se vê que para condutas criminosas afiançáveis o parlamentar sofrerá as sanções previstas tanto do Regimento Interno quanto também pelo Código de Ética e Decoro Parlamentar.

Voltando aos crimes inafiançáveis em flagrante delito, onde o parlamentar sofrerá as sanções do cárcere, o(a) Deputado(a) serão presos se cometerem os crimes previstos na Constituição Federal que diz:

XLII. a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da Lei;

XLIII. a lei considerará crimes inafiançáveis e insusceptíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que podendo evitá-los, se omitirem;

XLIV. constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado democrático de direito.

O flagrante delito que está tutelado no artigo 301 e seguintes do código de processo penal são hipóteses onde o parlamentar poderá ser preso em virtude do cometimento dos crimes ditos inafiançáveis, ou seja, para crimes afiançáveis o parlamentar responderá com base no regimento interno da Câmara dos Deputados combinado com o Código de Ética e Decoro Parlamentar. Logo o que pode-se concluir é que o parlamentar não poderá sofrer com a perda do seu mandato se cometer crimes afiançáveis, isto é se o parlamentar não cometer nenhum dos crimes previstos na CF/88 nos seus incisos XLII, XLIII e XLIV do artigo 5º ele não poderá perder seu mandato automaticamente. O Regimento Interno da Câmara dos Deputados preconiza as hipóteses de perda do mandato nas seguintes situações:

Capítulo VI. Do regime de tramitação

Art. 151. Quanto à natureza de sua tramitação podem ser:

I.  Urgentes as proposições:

b. Sobre as suspensões das imunidades de Deputados, na vigência do Estado de Sítio ou de sua prorrogação  

 

Seção II

Das Modalidades e processos de votação

Art. 188. A votação por escrutínio secreto far-se-á pelo sistema eletrônico, nos termos do artigo precedente, apurando-se apenas os nomes e o resultado final, nos seguintes casos:

I.  Deliberação, durante o estado de sitio, sobre a suspensão de imunidades de deputados, nas condições previstas no §8º do artigo 53 da Constituição Federal de 88;

IV. no caso de pronunciamento sobre a perda de mandato de deputado ou suspensão das imunidades constitucionais dos membros da Casa durante o estado de sítio.

Ainda no cotejo do Regimento Interno da Câmara dos Deputados o regimento reforça que o deputado não poderá ser preso em virtude de suas opiniões, palavras e votos e muito menos serem presos, tudo isso com o devido respeito aos artigos 231, §1º e 2º que dizem:

No exercício do mandato, o Deputado atenderá às prescrições constitucionais e regimentais e às contidas no código de ética e decoro parlamentar, sujeitando-se às medidas disciplinares nelas previstas.

§1º. Os deputados são invioláveis por suas opiniões, palavras e votos.

§2º. Desde a expedição do diploma, os deputados não poderão ser presos, salvo em flagrante delito de crime inafiançável.

Feitas as devidas considerações percebemos que o deputado não pode ser preso por crimes afiançáveis, sua prisão só ocorrerá nas hipóteses de crimes inafiançáveis em flagrante delito.

Um deputado ou deputada poderá sofrer medidas cautelares diversas da prisão? Poderá um(a) parlamentar sofrer as regras da tornozeleira eletrônica?

Para entender o que é o Monitoramento eletrônico precisamos saber onde está inserida tal medida. O Monitoramento eletrônico está descrito no artigo 319, IX do Código de Processo Penal. A medida diversa da prisão tem o condão de tentar que o indivíduo que está sofrendo uma investigação criminal possa responder por essa conduta em liberdade, só que, e se o agente detém o cargo de Deputado Federal ? A resposta é depende, já que é nítido que estamos vivendo a era do ativismo judicial, onde o que pode para um não pode para outro e vice – versa, ou seja, o judiciário pode impor aos parlamentares medidas cautelares do art. 319 do CPP, no entanto, cabe a respectiva casa legislativa poderá rejeitar tais medidas, cite-se uma jurisprudência sobre o tema:

CONSTITUCIONAL E PROCESSO PENAL. INAPLICABILIDADE DE PRISÃO PREVENTIVA PREVISTA NO ARTIGO 312 DO CPP AOS PARLAMENTARES FEDERAIS QUE, DESDE A EXPEDIÇÃO DO DIPLOMA, SOMENTE PODERÃO SER PRESOS EM FLAGRANTE DELITO POR CRIME INAFIANÇAVEL. COMPETÊNCIA PLENA DO PODER JUDICIÁRIO PARA IMPOSIÇÃO DAS MEDIDAS CAUTELARES PREVISTAS NO ARTIGO 319 DO CPP AOS PARLAMENTARES, TANTO EM SUBSTITUIÇÃO A PRISÃO EM FLAGRANTE DELITO POR CRIME INAFIANÇÁVEL, QUANTO EM GRAVES E EXCEPCIONAIS CIRCUNSTANCIAS. INCIDÊNCIA DO §2º, DO ARTIGO 53 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL SEMPRE QUE AS MEDIDAS APLICADAS IMPOSSIBILITEM, DIRETA OU INDIRETAMENTE, O PLENO E REGULAR EXERCÍCIO DO MANDATO PARLAMENTAR. AÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE.
(ADI 5526, Relator(a): Min. EDSON FACHIN, Relator(a) p/ Acórdão: Min. ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 11/10/2017, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-159 DIVULG 06-08-2018 PUBLIC 07-08-2018)

4.    Conclusão

                 A breve obra teve o condão apenas de informar onde estão inseridos as imunidades parlamentares de deputados e senadores, como o tema está acalorado com as últimas decisões do STF, é de bom alvitre localizar os referidos dispositivos e sanar algumas dúvidas. Discorremos mesmo que sucintamente as diferenças entre as imunidades formais e materiais, falamos um pouco sobre os crimes afiançáveis e inafiançáveis e por fim expomos sobre o uso ou não da tornozeleira eletrônica.

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Referências

ALENCAR, Rosmar Rodrigues. TAVORA, Nestor. Curso de direito processual penal. Editora JusPODVIM. 11ªedição. 2016

AZIZ, Tamine. Estatuto dos Congressistas. Disponível no site www.cadernodatata.com.br/estatuto-dos-congressistas. Acessado no dia 31/03/2022

BADARÓ, Gustavo. Processo Penal. Editora Elsevier. 2012.

CORREIA, Martha. Vade Mecum de Direito Internacional e Direitos Humanos. Editora JusPODVIM. 2020.

Regimento Interno da Câmara dos Deputados. Disponível no site https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/legislacao/regimento-interno-da-camara-dos-deputados. Acessado no dia 31/03/2022

MOTA, Leda Pereira. SPITZCOVSKY, Celso. Curso de Direito Constitucional. Editora Damásio de Jesus. 2004


Hugo Leandro dos Santos Barreira

Advogado - Belém, PA


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