- Dirigir sem habilitação nem sempre configura crime. Entenda quando o art. 309 do CTB exige prova de perigo concreto e como a jurisprudência recente do TJDFT protege o cidadão contra condenações penais baseadas em presunções
Introdução: infração administrativa e crime de trânsito não se confundem
No âmbito do direito penal de trânsito, é essencial compreender que nem toda conduta irregular ao volante configura crime. O sistema jurídico brasileiro estabelece uma distinção clara entre infrações administrativas, que possuem caráter educativo e sancionatório, e os crimes de trânsito, que exigem um grau mais elevado de ofensividade.
Essa diferenciação decorre do princípio da intervenção mínima do direito penal, segundo o qual a atuação punitiva do Estado deve ocorrer apenas quando outros ramos do direito se mostram insuficientes para a proteção do bem jurídico. Assim, para que haja responsabilização criminal, não basta a mera violação de normas administrativas, sendo indispensável a demonstração de perigo concreto e efetivo à segurança viária.
A relevância prática da discussão sobre o art. 309 do Código de Trânsito Brasileiro
Na prática forense, é recorrente a instauração de processos criminais contra motoristas que conduzem veículo sem habilitação, como se essa circunstância, por si só, fosse suficiente para caracterizar crime. Essa interpretação equivocada gera insegurança jurídica e expõe cidadãos a acusações penais desproporcionais, com impactos diretos em sua vida pessoal, profissional e social.
Muitos motoristas desconhecem que o artigo 309 do Código de Trânsito Brasileiro não pune automaticamente a ausência de CNH, mas condiciona a tipicidade penal à comprovação de perigo real de dano, o que torna a análise do caso concreto absolutamente indispensável.
O entendimento firmado pela Segunda Turma Recursal do TJDFT
Esse novo paradigma jurisprudencial foi reafirmado pela Segunda Turma Recursal do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, no julgamento do processo nº 0700454-55.2023.8.07.0003. Na ocasião, o Ministério Público interpôs apelação contra sentença absolutória, sustentando que a condução de veículo sem habilitação, aliada a supostas manobras arriscadas, seria suficiente para configurar o crime previsto no art. 309 do CTB.
O Tribunal, contudo, manteve a absolvição, reconhecendo que o conjunto probatório era insuficiente para demonstrar a existência de perigo concreto de dano, elemento indispensável para a configuração do tipo penal.
A exigência de perigo concreto como elemento do tipo penal
Ao examinar os autos, o colegiado destacou que o crime de dirigir sem habilitação é classificado como delito de perigo concreto, o que exige prova efetiva da probabilidade de dano a terceiros. Não se admite, nesse contexto, o perigo presumido ou abstrato.
No caso analisado, os depoimentos dos policiais apresentaram divergências relevantes quanto à dinâmica dos fatos, não houve indicação objetiva da velocidade permitida na via, tampouco comprovação de que outros veículos ou pedestres tenham sido efetivamente expostos a risco. Diante dessa fragilidade probatória, prevaleceu o entendimento de que não é possível sustentar uma condenação criminal.
Consonância com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça
A decisão do TJDFT está em plena sintonia com a jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça, que reiteradamente afirma ser imprescindível a demonstração de condução anormal e risco concreto para a configuração do crime do art. 309 do CTB.
O simples fato de o condutor ser inabilitado não autoriza, por si só, a intervenção penal. Esse posicionamento reforça princípios constitucionais fundamentais, como a presunção de inocência e o in dubio pro reo, impedindo que o direito penal seja utilizado como instrumento automático de repressão.
Impactos práticos para o cidadão acusado de crime de trânsito
Do ponto de vista do cidadão, essa compreensão traz maior segurança jurídica e esclarece uma dúvida frequente: dirigir sem habilitação, em regra, gera consequências administrativas, como multa e apreensão do veículo, mas somente se transforma em crime quando há prova clara de risco efetivo à coletividade.
Além disso, o acórdão evidencia que o depoimento policial, embora relevante, não é absoluto e deve ser coerente, consistente e corroborado por outros elementos probatórios. Na ausência desses requisitos, a absolvição é medida que se impõe.
Conclusão: a importância da defesa técnica em crimes de trânsito
A decisão analisada representa um importante avanço na contenção de acusações penais baseadas em presunções, reafirmando que o direito penal deve ser aplicado com cautela e responsabilidade. Para quem responde a processo por crime de trânsito, especialmente nos casos envolvendo o art. 309 do CTB, a atuação de um advogado criminalista experiente é fundamental para a correta análise das provas e para a garantia dos direitos fundamentais.
Se você ou alguém próximo enfrenta acusação por dirigir sem habilitação ou outro crime de trânsito, o escritório Nascimento & Peixoto Advogados está preparado para avaliar o caso à luz da jurisprudência mais atual e oferecer uma defesa técnica e estratégica. Entre em contato e agende uma análise jurídica do seu caso.
Em caso de dúvidas envie um e-mail para nascimentopeixotoadvogados@gmail.com, entre em contato através do nosso Site ou pelo telefone e WhatsApp (61)99266-4446.
