- Decisão do TJDFT reconhece o direito de paciente com câncer ao reembolso e à indenização por negativa de criopreservação, reforçando a proteção do consumidor e o acesso a tratamentos médicos essenciais
Conceitos e relevância do tema
A criopreservação, também conhecida como congelamento de óvulos ou embriões, é um procedimento médico destinado a preservar a fertilidade de pacientes que serão submetidos a tratamentos potencialmente esterilizantes, como a quimioterapia e a radioterapia. Trata-se de uma técnica moderna e amplamente reconhecida pela medicina reprodutiva como essencial para assegurar o direito ao planejamento familiar e à autonomia reprodutiva, especialmente em casos de doenças graves.
No contexto jurídico, o tema se insere no campo do direito do consumidor e do direito à saúde, áreas em que os tribunais brasileiros têm enfrentado, com crescente frequência, a resistência de planos de saúde em custear procedimentos indispensáveis à manutenção da dignidade e da qualidade de vida do paciente. Essa discussão ganha relevância diante da necessidade de harmonizar os contratos de saúde suplementar com os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da boa-fé objetiva e da função social do contrato, fundamentos que têm orientado a evolução da jurisprudência e a consolidação de precedentes favoráveis ao consumidor.
O caso analisado pelo TJDFT
Em meio aos desafios enfrentados por pacientes diagnosticados com câncer, a negativa de custeio de tratamentos essenciais pelos planos de saúde representa um obstáculo doloroso e injusto. Entre as situações mais delicadas está a recusa de procedimentos de criopreservação, técnica que permite preservar a fertilidade de pacientes submetidos a terapias oncológicas. Esse tema ganhou nova dimensão com recente decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), que reafirmou a proteção ao consumidor e fixou indenização por dano moral decorrente da negativa indevida de cobertura.
O caso envolveu uma paciente diagnosticada com câncer de colo do útero, cujo médico recomendou a realização urgente da criopreservação antes do início da quimioterapia, com o objetivo de evitar a infertilidade. O plano de saúde, entretanto, recusou o custeio sob o argumento de que o procedimento não constava no rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). A consumidora custeou o tratamento por conta própria e buscou o reembolso das despesas, além da compensação por danos morais. A sentença de primeira instância reconheceu o direito, decisão mantida integralmente pelo TJDFT no Acórdão nº 1987286, relatado pelo Desembargador Álvaro Ciarlini, julgado em 02 de abril de 2025.
Os fundamentos da decisão judicial
Ao examinar o recurso, o Tribunal destacou que o contrato de plano de saúde está sujeito às normas do Código de Defesa do Consumidor, conforme dispõe a Súmula 608 do Superior Tribunal de Justiça. Essa aplicação reforça o dever das operadoras de garantir um serviço adequado, eficaz e contínuo, respeitando o princípio da boa-fé e o direito à saúde previsto no artigo 6º, inciso I, do CDC e no artigo 196 da Constituição Federal. O acórdão também explicou que, embora o rol da ANS tenha natureza taxativa, o próprio STJ, ao julgar o Tema 1.067, reconheceu hipóteses excepcionais em que o tratamento fora do rol deve ser custeado, desde que haja comprovação científica de eficácia, recomendação médica fundamentada e inexistência de alternativa terapêutica equivalente.
No caso concreto, o laudo médico comprovou a urgência e a necessidade do procedimento para garantir o direito reprodutivo da paciente, enquadrando-se nas exceções previstas pela jurisprudência superior. O TJDFT ressaltou que a relativização da força obrigatória dos contratos é imprescindível quando a negativa de cobertura compromete a dignidade e a saúde do consumidor. Assim, afastou-se a interpretação rígida das cláusulas contratuais e determinou o reembolso integral das despesas com a criopreservação. Além disso, a Corte reconheceu que a recusa injustificada do plano causou abalo psicológico relevante, configurando dano moral in re ipsa, isto é, presumido pela simples ocorrência da negativa ilícita.
A importância da decisão e seus reflexos práticos
A decisão representa um marco no reconhecimento do direito à maternidade e ao planejamento familiar como parte da integridade física e emocional da mulher em tratamento oncológico. O Tribunal enfatizou que a paciente não precisava demonstrar sofrimento específico, bastando comprovar a conduta abusiva do plano. Fixou-se indenização de R$ 10.000,00, com base no método bifásico de cálculo adotado pelo STJ, valor considerado proporcional à gravidade do ato e às finalidades punitiva e reparatória da condenação.
Essa jurisprudência consolida a ideia de que o direito do consumidor em planos de saúde deve ser interpretado à luz da função social do contrato e do dever de solidariedade na saúde suplementar. A negativa de cobertura de tratamento prescrito por profissional habilitado não pode se sobrepor à urgência médica nem à dignidade do paciente. Mesmo em face do rol taxativo da ANS, os tribunais vêm reconhecendo que o médico, e não a operadora, é quem detém a legitimidade técnica para definir o tratamento mais adequado ao caso concreto. Negar esse direito é violar o núcleo essencial do direito à vida e à saúde.
Proteção ao consumidor e efetividade do direito à saúde
Muitos consumidores ainda têm dúvidas sobre quando é possível exigir o custeio ou reembolso de procedimentos não previstos pela ANS. A resposta, consolidada pelo STJ e aplicada pelo TJDFT, é clara: sempre que o tratamento for comprovadamente necessário, eficaz e recomendado por médico especialista, a negativa de cobertura é indevida e pode gerar indenização por danos morais. Isso se aplica a terapias inovadoras, medicamentos de alto custo e procedimentos de preservação de fertilidade, desde que haja respaldo técnico e urgência clínica.
A decisão do TJDFT reforça o novo paradigma jurisprudencial que coloca o paciente no centro da relação contratual, limitando práticas abusivas e ampliando a efetividade do direito à saúde e à reparação integral do consumidor. Mais do que uma vitória individual, trata-se de precedente que deve orientar a atuação judicial e administrativa em casos semelhantes, estimulando o respeito à autonomia médica e ao direito reprodutivo de pacientes oncológicos.
Conclusão e orientação ao consumidor
Quando o plano de saúde nega cobertura a um tratamento essencial, o consumidor não está desamparado. A via judicial tem se mostrado um instrumento eficaz para garantir não apenas o custeio imediato do procedimento, mas também a reparação pelos danos sofridos. Cada situação exige análise técnica e estratégica específica, motivo pelo qual é fundamental buscar orientação jurídica especializada.
Se você teve um tratamento negado pelo seu plano de saúde ou precisou arcar com despesas médicas indevidas, entre em contato com nossa equipe. O escritório Nascimento & Peixoto Advogados atua na defesa dos direitos dos consumidores e possui ampla experiência em ações contra planos de saúde, assegurando que a justiça prevaleça e seu direito à saúde seja plenamente respeitado.
Em caso de dúvidas envie um e-mail para nascimentopeixotoadvogados@gmail.com, entre em contato através do nosso Site ou pelo telefone e WhatsApp (61)99266-4446.
