Direitos humanos são só para os criminosos?


26/01/2017 às 09h45
Por André Arnaldo Pereira

Muito se comenta, principalmente nas redes sociais, que as entidades voltadas para a defesa de direitos humanos tenham apenas interesse nos marginais e criminosos. A ideia também consegue grande apoio da área mais conservadora da sociedade, ou seja, por parte de pessoas que não toleram a possibilidade de as classes populares serem detentoras dos mesmos direitos que elas possuem.

Antes de tudo, é preciso entender a ideia da universalidade dos direitos humanos, o que determina que todas as pessoas, independentemente de sua condição, seja racial, econômica, social ou mesmo criminal, possuem seus direitos. A Declaração Universal dos Direitos Humanos, promulgada em 1948 pela Organização das Nações Unidas, estabelece que qualquer ser humano possui os mesmos direitos, mesmo que seja um criminoso.

Se formos olhar por esse ângulo, direitos humanos são também direitos de criminosos, mas devemos entender que essa afirmação deve ser usada dentro do contexto adequado.

Na maior parte das vezes, a afirmação é aplicada de forma inconsistente, falaciosa, buscando forjar uma ideia errônea de que entidades de direitos humanos apenas se preocupam com os direitos de presidiários e de suspeitos, não atendendo da mesma maneira os demais membros de uma comunidade.

Onde surgiu a ideia de direitos humanos só para os criminosos?

A ideia equivocada sobre os direitos humanos voltados mais para criminosos do que para pessoas honestas e trabalhadoras passou a ser difundida ainda durante o período de Ditadura Militar, quando pessoas que defendiam os que estavam sendo ameaçados pelo regime militar, ou defendendo perseguidos ou presos pelos aparelhos repressores, eram rotulados como defensores de bandidos.

A ideia continuou mesmo depois da redemocratização do país, não apenas tentando deslegitimar métodos democráticos de combate à criminalidade, como também para garantir impunidade, uma vez que a própria polícia teve papel de destaque na repressão política da época, utilizando algumas práticas de investigação não tão democráticas que, infelizmente, ainda continuam em alguns lugares.

Como a ideia também consegue apoio por parte da ala conservadora da sociedade, intolerante com relação à possibilidade de os direitos serem estendidos a qualquer pessoa, a mesma noção continua a ser difundida, não considerando que toda e qualquer pessoa detém os mesmos direitos, seja ela pobre ou rica, negra ou branca, hetero ou homossexual.

O que é preciso entender é que a defesa da dignidade de pessoas que se encontram prisioneiras por qualquer delito ou prática criminosa, deve ser vista como uma regra, o que não significa que uma pessoa defensora de direitos humanos seja a favor do crime ou do bandido.

Devemos ainda considerar que uma das principais bandeiras dos militantes de direitos humanos tem sido a luta contra a impunidade que, por sinal, beneficia atualmente humanos que se consideram com mais direitos do que os normais, mantendo o que se conhece como foro privilegiado.

O movimento de direitos humanos não está apenas preocupado com a situação dos presídios brasileiros, possuindo uma agenda muito mais ampla, incluindo questões como a exclusão social, o racismo, o trabalho infantil, o direito à terra e à moradia, direito à saúde, questões de desigualdade de gênero, educação e outros.

Sob esse ponto de vista, é natural que organizações de direitos humanos deem maior atenção àqueles que precisam de proteção em razão de se encontrarem em posição de maior fragilidade dentro da sociedade.

A partir do momento em que o ser humano se tornar capaz de agir em relação ao outro do mesmo jeito que gostaria que agisse em relação a si próprio, estaremos em condições de considerar que os direitos humanos estão sendo respeitados.

Os direitos humanos não são apenas direitos de bandidos ou criminosos. O que é preciso entender que não podemos assumir a proposição de que algumas pessoas têm mais valor e outras menos e que todas devem ser respeitadas dentro de suas condições.

  • direitos humanos

André Arnaldo Pereira

Advogado - Santa Rosa, RS


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