Luciano Gomes de Queiroz Coutinho, promotor de Justiça que atua no Ministério Público do Estado na cidade de Piracicaba, interior de São Paulo, está levantando uma questão polêmica no meio jurídico. O promotor requereu ao juiz Wander Pereira Rossete Júnior, da Vara da Fazenda Pública de Piracicaba, informações sobre todas as ações que eventualmente forem ajuizadas por presos com pedidos de indenização financeira em face das péssimas condições carcerárias em que se encontram nos presídios brasileiros.
A iniciativa de Luciano Coutinho teve como base a decisão do Supremo Tribunal Federal de que os presos devem ser indenizados por danos morais por estarem cumprindo pena em penitenciárias caóticas, sob péssimas condições de higiene, marcadas pela brutalidade e superlotadas. Em sua petição ao juiz da Fazenda, o promotor assinala que o artigo 39 da Lei de Execuções Penais estabelece como dever do condenado “comportamento disciplinado e cumprimento fiel da sentença”, havendo ainda a obrigação de “indenizar sua vítima ou seus sucessores”.
A lei brasileira prevê a indenização das vítimas
O Direito brasileiro é um herdeiro do direito europeu, da mesma forma que boa parte do direito latino-americano. Conforme estabelece a legislação, o condenado é obrigado a reparar o dano causado pela prática de qualquer ato ilícito e isto está previsto também no artigo 927 do Código Civil.
No entanto, considerando-se o fato de que a maior parte dos criminosos têm sua origem em camadas marginalizadas da sociedade. O direito, que a vítima possui em ter uma reparação ou uma indenização em decorrência dos danos causados a si próprio ou no caso de sucessores vitimados por atos de criminosos, não é assegurado na maior parte dos casos. Tendo em vista as condições socioeconômicas do condenado, a vítima é quem arca com todos os prejuízos, físicos e morais, provocados por qualquer criminoso.
Diante da impossibilidade de se obrigar o criminoso ou praticante de ato ilícito em reparar o dano causado, o Direito se mostra desigual e inadequado, uma vez que o mesmo Direito que pune o condenado por seu ato ilícito, também é o direito que pune a vítima, que não tem o seu dano reparado e que pouco está se importando de que forma o criminoso que atentou contra si ou seu patrimônio está sendo condenado.
Evidentemente, é certo que o conforto que a condenação oferece para a sociedade, retirando do seu meio um criminoso, apresentando-se a Justiça como fiel cumpridora das leis, protegendo a sociedade e mantendo o controle sobre atos que possam ser cometidos contra qualquer cidadão. No entanto, ao se analisar a vítima de forma individual, é ela quem acaba tempo uma perda irreparável do bem jurídico lesado, podendo ser seu patrimônio, sua vida ou mesmo sua dignidade, uma vez que essa perda não é reparada e os danos cometidos não são devidamente indenizados, como a própria lei prevê.
Não se trata apenas da indenização das vítimas nos casos de condenação. Os jornais, muitas vezes, noticiam os crimes cometidos por presos beneficiados com a saída temporária e o tema tem se tornado bastante relevante, também trazendo à baila a discussão da sociedade com relação ao benefício e suas consequências.
O promotor e suas sugestões
No seu requerimento, o promotor Luciano Coutinho afirma que “apesar da regra legal, é fato notório que a grande maioria dos condenados pela prática de crimes não indeniza vítimas ou sucessores, nem paga integralmente as multas e prestações pecuniárias inseridas em suas condenações criminais, como deveriam”. E continua: “e considerando que significativa parcela dos autores de delitos não possui patrimônio regularmente declarado em seu nome, os aludidos débitos raramente são quitados e as ações judiciais voltadas para esse fim quase sempre têm resultado infrutífero”.
Em seu requerimento, o promotor citou a decisão do Supremo que, “por ser bastante recente, ainda não é possível saber quais serão os impactos desse precedente. Todavia, é razoável supor que ações de indenização por dano moral contra o Estado ajuizadas por detentos poderão se multiplicar por todo o país”.
Luciano Coutinho segue: “Saliento, ainda, que cabe ao Ministério Público zelar pelo correto cumprimento das penas impostas pelo Poder Judiciário em suas condenações criminais. Compete, também, ao Ministério Público a missão de defender a sociedade e amparar as vítimas de crimes, bem como seus familiares”.
Com esse pedido, o promotor considera necessário que o Ministério Público tome o conhecimento das eventuais demandas por indenização movidas contra o Estado, servindo as mesmas como pagamentos a autores de delitos que não tenham ressarcido suas vítimas ou cumprido com as obrigações de suas condenações criminais.
Dessa forma, segundo o promotor, será possível ao Ministério Público tomar as providências para assegurar que as quantias que serão pagas aos condenados sejam usadas para o cumprimento das obrigações previstas na lei, em vez de serem disponibilizadas para os autores dos crimes.