Assim que instaurou a ditadura, em 1937, Getúlio Vargas publicou o Decreto-Lei n° 88 que criava o Tribunal de Segurança Nacional, que julgava os crimes contra o Estado e contra a economia popular, introduzindo na legislação a prisão sem o trânsito em julgado da condenação e transferindo para o acusado a obrigação de provar a própria inocência. O artigo 20 era bem explícito: “Presume-se provada a acusação, cabendo ao réu prova em contrário”.
Ao contrário daquela época, a Constituição Brasileira é bastante clara ao não permitir, hoje, a prisão antes do trânsito em julgado. De acordo com juristas, a alteração dessa regra só poderá ser feita através de emenda à Constituição, não havendo, portanto, qualquer tipo de lei que permita a prisão de qualquer condenado em segunda instância, como ocorreu recentemente.
Na semana passada, o plenário do STF discutiu uma questão que está em voga: em duas ações de constitucionalidade, o Conselho da OAB e o PEN – Partido Ecológico Nacional pediam ao tribunal que considerasse constitucional o artigo 283 do CPP, admitindo prisão antes do trânsito em julgado somente como medida processual cautelar.
No caso de essa condição ser considerada constitucional, estaríamos retornando á condição de conceder o direito ao réu de recorrer em liberdade a um terceiro ou quarto julgado pelas instâncias superiores.
Idas e vindas do processo penal
O STF entendia, até 2009, que seria possível a execução provisória da pena já em segunda instância. O tema retornou às manchetes em 2015, em consideração à falta de efetividade da jurisdição criminal e ao aumento de impunidade. Em 2016, novamente em discussão, o STF decidiu que é constitucional permitir a prisão quando o réu for condenado em segunda instância.
Em razão da impunidade, o tema continua sendo polêmico, principalmente por estarmos vivendo um momento único na história, quando tantos condenados em primeira e segunda instância mantém o privilégio de continuar em liberdade, como é o caso de Luiz Estevão, que entrou com mais de 30 recursos por anos e anos, mostrando a fragilidade da legislação e os obscuros caminhos da Justiça brasileira.
Um fato que se percebe é que as instâncias superiores poucas vezes alteram as decisões dos tribunais, não sendo, portanto, admissível argumentar que pode ter havido erro em alguma sentença, incriminando uma pessoa que, presumivelmente, pode comprovar sua inocência.
Contra fatos não há argumentos: de janeiro de 2009 a abril de 2016, apenas 1,1% dos recursos impetrados foi acatado em favor do réu, e isso mostra que o julgamento em segunda instância pode, além de fazer cumprir a lei, também amenizar a opinião pública com relação à impunidade, principalmente dos crimes de corrupção, o foco da mídia e da população nos dias atuais.
A prisão em segunda instância, ao contrário do que se pensa, portanto, não é um retrocesso penal, e sim apenas a punição, trazendo crédito à Justiça brasileira e criando um caminho para um país onde é preciso deixar claro que ninguém está acima da lei.