Prisão em segunda instância: justiça menos desigual para todos


11/10/2016 às 21h10
Por André Arnaldo Pereira

Os recursos aos tribunais superiores só têm um objetivo: resolver eventuais controvérsias jurídicas decorrentes de processos na justiça comum, ou seja, servem para proteger princípios constitucionais.

Os ministros que votaram a favor da prisão após a condenação em segunda instância, seis deles no total, consideraram que o recurso a instâncias superiores tornou-se apenas uma forma de protelar ao máximo a decisão de cumprimento da pena. Com isso, a conclusão é que os recursos atendem apenas a pessoas de classes mais privilegiadas, que podem pagar bons advogados, evitando a aplicação da ordem penal.

Casos como o do jornalista Antonio Pimenta Neves, que assassinou a namorada, Sandra Gomide, por exemplo, que levou onze anos para o cumprimento da pena, mostra bem que a situação torna-se estranha, já que ele havia confessado o assassinato, tinha todas as provas e mesmo, assim, podia pagar advogados para protelar a pena.

Ou um caso como o do ex-senador Luís Estevão, que foi condenado pelo desvio de R$ 169 milhões em 1992 e chegou a apresentar mais de 30 recursos aos tribunais superiores. O processo foi arrastado por 24 anos e apenas em 2016 saiu o trânsito em julgado, levando o condenado à prisão.

Outros casos, como o do ex-jogador Edmundo, que atropelou e matou 3 pessoas, acabam prescrevendo. Edmundo foi condenado em 1999 e, após 21 recursos apresentados em doze anos, não passou uma noite sequer na prisão.

Justiça mais igual para todos

Nesses e em muitos outros casos, a condenação em segunda instância evita a impunidade, com a consequente postergação do cumprimento das penas. A maior parte dos países utiliza o sistema de prisão em primeira ou segunda instância, permitindo ao condenado que se defenda perante tribunais superiores, mas cumprindo sua pena.

O principal argumento dos ministros que votaram contrários à prisão em segunda instância é que a Constituição estabelece a presunção de inocência, ou seja, o réu não pode ser considerado culpado até prova em contrário.

Diante disso, o processo deveria chegar até o seu final para cumprimento da pena.

Outro argumento é que o sistema carcerário brasileiro está em estado lastimável e as condenações em segunda instância poderiam agravar ainda mais a situação. O Brasil tem hoje uma população carcerária de mais de 600 mil pessoas, com um déficit de 200 mil vagas. Apenas no ano de 2016 o número de presos subiu em mais de 40 mil.

A prisão em segunda instância pode prejudicar ainda mais o sistema carcerário, evidentemente, mas irá atender aos anseios da população pela redução da impunidade. Hoje, mais de 3.500 pessoas podem começar a cumprir pena em virtude dessa decisão.

Para os políticos que ocupam cargos no governo, no entanto, ela não poderá ser aplicada. Somente políticos que não estejam mais em cargos públicos entram na regra. Trata-se do caso de Eduardo Cunha e de Lula, por exemplo, ambos réus em processos na Justiça Federal.

Os políticos com foro privilegiado não são impactados pela decisão do STF enquanto estiverem em seus cargos, o que nos leva ainda a considerar que a decisão apenas torna um pouco menos desigual a justiça para todos.

  • prisão segunda instância

André Arnaldo Pereira

Advogado - Santa Rosa, RS


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